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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO - Os sambaquis
Montes de conchas contam a pré-história (4)

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Além do relato de Paulo Duarte, também consta na obra Antologia Cubatense, selecionada e organizada pela professora Wilma Therezinha Fernandes de Andrade e publicada em 1975 pela Prefeitura Municipal de Cubatão, este relato sobre os sambaquis cubatenses:
 
Exploração Científica dos Sambaquis de Cubatão
(Em busca das origens do Homem Americano)

Contribuição do Arquivo Histórico Municipal de Cubatão ao relatório apresentado pelo prof. André Prous.

I - INTRODUÇÃO

Os vestígios mais antigos dos homens pré-históricos encontrados no Brasil datam de mais de dez mil anos.

O estudo de tais vestígios deixados pelos habitantes primitivos do país não é movido pela simples curiosidade, não visa apenas coletar objetos para museus. Ele permite ter amplas informações sobre as mudanças da natureza, dos climas, dos mares, da fauna, da vegetação..., sobre as adaptações dos grupos humanos a essas modificações naturais, bem como sobre o progresso técnico que permitiu que certos grupos dominassem outros, mais atrasados. Em última análise, ele possibilita uma certa reconstrução do mundo passado, a qual permite entender melhor o mundo atual.

Uma das espécies de vestígios deixados pelo homem pré-histórico são os denominados "sambaquis", de "tamba" (concha) + "qui" (monte) = monte de conchas, os quais em geral são encontrados no litoral.

Aproximadamente a partir do quinto milênio antes da nossa era, pequenos grupos, compostos de poucas famílias, especializaram-se na coleta de mariscos que permitiam obter facilmente uma alimentação abundante. Por isso escolheram para moradia lugares bem perto da água salobra, para obter conchas, e perto da água doce para beber, de enseadas ou rios que passam pelo mangue; para evitar uma umidade muito grande, ficavam acima do nível da maré alta, seja em dunas, seja, melhor ainda, sobre afloramentos rochosos, que davam ao mesmo tempo matéria-prima de pedra para instrumentos de corte (machados e facas) e de percussão (martelos, bigornas e "quebra-cocos").

Os vestígios de comida, constituídos na maior parte de conchas imputrescíveis, eram jogados ao lado da maloca inicial, e com o tempo formavam um amontoamento impressionante, verdadeiro morro sobre o qual os homens passavam a instalar suas cabanas.

Dentro das camadas de conchas encontram-se principalmente instrumentos de pedra e de osso, algumas vezes também o chão das cabanas, além de esqueletos de pessoas que foram lá sepultadas, podendo atingir o número de centenas, entre homens, mulheres e crianças.

De acordo com Josué Camargo Mendes, os caracteres físicos predominantes dos construtores de sambaquis eram os seguintes: "Os indivíduos eram baixos e de constituição extraordinariamente robusta. As impressões das inserções musculares muito marcadas no esqueleto indicam trabalho muscular intenso. A altura média do homem era de 1,63 m; a da mulher, 1,52 m. Possuíam crânios grandes, com calota craniana muito alta. A capacidade craniana era elevada. As faces eram largas e a fronte geralmente inclinada. Os dentes dos indivíduos exumados mostram sempre grande desgaste, que chega mesmo a atingir a linha das gengivas". A esse respeito, Paulo Duarte comenta o seguinte: "Os primitivos usam a boca como instrumento também e, além disso, o mastigar de raízes duras e o molusco ingerido levava também detritos da valva calcária fragmentada ao serem abertas as conchas e muita areia, que serviam de abrasivo."

No Brasil, o estudo científico dos sambaquis é relativamente recente e mesmo em toda a América do Sul poucas são as análises em profundidade levadas a cabo.

No entanto, já em 1928 o grande americanista francês Paul Rivet escrevia o seguinte: "A exploração científica dos sambaquis do litoral brasileiro apresenta enorme interesse, como verifiquei pessoalmente, visitando os sambaquis de Cubatão, perto de Santos. Um estudo sistemático desses depósitos forneceria seguramente dados capitais para a solução do problema das origens do Homem Americano".


