Imagem: reprodução parcial da página A-6 de A Tribuna de 20/9/2012
CLIMA
Depois do vento noroeste,
ventania e chuva
Conhecido dos santistas, o bafo quente anuncia mudança de clima. Certeiro.
Eduardo Brandão
Da Redação
O vermelho contrasta com
o fundo preto e diversas figuras do imaginário coletivo regional. O tom vivo foi a forma poética que o pintor Manabu Mabe (1924-1997) usou para
representar típicas rajadas de ventos que sopram em Santos.
Além do legado de cor e sensibilidade (exposto na
Fortaleza de Santo Amaro da Barra Grande), a obra Vento Vermelho revela o nome que é sinônimo
de ondas de calor antes de pancada de chuva: o Noroeste.
Não é preciso ser observador da natureza, tampouco meteorologista, para identificar o
mais pródigo dos ventos santistas. Forte e abafado, o Noroeste nunca passa sem ser notado. "A impressão é de uma bolha de calor. Parece que estamos
numa panela de pressão", resume a atendente Gabrielle Fernandes.
A mesma impressão é usada pelo diretor científico da ONG Amigos da Água, Rodolfo
Bonafim, para explicar o fenômeno climático. Como os ventos sopram do continente, tornam-se mais fortes ao descerem pela muralha, quase vertical, da
Serra do Mar. Com a queda, a massa de ar quente tende a ser intensa. "Semelhante à câmara de uma bicicleta: quanto mais pressão, mais calor".
Assim, o soprar morno vindo do interior e da Capital torna-se quente em solo
santista. O resultado: a temperatura sobe.
Cenário verificado na tarde de ontem. A apenas três dias do fim da estação mais fria
do ano, foi registrada a tarde mais quente de 2012. Segundo a Base Aérea de Santos, os termômetros chegaram a 39º
C, às 15 horas. Conforme o levantamento anual da Defesa Civil, a marca anterior era de 1º de março, no alto verão, com 33,4º C.
O tempo seco eleva, ainda mais, as temperaturas. Na tarde de ontem, quando a umidade
relativa do ar estava em 18%, a sensação térmica era cinco graus Celsius acima da registrada.
Onda de calor que poderia ser maior, caso o ar não estivesse tão seco. Em
temperaturas semelhantes às verificadas ontem, mas com umidade relativa em 50% (clima característico do verão), a sensação térmica estaria na casa
dos 55º C, conforme cálculos de Bonafim. "Com o tempo seco, a sensação térmica é menor", resume.
Enquanto os ventos continentais sopram quentes, do mar o ar frio sinaliza que vem
chuva. A precipitação se dá pelo choque das duas massas opostas. Combinação fatal e conhecida pelos santistas. Porém, enquanto do céu não cai
nenhuma gota, o ar abafado e a sensação de calor provocam mal-estar nas pessoas.
Na tarde de ontem, rajadas de vento anunciavam a chegada de chuvas e traziam
problemas.
Rajadas avisavam: vem chuva
Foto: Bruno Miani, publicada com a matéria,
na página A-6
Humor - Ou muito me engano (e nesse caso corrija-me o Gabinete de
Meteorologia) ou foi mesmo o Vento Noroeste que se pôs desde dez horas de anteontem a soprar sobre a cidade, secando o coração das gentes". Assim
Vinícius de Moraes (1913-1980) descreveu outro aspecto do fenômeno meteorológico: a mudança de humor. "A mim secou-me os olhos, a boca e a alma
perseguida de insônia, e me tornou áspero o lençol, e me trouxe lembranças secas de vida", continua o poetinha, na crônica O Vento
Noroeeste.
Bafo quente que altera a expressão dos pedestres nas ruas movimentadas. Motoristas
fecham os vidros dos carros e se salvam graças ao ar gelado, que reduz a potência do motor.
Nas calçadas de edifícios comerciais, gotas de água que se desprendem dos aparelhos a
manter a temperatura constante nos escritórios são obstáculos aos transeuntes. Até mesmo os taxistas deixam as animadas conversas dependurados sobre
a porta dos veículos para a solidão refrescada pelo ar-condicionado, no interior do carro.
"Não gosto do Noroeste. Dói minha cabeça, sinto mais sono, uma certa lentidão nos
movimentos. À noite é difícil dormir", resume a vendedora Jaqueline Freitas. Já o balconista José Pedro da Fontes não se queixa do calor. "Melhor
quente que frio".
A ventania no final da tarde agitou a areia e as árvores na orla da praia
Foto: Bruno Miani, publicada com a matéria,
na página A-6
Umidade |
Entre 12 e 20% - Estado de Alerta - É recomendado
consumir líquidos, frutas e comida leve; suprimir exercícios físicos e trabalhos ao ar livre, entre 10 e 16 horas; evitar aglomerações em
ambientes fechados |
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Quadro Vento Vermelho, do pintor Manabu Mabe
Imagem publicada com a matéria
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