VINHETAS FLUMINENSES - As praças do Rio de Janeiro - A 15 de Novembro, na qual se
desembarca ao por o pé na metrópole brasileira. Vê-se em primeiro plano a estátua de Osório; à direita o Correio; sobre o mar a Polícia Marítima e
em seguida a baía, sempre em paz
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A capital do Brasil
Na baía de Guanabara - Visão
retrospectiva - Rio de Janeiro desde o mar - A atração da terra - O desembarque - A primeira impressão - Rio se adianta a fazer as honras de seu
progresso - Comodidades e atrativos - A cidade nova - Uma improvisação colossal - Saneamento e beleza, tudo em uma peça - Rio de Janeiro, grande
cidade de inverno - Um esforço que revela uma raça
Enquanto o Araguaya avança em velocidade média pela
baía da Guanabara, a cidade do Rio de Janeiro, reclinada umas vezes e empoleiradas outras nos morros da esquerda, vai deixando entrever o belo
aspecto com que se dispôs para que o viajante se sinta recebido por ela com uma atraente fisionomia de hospitalidade.
Já foram ficando para trás as tradicionais belezas da baía
sem par – o Pão de Açúcar, o Corcovado, e todo esse encantado arquipélago das ilhas risonhas, donde a arte da guerra instalou canhões, a história
poéticas ou sombrias reminiscências e a natureza palmeiras, bambus, toda uma flora suntuosa que enraíza na rocha viva das ilhotas e se lança ao
espaço, vivendo da luz, do calor fecundante, de uma capitosa e sutil embriaguez de vida que parece flutuar no éter.
Tudo isso foi ficando atrás, sem que eu tenha pensado
sequer na proeza de descrevê-lo, já pelo ingênuo que de por si resulta tamanho intento, já por certa apreensão que me acompanha cada vez que visito
raridades ou maravilhas que por tradição secular vêm pasmando às gentes – apreensão que, mais que minha boa estrela, me salvou, por exemplo, de
dizer uma só palavra ao Aconcágua quando passei os Andes, e me permitiu certa vez que fosse ao Tandil, regressar a
Buenos Aires sem lembrar-me da pedra movediça.
O NOVO RIO DE JANEIRO - As vias alargadas na cidade velha - Rua 1º de Março, formosa
artéria que une o porto à Avenida Central
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Assim, referindo-me à baía do Rio, só quero dizer que,
quem podendo fazê-lo, se morre sem haver gozado, sequer uma vez, a emoção de contemplá-la, não digo que precisamente deva ir por isso ao inferno,
mas mereceria passar algum tempo no limbo.
Eu a vi quando tinha cinco anos e não incorro na
puerilidade de dizer que me ficou gravada – apenas se lá na distância da primeira infância, a impressão de algo grandioso persistia, entre brumas
quiméricas. Na verdade, o que mais claro recordava eram os rápidos vaporzinhos que cruzavam a baía, e uma multidão de negros, com os torsos desnudos
e reluzentes brilhando ao sol, que, tripulando canoas, vendiam laranjas, cocos, bananas e papagaios, cuja viva plumagem e estridente algaravia
alvoroçava as crianças a bordo, interessando-nos bem mais que o panorama.
Mas no outro dia, ao entrar, recebi uma curiosa sensação:
havia baixado ao camarote, desesperando de não poder usar a máquina fotográfica, porque a manhã, chuvisquenta e nevoenta, avaramente nos escondia os
acidentes da costa. De pronto assomei ao tombadilho e vi em frente, ali perto, volumoso e conciso, surgindo de improviso da bruma, enorme e belo em
seu ríspido conjunto, o Pão de Açúcar.
