Curiosidades da Praça do Comércio
Cafés coloridos
– Em 1907, importante firma importadora de café dos EUA dirigiu-se por carta a respeitável casa de nossa Praça, denunciando o aparecimento de cafés
brunidos ou artificialmente coloridos. Recomendava, ao mesmo tempo, a não remessa e produto em tais condições, visto que não podia entrar na Bolsa
de Nova Iorque, por ser considerado não negociável.
Como é cediço, há lei em tal sentido, votada pelo
Legislativo do Estado, que m seu art. 7º preceitua: "Para os efeitos desta Lei será considerado adulterado o artigo
quando, no caso do alimento, for misturado, colorido, manchado etc., de modo a tornar imperceptível sua inferioridade ou seus defeitos".
Anos depois, em 1921, segundo denunciou o Jornal de
Liverpool em notícia difundida no Rio de Janeiro e em São Paulo, organizou-se na antiga capital da República verdadeira indústria para explorar a
exportação para a África do Sul de cafés pintados. O produto, apurou-se, era pintado com plombagina, oca e outras substâncias, provavelmente não
nocivas à saúde, mas que positivamente tornavam de mau gosto e prejudicavam a qualidade.
O mercado da África do Sul dava preferência aos
cafés pintados e essa circunstância isentaria de responsabilidade os exportadores cariocas, pois e comércio é regra elementar ir-se ao encontro do
consumidor.
Os cafés coloridos, no entanto, também eram
embarcados do Rio para outros portos nacionais...
Segundo lemos no
Relatório da Diretoria da ACS, presidida pelo dr. Belmiro Ribeiro de Morais e Silva, "respeitável firma exportadora
de nossa Praça já tentou fazer exportação regular de café para a África do Sul, onde ainda conserva um agente; mas não conseguiu ver coroados seus
esforços porque as ordens que recebia eram sempre para cafés pintados, o que não foi possível atender, porque em boa hora o Congresso do nosso
Estado votou uma lei proibindo a adulteração dos cafés exportados por Santos ou qualquer outro ponto do Estado".
Os presidentes
José Domingues Martins (1909-1910)
Bico-de-pena de Ribs publicado com a matéria
Boicotagem
– Em 1909, precisamente no dia 5 de março, 57 firmas comissárias da nossa Praça assinaram moção de protesto contra a The Brazilian Warrant & Co., de
Londres, que pretendia encampar todas as companhias de armazéns gerais e registradoras de Santos, valendo-se, todavia, da garantia de juros
outorgada pelo Governo do Estado a uma delas.
Em conseqüência, a maioria do comissariado de café
decidiu interromper relações com a conceituada firma E. Johnson & Cia., bem como todas as empresas chefiadas pelo sr. Edward Greene.
Tal decisão constituiria boicote que produziu
sérios embaraços à tradicional firma, ainda hoje vigorosa célula do grande comércio de nossa Praça. A situação, porém, não poderia perdurar
indefinidamente. Eis porque a ACS, que era presidida pelo sr. José Domingues Martins, interveio no deplorável incidente, e no dia 30 de setembro
daquele ano foi firmado acordo honroso entre a referida casa e as demais do comércio da Praça, do que resultou o reatamento das velhas e amistosas
relações.
Essa reconciliação foi geralmente acolhida com
júbilo em nossa Praça.
Contra o jogo, quando aberto!
– Em 1923, quando o jogo estava francamente exposto a todas as bolsas e em plena efervescência, a Associação Comercial de Santos não apenas se
pronunciou contra suas nefastas conseqüências, mas também reclamou seu fechamento sumário.
No dia 21 de maio daquele ano foi endereçado ao dr.
Washington Luís, presidente do Estado, ofício assinado pelo sr. José Martiniano Rodrigues Alves, presidente da ACS, cujos trechos iniciais eram
estes: "Os lamentáveis fatos que se vêm repetindo de modo espantoso, como conseqüência do desenvolvimento
extraordinário dos jogos de azar em Santos, têm verdadeiramente alarmado nosso comércio e nossa sociedade. São desfalques, estelionatos, suicídios,
crimes e desgraças de toda a ordem, que com freqüência impressionante a Imprensa registra e propala, criando para este centro comercial –
tradicionalmente considerado escola de trabalho e de honestidade para os moços – um deplorável renome de foco de infecção moral.