Floresta tropical (Mata Atlântica) envoltória do sambaqui nº 5 da Ilha do Casqueirinho,
tendo ao fundo o canal do Estuário de Santos
Foto: Cesar Cunha Ferreira, foto-geógrafo, 9/8/2004

II - DESENVOLVIMENTO

Já em 1904 Benedito Calixto apontava a existência em Cubatão de oito sambaquis e, em base aos textos das duas primeiras sesmarias brasileiras, fazia referência ao particular aspecto do lagamar local no tempo do descobrimento, isto é, na encruzilhada da nossa Pré-História com a História Pátria [1].

Em Cubatão foram encontrados e pesquisados até agora vestígios exclusivamente de tipo sambaqui.

A região onde foram encontradas tais jazidas, por ser baixa, com enseadas profundas de águas rasas e em grande parte ocupada pelo mangue, teve um ambiente extremamente favorável ao desenvolvimento de conchas e crustáceos. Além disso, a água salobra resultante da mistura das águas do rio com as do mar permitia uma pesca abundante.

Os coletores de conchas instalaram-se aqui nas poucas partes firmes e secas: nos morros do continente e nos morros da Ilha dos Casqueirinhos, todos de composição cristalina, nos quais existe um total de, pelo menos, cinco amontoamentos conchíferos.

Alguns desses sambaquis foram, como se verá, em parte danificados no decorrer do tempo.

Deve-se aos esforços, principalmente, de Paulo Duarte, na época em que era diretor do Instituto de Pré-História da Universidade de São Paulo, a salvaguarda de várias jazidas hoje existentes.

A partir de 1963, o sambaqui de Piaçaguera foi pesquisado pelos arqueólogos do Museu Paulista e do Instituto de Pré-História. Este último, em convênio com o "Musée de l'Homme" de Paris, instituição especializada e de renome internacional na matéria.

Desde 1972, o sambaqui nº 1 da Ilha dos Casqueirinhos está sendo pesquisado pelo prof. André Prous, do "Musée de l'Homme", auxiliado pelo prof. Guy Collet e por estudantes do curso de Pré-História da USP. Os outros sambaquis existentes naquela ilha ainda não começaram a ser pesquisados.

A respeito de ambas as pesquisas foi elaborado relatório no qual se baseia o presente trabalho.

De acordo com entendimentos mantidos, todo o material arqueológico (lítico e ósseo) coletado nesses sambaquis será cedido à municipalidade cubatense, quando for constituído o Museu Histórico Regional de Cubatão.

1 - SAMBAQUI DE PIAÇAGUERA - O HOMEM CONTINENTAL [2]

O primeiro sambaqui a ser pesquisado nesta região localiza-se na atual parte continental de Cubatão, em Piaçaguera, na área industrial da Cosipa. Situa-se, mais exatamente, num morro que dista 1 km, rumo Sul, da estação ferroviária (N. E.: precisamente, a estação de Piaçagüera).

Constitui-se principalmente de camadas de conchas de ostras, superpostas, que atingiram uma espessura de mais de três metros.

Depois do sambaqui de Maratuá, na ilha de Santo Amaro, o sambaqui de Piaçagüera é o mais antigo encontrado no Brasil até o presente.

A datação radiocarbônica obtida para a camada de primeira ocupação foi de 2.980 anos antes da era cristã e para a camada de ocupação final, 2.940 a.C.

De acordo com essas datações, podemos concluir que o homem pré-histórico habitante do continente que construiu esse sambaqui ocupou essa região há 4.955 anos atrás (2980 + 1975) (N. E.: 1975 é a data em que este texto foi escrito) e durante um período de tempo provavelmente bem curto de aproximadamente 40 anos (2980 - 2940).

Inúmeros objetos, instrumentos e utensílios encontrados e guardados no Instituto de Pré-História da Universidade de São Paulo, por outro lado, nos dão uma ideia de como vivia esse primitivo habitante pré-histórico de Cubatão. É o que veremos a seguir.

a) Martelos, machados e facas de pedra.

O próprio morro, onde se localiza o sambaqui, sendo constituído de gnaisse, forneceu a matéria-prima para a fabricação da maior parte dos instrumentos líticos, ou de pedra, encontrados. As pedras de gnaisse retiradas do morro eram utilizadas inclusive como simples suportes usados principalmente para quebrar coquinhos.

Os machados, porém, não podiam ser feitos de gnaisse por ser pouco resistente.

Era preciso procurar pedras mais duras noutros lugares. Além disso, gastava-se de sete a dez horas para polir o gume.

Por esse motivo, foram encontrados poucos machados; dez, quase todos de diabásio.

