Modelo da USP simula elevação da água em manguezais (áreas verdes) no canal de Santos
Foto: Julia Moraes/Folha Imagem, publicada com a matéria
CIÊNCIA
Elevação do nível do mar ameaça praias e mangues em Santos
USP simulou o que acontecerá se o Atlântico subir 1,5 metro até o fim do século em razão do aquecimento global
Em um cenário pessimista, o avanço do mar pode expor mais áreas habitadas ao ataque de ressacas e obrigar o porto a elevar estruturas
Rafael Garcia
Da reportagem local
Um cenário pessimista de elevação do nível do mar pode acabar com praias, destruir mangues e expor a ressacas áreas
urbanas que hoje estão protegidas na Baixada Santista. A conclusão é de pesquisas realizadas com um modelo físico com 750 m² – uma maquete da Baía e Estuário de Santos – construído num galpão do Laboratório de
Hidráulica da Poli (Escola Politécnica da USP).
O trabalho, realizado por encomenda do Ministério do Meio-Ambiente, tomou como base um cenário de elevação do mar de 1,5 metro até o fim do século. A previsão é maior do que a divulgada
neste ano pelo IPCC (Painel Intergovernamental sobre a Mudança Climática), um máximo de 8 cm, mas não é descartável. Climatologistas como o alemão Stefan Rahmstorf defendem valores mais próximos de 1,5 m.
"Isso pode acontecer", disse à Folha Paolo Alfredini, professor da Poli que coordenou o projeto. "Haverá erosão nas praias, se perderá a faixa de areia e haverá ataques [do mar] a
locais que hoje só são atingidos em ressacas mais fortes, como a que atacou a Ponta da Praia em 2005".
Além de perda de faixa de praias, sobretudo em São Vicente e no leste da Baía de Santos, haveria impacto nos mangues. "Praticamente todos os bosques de mangues
desapareceriam dali, porque eles não têm para onde se expandir", diz Emilia Arasaki, colaboradora de Alfredini no projeto.
"O manguezal é importante para navegação no Porto de Santos porque é um filtro que retém sedimentos", explica Alfredini. "Se o manguezal morre afogado por uma subida do nível do mar, o
sedimento vai direto para o canal e aumenta as taxas de dragagem". Dessa forma, seria preciso escavar o leito do canal com maior freqüência para que grandes navios não encalhassem nos sedimentos.
Ameaça das ressacas - Apesar de o modelo de Alfredini ter como foco a topografia natural - praias e mangues -, ele já indica que várias áreas urbanas podem ser bastante afetadas,
com tempestades podendo trazer maiores prejuízos a áreas mais interiores de Aparecida e Ponta da Praia, mesmo que as ondas não avancem sobre as calçadas nesses locais.
"Em todo o sistema de canais de drenagem que tornam determinadas áreas habitáveis, o nível de referência é o mar", diz Alfredini. "Essas regiões são muito planas, e se o mar subir 1,5
metros grandes áreas passarão a ser mais inundadas".
A subida do mar também pode prejudicar o sistema de coleta de esgoto da cidade, que direciona efluentes para emissários na orla, dizem os cientistas. E outra preocupação é o
comprometimento de atuais fontes de água doce, porque a água salgada invadirá mais os canais e lençóis freáticos.
Apesar do detalhamento do modelo de Alfredini, porém, mais estudos são necessários para saber como lidar com o problema no futuro. Ainda não está claro se a construção de um sistema de
diques com preços realistas pode evitar os impactos do aumento do nível do mar no século 21. Na pior hipótese será preciso adaptar construções ou simplesmente conviver com o problema: uma Baixada com menos praias e mangues, sem proteção natural
contra ressacas.
"Mas essa decisão passa por políticas de curto, médio e longo prazo", diz Alfredini. "Nós podemos nos programar para isso".
Paolo Alfredini e Emília Arasaki observam o modelo que construíram na Escola Politécnica
Foto: Julia Moraes/Folha Imagem, publicada com a matéria
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