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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - OS DIRIGENTES
Esmeraldo Soares Tarquínio de Campos Filho-2


(1969 - cassado antes de assumir)

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Em 12 de abril de 2012, o jornal santista A Tribuna publicou, nas págs. A-1/D-1:


Senso de justiça na vida pública
Foto: arquivo, publicada com a matéria, na primeira página

O Esmeraldo que a História não esquece

Se vivo estivesse, Esmeraldo Tarquínio completaria 85 anos hoje. Deputado estadual, foi eleito prefeito de Santos em 1969. Mas sequer assumiu a cadeira. Teve os direitos políticos cassados pelos generais da ditadura militar.

Esmeraldo, uma lembrança viva

O prefeito que não assumiu, cassado pela ditadura, faria 85 anos

Eduardo Brandão
Da Redação

Uma voz grave enchia salão da Sociedade Humanitária e invadia a Praça José Bonifácio. Era assim todas as noites, de quinta a domingo, no efervescente Centro de Santos no começo da década de 1950. Entre boleros, sambas-canção, blues, jazz e casais a bailar, o jovem despachante aduaneiro defendia alguns trocados, que o ajudariam a pagar o curso de Direito.

Era outra época e Santos significava quase sinônimo de Café – apesar de ser um tempo após a crise mundial de 1929. Não havia nenhum curso superior na Cidade. Assim, para formar-se advogado, ele precisou estudar no Rio de Janeiro, à época capital do Brasil.

Os bailes da vida não foram apenas uma forma prática de viabilizar o estudo: neles o amor também lhe mostrou o seu mais belo sorriso. Foi em cima do palco que conheceu Alda Terezinha Camargo, companheira de vida, que o acompanhou até o fim.

O carismático crooner sequer tinha ambições de seguir passos na vida pública, fato decisivo para ele ser protagonista, décadas depois, da história santista. Mas com o microfone nas mãos, o vicentino Esmeraldo Soares Tarquínio de Campos Filho transmitia uma de suas mais significativas qualidades: o carisma.

Se um aneurisma cerebral não tivesse encurtado sua vida, em novembro de 1982, o político completaria hoje 85 anos. "Ele era uma dessas pessoas que não se encontra ninguém que possa falar mal", resume o jornalista Mauri Alexandrino.
"Aliás, ao contrário, Esmeraldo era muito querido. Andar com ele era complicado; cada quarteirão levava cerca de uma hora. Ele parava para conversar com todos e o fazia com muito prazer", continua.

A memória era outro atributo: não se esquecia de nenhum nome, rosto ou endereço. "Não era uma imagem fabricada, falsa; era apenas ele", completa.

Porém, não soltava a voz somente nos palcos santistas. Na Capital, o ex-político participava do programa Titulares da Notícia, na TV Bandeirantes, onde se debatia futebol – sua outra grande paixão. E no futebol, o amor sem fim pelo Santos F. C. Ao término da edição, ele ia à região dos bares no Centro de São Paulo.

"Era comum ele cantar nos cabarés da Capital. Não como amador, mas como profissional. Ganhando para isso. Fez participações em shows de estrelas do jazz internacional. Era ovacionado", recorda o amigo.

Jornalismo – O espírito boêmio, a facilidade em cativar as pessoas e o senso de justiça o levaram naturalmente à vida pública. "A trajetória política de meu pai foi curta, durou cerca de nove anos. Mas seu legado é eterno", avalia Esmeraldo Tarquínio Neto.

Em 1959, Esmeraldo chegou à Câmara Municipal de Santos, eleito pelo então PSB. Três anos depois, elegeu-se deputado estadual, cargo que exerceu até 1969, quando teve o mandato cassado pela ditadura militar. "Foi uma época difícil, muitas portas se fecharam", recorda seu filho.

O exílio da vida pública não o impediu de lutar por justiça social. Em 1971, aos 44 anos, matriculou-se na primeira turma de Jornalismo da Sociedade Visconde de São Leopoldo, atual Universidade Católica de Santos (UniSantos).

Apesar de ser duas décadas mais velho que os demais alunos, Esmeraldo transformou-se numa espécie de líder da garotada de 20 e poucos anos. "Era algo natural dele, um magnetismo sem explicação", cita Alexandrino.