Dessa maneira, compreende-se porque os instrumentos mais raros e mais preciosos para os homens pré-históricos de Piaçaguera eram os machados.

Para dar forma aos machados utilizavam-se martelos, os quais também eram feitos de pedras duras (o próprio diabásio ou quartzita).

O martelo também era empregado para retirar lascas dos blocos de quartzo usadas como facas.

Esta instrumentação lítica é ainda pobre e pouco diversificada. Mas deve-se considerar que era complementada por objetos feitos de osso e por eventuais instrumentos de madeira já desaparecidos.

b) A história das conchinhas de adorno.

Os homens de Piaçaguera certamente davam muita importância aos objetos de adorno, pois iam longe procurar conchinhas para essa finalidade e caçar tubarões, cujos dentes perfurados eram usados como pingentes.

Além dos dentes de tubarão, utilizavam também dentes de mamíferos, de pecari usados como buris, de bugio, de onça, de jacaré e de paca que, perfurados, tinham a mesma finalidade de servir para a confecção de colares e outros objetos de adorno.

Parece que era difícil obter um número suficiente de objetos de adorno para atender às necessidades da população, porque as peças quebradas eram consertadas e reutilizadas, em vez de serem abandonadas.

c) As atividades da caça na serra de Paranapiacaba.

O fato de serem utilizados muitas vezes dentes e ossos de animais como material de adorno comprova que existia, como atividade corrente, a caça de animais.

Corroborando essa conclusão, foram também encontradas pontas de dardo em osso de mamífero e em esporão de arraia, as quais deveriam ser utilizadas pelo homem de Piaçaguera principalmente para caçar.

Portanto, as pesquisas já efetuadas pelo Museu Paulista nos permitem imaginar, de alguma maneira, as aventuras vividas pelo homem de Piaçaguera nas suas movimentadas atividades de caça, certamente ricas em peripécias, realizadas principalmente na serra de Paranapiacaba.

d) Um ritual característico e cheio de respeito pelo homem.

O homem pré-histórico de Piaçaguera desse tempo enterrava seus mortos, na sua maioria, com os membros fletidos em decúbito lateral.

Nas sepulturas, acompanhando os corpos, colocava-se corante mineral vermelho, adornos, tais como pingentes e colares, e instrumentos, entre os quais o precioso machado. Justamente as coisas mais valiosas do grupo eram deixadas com os mortos.

2 - SAMBAQUI Nº 1 DA ILHA DOS CASQUEIRINHOS - O HOMEM ILHÉU.

A segunda jazida a ser pesquisada em Cubatão localiza-se na Ilha dos Casqueirinhos, na sua parte mais setentrional.

Os vestígios descobertos, quinze metros quadrados no total, constituem parte do pouco que sobrou de uma jazida que parece ter sido grande e correspondem à sua região mais periférica.

Como todo sambaqui, esse depósito constitui-se primordialmente de camadas de conchas superpostas. Dentro dessas camadas foram encontrados materiais arqueológicos, líticos e ósseos, e alguns corpos sepultados.

O fato, porém, que chama a atenção é a grande quantidade de restos de peixes encontrados, os quais são dos mais variados tamanhos e que, por si só, independentemente de qualquer processo de datação química, indicam aproximadamente a época em que esse sambaqui foi construído.

Há ainda uma característica especial que, por ser sui generis, merece ser posta em relevo: os pesquisadores encontraram, na camada inferior, alguns degraus cavados na areia conduzindo a sepulturas existentes embaixo dos níveis de conchas e peixes.

Em que época, porém, mais exatamente, o homem pré-histórico desse sambaqui teria habitado a ilha?

De acordo com o processo de datação radiocarbônica a que foi submetida, quando começaram as pesquisas, uma amostra de conchas coletadas pelo prof. José Afonso Moraes de Bueno Passos, representante nesta área do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), podemos afirmar que o homem deste sambaqui viveu na ilha há mais de 2.155 anos atrás (N. E.: em relação ao ano em que este texto foi escrito, 1975), ou seja, 180 anos antes de Cristo, aproximadamente. As camadas inferiores, de ocupação inicial, cujo estudo ainda não foi concluído, devem ser mais antigas.

O homem ilhéu desse tempo viveu, pois, aproximadamente 2.700 anos depois do homem continental de Piaçaguera.

