POUSO CIRCULAR - No Caminho do Mar, o primeiro ponto de cruzamento com a Calçada do
Lorena é assinalado por um pouso circular
3.1.4. O Caminho
do Mar - A Estrada da Maioridade
O traçado do Caminho do Mar é uma herança da época imperial, adaptado à era rodoviária.
Em 1836, o marechal do Corpo de Engenheiros, Daniel Pedro Muller, foi encarregado de
"formar o plano de uma estrada de carro desde o Cubatão de Santos até as povoações mais consideráveis, que ali exportam seus produtos". Fez
igualmente o projeto para uma ponte sobre o canal denominado Rio de Sant'Anna, na baixada.
Já em 1838, o presidente da Província, Gavião Peixoto, informa que "o trilho
ultimamente aberto tem a capacidade necessária para uma boa estrada, pela qual se faça em carros o transporte de gêneros do comércio, ficando
somente com 12 voltas, quando o atual, em que isso é inadmissível, tem 133".
O atual a que se refere é a Calçada do Lorena.
Foi na administração do brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar, em 1841, que ficou em
condições de tráfego, sob orientação de João Bloem, tendo recebido, então, o nome de Estrada da Maioridade, "obra de vital interesse para a
província, pois que, sem essa estrada, todos os melhoramentos que se fizerem em suas ramificações serão improfícuos".
A estrada tinha 20 palmos de largura. O trecho de Serra era de 3.580 braças (cerca de
7.876 metros).
Na administração de Manoel Fonseca de Lima e Silva, a estrada parece ter recebido
grandes melhoramentos. "A Estrada da Maioridade era digna de maior atenção, por ser a mais importante da província". Outra razão teria levado aquele
presidente a dar especial atenção àquela estrada - a visita de D. Pedro II e D. Teresa Cristina.
Os imperadores chegaram a Santos a 18 de fevereiro de 1846 e subiram a São Paulo a 25,
acompanhados de grande comitiva: o senador Vergueiro, Raphael Tobias de Aguiar, estavam entre os paulistanos que foram aguardar visitantes no Ponto
Alto, onde a comitiva imperial pernoitou, numa casa da qual restou fotografia. O ponto situa-se no planalto, nas proximidades do Rio Grande, num
terreno onde a costa atinge 900 m, o que justifica o nome do local.
Esse fato fica para a história de São Bernardo do Campo: ter acolhido no planalto a
Família Imperial em sua primeira viagem a São Paulo. Fica também uma pergunta: existirá ainda essa histórica casa, à frente da qual Washington Luiz
foi fotografado?
O trânsito de carros na administração Pires da Motta já parecia regular: "A Serra da
Maioridade, no dizer da presidência, obra gigantesca, a maior da província, e de maiores vantagens para o comércio, oferecia trânsito fácil e
cômodo; por ela subiam e desciam carros pesadamente carregados".
3.1.4.1. A Estrada Vergueiro
Assumindo a presidência da província a 16 de outubro de 1862, a 31 desse mês Vicente
Pires da Motta entregava a José Vergueiro a direção e a administração da estrada para Santos. Pouco mais de um ano depois, a 5 de dezembro de 1863,
esse presidente e comitiva realizaram uma viagem a Santos que levou 5 hs. e 57 minutos. Inegavelmente um grande progresso em relação ao tempo gasto
por Lallemantt 5 anos antes: "Com um bom animal pode-se fazer comodamente o percurso de Santos a São Paulo em um dia (...), com a troca de animal
pode-se concluir muito bem a pequena viagem em dez horas".
A estrada foi entregue ao público a 21 de julho de 1864, na administração Homem de
Mello.
Vergueiro elaborou um traçado inteiramente novo no trecho entre a cidade de São Paulo
e o alto da serra. Iniciando-se no Largo da Pólvora, seguia para Vila Mariana, Meninos, São Bernardo, Varginha, Zanzalá e Alto da Serra, tocando a
estrada antiga em 3 pontos. A declividade máxima das rampas era 2%. Largura, 35 palmos, sendo 25 de pista e 5 de acostamento de cada lado.