A CIVILIZAÇÃO DA ÁGUA NO BRASIL - Apontamento panorâmico da grande represa do Rio das Lajes, do
dique de contenção e das quedas que constituem a colossal obra hidrelétrica em construção pela Light and Power, a 81 quilômetros do Rio de Janeiro,
para servir à cidade. A represa levanta as águas até 25 quilômetros acima do dique; o represamento será de 221.000.000 de metros cúbicos. Várias
aldeias ficarão alagadas. A água cairá sobre as turbinas de uma altura de 400 metros
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Ao vê-lo, por um ato maquinal, fechei os olhos, e com
estupefação indizível senti que uma espécie de cerebração invertida, involuntária e potentíssima, me leva vertiginosamente para atrás, desandando a
vida. Senti nos ouvidos um zumbido particular, que me pareceu o sinal de correr uma cortina – e súbito, completa, na magnificência rutilante de um
dia de sol de dezembro, me apareceu a esplendorosa baía, tal qual, sem sabê-lo eu mesmo, havia ficado esculpida na memória da criança, trinta e
cinco anos antes. Com a viva recordação, pareceu que vinha a mim algum eflúvio da infância distante – e no camarote escuro, hipnotizado, estático,
vivi um minuto inefável.
Sem esperá-lo, havia feito minha festa. E subi ao
tombadilho já tranqüilo e alheio ao assombro. Desde esse momento ficava sabendo de memória à natureza e não havia mais que constatar a majestade de
seus rasgos imutáveis, aos que a pureza e a graça das linhas pareciam encher de eternidade.
Em troca, a obra humana havia mudado. Desapareceram as
canoas rápidas tripuladas por negros gesticulantes, e aumentara entretanto o número de vaporzinhos, cuja limpeza matinal, polida como um interior
holandês, dava prazer observar, nas madeiras, nos bronzes, que irisava a luz, e no aspecto das tripulações, onde as caras escuras e sonolentas, como
em Santos, só se faziam notáveis por sua raridade.
Desde o fundeadouro, uma impressão se insinua,
persistente: e é que o homem, ao trabalhar sua cidade, se preocupou com amor da estética exterior – e o golpe de vista, independentemente da
natureza, é simplesmente admirável. Rio de Janeiro se adianta a receber ao viajante, luzindo a linha monumental de palácios e mercados-modelo,
estátuas e arvoredos hospitalares, e acercada a cidade toda aí mesmo, como a expressar uma bem-vinda. Sobe-se as escadas do magnífico Cais Pharoux,
cujo majestoso píer de granito se desenvolve em uma vasta curva harmoniosa, e aí está tudo quanto se pode desejar: o cais mesmo é uma praça frondosa
que começa desde que se pisa em terra, e o útil e o estético vão se insinuando discretamente a cada passo.
A mim, desde logo, atrai a atenção afetiva das coisas: as
tipas argentinas, postas ali como uma atenção deliberada ao viajante rio-platense, e que por certo fazem airoso papel entre as árvores
tropicais, e uma estátua de Osório, sabre em mão e lançado ao trote, em sua eqüestre arrogância de Bayardo. E sigo observando a inteligente
disposição das coisas: enquanto você chega à terra firme, venha da Europa ou do Prata, o primeiro que deseja é telegrafar: pois ali está, a cem
passos do cais, um antigo palácio imperial convertido em casa dos telégrafos. O correio a cem passos mais – e até duas históricas igrejas ali
contíguas, para o caso de a viagem ter sido ruim e haver que dar graças a Deus.
Se toma por qualquer das duas ruas que se abrem à frente,
Sete de Setembro ou Primeiro de Março, ambas amplas, asfaltadas, com o aspecto de nossas melhores vias, e já a duzentos passos se desemboca na
formosa Avenida Central, que recreia a vista e enche os pulmões e o espírito com sua dupla linha de altos edifícios, em cujos estilos se nota com
alegre surpresa que não fizeram das suas os Luíses (por mais que seja sensível que não eliminaram ali a telha, pouco adequada à edificação urbana de
tipo monumental), e seu magistral desenvolvimento, dilatado como um contínuo oásis de mar a mar.
Está-se na grande aorta do sistema circulatório do Rio –
mas escasseando os coches e estando, como estão, recolhidos em suas garagens os automóveis por não querer aceitar uma tarifa razoável, poder-se-ia
crer que o transporte do recém-chegado é um problema.
Nada disso: na própria avenida, quando se entra nela, está
localizada a estação dos bondes elétricos, que de minuto em minuto saem com um ou dos reboques para todos os rumos da cidade e para as alturas
circunvizinhas.