A partir dos vestígios encontrados neste sambaqui podemos perfeitamente formar uma ideia e conhecer alguns aspectos da vida do homem ilhéu, habitante pré-histórico do atual Município de Cubatão. É o de que trataremos.

a) Novos hábitos alimentares.

Sabe-se que no começo da nossa era houve mudança nos hábitos alimentares, de vez que o alimento preferido não era mais o contido nas conchas, mas sim o peixe.

O fato do homem ilhéu habitante pré-histórico de Cubatão ter vivido relativamente próximo ao início da era cristã (apenas 2 séculos antes) talvez já explique o porque do consumo de uma grande quantidade de peixes: tratava-se possivelmente de um período de transição para o novo tipo de vida com outros usos e costumes.

Além das ostras e mexilhões que ainda prevaleciam, o primitivo habitante de Cubatão dessa época alimentava-se também de caranguejos.

No entanto, alguns vestígios de seláquios - tubarões e arraias - bem como de mamíferos terrestres também foram encontrados.

b) Ainda a fabricação de instrumentos de pedra.

Esse homem da ilha, que habitou Cubatão quase três milênios depois do primitivo cubatense continental, continuava fabricando seus instrumentos de pedra, praticamente da mesma maneira.

Assim, os utensílios que, apesar de resistentes, não precisavam ser muito duros, como os quebra-coquinhos, por exemplo, continuavam a ser feitos de gnaisse; outros instrumentos, como os machados e martelos que deviam ter maior durabilidade, também continuavam sendo feitos de diabásio; finalmente, servindo como facas, utilizavam-se ainda de lascas cortantes de quartzo.

Mas, diga-se de passagem, as pedras serviam ainda para outras finalidades. As que eram consideradas bonitas pela sua forma ou cor eram simplesmente colecionadas e as de cor vermelha eram utilizadas como corante para pintura corporal.

c) Os utensílios de osso.

O homem ilhéu, habitante pré-histórico de Cubatão, além da pedra, utilizava-se também de ossos de animais para fabricar seus utensílios.

No entanto, os pesquisadores encontraram poucos objetos de osso na jazida; uma pequena ponta, provavelmente de dardo, em forma de losango; uma maior, de flecha, feita com um osso de perna de mamífero cortada em bisel e três pontas polidas, sendo duas em osso de mamífero e uma em osso de peixe. Além disso, foi descoberta uma vértebra de seláquio, perfurada artificialmente, que devia ser usada como adorno.

d) O que nos revelariam os degraus da jazida?

Os degraus cavados na areia em direção aos corpos sepultados abaixo da camada inferior, como já dissemos, são absolutamente peculiares a essa jazida, de vez que não são observados noutros sambaquis.

No atual estágio das pesquisas, no entanto, não se sabe ainda como interpretar a existência de tais degraus. É curioso porém notar que um dos corpos sepultados, aos quais os degraus conduzem, tem os pés cercados por uma série de pequenas bolas de gnaisse.

Como pudemos ver, apesar das pesquisas não estarem ainda concluídas e apesar de apresentarem um quadro parcial em relação às informações que teriam sido fornecidas pelo estudo do sambaqui integralmente conservado, elas nos permitem conhecer uma grande parte da vida desse habitante pré-histórico da Ilha.

Depois de concluídos os trabalhos de campo e as análises de material, e após uma comparação mais detalhada com os achados de Piaçaguera, mostrando a eventual evolução técnica, alimentar, cultural etc. da população local no período compreendido entre a edificação das duas jazidas, podem-se esperar resultados ainda mais satisfatórios.

3) OUTROS SAMBAQUIS OU CASQUEIROS DA ILHA - UMA NOVA ADAPTAÇÃO ECOLÓGICA.

Além do sambaqui nº 1 a que nos referimos, existem pelo menos mais três jazidas na Ilha dos Casqueirinhos. A exploração científica desses depósitos, porém, ainda não foi iniciada.

a) Um sambaqui diferente de uma era diferente.

Um dos três sambaquis ainda não pesquisados da Ilha dos Casqueirinhos é composto essencialmente de conchas de mexilhões. Isso evidencia um novo tipo de adaptação ecológica, isto é, uma nova forma de adaptação do homem ilhéu pré-histórico ao meio-ambiente em nossa região.

