Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/baixada/bs001c5.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 09/13/05 11:26:12
Clique aqui para voltar à página inicial de Baixada Santista
BAIXADA SANTISTA/temas - AGENDA 21
Câmara e Agenda 21 Regional

Com o título: "Câmara e Agenda 21 Regional - Para uma Rede de Cidades Sustentáveis - A Região Metropolitana da Baixada Santista", esta tese foi defendida em 2004 na Universidade Federal de São Carlos/Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia/Programa de Pós-Graduação e Engenharia Urbana, por Sílvia de Castro Bacellar do Carmo, tendo como orientador o professor-doutor Luiz Antônio Nigro Falcoski, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Engenharia Urbana. Esta é a continuação da transcrição integral desse estudo, oferecida pela autora a Novo Milênio:
Leva para a página anterior

CÂMARA E AGENDA 21 REGIONAL - PARTE I - Capítulo 1 (cont.)

Sílvia de Castro Bacellar do Carmo

1.5 - Planejamento e Gestão Urbano Ambiental no Contexto Nacional

Esta seção reúne os conceitos, diretrizes e instrumentos que norteiam as novas linhas de conduta no planejamento urbano brasileiro, comenta a inserção da dimensão ambiental como elemento essencial da composição dos planos, e discute as mudanças decorrentes com a aprovação do Estatuto da Cidade, complementando a investigação teórica sobre a questão da sustentabilidade no meio urbano. 

Dentro deste contexto, promove um recorte na questão de planejamento metropolitano, dedicando um item específico ao assunto por ser referente ao campo espacial definido. 

1.5.1 Tendências do Planejamento e da Gestão Urbana

Previamente à discussão dos novos parâmetros que norteiam atualmente o planejamento urbano no Brasil, traça-se um breve histórico das fases pelas quais passou, com o intuito de reforçar o entendimento das novas perspectivas que norteiam os planos dirigidos ao espaço urbano, assim como fornecer um quadro sucinto da evolução de sua composição.

De acordo com Villaça (1999b) a produção do planejamento urbano em nosso país pode ser dividido em três períodos:

o primeiro, correspondente ao final do séc XIX e primeiras décadas do séc XX, onde os planos visavam melhoramentos relacionados à higiene pública e embelezamentos das cidades, representando as propostas da classe social dominante;

o segundo, do início da década de 1930 até a década de 1990, caracterizado pela ênfase técnica e pelo plano-discurso, assim denominados os planos de cunho intelectual, sem compromissos com a viabilidade e execução;

e, por fim, o terceiro período, a partir da década de 1990 até os dias atuais, que surgiu como uma contraposição ao segundo período, mas que manteve e ainda mantém algumas das concepções do período anterior.

O segundo período, por sua vez, também pode ser subdividido em três outros: 

a) de 1930 a 1965: fase do Urbanismo e do Plano Diretor. Representou uma transição onde a falta de solução para os problemas urbanos começa a ganhar destaque, e o embelezamento cede lugar para a infra-estrutura, sendo caracterizadas como décadas de intensa remodelação urbana; 

b) de 1965 a 1971, fase dos Super Planos [1]. A abrangência dos planos é ampliada, não se limitando mais aos aspectos físicos, e propagam-se os conceitos de interdisciplinaridade e de integração regional. Os planos deixam de ser elaborados pelo quadro de funcionários da administração municipal, e passam a ser criados por especialistas externos, sem um intercâmbio entre as propostas e a viabilidade de implementação das mesmas; e 

c) de 1971 a 1992, fase denominada de Plano sem Mapa. Os planos voltam a serem elaborados por técnicos internos das prefeituras, com uma estruturação completamente diferenciada dos anteriores: os diagnósticos técnicos e mapas são descartados, ou substancialmente reduzidos, passando a compor o produto final uma lista de objetivos, políticas e diretrizes, que necessitam de detalhamento futuro para serem colocados em prática.

Passando do tema planejamento para a gestão urbana [2], com o intuito de ampliar o quadro exposto anteriormente sobre a periodicidade dos tipos de planejamento praticados, insere-se a seguir a observação formulada por Bonduki (2000).

Segundo este autor, o período de 1930 a 1985 corresponde à época onde o modelo central-desenvolvimentista regia as políticas públicas urbanas. Este modelo foi esboçado a partir do primeiro governo do Presidente Getúlio Vargas (1930-45) e consolidou-se no regime militar (1964-85). Seus principais aspectos são:

autoritarismo;

centralização da gestão;

ausência de participação – em qualquer nível – dos usuários e da sociedade em geral;

desrespeito ao meio-ambiente e ao patrimônio cultural;

desarticulação das políticas setoriais;

prioridades às vezes desnecessárias, canalizando recursos públicos para empreiteiras e relegando a segundo plano as iniciativas na área social;

priorização, nos financiamentos habitacionais, para os setores de maior renda.