Como se vê, procedeu-se tendo em conta a comodidade do
viajante, facilitada ainda, tanto quanto possa ocorrer, por uma cortesia pública destacada, à prova de toda interrogação. Hei de voltar quiçá a
falar disso, que acusa um rasgo do caráter e da cultura coletiva. Agora o anoto para acentuar a massa de facilidades que tem o viajante no Rio de
Janeiro, resultando delas uma ótima impressão de conjunto; e é sabido que essa primeira impressão influi enormemente, em bom ou mal sentido, sobre o
juízo definitivo do observador, por mais refratário que seja às sensações amáveis.
Uma confusão com as malas, uma dificuldade para
telegrafar, uma incultura policial ou popular, um tropeço qualquer no desejo dominante de chegar ao hotel onde se supõe que espera a desejada
acolhida do banho, uma vista ingrata, um detalhe desasseado, enfim, às vezes pequenas coisas chocantes, determinam uma involuntária prevenção, que
se agacha no ânimo e aí fica, solapando o otimismo de toda agradável impressão posterior.
Os autores da transformação do Rio de Janeiro parecem ter
tido muito presente em sua obra esta sutil e importantíssima questão da psicologia viajante, seja quem fosse o que viaje, e conseguiram que tudo o
que vê à primeira mirada seja grato e que tudo o que necessita o recém-chegado possa ser obtido sem trâmites fatigosos nem caminhadas pesadas.
AS GRANDES OBRAS NO BRASIL - Mapa mostrando a fonte de captação e o trajeto percorrido pela
energia hidrelétrica que a poderosa companhia Light and Power levará do Rio Lajes ao Rio de Janeiro, cruzando 81 quilômetros de território de
montanha e formando para isso um lago em cujo fundo ficarão submersas 12 aldeias, com mais de duzentas casas de pedra
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*
Aludir à
transformação do Rio de Janeiro, como acabo de fazer, é pôr-se de pleno sobre um tema obsessivo para quem, de improviso, e em uma observação seguida
e rápida, é informado da ingente obra de construção civil realizada aqui em menos de quatro anos – no tempo hábil que corresponde, destacadas as
dificuldades, a um período de governo quadrienal.
Nem se ganhou Zamora em uma hora, nem se pode estimar em
um passeio todo o enorme conjunto de tamanha tarefa, que por seu múltiplo aspecto, por seu volume, pela pujante decisão que exigiu, pode constituir
e constituirá, na história da formosa metrópole brasileira, uma enaltecedora e hercúlea olimpíada de seu progresso.
Seria um erro pensar, ao ler isto, que me estou
contagiando com tão ponderada verba tropical. Quisera ter eu locuções substantivas bastante eficazes para pôr em realce a magnitude desta galharda
metamorfose – e não o quisera por mim, que já senti, à sua vista, a sincera admiração do inesperado: - quisera-o por vocês, leitores do Prata;
quisera-o para lhes enviar o mais eficiente testemunho do cordial apreço em que deve ser tido o povo que de tal é capaz – porque se bem estes
misteriosos ímpetos coletivos parecem obra exclusiva de um ou de poucos temperamentos destacados e superiores, a cooperação ambiente lhe dá o povo,
que, por outra parte, também deu de suas entranhas o temperamento, o caráter realizador, encarnando-o em um ou mais homens, como expressões e
sínteses da raça – pois é justo acrescentar que todos os fatores, eminentes e secundários, desta alentada empresa de arte, de saúde, de vida e
civilização, foram brasileiros – de modo que o Brasil, se se lhe perguntasse que parte sua há em sua obra, poderia contestar como o velho Dumas, na
noite de estréia da Dama das Camélias, a um curioso cético que lhe dizia "-Ora, maestro! Confesse que você fez algo nisso!" "-Eu creio bem!"
– respondeu o velho leão com orgulho: "-Eu fiz o autor!"
Em certo sentido, não obstante, é justo fazer notar que
o progresso do Rio de Janeiro teve um cooperador pujante e feliz no capital e no engenho estrangeiro, principalmente na ação hábil, poderosa e
eficiente de um homem que pode, sem exagero, chamar-se excepcional.
Os brasileiros compreendem de imediato que me refiro ao
doutor Mackenzie, a quem todo o Rio conhece e quer bem, reconhecendo, ainda os que tenham combatido algum dos vastos desenvolvimentos de seu gênio
empreendedor, que sua chegada à capital do Brasil foi um acontecimento afortunado e benéfico.