Esse depósito, diferente dos outros já pesquisados, evidencia que o homem desse sambaqui viveu numa era diferente da do homem continental de Piaçaguera e da do próprio homem ilhéu do sambaqui nº 1.

b) Anterior ao sambaqui de Piaçagüera?

Em que época teria vivido esse habitante pré-histórico, cujos vestígios se encontram no sambaqui nº 2 da ilha?

Teria habitado a ilha há mais de 5.000 anos atrás, sendo, portanto, anterior ao homem continental de Piaçaguera?

Ou teria tido uma existência mais recente, numa era provavelmente intermediária entre a edificação das jazidas do homem de Piaçaguera (2940 a. C.) e do homem ilhéu do sambaqui nº 1 (180 a. C.)?

Essas perguntas, bem como muitas outras que podem ser formuladas, somente com a continuação das pesquisas poderão ser respondidas.


Conchas, encontradas em abundância em sambaquis na Ilha do Casqueirinho 
Foto: Cesar Cunha Ferreira, foto-geógrafo, 9/8/2004

III - CONCLUSÃO

Em Cubatão, ultimamente, os pesquisadores têm obtido todo apoio, tanto da Prefeitura Municipal quanto de outras entidades. Mas há anos atrás, antes de se iniciar aquela exploração científica, já tinham as jazidas sofrido lastimáveis perdas. Em 1928, Paul Rivet, ao visitar os sambaquis de Cubatão, ficou impressionado com o que viu e com a indiferença governamental.

Em outros locais, ainda hoje os depósitos arqueológicos continuam a não ser respeitados, num flagrante desacato às disposições legais vigentes.

Já em 1904 Benedito Calixto dizia: "Temos fé, entretanto, que este indiferentismo e pouco caso há de findar e que um dia se tratará seriamente, já não diremos de estudá-los convenientemente, mas ao menos de impedir a destruição completa desses sambaquis, ou por outra, desses restos de sambaquis, que ainda existem (...). Nesse clamor aos poderes públicos fazemos coro com A. Löfgren, H. von Ihering e outros que tanto se interessam por esta questão de conservação dos Sambaquis".

É necessário, pois, conter a onda de destruição de um patrimônio valioso que precisamos preservar até que a Ciência dele se tenha utilizado como um grande livro do nosso passado desconhecido.

"Só Deus sabe com que enternecimento e com que unção mesmo", diz o cientista Paulo Duarte, "tocamos essas ossadas friáveis, nesses crânios fossilizados, nesses implementos rudes que ele (o homem pré-histórico) fabricou com as próprias mãos, quando os libertamos da ganga de conchas desfeitas, por ele aí colocadas com respeito pré-religioso (...). Sentimento e respeito profundo por esses restos mineralizados que vândalos modernos (...) transformam em farinha de ostra para adubo ou comida de animais domésticos.

"É por isso que (...) nos batemos e, como Jeremias, clamamos por uma ação comum contra a anticientífica, anticultural, anti-humana, antirreligiosa e anticivilizada profanação dessas jazidas, teste lastimável de um primarismo que deprime e envergonha".

Esperamos que em Cubatão as jazidas arqueológicas continuem a ser respeitadas e que os cientistas tenham o apoio necessário para prosseguir em sua exploração científica.

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[1] Dentro daquele quadro primitivo encontrava-se especialmente evidenciado o porto continental das Armadias ou de Peaçaba (Piaçaguera) junto ao caminho que vai para Piratininga e o porto insular dos Outeiros da Ilha de Caramacoara (Ilha dos Casqueirinhos), junto a uma das barras do maior rio da Baixada - o Cubatão. Ver: Calixto, Benedito - Algumas notas e informações sobre a situação dos sambaquis de Itanhaém e de Santos. In: Revista do Museu Paulista, vol. VI, São Paulo, 1904, pág. 512-518.

[2] Ao usarmos, no presente trabalho, as expressões "homem continental" e "homem ilhéu" não pretendemos atribuir aos termos um significado particular. Trata-se simplesmente de um recurso didático adotado para distinguir o construtor do sambaqui de Piaçaguera, local que se encontra desde os primórdios da nossa História na parte continental do atual município de Cubatão, do construtor do sambaqui da Ilha dos Casqueirinhos. A existência dessa ilha também é comprovada desde os primórdios da nossa História. Não sabemos, porém, se existem dados que confirmem ou neguem a existência da ilha na época em que o sambaqui foi construído.

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