Ao colocar que o modelo central-desenvolvimentista ainda influencia as ações do poder público, Bonduki (2000) concorda com Villaça (1999b) quando este coloca que o planejamento urbano praticado em nossos dias possui em suas concepções, características da fase imediatamente anterior. A partir desta consideração, pode-se dizer que na verdade, o planejamento urbano brasileiro encontra-se ainda em uma fase de transição. 

A difusão do Plano Diretor no Brasil deu-se a partir da década de 1940, apesar desta denominação ter sido utilizada para o Plano Agache em 1930, na cidade do Rio de Janeiro. Com a criação do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (SERFHAU), em meados dos anos 60, iniciou-se um grande incentivo para a elaboração de Planos Diretores em todo o país, processo que terminou com a extinção deste órgão em 1974; a atuação do SERFHAU restringia-se a fornecer assessoria técnica aos municípios e financiar a contratação de equipe técnica para a elaboração do Plano, com recursos do Banco Nacional da Habitação (BNH).

Nesta mesma época tornou-se obrigatório aos municípios paulistas, através da Constituição do Estado de São Paulo, a elaboração de Planos Diretores de Desenvolvimento Integrado, e, com o intuito de assessorar os municípios foi criado o Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal (CEPAM) (MOREIRA, 1989). Porém, segundo Villaça (1999b), a maioria dos Planos Diretores elaborados no país a partir da década de 1960 não atingiram os objetivos a que se propuseram. A maior parte dos Planos Diretores possuem um caráter físico-territorial, e são essencialmente regularicionistas.

Um dos instrumentos para a execução de um Plano Diretor é o zoneamento, o qual atua sobre a organização territorial urbana. Representa a modalidade de planejamento urbano mais antiga e difundida no Brasil, já existindo no final do século XIX nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Usualmente, na formatação dos artigos que integram as regras para o uso e ocupação do solo, nem sempre são consideradas todas as áreas de uma cidade, ficando a regulamentação restrita aos bairros de classe média para cima (VILLAÇA, 1999a).

No urbanismo tradicional exercido em nosso país, também chamado de funcionalista, o zoneamento divide a cidade em zonas estáticas, com funções específicas de uso do solo, segregando as diversas atividades e funções, sendo simplesmente conectadas por uma rede de transportes, e contrapondo-se, portanto, à idéia de que a cidade é dinâmica, e de que necessita de flexibilidades.

Na análise de Rolnik (2001b) o planejamento urbano praticado no Brasil a partir da década de 70 consistia em um ideal de cidade a ser atingido em longo prazo, com projetos a serem executados paulatinamente, até ser alcançado o produto final. Seu desenvolvimento era de exclusiva competência do Poder Público Municipal, e caracterizava-se por uma visão extremamente centralizadora e tecnocrática.

A separação existente entre o planejamento técnico e os atores responsáveis pela gestão da cidade levou à evolução de cidades com contrastes, produzindo espaços rigidamente enquadrados na legislação urbanística, que se contrapõem a espaços considerados na margem da ilegalidade, ocupados pela parcela da população que não possui condições para arcar com o ônus financeiro decorrente das áreas incluídas nos planos urbanos, e, portanto, servidas de infra-estrutura adequada.

Define esta contraposição como uma exclusão territorial, e completa seu pensamento com a idéia do "urbanismo de risco", decorrente desta divisão da cidade, onde a população de baixa renda instala-se em terras periféricas, sem infra-estrutura, ou ocupa áreas ambientalmente frágeis e/ou estratégicas.

A partir da Constituição Federal de 1988 (C.F./88) alteraram-se algumas tendências do planejamento urbano no Brasil. Através do artigo 21 § XX ficou estabelecido como competência da União "instituir as diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos", e, através do artigo 30, confere competência ao Município para ordenar o parcelamento, a ocupação e uso de seu território, legislar sobre assuntos de seu interesse local, e suplementar a legislação federal e estadual no que lhe couber.

Os artigos 182 e 183 da Carta Magna são dedicados à política urbana, sendo o primeiro dedicado à função social da propriedade, e o segundo ao usucapião da terra urbana. O Plano Diretor ganhou destaque no art. 182, tornando-se obrigatório para os municípios com mais de 20.000 habitantes e para os municípios das regiões metropolitanas, além de ser definido como o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.

