PRIMEIRA PARTE (1886-1895)Capítulo VII
Prazo da concessão, atraso nas obras
Segundo a lei n. 1.746, de 13 de outubro de 1869, reguladora das concessões portuárias, o prazo destas se fixaria "conforme as
dificuldades da empresa, não podendo ser, em caso nenhum, maior de 90 anos".
O decreto n. 9.979, de 12 de julho de 1888, que autorizou o contrato com José Pinto de Oliveira e outros, marcou a essa concessão o prazo de 39 anos, a contar de tal data. Entre os concorrentes de então, Carvalho Bastos propusera 16, Pinto
Gonçalves 31, Pinto de Oliveira 36, barão de Ipanema 41 e Mirandola 46 anos.
Eliminadas as duas primeiras, conforme se viu,por várias razões, entre as quais a mais importante era a falta de idoneidade financeira, prevaleceu a terceira,
com o prazo fixado em 39 anos.
"Gozarão os concessionários durante todo o prazo de seu privilégio, que fica elevado a noventa anos, contados da data deste decreto"…, tais, já vimos, as palavras iniciais da cláusula VI do decreto n. 966, de 7 de novembro de 1890, do punho de
Francisco Glycerio. Ministro de um governo discricionário, podia fazê-lo como compensação de novos e pesados ônus impostos aos contratantes. O decreto, por isso, passou sem protesto até 1894, quando o dr. Adolpho Pinto escreveu:
No artigo VI do decreto de 7 de novembro, cujas disposições temos procurado esclarecer, logo após o incidente – durante o prazo do
privilégio – esgueira-se esta outra subordinada – que fica elevado a 90 anos contados deste decreto… Meia dúzia de palavras, apenas, que despojam a Nação de cerca de cem mil contos de réis!
Efetivamente já vimos que, pelo decreto de concessão, tinha a empresa do cais o usufruto das obras por 39 anos, depois dos quais passariam elas com todas as suas benfeitorias para o pleno domínio e posse da Nação, sem indenização alguma.
Nestas condições o ato do Governo prorrogando o prazo da concessão, que então já estava reduzida a 37 anos por mais 90 anos, contados da data do decreto da prorrogação, equivale à outorga de um próprio nacional, sem compensação nenhuma, ao uso e
gozo de particulares, pelo tempo de 53 anos, pouco importando para o caso, por não alterar os efeitos da dádiva, a circunstância de ser ela feita quando ainda não estava o Governo na posse do imóvel.
Elevado como foi o capital correspondente ao trecho do cais em construção à quantia de 14.627:194$707, admitindo mesmo que a obra fique limitada a essa parte, e que a renda líquida anual da empresa durante o prazo de 90 anos a que foi elevado o
"privilégio", não exceda de 12% sobre o capital fixado, ainda assim a importância dos lucros ascenderia à soma de 1.755:263$360 por ano, o que corresponde a nada menos de 93.000:000$000 no fim dos 53 anos da prorrogação concedida.
Pelo mínimo, este é o quantitativo em que se pode computar hoje a soma de dinheiros que aquele ato de suprema munificência oficial desviou do tesouro público para as arcas da empresa.
Aos que têm alguma imaginação e podem prever, através de um século, o que será São Paulo, o que será o movimento do porto de Santos, nós deixamos o trabalho de calcular o valor real desse delírio da prodigalidade
[57].
Não havia violação da lei de 1869, desde que permitia ela o prazo máximo de 90 anos. Era este, convinha lembrar, o prazo da concessão Estrella-Andrade Pertence,
recebido sem oposição, em 1873. Prolongar mais de 5 vezes o cais primitivo era, além das despesas necessárias, construir todas as obras complementares, aterros, armazéns, telheiros, linhas férreas, ruas, desvios, o que, se calculava, em mais de
40.000 contos até Paquetá e entre 50 e 60.000 até Outeirinhos.
Para tanto só havia duas soluções: ou o Governo, de acordo com a empresa, elevaria as taxas, com prejuízo do comércio; ou prorrogaria, ainda de conformidade com ela, o prazo da concessão, mantendo inalteráveis aquelas. Foi o que fez. Era isto
tanto mais aconselhável, quanto as referidas taxas teriam que reduzir-se, como vimos, logo que os lucros subissem além de 12%. A alternativa assim se explicou pelo Diario de Santos, mais tarde, quando esta e outras questões voltaram à
discussão, em 1896:
Em virtude do primitivo contrato, de 1888, tinha a Companhia de construir 866 metros de cais, nos quais devia despender 3.851:505$570.