No meio de teorias de comunicação e técnicas jornalísticas, encontrava tempo para fazer o que mais gostava: o bom trato com o próximo.

"Ele entrava na sala de aula, caminhava elegantemente até sua cadeira, sempre a primeira da fila. Sentava-se, olhava para cada um de nós e percebia quem precisava de atenção, de uma conversa. E sempre nos ajudava com bons conselhos", recorda, emocionada, a editora-executiva de A Tribuna, Vera Leon. Juntos dividiram os quatro anos de estudo superior.

Do companheirismo da sala de aula à amizade foi um salto. "Foi um mestre, uma referência, uma figura paterna nutrida por muitos de nossa turma", continua. Vera ainda lembra com carinho das conversas nos bares próximos à faculdade, o ponto de encontro de todos os estudantes com a mística figura pública santista.

Assim que se formou, foi convidado a lecionar para as turmas mais novas. O político cassado, cantor e advogado passou também a ensinar aos futuros jornalistas.

Vida dura – A leveza que conduzia seus passos contrastava com os tempos amargos de sua infância. Nascido negro num país que mascara (mas não esconde) seus preconceitos, Esmeraldo conheceu desde a infância o lado amargo da vida.
Ficou órfão aos 7 anos, idade em que começou a fazer os primeiros trabalhos remunerados. Aos 10 anos, já trabalhava como office-boy, para ajudar no sustento da casa.

Após a Segunda Guerra Mundial, já com 18 anos, deu início à vida política. Atividade que dividia com a música, os estudos e o trabalho. "Tarquínio era alto, bonito, elegante, um gentleman. Onde quer que fosse, era o centro das atenções", recorda Alexandrino.

Comemoração

Desde 1998, está em vigor a Lei Municipal 1.678, que celebra o Dia Esmeraldo Tarquínio. De autoria do ex-vereador Martinho Leonardo, a medida institui que, em todo dia 12 de abril, escolas municipais e demais centros de ensino da Prefeitura comemorem a data

 


Esmeraldo Tarquínio é lembrado pelos amigos como um homem elegante, alto, bonito, um gentleman que era o centro das atenções por onde passava

Foto: arquivo, publicada com a matéria

Símbolo santista da resistência ao Golpe

Acontecimentos adversos marcaram a trajetória pública de Esmeraldo Tarquínio. Perseguido pela ditadura, teve seus direitos políticos suspensos em 1969, quando exercia o cargo de deputado estadual.

Cassado com base no Ato Institucional nº 5 (AI-5), o fato deu-se um mês antes de assumir como prefeito de Santos, cargo conquistado de forma legítima nas urnas. Foram 45.210 votos obtidos nas eleições de novembro de 1968 (39,5% dos votos válidos). O golpe o afastaria da vida pública por 10 anos.

Solidário com seu parceiro, o vice-prefeito Oswaldo Justo renunciou ao posto. Os militares se apressaram em resolver o impasse: Santos foi considerada "área de interesse da segurança nacional". Condição mantida até 9 de julho de 1984, quando a Cidade teve a autonomia política reconquistada.

Após retomar os direitos políticos em março de 1979, Esmeraldo procurou logo recuperar o tempo que ficou impossibilitado de atuar na vida pública. Entretanto, em 1982, uma doença o tirou da reta final da campanha eleitoral de volta à Assembleia do Estado.

Autonomia – Merecidamente considerado um dos símbolos santistas de resistência ao golpe militar, Esmeraldo não testemunharia o retorno da autonomia política da Cidade. Após 20 dias internado em decorrência de um aneurisma cerebral, faleceu em 10 de novembro de 1982.

Nove meses depois, o Diário Oficial da União publicaria o decreto-lei nº 2.050, marcando a eleição municipal para o dia 9 de julho de 1984. O resultado do primeiro pleito para a prefeitura, após 15 anos de intervenção federal, consagraria a ausência do último prefeito eleito democraticamente.

Sagrou-se vencedora a chapa liderada por seu antigo companheiro e vice-prefeito, Oswaldo Justo, e do seu filho, Esmeraldo Tarquínio Neto.