Infelizmente, estes artigos necessitaram de regulamentação, o que só veio ocorrer treze anos após a promulgação da Constituição, com a aprovação do Estatuto da Cidade, documento que será amplamente investigado em item específico na seqüência deste capítulo.

Na opinião de Nuno Portas (2001), renomado urbanista português, o planejamento atual das cidades deve ser norteado pela democracia e pela sustentabilidade. Porém, as questões de sustentabilidade e os problemas urbanos são compreendidos de maneiras diversas pela população. O papel do planejador deve ser o de priorizar os projetos que vão ao encontro aos maiores anseios da sociedade e que estejam dentro dos parâmetros da sustentabilidade, e argumenta que uma política de sustentabilidade não pode ser feita acima do sistema democrático.

Dentro dos atuais paradigmas urbanísticos, o Planejamento Estratégico Urbano tem sido apontado como o novo caminho a ser trilhado. O Planejamento Estratégico direcionado à questão urbana representa a elaboração de um plano de ações, mediante um amplo processo participativo, onde são questionados e analisados todos os aspectos sociais, espaciais e ambientais do município, com o objetivo de priorizar os projetos que levem à sustentabilidade do território e aos anseios de qualidade de vida da população.

Distingue-se do planejamento tradicional, quando foge do modelo técnico-normativo para regular as ações futuras, sejam das organizações públicas ou privadas, e principalmente quando integra todos os atores sociais nos processos decisórios. Segundo Falcoski (1997), trata-se de um processo dinâmico, que envolve a discussão em cima de uma grande gama de alternativas, e suas conseqüências – tanto os impactos positivos quanto os negativos, fornecendo dados e informações para as tomadas de decisões dos projetos futuros.

A elaboração de cenários como instrumentos auxiliares na formatação de um certo objetivo desejado e a formulação de estratégias para conseguí-lo são algumas das características do Planejamento Estratégico, sendo este trabalho de elaboração de cenários desejáveis muitas vezes chamado de "Visão do Futuro".

O Centro Ibero-Americano de Desenvolvimento Estratégico Urbano (CIDEU), organização criada em 1993, com o objetivo de impulsionar a elaboração e implantação de planos estratégicos em cidades da América Latina, com sede em Barcelona, Espanha, teve a cidade do Rio de Janeiro como um dos seus membros fundadores, agregando atualmente mais de 50 cidades distribuídas pelo planeta. Define o Planejamento Estratégico Urbano como:

uma nova forma de governar as aglomerações urbanas, em um clima de consenso e de participação coletiva;

uma metodologia de câmbio na cultura urbana, que permite superar os antigos métodos de imposição, com novas formas de antecipação do desejado e do possível;

um método que consiste em conceber um futuro desejável e em definir os meios reais para alcançá-lo;

um processo orientado para a ação (CIDEU, 2002).

O quadro 1.3 mostra uma série de elementos básicos que compõem e diferenciam o Planejamento Estratégico e o Planejamento Urbano Tradicional. Os autores, Jordi Borja e Manuel Castells, especialistas espanhóis, foram os responsáveis pela introdução do modelo estratégico no Brasil, quando contratados pela cidade do Rio de Janeiro para assumir a Direção Executiva de elaboração de um novo plano para a cidade no ano de 1994, trazendo para a América Latina os exemplos da reurbanização de Barcelona.

PLANO ESTRATÉGICO
PLANO DIRETOR TRADICIONAL
Plano integral com objetivos territoriais
Ordenação do espaço urbano
Prioriza projetos sem necessariamente localizá-los no espaço
Determina os usos do solo, os sistemas gerais e atuações públicas
Baseado no consenso e participação social em todas as etapas
Responsabilidade do desenho pela administração pública e participação posterior
Utilização de análise qualitativa e de fatores críticos
Utilização de estudos territoriais e do meio físico
Plano de compromissos e acordos entre os agentes para ação imediata a curto prazo
Plano normativo para regular a ação privada futura e possível
É um plano de ação
É um plano para regular a ação
Quadro 1.3: Diferenças entre o plano estratégico e o plano diretor.
Fonte: Borja e Castells apud Falcoski. Cadernos IPPUR. V. XI. 1997. (FALCOSKI, 1997).