Deu-se-lhe para remunerar o capital que fosse despendido, o usufruto das obras por 39 anos.
Atualmente tem a Companhia a seu cargo construir 4.590 metros de cais, ou seja, um quíntuplo da obra primitivamente contratada.
Aceitando-se as bases do orçamento Saboia, feito em 1886, com o câmbio a 26, o capital a empregar deve ser cinquenta vezes mais, e se para amortizar o capital da construção de 866 metros dava o Governo à Companhia Docas o prazo de 39 anos, para a
construção de 4.590 metros devia dar-lhe, não 90 anos, porém, prazo muito superior.
A questão se resolve em uma simples regra de proporção.
Atenda-se agora a que os estudos do dr. Saboia eram deficientíssimos. A dragagem e aterro excederam em muito ao orçado: a faixa do cais aumentada, houve necessidade de se construir bueiros para escoamento das águas pluviais, de quebrar a rocha
submarina entre a Alfândega e a Capitania, e de executar outras obras importantes e custosas para solidez a construção do cais.
Atenda-se ainda à depressão cambial destes últimos anos que fez aumentar de mais de 200% o custo dos materiais e salários de trabalhadores.
Temos assim o capital do cais considerado somente até o Paquetá elevado a dez vezes mais, devendo ascender a cerca de 40 mil contos para ficar a obra completa, com armazéns, nova casa de máquinas, trilhos, guindastes, calçamentos, canalização de
águas pluviais etc., computado aí o aumento da dragagem, aterro, quebramento da laje submarina etc.
Para chegar aos Outeirinhos ainda terá a Companhia de despender mais 50 ou 60 mil contos conforme a instalação de armazéns e máquinas que neste trecho se reconheçam necessários.
Nestas condições, tomando-se mesmo, para termo da proporção, o orçamento Saboia e o dispêndio a fazer com as obras novas, vê-se que o prazo de 90 anos hoje concedido à Companhia é muito menos favorável do que o prazo de 39 anos
do decreto n. 9.979 de 12 de julho de 1858 [58].
A São Paulo Railway, a Paulista, a Mogiana, a Sorocabana tinham então privilégio por 90 anos. Além disso, o que não sucedia com as Docas, gozavam de garantia de
juros. Foi esse paralelo que Osorio de Almeida pôs em foco:
Estudando as duas empresas encontrará o leitor entre elas muitos pontos de contato, achará ao mesmo tempo algumas diferenças.
Vejamos os primeiros:
1º - Ambas contrataram com o Governo a satisfação de necessidades públicas; transporte fácil, seguro, rápido e econômico – a estrada de ferro; embarque e desembarque, fáceis, seguros, rápidos e econômicos – o cais.
2º - Para a estrada o privilégio de 90 anos, para o cais o de 39 anos pelo contrato de 1888.
3º - Para nenhuma dessas obras o Governo entra com todo ou com parte do capital.
Vejamos agora as diferenças, tomando sempre em consideração o contrato de 1888 do cais, antes das modificações feitas pelo general Glycerio, a que depois atenderemos:
1º - A estrada teve garantia de juros de 7% para o seu capital, hoje não a tem direta, porque a renunciou em tempo oportuno, mas a tem direta visto que pode elevar suas tarifas todas as vezes que o seu dividendo desça a aquém daquela taxa durante
dois anos consecutivos.
O cais não teve e não tem garantia de juros e estes não têm limite mínimo. De modo que estes poderiam tornar-se nulos, caso fosse realizada a ideia, aliás comprada por bom preço, da estrada de ferro de São Sebastião e que para este porto fosse
desviada a maior parte do comércio de Santos.
2º - Findo o prazo da concessão, a estrada continuará a ser propriedade da São Paulo Railway Company, de modo que o Estado terá ficado apenas com a utilidade indireta, sempre originária das estradas de ferro.
Findo o prazo da concessão, o cais, com todas as benfeitorias e material rodante, passará a ser propriedade inteiramente gratuita do Estado. De modo que os concessionários que ali empregaram os seus capitais são apenas os usufrutuários das obras.
3º - A estrada teve isenção de direitos para o material de sua construção e, cremos nós, o tem para seu combustível.
O cais não tinha esse favor e só obteve quando o ilustre paulista Glycerio assinou o decreto n. 966, de 7 de novembro de 1890.
4º - A estrada só pode ser resgatada trinta anos depois de inaugurado o seu tráfego, tomando-se para preço do resgate quantia tal que dê juro igual ao rendimento médio do último quinquênio.
