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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SANTOS EM 1587 - BIBLIOTECA NM
1587 - Notícia do Brasil - [II - 109]

Clique na imagem para voltar ao índice desta obraEscrita em 1587 pelo colono Gabriel Soares de Souza, essa obra chegou ao eminente historiador Francisco Adolpho de Varnhagen por cópias que confrontou em 1851, para tentar restabelecer o texto original desaparecido, como cita na introdução de seus estudos e comentários. Em 1974, foi editada com o mesmo nome original, Notícia do Brasil, com extensas notas de importantes pesquisadores. Mais recentemente, o site Domínio Público apresentou uma versão da obra, com algumas falhas de digitalização e reconhecimento ótico de caracteres (OCR).

Por isso, Novo Milênio fez um cotejo daquela versão digital com a de 1974 e com o exemplar cedido em maio de 2010 para digitalização, pela Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá. Este exemplar corresponde à terceira edição (Companhia Editora Nacional, 1938, volume 117 da série 5ª da Brasiliana - Biblioteca Pedagógica Brasileira), com os comentários de Varnhagen. Foi feita ainda alguma atualização ortográfica:

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Tratado descritivo do Brasil em 1587

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Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa

SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS GRANDEZAS DA BAHIA

TÍTULO 13 — Da herpetogratia e dos batráquios e vários outros

Capítulo CIX

Em que se declara a qualidade das cobras, lagartos e outros bichos.

Agora cabe aqui dizermos que cobras são estas do Brasil, de que tanto se fala em Portugal e com razão, porque tantas e tão estranhas, não se sabe onde as haja.

Comecemos logo a dizer das cobras a que os índios chamam jibóia, das quais há muitas de cinqüenta e sessenta palmos de comprido, e daqui para baixo. Estas andam nos rios e lagoas, onde tomam muitos porcos da água, que comem; e dormem em terra, onde tomam muitos porcos, veados e outra muita caça, o que engolem sem mastigar, nem espedaçar; e não há dúvida senão que engolem uma anta inteira, e um índio; o que fazem porque não têm dentes, e entre os queixos lhes moem os ossos para os poderem engolir.

E para matar uma anta ou um índio, ou qualquer caça, cingem-se com ela muito bem, e como têm segura a presa, buscam-lhe o sesso [ânus] com a ponta do rabo, por onde o metem até que matam o que têm abarcado; e como têm morta a caça, moem-na entre os queixos para a poder melhor engolir.

E como têm a anta, ou outra coisa grande que não podem digerir, empanturram de maneira que não podem andar. E como se sentem pesadas lançam-se ao sol como mortas, até que lhes apodrece a barriga, e o que têm nela; do que dá o faro logo a uns pássaros que se chamam urubus, e dão sobre elas comendo-lhes a barriga com o que têm dentro, e tudo o mais, por estar podre; e não lhes deixam senão o espinhaço, que está pegado na cabeça e na ponta do rabo, e é muito duro; e como isto fica limpo da carne toda, vão-se os pássaros; e torna-lhes a crescer a carne nova, até ficar a cobra em sua perfeição; e assim como lhes vai crescendo a carne, começam a bulir com o rabo, e tornam a reviver, ficando como dantes; o que se tem por verdade, por se ter tomado disto muitas informações dos índios e dos línguas que andam por entre eles no sertão, os quais afirmam assim.

E um Jorge Lopes, almoxarife da capitania de S. Vicente, grande língua, e homem de verdade, afirmava que indo para uma aldeia do gentio no sertão, achara uma cobra destas no caminho, que tinha liado três índios para os matar, os quais livrara deste perigo ferindo a cobra com a espada por junto da cabeça e do rabo, com o que ficou sem força para os apertar, e que os largara; e que acabando de matar esta cobra, ele lhe achara dentro quatro porcos, a qual tinha mais de sessenta palmos de comprido; e junto do curral de Garcia de Ávila, na Bahia, andavam duas cobras que lhe matavam e comiam as vacas, o qual afirmou que adiante dele lhe saíra um dia uma, que remeteu a um touro, e que lho levou para dentro de uma lagoa; a que acudiu um grande lebréu [cão-de-fila], ao qual a cobra arremeteu e engoliu logo; e não pôde levar o touro para baixo pelo impedimento que lhe tinha feito o lebréu; o qual touro saiu acima da água depois de afogado; e afirmou que neste mesmo lugar mataram seus vaqueiros outra cobra que tinha noventa e três palmos, e pesava mais de oito arrobas; e eu vi uma pele de uma cobra destas que tinha quatro palmos de largo.

Estas cobras têm as peles cheias de escamas verdes, amarelas e azuis, das quais tiram logo uma arroba de banha da barriga, cuja carne os índios têm em muita estima, e os mamelucos, por acharem-na muito saborosa.