Imagem publicada com a matéria
Democrática e turística
É assim que podem ser resumidas as principais características deste país, que é um dos
menores da América Latina
Ronaldo Abreu Vaio
Da Redação
Guardadas as devidas proporções e considerando o
descompasso do tempo, a Karol Vanessa Handy Lopes, de 35 anos, se sumissem os prédios e o tráfego de Santos, a cidade seria idêntica ao seu vilarejo
natal próximo a Pavones, às margens do Oceano Pacífico. As casas do povoado eram de madeira, habitadas por cerca de 1.500 pessoas, entre
agricultores e pescadores, que vez ou outra poderiam se deparar com guaxinins ou iguanas no quintal de casa. Um cenário que Karol conseguiria
imaginar para uma Santos que já se perdeu na noite dos tempos – basta substituir iguanas e guaxinins por cotias e gatos do mato. "Quando cheguei
aqui, não sabia o que eram os apitos dos portões eletrônicos (dos prédios) de madrugada e estranhei", sorri.
A tranquilidade bucólica do vilarejo em que Karol nasceu pode ser considerada um extrato do que é a Costa Rica. Um dos menores da América Latina,
com pouco mais de 4 milhões de habitantes, o país foi o único latino-americano incluído entre as 22 democracias mais antigas do mundo, em uma
prestigiada lista elaborada pelo cientista político da Universidade Yale, Robert Dahl. Essa liberdade política plena vem ininterrupta desde o início
dos anos 50. E segue par e passo com a ausência de distúrbios ou conflitos de maior envergadura. Aliás, desde 1949, a Costa Rica não tem nenhuma
força militar em atividade.
Com tudo isso, natural que Karol estranhasse algumas coisas, no início dos sete anos em que já está por aqui. Ela veio por obra e força do marido
brasileiro, que conheceu quando trabalhava em seu país – ele é fotógrafo profissional, especializado em surfe. "O cupido é traidor", brinca.
Karol chegou em São Paulo no inverno brasileiro. Jamais podia imaginar que o frio
fosse daquele jeito. "Pensei que era um país tropical", diz, comparando com a sua Costa Rica, em que a diferença entre o inverno e o verão, segundo
afirma, é que no inverno chove o dia todo, no verão, só à tarde. "Lá não tem o gostinho do inverno".
Se não tem gostinho de inverno, tem o de muitos quitutes que deixou para trás. Lembra de vários, a começar pelo vigorrón: mandioca cozida,
salada de repolho, porco frito ao molho de tomate. Em dias de festa, a iguaria é servida em folhas de bananeira ou de chapéu de sol. Também uma
folha de bananeira será usada para fazer a trouxinha com que se embrulha o tamal para ir ao banho-maria, cozinhar. O tamal, aliás, é
quase impossível de ser corretamente reproduzido no Brasil, onde é difícil de encontrar um ingrediente básico: a farinha de milho fina.
O tamal é uma massa recheada, feita à base dessa farinha. Já o recheio fica por conta da imaginação. Os de feijão, porco ou frango são os
mais tradicionais. E a carne de boi? Esqueça-a: é muito cara na Costa Rica. "A carne de primeira é toda voltada para a exportação. Quando cheguei no
Brasil e vi que era uns 50% mais barata aqui, pensei: "vai ser carne todo dia", brinca.
Karol apresenta os tamales típicos da Costa Rica, e de muitos países caribenhos, com nomes
diversos. Uma massa recheada, feita à base de farinha de milho fina, embrulhada em folha de bananeira para ser cozida em banho-maria
Foto: Fernanda Luz, publicada com a matéria
Viver e respirar turismo - Em seu país, Karol trabalhava no setor de turismo. Comparações
são inevitáveis. Segundo ela, a Costa Rica vive e respira o turismo, cuja receita já é maior do que a da exportação de café e abacaxi, juntos. E o
país usufrui da chancela do Fórum Econômico Mundial, que o posiciona em segundo lugar da América Latina e no 44º no mundo, de um universo de 139
países, em seu Índice de Competitividade em Viagens e Turismo.
O segredo do sucesso seria simples: o turista está pagando, tem direito a ser servido. Essa
percepção, avalia Karol, ainda não está tão desenvolvida por aqui, ao menos no que tange ao preparo da indústria. Pois, paradoxalmente, se
dependesse do acolhimento natural de seu povo, o Brasil seria um destino por excelência, na visão dela.
Um exemplo de uma alegria de viver tão acolhedora, Karol vai buscar nas festas de aniversários. "Gosto da forma como os brasileiros cantam parabéns,
as brincadeiras, 'com quem será...', essas coisas. Lá, só cantam a música e pronto". Dos aniversários, também ama a tríade da perdição: coxinha,
bolinha de queijo e brigadeiro.