Sessão solene

Os 85 anos de nascimento de Esmeraldo Tarquínio serão lembrados amanhã, em sessão solene na Câmara Municipal de Santos. O ato, iniciativa do vereador e líder do PT, Reinaldo Martins, atendendo pedido do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra de Santos, acontece às 19 horas, no plenário do Legislativo, à Praça Tenente Mauro Batista de Miranda, 1 (antigo quartel dos Bombeiros), na Vila Nova.

 


Tarquínio gostava de estar em contato com as pessoas, tanto como homem público como na convivência na faculdade, entre amigos, nas ruas

Foto: arquivo, publicada com a matéria

Na voz da filha, herança artística

Um homem é a sua obra. E se o legado do ex-prefeito eleito não se limita apenas à vida política, na arte há uma herdeira: sua filha, Deborah Tarquínio. "Hoje (ontem), uma senhora me parou na rua e disse eu ao me ver cantar lembra-se de meu pai", diz a cantora.

O amor à música é uma ligação que a faz recordar das tardes de domingo de sua infância. "Era o único momento que eu podia ficar com meu pai". Nessas tardes, vitrola e discos faziam companhia para a garota e seu maior ídolo. "Aprendi a ouvir boas músicas e a dar valor à MPB, ao jazz e aos blues com meu pai", afirma. Com ele, Deborah desenvolveu o ofício de cantar. "Ele sempre estava a cantarolar alguma melodia. Era lindo".

De todas as músicas do repertório de Deborah Tarquínio Trio, uma não pode faltar: My Funny Valentine, eternizada por Frank Sinatra. "Era a canção que meu pai cantava para minha mãe. Até hoje ouço e me emociono".

Ela recorda da alegria que seu pai tinha em viver. "Ele adorava dançar, cantar, sorrir. Adorava dar importância aos outros, ajudá-los".

Para Deborah, contudo, muitas narrativas sobre a trajetória do ex-prefeito eleito são apenas histórias aprendidas na escola. "Quando meu pai morreu eu tinha apenas 14 anos". Mas são os invisíveis fios que fazem o mundo mover. Quis o destino que 15 anos depois da morte de Esmeraldo, nascesse o filho de Deborah: exatamente no mesmo dia que Santos ficou órfão do homem que marcou sua história.

Publicado no jornal santista A Tribuna, página A-6 da edição de sexta-feira, 13 de abril de 2012:


Simples, mas, agora, à altura da majestade de um homem que fez e entrou para a história santista
Foto: Luigi Bongiovanni, publicada com a matéria

 

Uma justa reverência, 30 anos depois

Túmulo de Esmeraldo Tarquínio é remodelado no Cemitério do Paquetá e entregue à Cidade no dia que ele completaria 85 anos

Vera Leon
Editora-executiva

Feliz do homem que pode ser lembrado como imprescindível porque sua luta foi a de uma vida inteira. Feliz de quem pôde, em algum momento da caminhada, conviver com o homem imprescindível para aprender o que faz uns serem o joio e outros, o trigo. Esmeraldo Tarquínio foi o trigo que semeou uma parte da história santista, em particular, e continuará a fertilizar o inconsciente coletivo onde, de alguma forma, todos nos encontramos.

O nome do príncipe – Esmeraldo Soares Tarquínio de Campos Filho – agora dá nome à sua última morada na Terra, um pedaço simbólico de chão no Cemitério do Paquetá, onde até então não estava à altura de sua majestade.

Familiares, amigos e autoridades estiveram na manhã de ontem naquele campo santo e deram a Esmeraldo a moldura digna que a Cidade estava a lhe dever: um túmulo, 30 anos depois da sua morte.

O prefeito João Paulo Papa, presente à cerimônia, teve a sensibilidade de reconhecer que a Cidade estava em débito com o homem que tantas memórias deixou nas linhas e entrelinhas de Santos. E deu-lhe, no dia em que faria 85 anos de idade, um presente. Um túmulo simples, com seu nome, data de chegada a este mundo e data da volta ao Grande Lar. No túmulo, ainda, uma pequena escultura da cabeça de Esmeraldo, feita pelo artista plástico Luís Garcia Jorge, para que os mais novos "conheçam" o homem semeador.