O resgate do cais poderá ser feito em qualquer tempo, depois dos 10 primeiros anos de sua conclusão, e o preço será a quantia em apólices que dê renda equivalente a 8% de todo o capital efetivamente empregado na empresa.
5º - As tarifas da estrada só poderão ser reduzidas quando os seus lucros líquidos excederem, durante dois anos consecutivos, a 12% do seu capital. E é muito fácil admitir, segundo tem mostrado a experiência, que tal fato não se tenha dado nas
estradas paulistas, principalmente com a antiga lei de sociedades anônimas, pela qual ações beneficiárias, fundos de reserva etc., não eram considerados como lucros líquidos.
As tarifas o cais serão revistas de cinco em cinco anos e sofrerão redução logo que os lucros líquidos atinjam a 12% do seu capital [59]
Mas não foi somente a extensão do prazo da concessão que provocou a campanha de 1894. Havia também sua classificação em privilégio, por força do referido
decreto n. 966, de 7 de novembro de 1890, a saber: "Gozarão os concessionários durante todo o prazo de seu privilégio que fica elevado a 90 anos…"
Contrabando era o que se queria passar com essa palavra, na análise adversa [60]. Ela apelava para a lei de 1869, explicada pelo seu principal autor, o visconde de Itaboraí como exclusiva do monopólio [61].
Esquecia-se, no entanto, que, do ponto de vista puramente legal, o decreto do Governo Provisório fazia direito novo, e que, sob o aspecto administrativo, a
livre concorrência nos serviços portuários de Santos – depois do vulto que eles assumiram com as sucessivas ampliações do projeto primitivo -, ameaçaria ao mesmo tempo a concessionária, o comércio e a fazenda; a primeira, na segurança dos seus
capitais; a segunda, na eficiência dos serviços; e a terceira, no valor do patrimônio que lhe deve reverter gratuitamente no fim de certo prazo.
Aliás, obras como essa geram um privilégio de fato, com os inconvenientes próprios do monopólio, mas sem as vantagens da regulamentação em bem do público. Já o
reconhecera Saboia e Silva encarecendo a exploração oficial, ao escrever em seu relatório: "O melhoramento de um porto como o de Santos, a que se acha vinculada a prosperidade de mais de uma província, não deve ser objeto de uma empresa
comercial, que não poderia deixar de monopolizar o serviço do porto".
Por último, não se poupou a empresa nas prorrogações que obteve, para conclusão de seus trabalhos. O decreto n. 9.979, de 12 de julho de 1888 (cais do extremo da ponte velha da estrada de ferro até à Rua Braz Cubas), autorizando o contrato de
concessão, fixou como termo três anos contados da sua data, isto é, 12 de julho de 1891; a empresa pagaria dois contos de réis de multa por mês de atraso.
O decreto n. 10.277, de 30 de julho de 1889 (cais até o enrocamento que precede a ponte nova da estrada de ferro) dilatou o termo dos trabalhos por mais um ano, isto é, 30 de julho de 1892. O decreto n. 966, de 7 de novembro de 1890 (cais até
Paquetá) deu o prazo de cinco anos para termo de todos os trabalhos, a contar de então, o que se cumpriria em 7 de novembro de 1895. E, finalmente, o decreto n. 942, de 15 de julho de 1892 (cais até os Outeirinhos) concedeu mais cinco anos,
contados de 7 de novembro de 1895, data em que, diz o respectivo texto, devia "estar terminada a construção de todo o cais concedido antes desta data".
Não construiu a Companhia, nos termos convencionados, o cais a que se havia obrigado; nem teve multa por isso. Originou-se daí (como tinha tido também sua fonte no aumento do capital e do prazo da concessão) certa acusação de favorita dos
governos. Entretanto, se o cais acompanhava o progresso do porto, cada vez mais intenso, e se só auferia o dinheiro para remunerá-lo nas taxas cobradas, não era de interesse direto da Companhia terminar tudo o mais cedo possível?
Declararam sempre os empresários seu propósito com esse fim, não havendo por que lhes negar crédito, tanto mais quanto obstáculos de toda ordem – processuais, técnicos, sanitários, administrativos e até políticos – falavam, pelo contraste, em
favor deles.
A oposição, que já então não se escondia, chegou a pintar, com cores róseas, o que eram dificuldades, pois que entre 1888, assinatura do contrato, e 1892, crise no apogeu, tudo havia mudado:
Os concessionários do cais, jamais poderiam deparar melhor época para meter mãos à obra e converter em realidade a magna aspiração
paulista.