"Na verdade, a jogatina, a mais desenfreada,
campeia aqui por toda a parte, atraindo, empolgando, alucinando, pervertendo e decompondo os espíritos e os caráteres menos firmes e fazendo
vítimas, dia a dia, insaciavelmente. E não floresce somente nos cassinos elegantes mas estende-se mais perigosamente ainda e com mais concorrência
pelas modestas casas de tavolagem e elas mais sórdidas baiúcas da Cidade.
"O maior perigo constituem-no justamente os jogos
de fácil acesso aos operários e à classe modesta, a mais numerosa nesta Praça, que infelizmente encontram, até nos estabelecimentos de luxo, jogos a
eles destinados".
Rematando, a ACS solicitava providências prontas e
enérgicas do chefe do Governo Paulista, "que viessem a mudar este deprimente e intolerável estado de coisas".
Não houve resposta ao ofício, embora um outro, no
mesmo sentido, fosse encaminhado ao presidente do Estado no dia 20 de outubro de 1923, também sem solução.
Mas ficou o brado de
alerta da Associação Comercial e, com ele, o ponto de vista da Praça de Santos sobre a matéria.
Os presidentes
Dr. José Maria Whitaker (1911-1912)
Bico-de-pena de Ribs publicado com a matéria
Crime e benemerência -
Por volta de 1890, quando o instituto agora centenário era presidido pelo dr. António Carlos da Silva teles, estabeleceu-se em Santos um comércio
ilícito em seus meios e criminoso em sua origem. Indivíduos que não pagavam imposto de comissários de café compravam a carroceiros ou obtinham de
subalternos na estrada de ferro não pequenas quantidades da mercadoria, ensacavam-na e vendiam-na a preço comum, fazendo da negociata hábil condição
de vida.
Obrigados à prestação de contas a seus comitentes,
os comissários de café vinham sofrendo sérios prejuízos, como é de ver.
Certa ocasião, o subdelegado de Polícia, sr.
Augusto Teixeira de Carvalho, empreendeu batidas por tavernas para esclarecer um furto de café havido na casa Malta & Cerquinho, quando veio a
deparar com cerca de 6 sacas do produto, que apreendeu, confessando os elementos acusados que as compraram de contumazes ladrões especializados na
ilícita transação.
Obtendo do Governo Provisório do Estado a devida
autorização, a ACS deferiu à Polícia a incumbência de proceder a leilão do café apreendido, sendo o produto líquido entregue ao Asilo de Órfãos.
A força do boato -
O boato foi alarmante. Correu quase todas as Praças nacionais e foi propagar-se nos mercados do Exterior. Em conseqüência, nossa Praça foi tomada de
pânico pelo afrouxamento das cotações do café e paralisação dos negócios. Foi de tal ordem o movimento negativo produzido na Praça, que nossa
Associação teve de agir prontamente, reunindo-se, não apenas para restabelecer a normalidade do mercado, mas também para averiguar, por meio de
Comissão Especial, a procedência das informações alarmantemente absurdas.
E o resultado não se fez esperar: a própria casa, a
que era atribuído o boato, desmentiu-o aqui e lá fora...
Isso ocorreu em 1921. A
Tribuna, o grande órgão dirigido por M. Nascimento Júnior, escreveu isto: "Um dos grandes males que afetam a vida
comercial e a manutenção do crédito e prestígio das casas de negócios, a boa ordem dos preços e a disciplina em geral, consiste na propagação do
maldoso boato, que se insinua em todos os círculos comerciais e bancários, a abalar a estabilidade daquela casa, a segurança daquele negócio, a
situação daquele comerciante e, não raro, com ares compungidos de hipócrita e velhaco".
Os presidentes
Dr. A. S. Azevedo Júnior (1915-1920 d 1924-1926)
Bico-de-pena de Ribs publicado com a matéria
Faliu e resignou ao cargo de diretor -
Há muitos anos, precisamente 88 anos. Ele era conceituado comerciante na Praça, onde se fazia admirar pela rigidez de caráter e retidão de costumes
comerciais. Não foi, porém, feliz em determinada transação e viu-se na contingência de requerer a própria falência.
