Na Rua Delfino Stockler de Lima, chalés enfileirados, como nos anos 1950
Moradores esperam a festa e observam mudanças
A iniciativa não é de nenhum político aproveitador.
Moradores comuns tomaram a iniciativa de afixar faixas em frente às suas casas, para saudar o Dia do Marapé, comemorado a 13 de junho. A Sociedade
de Melhoramentos, de sua parte, se encarregou de preparar algumas comemorações, que começam às 9 horas, com missa na Igreja São Judas Tadeu, e
prosseguem com inauguração de um ambulatório médico, uma área de lazer e escadarias de acesso ao morro.
Mercadinho do Marapé, uma tradição
Ano eleitoral, e
os candidatos deverão invadir o bairro no domingo. Políticos que em nenhum momento se preocuparam com a ameaça de despejo que pesa sobre
mais de 200 famílias, mas que não podem perder uma data como essa para uma visitinha. Pois é: domingo é dia de festa, a Sociedade de Melhoramentos
completa 28 anos de atividades e ninguém deverá apontar seus medos e inquietações.
De um modo geral, os moradores do Marapé não têm do que reclamar, pois o lugar não concentra grandes problemas.
As pessoas só não entendem por que a Nilo Peçanha, apesar de levar o título de avenida, continua sem asfalto, toda esburacada e se transforma em
imenso lamaçal sempre que chove. Em compensação, por essas características ainda se vê galinhas ciscando no meio da via e crianças jogando taco.
Cenas que desaparecem gradativamente da paisagem de Santos.
Esse bairro, predominantemente horizontal e residencial, parece fadado a grandes mudanças. As imobiliárias
descobrem os chalés com enormes quintais e insistem até que os proprietários cedam os espaços para a construção de prédios. Na Rua Visconde de
Cairu já se observa a formação de um paredão de concreto. A circulação de ar começa a ficar comprometida e o morador Anacleto Serafim de Almeida
descreve a situação com palavras bem simples: "Esse crescimento fará com que o pessoal da velha guarda desapareça antes do tempo".
Poucas são as ruas do Marapé onde ainda se depara com chalés enfileirados, como nos anos 50. A Rua Delfino
Stockler de Lima surge como uma exceção. E, por trás das casinhas bem cuidadas, não raro há vistosas hortas, de onde os moradores colhem alimentos
sadios. Como nos velhos tempos em que não se dependia tanto de enlatados.
O bairro se transforma, mas o tradicional mercado da Avenida Pinheiro Machado permanece como na época da
inauguração em 1954. Talvez bem mais movimentado, já que abre aos domingos, até as 12 horas, e por isso leva vantagem sobre os supermercados, que
permanecem fechados nesse dia da semana.
Lá se encontra de tudo um pouco, até aquele presentinho que ficou esquecido. Não falta também um pouco de verde,
pois o zelador Antônio do Rosário Bento tem o cuidado de cultivar plantinhas entre os corredores movimentados. É pena que o famoso painel do
artista Clóvis Graciano permaneça tão abandonado: ilustra um aspecto da antiga comercialização, e as pastilhas coloridas que caíram foram
substituídas por outras, brancas, que destoam em meio à composição. A Prefeitura já falou até em desapropriar a parede que abriga o painel, mas a
idéia não foi avante.
Uma idéia que deu certo foi aquela de se integrar menores das instituições na comunidade, lançada por
voluntários da Igreja de São Judas Tadeu. É assim: todos os domingos, meninos e meninas de internatos se juntam com outros do bairro para
participar da chamada Missinha das Crianças e de atividades de lazer. Só vendo o padre Chico e a Lourdes em meio à garotada, satisfeitos porque o
trabalho vem dando certo.
Por essas e por outras, a igreja de São Judas Tadeu conquista novos freqüentadores. E, no dia 28 de outubro, os
fiéis promovem a tradicional festa em louvor ao padroeiro. Segundo diz a tradição, o apóstolo Judas foi martirizado na Pérsia, nessa data, daí a
homenagem dos católicos. Desde cedo a igreja fica cheia de gente, formam-se imensas filas para a compra de vela e flores.