Mr. Mackenzie é um médico
canadense do mais acabado tipo britânico, alto, quase gigantesco, de ossatura poderosa, grande cara enxuta
e limpa de barbas, olhos tranqüilos e frios, ar entre bondoso, distraído e triste.
Vendo a imensa massa de interesses e forças, de caudais e
concessões, de ambições, tarefas e responsabilidades que chegou a reunir em sua mão, observa-se com interesse e admiração aquele homem cortês e
grave, que parece incapaz de se apaixonar e que, entretanto, é impossível que não se apaixone; porque essas coisas colossais, esses complexos
enormes de trabalho que exigem habilidade superior, força mental intensa, tenacidade invencível, olho dominador e pulso firme, não podem ser
realizadas sem paixão.
Que não me digam que Vanderbilt e Morgan são gentes de
alma fria. Serão aparentemente impassíveis, como as montanhas, mas o fogo, como a elas, lhes há de arder dentro. Mr. Mackenzie é um
formidável conquistador daquela estirpe e deve encerrar debaixo de sua exterioridade imperturbável inauditas veemências. Enfermo foi ao Rio de
Janeiro, buscando um clima ameno. Curou-se ali, encantou-se da terra e viu que havia naquele país virgem um campo imenso de ação para um homem de
sua têmpera.
Ficou: e em quatorze anos realizou a obra mais vasta e
diversa em matéria de empresas públicas, sendo hoje o nome da Light and Power, por ele fundada, uma espécie de divisa da fortuna e da eficácia. Ao
redor de cem milhões de dólares levou já a Light, como popularmente é chamada, desde Toronto e
Nova York ao Rio de Janeiro, a São Paulo, e agora ao Sul do Brasil, onde vem construindo a linha férrea de
maior transcendência e futuro de todo o sistema brasileiro. Fez no Rio os bondes, o telefone, o gás, e tudo possui e maneja com uma habilidade
invejável.
Em uma viagem que fiz ao Corcovado, notamos que o trem de
cremalheira andava meio mal; e um passageiro brasileiro explicou o caso: "É que ainda não foi tomado pela Light!" Mas o havia comprado já, como à
quase totalidade das linhas urbanas, cuja unificação está dotando o Rio de um serviço de locomoção admirável. Agora a Light está construindo uma
usina de força hidrelétrica que trará honra ao Brasil, pois oferecerá ao Rio a energia, a preços ínfimos e em quantidade praticamente inesgotável.
As obras de captação a 80 quilômetros da metrópole, represando um rio e fazendo com seu caudal pouco menos que um mar interior, dentro do qual
ficarão submersas aldeias inteiras, está atraindo a atenção da engenharia universal.
É a grande e bela obra que projetou nosso Wauters – que em
sua terra passa por um engenheiro distinto, mas, se fosse para outro país, seria um grande engenheiro -, para edificar o Cadillal
(N.E.: dique El Cadillal, situado em Tafi Viejo,
Tucuman, Argentina)
– só que a obra do Rio é seis vezes maior, desde que represará 220.000.000 de metros cúbicos de água em vez dos 40.000.000 do Cadillal, o que já era
uma enormidade, pois constitui um lago de 600 hectares de superfície!
Concluindo com a Light, que me pareceu coisa digna de ser
anotada em primeiro lugar entre o que o Rio oferece ao olho observador, direi que tem em São Paulo os bondes, também com um serviço de primeira
ordem, e agora entra em uma nova fase, de fomento à rede ferroviária, onde sua ação se vai fazer sentir poderosamente.
Disto está todo mundo convencido, e ainda que tenha obtido
concessões hábeis e enormes, que asseguram ao capital rendimentos excepcionais à perpetuidade, é fora de dúvida que o progresso material do Brasil
vai dever à Light florescimentos muito mais valiosos que os dividendos que anualmente vão alegrar o olho e encher o bolso dos acionistas canadenses.