Diretor da Associação Comercial de Santos, um de
seus primeiros cuidados foi resignar ao cargo; em resposta, a diretoria, que era presidida pelo barão de Embaré, enviou-lhe em 26 de abril de 1882
ofício vazado nos seguintes termos: "Apreciando devidamente a delicadeza de sentimentos que ditou V. S. à resolução de
resignar ao cargo que tão brilhantemente ocupou desde longo tempo, lamenta a diretoria, devido a uma triste ocorrência, achar-se privada do
esclarecido conselho de V.S. e, apresentando-lhe seu profundo sentimento, espera ela que, brevemente reabilitado, voltará a apresentar a esta
Associação os seus valiosos serviços, que muito concorreram para seu engrandecimento".
Era o sr. José Ricardo Wright.
Arquivo negro -
Em reunião de 1º de dezembro de 1926, a diretoria da Associação Comercial, presidida pelo dr. Alberto Cintra, decidiu criar serviço especial de
informações de caráter reservado, destinado aos associados que mantinham transações com o Interior. Com elas podiam precaver-se de possíveis
prejuízos a que estão expostos todos quantos negociam de boa fé, nem sempre dispondo de elementos seguros para julgar a idoneidade alheia.
Essa seção, de evidente
utilidade para todos, dispunha de um Arquivo Negro, que reunia fichas reveladoras do procedimento daqueles que fugiram censuravelmente a seus
compromissos, acarretando com essa atitude danos ao comércio da Praça.
Os presidentes
Dr. Belmiro Ribeiro de Morais e Silva (1921-1922)
Bico-de-pena de Ribs publicado com a matéria
Questão de nacionalidade da firma -
Durante a Primeira Guerra Mundial, uma firma francesa insurgiu-se contra uma organização de nossa Praça – Krische & Co. -, acusando-a de
nacionalidade alemã e conseguindo o seqüestro de uma partida de café por meio da Corte de Apelação de Rouen.
A ACS pôs-se em campo em favor da associada
injustamente acusada, pois se tratava de firma brasileira com sede em Santos, regida pelas leis brasileiras e administrada por dois cidadãos
ingleses, um deles diretor-presidente. É verdade que um dos acionistas da empresa, o sr. Krische, era alemão, nascido em Hamburgo, mas desempenhava
o cargo de simples agente naquela cidade germânica.
Depois de longas peripécias, a ACS conseguiu
deslindar o caso, provando a injustiça da acusação, quando houve até interferência do então ministro das Relações Exteriores, dr. Lauro Miller.
Foi esse, aliás, um dos episódios em que nossa
Associação Comercial teve de intervir a oportunidade da Primeira Guerra Mundial, durante a qual os associados de nacionalidade alemã tiveram seus
direitos sociais suspensos, não podendo sequer visitar a sede social.
Alteração da tarifa aduaneira: coragem de dizer! -
Atendendo ao que lhe solicitaram as autoridades fazendárias do Governo Imperial, a ACS deferiu a seus diretores srs. Fritz Chris, Adolf Tromel e
João Alberto Casimiro da Costa a incumbência de estudarem e emitirem parecer ao projeto da nova Tarifa das Alfândegas.
Em 9 de maio de 1881, essa
Comissão Especial encaminhou à diretoria expediente em que consubstanciou seu juízo sobre a matéria, afirmando, ipsis litteris: "Trata-se
de assunto que demanda acurado estudo e reflexão, e o prazo que ao comércio é concedido para tal trabalho é impossível fazê-lo de modo conveniente.
Quando mesmo o prazo necessário fosse concedido, os membros da Comissão, abaixo designados, lamentariam sacrificar um tempo em pura perda, convictos
como estão da pouca ou nenhuma atenção que o Governo Geral presta a quaisquer notificações que porventura esta Associação pudesse propor em virtude
do parecer da Comissão. Haja vista algumas representações que o Comércio desta Praça tem feito ao Governo por intermédio desta Associação, que nem
mesmo mereceram a honra de uma resposta qualquer".
Os presidentes
Dr. José Martiniano Rodrigues Alves (1923-1924)
Bico-de-pena de Ribs publicado com a matéria
Imposto da ponte -
Havia no passado fatos curiosos e esdrúxulos que, apontados e até combatidos, continuavam a prevalecer e a prejudicar os interesses da coletividade.
O chamado "Imposto da Ponte" era um deles.
