Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
SEGUNDA PARTE - MEMORIAL E DECLARAÇÃO DAS
GRANDEZAS DA BAHIA
TÍTULO 8 — Das
árvores reais e paus de lei
Capítulo
LXVI
Em que se acaba de concluir a informação das árvores
reais que se criam na Bahia.
Maçaranduba é outra árvore real, de cujo fruto já fica dito atrás; são naturais estas árvores da vizinhança do mar; e acham-se muitas de
trinta a quarenta palmos de roda, de que se fazem gangorras, mesas, eixos, fusos, virgem, esteios e outras obras dos engenhos, cuja madeira é de cor
de carne de presunto, e tão dura de lavrar que não há ferramenta que lhe espere, e tão pesada que se vai ao fundo. Estas árvores são tão compridas e
direitas que se aproveitam do grosso delas de cem palmos para cima, e nunca se corrompem.
Há outra árvore real que se chama jataí-mondé, que não é tamanha como as de cima, mas de honesta grandura, de que se fazem eixos, fusos,
virgens, esteios e outras obras dos engenhos, cuja madeira é amarela, de cor formosa, muito rija e doce de lavrar e incorruptível; e é tão pesada
que vai ao fundo; e não se dá em ruim terra.
Nas várzeas de areia se dão outras árvores reais, a que os índios chamam curuá, as quais se parecem na feição, na folha, na cor da madeira,
com carvalhos; e acham-se alguns de vinte e cinco a trinta palmos de roda, de que se fazem gangorras, mesas, eixos, virgens, esteios e outras obras
miúdas; mas não é muito fixo ao longo da terra; a qual também serve para liames de navios e barcos e para tabuado; e de pesado se vai ao fundo.
Há outras árvores reais, a que os portugueses chamam angelina, e os índios andurababapari, as quais são muito grandes e acham-se muitas de
mais de vinte palmos de roda, de que fazem gangorras, mesas, eixos, virgens, esteios e outras obras dos engenhos e das casas de vivenda, e boas
caixas por ser madeira leve e boa de lavrar, e honesta cor.
Jequitibá é outra árvore real, façanhosa na grossura e comprimento, de que se fazem gangorras, mesas dos engenhos e outras obras, e muito
tabuado; e já se cortou árvore destas tão comprida e grossa, que deu no comprimento e grossura duas gangorras, que cada uma pelo menos há de ter
cinqüenta palmos de comprido, quatro de assento e cinco de alto. Esta madeira tem a cor brancacenta, é leve e pouco durável, onde lhe chove; não se
dão estas árvores em ruim terra.
Ubiraém é outra árvore real de que se acham muitas de vinte palmos de roda para cima, de que se fazem gangorras, mesas, virgens, esteios
dos engenhos e tabuado para navios, e outras obras, cuja cor é amarelaça; não muito pesada, e boa de lavrar.
Pelas campinas e terra fraca se criam muitas árvores, que se chamam sepepiras
[sucupira], que em certo tempo se enchem de flor como de pessegueiro; não são árvores muito façanhosas na grandura, por serem desordenadas nos troncos, mas
tiram-se delas virgens, esteios e fusos para os engenhos; a madeira é parda e muito rija, e tão liada que nunca fende; e para liação
[liame] de navios e barcos é a melhor que há no mundo, que sofre melhor o prego e nunca apodrece; de que se também fazem carros muito bons; e é tão
pesada esta madeira que se vai ao fundo.
Putumuju é uma árvore real, e não se dá senão em terra muito boa; não são árvores muito grandes, mas dão três palmos de testa. Esta é das
mais fixas madeiras que há no Brasil, porque nunca se corrompe, da qual se fazem eixos, virgens, fusos, esteios para os engenhos, e toda a obra de
casas e de primor; a cor desta madeira é amarela com umas veias vermelhas; é pesada e dura, mas muito doce de lavrar.
Há outras árvores, que se chamam urucuranas, que são muito compridas e de grossura, que fazem delas virgens e esteios para os engenhos, e
outras muitas obras de casas, e tabuado para navios, a quem o gusano não faz mal; a qual madeira é pesada, e vai-se ao fundo; tem a cor de carne de
fumo, e é boa de lavrar e serrar. |