Com a licença de Esmeraldo Tarquínio Neto, também presente e emocionado, ali estive como alguém que um dia, num banco de faculdade, conheceu um homem negro, alto, elegante e que, por gratidão eterna, elegeu como pai. Inevitável essa volta no tempo, reviver o que aqueles aspirantes a comunicadores sentiam quando "a entidade" entrava solene na classe, cachimbo aceso a espalhar um cheiro de chocolate e olhar percorrendo como um raio-X a turma barulhenta. Uma filharada que se fez adotar por ele, porque além de professores, precisávamos de um mestre.

Feliz, também, de quem pode ter mais de um pai nessa vida. Minha conta é de somar, quando penso no seu Sebastião, que me deu sua genética, e no Esmeraldo, que me deu a mão, um par de ouvidos atentos e a visão de um campo de trigo. No fim das contas, por causa desses dois homens – que certamente eram de boa vontade e por isso devem estar em paz – sei exatamente o que quis dizer o poeta Berthold Brecht:

Há homens que lutam um dia, e são bons;
Há outros que lutam um ano, e são melhores;
Há aqueles que lutam muitos anos, e são muito bons;
Porém há os que lutam toda a vida.
Esses são os imprescindíveis.

Homenagem
Hoje, às 19 horas, a Câmara presta homenagem póstuma aos 85 anos de nascimento de Esmeraldo Tarquínio de Campos Filho. Se estivesse vivo, ele comemoraria a data ontem. A sessão solene será realizada à Praça Tenente Mauro Batista de Miranda, 1, na Vila Nova
 

Registro no jornal santista A Tribuna, página A-4 da edição de 13 de abril de 2013:


Imagem: reprodução parcial da página A-4 de A Tribuna, de 13/4/2013

Nota no jornal santista A Tribuna, página A-4 da edição de 16 de abril de 2013:

44 anos de um governo interrompido

Da Redação

Um dos políticos santistas mais populares de seu tempo, Esmeraldo Tarquínio Filho foi lembrado na sessão da Câmara. Ontem seriam completados 44 anos de seu primeiro dia de governo, que nunca aconteceu. Eleito prefeito de Santos em 1968, com quase 45 mil votos, não chegou a tomar posse pois foi cassado pela Ditadura Militar.

A iniciativa da homenagem é de um grupo de trabalho da Comissão da Verdade de Santos, que leva o nome de Esmerado Tarquínio e é presidida pelo vereador Evaldo Stanislau (PT).

No palanque, o filho do ex-prefeito eleito, Esmeraldo Tarquínio Neto, deu detalhes do plano de governo que o pai idealizara para a Cidade. "Ele previa um governo progressista, vanguardista e moderno. Seu programa tinha como metas principais o desenvolvimento econômico e a justiça social".

Para desenvolver Santos economicamente, o ex-prefeito pretendia implantar um Distrito Industrial no Vale do Quilombo, na Área Continental da Cidade.

Segundo Neto, outra meta de seu pai era transformar o Município, já naquele tempo, em um local realmente turístico, com "a implementação de uma estrutura hoteleira e receptiva".

Também tinha a ideia de construir uma cidade cinematográfica, talvez em armazéns do Porto com desuso programado, abrigando os sets de filmagem.

A elaboração de um novo plano diretor era outra meta de Esmeraldo Tarquínio. E, para isso, ele provavelmente contaria com a ajuda do arquiteto e urbanista Jaime Lerner, com quem mantinha conversas na época e que, anos mais tarde, tornar-se-ia governador do estado do Paraná de 1995 a 1999 e de 1999 a 2003.

No fim de seu discurso, Neto propôs aos presentes uma reflexão. "Até onde teríamos chegado se Esmeraldo Tarquínio tivesse assumido a condução da Cidade? Provavelmente teríamos alcançado o patamar do desenvolvimento econômico acelerado, o crescimento ordenado da população, a ocupação racional e planejada de seus espaços e a integração do Porto ao Município". E concluiu: "Ao elegê-lo, Santos deu uma resposta ao arbítrio".


Esmeraldo Tarquínio em 1973, no Bar da Faculdade de Comunicação (Facos), então situado no prédio do Colégio Santista, na Rua Sete de Setembro
Foto: acervo do jornalista José Carlos Silvares