O fenômeno da globalização levou as cidades e regiões a aderirem à uma visão empresarial no tratamento de suas gestões urbanas, marcado pela competitividade inter-municipal na busca de seu desenvolvimento econômico local. Vernier (2000) discute a nova tipologia das cidades - cidade-mercadoria, cidade-empresa e cidade-pátria, dentro da questão urbana atual, concluindo que a competição entre cidades constitui a idéia central do pensamento teórico do planejamento estratégico urbano. Argumenta que:

É a constatação da competição entre cidades que autoriza a transposição do modelo estratégico das empresas que para o universo urbano, como é ela que autoriza a venda das cidades, o emprego do marketing urbano, a unificação autoritária e despolitizada dos citadinos e, enfim, a instauração do patriotismo cívico.

A cidade do Rio de Janeiro seguiu esta linha teórica na elaboração do Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro. Segundo Teodózio e Falcoski (2002) o Rio de Janeiro promoveu um modelo onde a cidade é pensada unicamente como uma empresa, com prioridades dadas à estética urbana, aos modismos e ao divertimento. Colocam também que as consultas às populações são de caráter puramente formal, sendo o setor privado, representado pelos empresários, os verdadeiros definidores das estratégias.

Porto Alegre implantou um modelo diferente de planejamento estratégico, baseado em uma política democrática e participativa, e incorporando o Orçamento Participativo como o definidor dos investimentos urbanos - Maricato (2000) considera que o Orçamento Participativo possa ter mais eficácia em relação à diminuição da segregação territorial, do que as legislações urbanísticas.

Em contraponto à cidade–empresa, Porto Alegre criou o conceito do modelo cidade–processo social (TEODÓZIO e FALCOSKI, 2002), onde o planejamento é baseado na justiça social e no pensamento plural, com ênfase nas questões ambientais e no desenvolvido sustentável urbano.

A partir desta nova visão sobre como deve ser o planejamento das cidades, alteram-se os critérios definidores do que se espera dos planos urbanos. De acordo com Falcoski (1997), Plano Diretor é uma lei que define a Política de Desenvolvimento Urbano do Município, estabelecendo regras que organizam e disciplinam as ações públicas e privadas na construção do espaço urbano da cidade.

É um instrumento normativo e estratégico de política urbana, cujos principais objetivos são garantir as funções sociais da cidade e orientar o desenvolvimento, através da integração das funções sócio-econômicas, do uso adequado do solo urbano, da proteção e gestão ambiental, da integração e adequação do conjunto de obras e serviços, promovendo a melhoria da qualidade de vida dos munícipes e buscando fortalecer as atividades produtivas do local, ao mesmo tempo em que incentiva os desenvolvimentos sociais, culturais, econômicos e tecnológicos.

Dependendo das características do município e de suas peculiaridades, surgirão as exigências que ordenarão o seu desenvolvimento. E estas, portanto, servirão de base para as políticas públicas locais e para as diretrizes do seu Plano Diretor. Para cada cidade deve ser elaborado um projeto distinto, privilegiando suas necessidades intrínsecas e interesses (MOREIRA, 1999).

O processo de elaboração de um Plano Diretor, onde devem ser discutidos os diversos problemas urbanos locais, é normalmente ignorada pela elite econômica do País, por ser contrária à perda de seus interesses imobiliários, representados pela especulação.

A esta parcela da população interessam planos compostos somente de diretrizes, sem a possibilidade de regulamentações auto-aplicáveis, transformando-os em documentos inúteis. A conscientização da sociedade civil, com sua decorrente organização e politização, a partir dos anos de 1980, é a responsável pela alteração deste quadro, introduzindo novos paradigmas à legislação urbanística.

Enquanto a participação da população no planejamento não era desejável nas décadas de 1960 e 70, limitando-se a apresentação do plano em sua fase final, a partir da década de 80 começam a ser incentivada. Na opinião de Azevedo Netto (1999) a comunidade deve estar presente durante todo o processo de planejamento: levantamento dos problemas, seção de prioridades, definição de estratégias e organização de execução.

A população pode ser convocada a interagir de três maneiras: 1) participação consultiva, onde a população não precisa ser organizada; 2) participação deliberativa, a qual requer a organização da sociedade civil em associações de classe, comunidades de bairros, agremiações, conselhos etc.; 3) participação executiva.

Azevedo Netto também chama a atenção para as audiências públicas praticadas nas esferas do Executivo e Legislativo, por não representarem uma efetiva participação popular.

