Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 12 — Dos
mamíferos terrestres e anfíbios
Capítulo
XCV
Em que se trata de uma alimária que se chama
jaguaretê.
Têm para si os portugueses que jaguaretê é onça, e outros dizem que é tigre; cuja grandura é como um bezerro de seis meses; falo dos
machos, porque as fêmeas são maiores. A maior parte destas alimárias são ruivas, cheias de pintas pretas; e algumas fêmeas são todas pretas; e todos
têm o cabelo nédio, e o rosto a modo de cão e as mãos e unhas muito grandes, o rabo comprido; e o cabelo nele como nas ancas.
Têm presas nos dentes como lebréu, os olhos como gato, que lhe luzem de noite tanto que se conhecem por isso a meia légua; têm os braços e pernas
muito grossos; parem as fêmeas uma e duas crianças; se lhes matam algum filho andam tão bravas que dão nas roças dos índios, onde matam todos
quantos podem alcançar; comem a caça que matam, para o que são mui ligeiras, e tanto que lhes não escapa nenhuma alimária grande por pés; e saltam
por cima a pique altura de dez, doze palmos; e trepam pelas árvores após os índios, quando o tronco é grosso; salteiam o gentio de noite pelos
caminhos, onde os matam e comem; e quando andam esfaimadas entram-lhes nas casas das roças, se lhes não sentem fogo, ao que têm grande medo.
E na vizinhança das povoações dos portugueses fazem muito dano nas vacas, e como se começam a encarniçar nelas destroem um curral; e têm tanta
força que com uma unhada que dão numa vaca lhe derrubam a anca no chão.
Armam os índios a estas alimárias em mundéus, que são uma tapagem de pau-a-pique, muito alta e forte, com uma só porta; onde lhes armam com uma
árvore alta e grande levantada do chão, onde lhes põem um cachorro ou outra alimária presa; e indo para a tomar cai esta árvore que está deitada
sobre esta alimária, onde dá grandes bramidos; ao que os índios acodem e a matam às flechadas; e comem-lhe a carne, que é muito dura e não tem
nenhum sebo. |