Tudo lhes viera em auxílio, tudo tinham nas melhores condições possíveis e desejáveis – dinheiro, braços e materiais; e tão cônscios estavam de que a sorte os favorecia com a mais pródiga munificência, que assentaram desde logo
explorar inter pocula os proveitos da negociata… Pois bem, já se passaram três, quatro, cinco e quase seis anos, e ainda a primeira parte do cais, da Alfândega até a ponte inglesa, não está concluída; e pungente seria a missão de quem se
propusesse fazer o inventário das desgraças e dos prejuízos que de semelhante fato resultaram para o Estado, tanto sob o ponto de vista sanitário, como em relação aos interesses comerciais que têm no porto e na cidade de Santos estação obrigada
[62].
A crise comercial, a febre amarela, a dificuldade em obter trabalhadores, o fundo lodoso do canal, a enorme laje existente em certa parte
dele, os embargos judiciais de pretensos posseiros, tudo isso constituía poderosos elementos de prova [63]. Mas a maior estava na construção da
obra, sem nada pesar aos cofres da Nação, num esforço de perseverança que não teria igual no país.
Planejadas em moldes reduzidos, mas logo ampliadas ao que deviam ser, as Docas de Santos poderiam talvez não ter razão neste ou naquele incidente de sua vida, mas a teriam no tempo, em sua significação total.
E se de filhos de São Paulo lhe advieram tantas opugnações sucessivas e, por vezes, injustas, a paulistas, dois sobretudo, devem elas a compreensão imediata do que ofereceram dois rio-grandenses ousados. Coisas, por exemplo, que, no próprio
Parlamento, eco da imprensa, se teriam obtido sub-repticiamente, tiveram, muito tempo depois, justificação cabal.
Descrevera Adolpho Pinto o decreto n. 966, de 7 de novembro de 1890, como um dos frutos da "orgia sardanapalesca que se chamou Governo Provisório". Não acudiu à chamada Francisco Glycerio, mas, muito tempo depois, contou com naturalidade como fez
as debatidas concessões, sem valimentos políticos ou outros quaisquer, nem sequer conhecendo de vista os empresários. Não é demais citá-lo na íntegra (Senado, 11 de julho de 1906):
O SR. FRANCISCO GLYCERIO – Sr. presidente, a questão das Docas de Santos preocupou o Império durante mais de 30 anos. O Império cedeu à
Província de São Paulo o direito de mandar construir as docas. Essa era uma questão vital para a Província de São Paulo, de modo que quando a mim foi dada a gerência do antigo Ministério da Agricultura, compareceu à minha presença o sr. Candido
Gaffrée, diretor das Docas, pessoa a quem via pela primeira vez. Perguntei-lhe o que pretendia. Respondeu-me que pretendia obter favores do Governo Provisório, para ver se era possível construir as Docas de santos de que ele e alguns amigos eram
concessionários.
- Mas, repliquei eu, o senhor tem todos os elementos para levar a efeito a construção daquela importante obra?
- Sim, respondeu-me ele.
- Pois bem, volte para o seu escritório, tornei eu, faça a proposta que imaginar, que eu lh'a concederei.
O sr. Gaffrée apresentou a sua proposta alguns dias depois e eu, no meu gabinete ministerial, dei o despacho de tarifa mandando informar aos diretores das obras públicas, sem mesmo dar a entrada do estilo a esse papel.
A todas as reclamações da Secretaria contra o pedido do sr. Gaffrée, opus tenaz resistência, defendendo o seu direito e promulgando o decreto de 7 de novembro de 1890, em virtude do qual aquela empresa se julgou abrigada dos azares da sorte e pô
de concluir as obras. Daí para cá jamais opus o mais ligeiro obstáculo a essas obras.
O SR. URBANO SANTOS – Mesmo porque, como v. ex. demonstrou, foi v. ex. o seu autor.