Ermínia Maricato (2000) defende o desenvolvimento de uma gestão urbana que diminua a desigualdade e amplie a cidadania, e como uma das considerações para alcançar estes objetivos sugere a elaboração de Plano de Ação ao invés de Plano Diretor, devido à essência atual puramente normativa deste último. Recomenda que este Plano de Ação:

deva ser revisto periodicamente;

deva incluir ações, operações e investimentos;

agregue o orçamento participativo; 

incorpore o controle urbanístico como uma questão central, revendo os procedimentos usuais de fiscalização, e, finalmente, 

integre os diferentes setores do governo, e do governo com a sociedade.

Em outro documento, também sobre as cidades brasileiras, Maricato (2001) posiciona-se sobre o caminho que deve nortear o atual e futuro planejamento e gestão das cidades para que não continuem a contribuir no atual ritmo predatório, com a exclusão social e a degradação ambiental, pois aglutina vários dos pontos apresentados. Recomenda que devam ser observados alguns pressupostos:

Criar a consciência da cidade real (legal e ilegal) e indicadores de qualidade de vida;

Criar um espaço de debate democrático, dando visibilidades aos conflitos, e aos diferentes interesses sociais;

Promover reforma administrativa que possibilite uma abordagem integrada das questões;

Formação de quadros e agentes para uma ação integrada;

Aperfeiçoamento e democratização da informação, com a organização e acessibilidade à população e técnicos dos dados cadastrais do município;

Um programa especial para regiões metropolitanas, com a institucionalização de uma estrutura comum aos municípios e a formação de quadros técnicos específicos; 

A Bacia Hidrográfica como referência para o planejamento e gestão, incorporando os aspectos ambientais e naturais;

Formulação de políticas de curtíssimo, médio e longo prazo, adequadas às necessidades em seu tempo real.

Algumas das recomendações colocadas por Maricato (2000 e 2001) já podem ser consideradas como em estágio de desenvolvimento, se for observada a colocação de Bonduki (2000, p.17). Segundo este autor, algumas das características evidenciadas na nova gestão urbana que vem sendo colocada em prática no país são: "descentralização, participação popular, parcerias com organizações não governamentais (ONGs), respeito ao meio-ambiente e busca do direito à cidade".

No documento Carta das Cidades, aprovado na plenária final da I Conferência das Cidades, realizada em dezembro de 1999 e organizada pela Câmara dos Deputados, a cidade brasileira foi considerada como: 

[...] o retrato de uma sociedade que se construiu e se reproduz sobre a exploração e opressão da imensa maioria da população. Este modelo contou com um Estado que investiu pesadamente no fomento e na estruturação do desenvolvimento urbano-industrial, resultando cidade desigual e segregada.

Este documento estabeleceu algumas diretrizes básicas, professando a defesa da reforma urbana com o desenvolvimento das políticas públicas e das legislações relacionadas ao assunto. Entre as propostas que compõem o referido documento destaca-se "[...] a democratização do planejamento e da gestão das cidades, assegurando a participação popular, mediante a realização de orçamentos participativos [...]". 

A III Conferência das Cidades, novembro de 2001, formatou um documento intitulado Carta de Brasília pela Moradia Digna para Todos. Este documento se inicia com a constatação de que os brasileiros vivem e sobrevivem em cidades cada vez mais complexas e problemáticas, e considera, mais adiante, que as políticas macroecômicas adotadas, que privilegiaram a estabilidade econômica em detrimento das políticas sociais, são as responsáveis pelo quadro deficitário em que se encontram as cidades. Aponta a implementação dos instrumentos instituídos pelo Estatuto da Cidade como fundamental para garantir à população as condições adequadas de moradia.

Os dois documentos supra referidos reproduzem muitas das idéias e constatações registradas anteriormente neste trabalho, reforçando a importância de uma nova postura em relação às questões urbanas.

NOTAS:

[1] Exemplos de Super-Planos: Plano Doxiadis – cidade do Rio de Janeiro (1965); Plano Urbanístico Básico - PUB, cidade de São Paulo (1969); e Plano para a Região Metropolitana de Porto Alegre.

[2] Adota-se nesta pesquisa a diferenciação entre planejamento e gestão, conforme exposta por Souza (2002): "planejamento e gestão não são termos intercambiáveis, por possuírem referenciais temporais distintos, e, por se referirem a diferentes tipos de atividades". Enquanto planejar remete ao futuro, gestão remete ao presente. 

O planejamento significa prever o desenvolvimento de um dado processo, enquanto gestão traduz-se como administrar uma situação. Em sua análise, o referido autor conclui que "planejamento e gestão são distintos e complementares" baseando-se na premissa de que "o planejamento é a preparação para a gestão".

Leva para a página seguinte da série