As diferenças entre as classes sociais na Costa Rica são bem menores do que no Brasil. E a educação é reconhecida como um caminho certo para manter
esse abismo cerrado. Lá, a grande maioria das crianças frequenta instituições do sistema de ensino público. Karol tem três filhos. Mesmo
reconhecendo as diferenças em relação ao seu país, todos estudam, ou estudaram, em escolas públicas. "Não é porque você estudou em escola pública
que vai sair 'burrinho'. Querendo, sai com uma boa base", crê.
Foto: reprodução, publicada com a matéria
As esferas de pedra - Um enigma. É o que são essas 300 esferas de pedra encontradas na
região do delta do Rio Díquis e na Ilha del Caño. Elas variam de alguns centímetros a mais de dois metros de diâmetro, pesando mais de 15 toneladas.
A maioria é esculpida de gabro, similar ao basalto. Algumas poucas são de calcário. Presume-se, tenham sido produzidas entre 200 a.C e 1.500 d.C. O
povo que as teria esculpido desapareceu após a conquista espanhola.
Gallo Pinto - É um prato popularíssimo na Costa Rica – que disputa, com a Nicarágua, a criação
da iguaria. Basicamente, é uma variação do arroz com feijão brasileiro, em que ambos são preparados em separado, mas misturados, depois, em um bolo.
Acompanha banana da terra, tortilhas de farinha de milho e natilla – espécie de iogurte.
Foto: Shutterstock, publicada com a matéria
Café... - A planta foi primeiro introduzida no país no século 19 e o grão foi exportado
para a Europa ainda em 1843 – ao mesmo tempo em que a cultura crescia no Brasil. Logo, a commodity se transformou no principal produto de
exportação costa-riquenho.
As maiores plantações estavam no Planalto Central, a secção mais populosa do país, e o café era
levado em carro de boi até o porto de Puntarenas, no Pacífico. Mas, como o maior mercado consumidor era o europeu, uma saída pelo Atlântico se fazia
estrategicamente necessária.
Em 1870, o governo do país contratou o tio do empresário norte-americano Minor Keith para
construir uma estrada de ferro até o Porto de Limón, na costa do Caribe – que se abre ao Atlântico. Para a construção, começaram a chegar os
primeiros imigrantes diferentes dos espanhóis: os jamaicanos, assim como prisioneiros dos Estados Unidos, italianos e chineses.
Com a morte do tio, Keith assumiu os negócios. Logo, amealhou do governo largas porções de terra e
um contrato de leasing da estrada de ferro, pela construção. Nas terras, iniciou uma nova cultura.
...e as bananas - A fruta passou a rivalizar com o café como principal produto de exportação costa-riquenho. E Keith se deu muito bem: por
conta do sucesso, ele fundou, junto com Andrew Preston, a famosa United Fruit Corporation, em 1899. Durante os anos 20, a companhia esteve presente
praticamente em toda a América Latina. Em algumas regiões, dominava toda a rede de comércio e transportes, dando origem ao termo república de
bananas – que durante muito tempo ficou associado aos países latino-americanos, especialmente da América Central.
Parques e o verde - Além das praias do Caribe e do Pacífico (distantes apenas alguns quilômetros), a forte indústria do turismo na Costa Rica
está também calcada em sua rede de parques nacionais e áreas protegidas, que cobrem cerca de 25%,dos 51 mil quilômetros quadrados, do território –
maior proporção do planeta. Nesse quesito, a Costa Rica neste ano ocupa o quinto lugar do mundo no Índice de Desempenho Ambiental, do Centro de
Política e Lei Ambiental da Universidade de Yale, nos Estados Unidos. O Brasil figura em 30º lugar nesse
ranking, com 132 países.
Guerra e paz - Comparada à maioria dos países da América Latina, a Costa Rica é realmente um oásis de tranquilidade. Em sua história recente,
só passou por dois períodos turbulentos. O primeiro, em 1917, quando o general Federico Tinoco Granados instalou uma ditadura. Dois anos depois, ele
foi deposto e exilado.
Em 1948, suspeitas de fraude eleitoral levaram a uma guerra civil que durou 44 dias e ficou marcada como o evento mais sangrento que o país viveu,
matando 2 mil pessoas. Duas das consequências desse movimento foram a supressão das forças armadas no país – que tomaram parte na guerra civil – e o
advento da Constituição de 1949, que selou os rumos democráticos e pacíficos da Costa Rica, até hoje.
República da Costa Rica
(República de Costa Rica)
Capital - São José
População - 4.301.712 (censo, 2011)
Línguas oficiais - Espanhol, Mekatelyu e Bribri
PIB - US$ 40,947 bilhões (estimativa, 2011)
Renda per capita - US$ 8.876
Datas nacionais - O país tem três datas de independência: a primeira, 15 de setembro (da
Espanha, em 1821), 1º de julho (do México, em 1823) e 21 de
março (das Províncias Unidas da América Central, em 1847)
Colônia na região - O Consulado Honorário em São Paulo indicou a Embaixada da Costa Rica, em Brasília,
para informações. O contato feito por e-mail com a Embaixada não trouxe retorno.
|
|