Imagem: reprodução parcial da página 47
[57] Diario Popular, 19 de junho de 1894. O eco em 1896 não
faltará. "Prazo de 90 anos, senhores! A vida de duas gerações! Vamos calcular em quanto importa esta concessão. Capital da empresa, 14.627:194$730. Dando de barato que a renda nunca exceda de 12%, teremos; 12% sobre este capital – a importância
de 1.755:263$360 por ano. Em 53 anos, que tantos são os acrescidos aos 39 do contrato, isto importa em 93.000 contos de reis, quantia esta, senhores, que devia ser recolhida aos cofres públicos para daí reverter em benefício da população, e de
que este decreto fez presente à empresa de amor e graça, de mão beijada, sem a menor razão de ser. É generosidade demais, infelizmente generosidade à custa alheia. 93.000:000$000 é muito! Que será do porto em 90 anos? A que importância subirá o
comércio daquele importante e já tão rico estado em 90 anos? Durante estes 90 anos está jungido a esta empresa, a este privilégio, atado de pés e mãos. Para a concessão d prazo de 90 anos, violou-se primeiro o contrato, no qual tinha sido
estipulado por oferta dos próprios interessados o prazo de 39 anos; violou-se o edital de concorrência, no qual estava estabelecido que o prazo não podia exceder de 50 anos; violou-se a própria lei de 1869, que se permite o prazo máximo de 90
anos e como concessão primitiva e não como prorrogação, porque como prorrogação os concessionários ficaram com o prazo de 92 anos, 3 meses e 25 dias". Moraes Barros, Senado, 23 de novembro de 1896.
[58] A Companhia Docas de Santos e a Alfandega de São Paulo, 2ª série, cit. Pág. 31.
[59] Osorio de Almeida, O caes de Santos, Estado de São Paulo, 22 de julho de 1894.
[60] "Comecemos por levantar o véu do grosso contrabando que se pretende passar, mal envolto nestas simples palavras – seu privilégio – habilmente
enxertadas na primeira proposição subordinada do período citado. Com efeito, pela primeira vez nas relações contratuais entre o Governo Geral e a empresa do cais de Santos, aparece a concessão desta obra qualificada, ainda que incidentemente ou
com pé de lã, de privilégio". Adolpho Pinto, Caes de Santos, Diario Popular, 18 de junho de 1894. – Adiante: "Introduzida assim, ob e sub-repticiamente a palavra privilégio…" id.
[61] "O SR. VISCONDE DE ITABORAÍ – Quais são as
concessões que o Governo ficaria autorizado a fazer aos empresários por este projeto?
"Apenas a de se incorporarem como sociedades anônimas e a dar-lhes faculdade de poderem desapropriar, na forma da lei, os terrenos de que necessitarem para a construção de docas. E que ônus se impõem às companhias? O de cederem todas as obras ao
Estado no fim de 90 anos. Que desvantagens, pois, resultariam para o Estado ou para o comércio? Nenhuma, exceto nos portos em que a faculdade de construir uma doca equivale a um privilégio exclusivo.
"O SR. SILVEIRA DA MOTTA – E as taxas da entrada nas docas?
"O SR. VISCONDE DE ITABORAÍ – Até isso poderia o Governo deixar às companhias; a concorrência estabelecerá as taxas razoáveis.
"O SR. SARAIVA – O projeto dá ao Governo a faculdade de prover as taxas.
"O SR. VISCONDE DE ITABORAÍ – Isso mesmo creio que não seria preciso; uma vez que não houvesse privilégio exclusivo; desde que uma doca exigir mais do que valer o serviço, os navios não entrarão nela, continuarão a fazer as cargas e descargas do
mesmo modo por que o fazem agora, ou construir-se-ão docas que estabeleçam concorrência com a primeira". Senado, 16 de setembro de 1869.
[62] Adolpho Pinto, O caes de Santos, Diario Popular, 15 de junho de 1894.
[63] "Quanto ao desenvolvimento que as obras do cais têm tido, apelam os suplicantes para o testemunho do digno engenheiro
fiscal do Governo Federal, junto a esta empresa, que poderá atestar quais os embaraços criados por todos quantos deviam facilitar à empresa o andamento das obras, e não obstante esses embaraços e a epidemia que reinou ali no verão último, a
empresa tem prosseguido ativamente nas obras, importando, com grande sacrifício pecuniário, o seu material pesado de construção por vapores, pagando fretes extraordinariamente altos para ganhar o tempo perdido com a greve de operários na Europa,
e trabalhando constantemente no referido local que está em grande parte pronto, de forma a concluir, como esperam, essas obras, no prazo que lhes foi concedido". Memorial da diretoria ao ministro da Viação e Obras Públicas, 3 de fevereiro de
1890.
Ainda: "As imensas dificuldades com que a digna diretoria teve de lutar, não só quanto à construção das obras, que foi sempre mantida em
plena atividade, apesar da crise política e financeira por que passou o nosso país, mas principalmente quanto à organização de um serviço entre nós inteiramente novo e ainda não regulamentado oficialmente…" Parecer do Conselho Fiscal, 1893.
Santos primitivo. Porto do Bispo no Valongo, em 1893 (tela de
Benedito Calixto)
Imagem: reprodução da página 50-a