Na Ponte Vermelha, clima de amizade e descontração
Quantidade tão grande de gente não se vê nem nas finais de campeonatos do Clube de Malha e Bocha Rio de Janeiro
ou do Clube de Bocha Ponte Vermelha. E olha que esses dois clubes são muito bem freqüentados.
O Ponte Vermelha vive cheio de velhinhos, que por sua alegria e descontração sempre atraem torcedores. Imaginem
só: somando-se as idades dos integrantes de um dos quartetos de bocha atinge-se 268 anos! E, quando se fala sobre o clube, não se pode esquecer de
João Moraes, considerado a alegria de todos. Se ele está por perto, ninguém fica triste.
Pois o mesmo ambiente de amizade e brincadeiras se encontra no Clube Capim Gordura, fundado em 1979, em torno da
sueca e do dominó. Funciona em local cedido pelo Bar e Café Brasileiro e, quem quiser conhecer um dos radialistas mais antigos de Santos, Simões
Calado, basta procurá-lo nas imediações.
Muitas crianças e valas fétidas no núcleo residencial ameaçado de extinção
Famílias sob ameaça de despejo
O clima é de muita insegurança. Voltaram a correr boatos de
que a Companhia Imobiliária Atlântica e o Centro Redentor Gustavo da Costa Silveira irão despejar os moradores dos caminhos Dona Adelaide, Asilo
dos Inválidos e Ferreira Lage, encravados entre as ruas Carvalho de Mendonça e Heitor Penteado.
A área passou a ser ocupada durante a Segunda Guerra. Hoje calcula-se que mais de 200 famílias vivam nos velhos
chalés, entre caminhos estreitos e valas malcheirosas, que transbordam a cada chuva mais forte.
São famílias que aterraram o local, introduziram melhorias, pagam impostos e jamais poderiam esperar que um dia
estariam envolvidas em uma ação de despejo. Em 1976, o Centro e a Atlântica surgiram como por encanto, se dizendo donos daquelas terras. Sem
maiores cerimônias, intimaram 87 famílias a deixarem a área no prazo de dez dias.
Mas os moradores se uniram e ganharam forças: correram ao Fórum para tentar fazer valer seus direitos. Até hoje
a ação corre na Justiça, volta e meia surgem boatos, crescem a tensão e o medo. As mães agarram os filhos e temem o pior.
Um fato é certo: quem entrou com pedido de usucapião (no máximo 10 famílias) venceu a questão. Luís Antônio
Rodrigues, 75 anos de idade, e Maria Augusta Rodrigues, estão lá para provar.
O casal é uma prova de que os antigos moradores têm direito à terra
Mais de 20 mil habitantes
O Bairro do Marapé ocupa uma área de 115,70 hectares e é
delimitado pelas ruas Gaspar Ricardo e Joaquim Távora, Avenida Pinheiro Machado e contorno do morro. O Censo de 1970 apontou uma população de
18.672 habitantes, acrescida de quase cinco mil pessoas na década, pelas estimativas da Prodesan.
Segundo a estatística mais recente de que se dispõe (Censo de 1970), o Marapé tem 2.560 lotes ocupados e 90
vagos. As unidades residenciais são 4.677; as de serviço, 203; as comerciais, 151; e as industriais, 55.
Os historiadores dizem que o nome é uma evolução de Parapé (depois Marapé), de pêra, que significa
mar, e pé, caminho. Ou seja, Marapé significa caminho do mar e faz alusão a um antigo caminho dos indígenas, único que
existiu durante alguns séculos, comunicando parte da ilha, perto do Estuário, a outra, na direção do mar grosso. Esse caminho partia do porto,
região da Alfândega, passava junto à Itororó, acompanhava o Monte Serrate, galgava a lombada existente junto à Santa Casa, descia para a várzea do
Jabaquara e dali, sempre acompanhando os morros, passava pelo Marapé, saindo, por fim, na praia.
Em outubro, uma grande festa em louvor ao padroeiro
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