AS GRANDES OBRAS DO RIO - Construções da Light and Power - Usina de força motriz no Rio das
Lajes. Está localizado ao pé da montanha, à margem do rio, que se vê na imagem. A inclinação desbastada na paisagem representa a localização das
sete linhas de tubulações que partem do alto da montanha, a uma elevação de 300 metros sobre o rio, terminando na usina. À direita, vê-se a linha
férrea construída pela companhia m uma distância de 23 quilômetros, para conectá-la com a ferrovia do Estado. À esquerda se divisa a linha
inclinada, feita para as obras da companhia
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Descontada a ação deste formidável e potente mecanismo
financeiro-industrial da soma de tarefa de cultura e progresso realizada no Rio, pode-se assegurar que tudo o que fica em obra útil é de pensamento
e de energia brasileiros. E atenta a relação de recursos e tempo, é colossal.
Um plano em cores, que gentilmente me preparou a
Prefeitura, permite abarcar em uma olhada o cômputo do trabalho realizado – mas ainda assim, as faixas vermelhas que assinalam o vigoroso traço das
avenidas, rasgadas a violentos puxões no comprimido e pegajoso casario colonial, não poderiam dar a idéia que dá a realidade, percorrendo estas
vias, notando sua largura até de cem metros, seu desenvolvimento contínuo até de treze quilômetros – coordenadas como estão, por exemplo, a Avenida
do Mangue com a que bordeja o cais do porto, esta com a Avenida Central, e esta por fim com a insuperável Avenida Beira-Mar.
Tudo isto unido dá 13.300 metros – mas a cifra, que já diz
algo, não diz a notável harmonia do conjunto, o realce da edificação monumental na Avenida Central, seus arvoredos, sua iluminação solar, seus
pavimentos irrepreensíveis, seus graciosos rond-points de distância em distância – nem pode dizer nada desses 5.200 metros da Avenida
Beira-Mar, com suas triplas calçadas, suas duplas faixas de jardins e sua saliência de granito maciço sobre a estupenda curva da baía de Botafogo.
Precisamente agora, a prefeitura atual, retomando o fio da
vasta tarefa deixada por seu memorável antecessor o doutor Pereira Passos, decretou a continuação da Avenida Beira-Mar, em uma extensão aproximada à
já enorme que alcança.
O NOVO RIO DE JANEIRO - A Reforma efetuada em três anos - Planta indicativa das ruas e avenidas
novas, das pavimentações feitas, o grande porto iniciado, e alguns dos muitos edifícios construídos no período 1903-1906. [LEGENDAS - obras
projetadas pela Prefeitura e pelo Governo Federal; obras já executadas, em junho de 1906 pela Prefeitura e pelo Governo Federal; edifícios
construídos para escolas; áreas destinadas a mercados. Planta organizada pela Repartição da Carta Cadastral]
Imagem (Ortega y Radaelli - Buenos Aires) e legenda publicadas na página 34-A.
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Mas voltando ao fato no áureo quatriênio - em que
constelaram os nomes do presidente Rodrigues Alves, propulsor ou mantenedor impassível da gigantesca renovação,
o qual não deixou de encontrar contra ele o eriçamento hostil da apatia e da rotina tradicional; do prefeito Pereira Passos, genial pensamento e
formidável vontade, que se desatava como uma romba contra todo obstáculo; do doutor Osvaldo Cruz, este que acaba agora de triunfar na
Alemanha e que foi quem fez a salvadora e admirável tarefa de higienizar a cidade e desterrar de seu
crédito o estigma ignominioso da febre amarela, da bubônica e demais infecções que se haviam feito endêmicas na antiga cidade desarmada; do doutor
Lauro Müller, ministro de Obras Públicas, que fez por sua vez o porto do Rio e começou os da Bahia e Pernambuco, enquanto fazia abrir, sem levantar
a mão, essa Avenida Beira-Mar, que se construiu quase dissimulando-a, como uma "obra complementar" do porto; do doutor Paulo Frontim, a quem se deve
a concepção da Avenida Central, e nela, a arquitetura impecável de obras como a Caixa de Amortização, que é simultaneamente banco, palácio,
monumento e templo do milhão; - voltando, dizia, à imensa tarefa daquele quatriênio, digo com verdade e franqueza, que não conheço em nenhuma cidade
do mundo, exemplo de tal obra realizada em tal tempo.