Era um tributo absurdo que onerava a situação
econômico-financeira do comércio da época, nem sempre folgada. Havia a famosa Ponte do Consulado, onde atracavam
embarcações nacionais e estrangeiras; ficava pelas imediações do Largo do Gusmão. Era velha e caiu de podre. Durante muito tempo, a Recebedoria de
Rendas cobrava o imposto decorrente da utilização dessa ponte, de que não havia o mais leve vestígio, demolida como coisa inútil ou monstrengo.
A diretoria da nossa Associação Comercial, em 1892, na
gestão do Dr. Antônio Carlos da Silva Teles, representou ao governo do Estado pleiteando a revogação da lei que criara o tal imposto, atendendo aos
reclamos do comércio. Até o fim da administração daquela diretoria, o governo não a havia respondido à Associação.
Como se vê, pagava-se um imposto sobre serviço que não
existia!
Incidente com o Inspetor da Alfândega -
Por volta de 1891, a firma H. Haffers & Cia. requereu despacho à Alfândega de uma partida de 500 sacas de café tipo escolha. O despacho, no entanto,
não teve prosseguimento porque o chefe da repartição aduaneira, a seu juízo, considerou que o café era de qualidade fina, e não como o pretendia a
firma exportadora.
Não se conformando com a decisão, a respeitável
organização comercial, que por muito tempo atuou em nossa Praça, buscou a intervenção do Instituto de que era associada – a Ass. Comercial – e uma
comissão especial, integrada pelos srs. Azurem Costa, Inácio Penteado e A. Wildeberger, opinou em seu parecer que o café contido nas amostras era
realmente do tipo escolha.
Para encurtar a história, diremos que o Inspetor da
Alfândega impugnou o parecer e manteve sua resolução. Fez mais: maltratou os membros da comissão com palavras descorteses e afirmou "não
dar importância à Associação Comercial de Santos".
Em face dessa atitude grosseira, a diretoria da
ACS, em reunião de 5 de novembro de 1891, decidiu não mais fornecer à Alfândega a pauta semanal.
No exercício seguinte,
achava-se na Inspetoria da Alfândega, embora em interinidade, o major Álvaro Ramos Fontes, com o qual a Associação passou a manter as melhores
relações de amizade.
Os presidentes
Dr. Alberto Cintra (1926-1930)
Bico-de-pena de Ribs publicado com a matéria
Alfândega de S. Paulo -
Lá por volta de 1892 também se tramava contra Santos. Queriam nada mais, nada menos, que criar uma alfândega em São Paulo, sob o ponto de vista de
que em Santos havia crise de transportes, "originada, de
um lado, pela insuficiência e deficiência dos meios de condução para o Interior, e de outro, pelas péssimas condições sanitárias do Porto".
O negócio era "para valer", pois a Câmara dos
Deputados mostrava-se francamente favorável à iniciativa, e a Comissão de Fazenda e Indústrias, em apressado parecer, sem analisar as causas da
crise, que em verdade assoberbava nosso porto, sentenciou que "a demora das descargas dos navios, que as dificuldades
de transportes, a aglomeração de cargas, o crescimento enormíssimo de despesas e a impossibilidade de segura fiscalização e arrecadação de direitos
na Alfândega são graves e vexatórios inconvenientes que urge remediar".
Como sempre, a Associação Comercial de Santos tomou
posição no caso e fustigou o cometimento, inteiramente danoso aos interesses do Comércio e do Município, sustentando o ponto de vista de que, se
havia insuficiência e desordenação nos meios de transportes e detença e acumulação de cargas em nosso porto, o grande culpado era o Governo, apenas
ele.
No Relatório apresentado em 14 de outubro de
1895, a diretoria, presidida pelo sr. Ernesto Cândido Gomes, considerava o fato consumado, e já se anunciava a criação da Alfândega de São Paulo
para o dia 15 de novembro de 1895.
Multada por falta de selo -
Nossa Associação Comercial foi multada repetidas vezes por falta de selo na correspondência encaminhada às autoridades federais, notadamente ao
ministro da Fazenda, por considerar-se isenta dessa contribuição postal.
Em face da ocorrência, dirigiu consulta ao direto
do Tesouro Nacional, que, em ofício de 18 de julho de 1910, respondeu que "todas as representações encaminhadas pelas
associações comerciais do País às autoridades federais estão isentadas do imposto do selo".
Desse modo, comprovou-se a
injustiça das multas que, aliás, nunca mais ocorreram.
Os presidentes
Esaú Silveira (1933)
Bico-de-pena de Ribs publicado com a matéria |