Foram realizados 25 cortes e 64 aterros, construídas 51 pontes, além de 3 antigas.
"Na Serra da Maioridade, desobstruída por ele, diminuiu as rampas, levantando grandes
muros de pedra, deu-lhe maior largura, fez-lhe ao lado valetas para escoamento das águas, apedregulhou-a e calçou-a em certos pontos".
A rampa máxima ficou em 8% e a largura média em 22 palmos. O custo da obra foi 990:701
818. "Foi a primeira estrada de rodagem da antiga província de São Paulo". Uma curiosidade é que toda a estrada, do centro de São Paulo a Santos,
chamou-se "Estrada do Vergueiro". A atual Rua Vergueiro é um remanescente dessa época, bem como o trecho da estrada que restou próximo à Via
Anchieta.
A 16 de fevereiro de 1867 era entregue ao tráfego a estrada de ferro de Santos a
Jundiaí. Com a ferrovia, a Estrada da Maioridade conheceu progressivo abandono. O aterro do Cubatão, feito em 1827 por Lucas Antônio Monteiro de
Barros, entre o Rio Cubatão e Santos, foi cedido à estrada de ferro; dessa forma a estrada ficou quase inutilizada.
3.1.4.2. A era automobilística
A primeira viagem de automóvel entre São Paulo e Santos foi empreendida nos dias 16 a
17 de abril de 1908, tendo a viagem demorado 37 horas.
Os carros eram um Motobloc francês de rodas altas que deixavam o chassis a 30 cm do
chão e um Sizaire et Naudin. A façanha foi realizada por Antonio Prado, Clóvis Glycério, Mário Cardim (repórter de O Estado), Bento Canabarro
e o motorista Malle.
A viagem foi cheia de percalços, demonstrando a precária situação da estrada. O leito
da estrada estava quase totalmente destruído pela enxurrada. No Cubatão não encontraram estrada, o trecho foi vencido sobre lama e vegetação.
Essa situação só vai melhorar em 1913, quando Rudge Ramos resolve fundar uma empresa
destinada a construir uma estrada entre São Paulo e o Alto da Serra. O empreendimento é financiado com a cobrança de pedágio. A estrada é denominada
Caminho do Mar. Nesse ano, o conselheiro Rodrigues Alves manda macadamizar a estrada. Os trabalhos ficaram assim distribuídos: o trecho entre o
Sacoman e o Rio Grande ficaria sob a responsabilidade da empresa de Rudge Ramos. Do Rio Grande a Santos, sob a responsabilidade do 1º Distrito de
Obras Públicas do Estado.
A partir de 1920, os auto-veículos já estão em condições de concorrer vantajosamente
com as ferrovias em distâncias inferiores a 100 km, porém os novos veículos exigiram pequenas alterações no traçado para amenizar as rampas.
A intensificação do trânsito da estrada levou Carlos de Campos, em 1925, a promover a
pavimentação do trecho da serra do Caminho do Mar. Pela primeira vez na América do Sul foi usada pavimentação em concreto.
As obras complementares, principalmente drenagem de águas pluviais, foram executadas
com muito cuidado: os córregos que formam a rede de drenagem natural foram canalizados nos cruzamentos com a estrada e ao longo de toda a pista foi
deixado um valo de concreto que impedia a água cruzar a pista ou se infiltrar no sub-piso. Em conseqüência, até pouco tempo, meio século depois de
sua execução, a estrada não apresentava evasão de material do sub-piso, fato que vem ocorrendo desde a obstrução do valo, o que constitui séria
ameaça à estabilidade dessa via.
Os muros de arrimo foram executados em granito, à semelhança do que já fizera José
Vergueiro; esse tratamento é coerente com os pousos e ambienta esses monumentos.
É oportuno lembrar que, até a construção da Via Anchieta, todo o trânsito de caminhões
se fazia por essa estrada e, até proibição posterior, o Caminho do Mar era utilizado pela indústria automobilística, com pista de prova para
caminhões que subiam e desciam a serra, carregados de lastro, e continua sendo de automóveis.
Mesmo com esse uso, os danos que a pista apresenta são
superficiais.
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