Nós, por exemplo, e repito que não é meu ânimo comparar
coisas incomparáveis, tivemos as épocas graduais do grande progresso urbano: uma vez foi o porto, outra as obras de salubridade, outra as avenidas e
as praças, outra as escolas, oura a pavimentação, a luz, os bondes, a Assistência Pública – mas o Rio de Janeiro fez tudo o que fez de golpe, em um
empurrão titânico, que a perfila de maneira admirável.
Ali pode-se dizer que se dormiu a gente, enferma e
apreensiva, na velha cidade infecta e chata, aglomerada e antiestética como um burgo medieval, e despertou como de um sonho feérico, em saúde e
esperança, com dezesseis avenidas e oitenta ruas novas ou alargadas e nelas toda a edificação moderna, feita ou reconstruída; com um porto
magnífico, com toda uma organização sanitária, com oito jardins novos, que são os belíssimos de Glória, Tijuca, São Cristóvão, Carioca, São
Salvador, Rossio e Valongo; com mais de 100.000 metros de pavimentação lisa, sem contar as avenidas Central e Beira-Mar; com monumentos de arte
arquitetônica, como o Teatro Municipal, construído pelo arquiteto Oliveira Passos, filho do grande prefeito; com o pavilhão Monroe, esbelto, airoso,
admirável criação do atual prefeito, general Souza Aguiar, que é arquiteto de alta valia; com os palácios da Biblioteca e da Escola de Belas Artes,
numerosas escolas espalhadas em toda a cidade, e Mercado Modelo, água artesiana para regar as ruas, e vários quilômetros de caminhos suburbanos,
como o esplêndido à Tijuca, que foi refeito completamente.
OS PREFEITOS DO RIO DE JANEIRO - O ex-prefeito, doutor Pereira Passos, que talhou a nova metrópole
no casario colonial
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Já sei que estas enumerações carecem de uma expressão
bastante perceptível – mas enfim, a enormidade do feito material realizado se pode apreciar aproximadamente – e se a fantasia do leitor é capaz de
imaginar a harmonia, o colorido, a grandeza e a garça que a todo esse trabalho, feito arrasando e voltando a levantar bairros inteiros, lhe presta a
insuperável natureza, o mar, o céu, a luz maravilhosa, as curvas mórbidas da costa, os morros cobertos de perenes verdores, os jardins ostentando
todas as galas do trópico -, se o leitor é capaz de imaginá-lo, imagine-o, sem medo de se exceder.
Quanto a mim, a primeira noite, oprimido pelo vertiginoso
giro e pela sucessão de sensações, não pude menos que sonhar, pensando no Rio, com aquelas cidades encantadas dos contos orientais, que uma legião
de gênios morenos construía no espaço de uma noite.
A obra está aí, palpável e eloqüente. Não está toda feita,
mas o fato da razão do impulso, e o que falta, permite apreciar, por contraste, a tarefa realizada. Agora já não há oposições nem obstáculos – todo
mundo está conquistado e se alinha. Não cabe pois duvidar do futuro – se bem que no presente se nota uma espécie de estagnação ou repouso no impulso
– repouso que o general Souza Aguiar teve por bem me explicar como uma necessidade de repor as forças financeiras em um período de prudente
ordenamento e economia, que permitirá em breve prazo novos desenvolvimentos.
Pueril seria afirmar que quanto se fez nesta
extraordinária jornada de bom trabalho é genial e admirável – mas é admirável, sem dúvida alguma, a magnitude do esforço, a coesão e amplitude
prospectiva do plano acometido e a energia incontrastável com que se lhe deu início, tendo o prefeito Pereira Passos até que assumir uma verdadeira
ditadura municipal para poder levar por diante as eternas conjurações dos interesses liliputienses e as córneas resistências da rotina secular.
Pensava nesta correspondência ter espaço para fazer uma olhada interior à
vida da metrópole brasileira, mas o encanto de sua transformação transbordou os termos razoáveis de um trabalho desta índole, e os temas de
atualidade e estudo foram ficando retardados por seu próprio peso prosaico, enquanto eu seguia a tecer esta carta florida "que seria melhor não
sendo tão comprida".
OS PREFEITOS DO RIO DE JANEIRO - O prefeito atual, general Souza Aguiar, que organiza as
finanças, preparando um novo período de grandes obras
Imagem e legenda publicadas na página 36-A
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