Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
PRIMEIRA PARTE - ROTEIRO GERAL DA COSTA BRASÍLICA
Capítulo XXVI
Em que se declara a terra e costa de Tatuapara até o Rio
de Joanne.
De Tatuapara ao Rio Jacuípe são quatro léguas, as quais ao longo do mar estão ocupadas com currais de gado, por serem de terra baixa e fraca; os
quais currais são de Garcia d'Ávila e de outras pessoas chegadas à sua casa. De Tatuapara até este rio não há onde possa entrar um barco, senão
neste Rio de Jacuípe e aqui com bonanças ainda com trabalho; mas, atrás uma légua, onde se chama o Porto de Brás Afonso, onde os arrecifes que vêm
de Tatuapara fazem uma aberta, podem entrar caravelões, e do arrecife para dentro ficam seguros com todo tempo.
Este Rio de Jacuípe se passa de baixamar acima da barra uma légua a vau, ao longo do qual tem o mesmo Garcia d'Ávila um curral de vacas. Deste Rio
de Jacuípe até o Rio de Joanne são cinco léguas, até onde são tudo arrecifes, sem haver onde possa entrar um barco, senão onde chamam o Porto de
Arambepe, onde os arrecifes fazem outra aberta, por onde com bonança podem entrar barcos, e ficarem dentro dos arrecifes seguros.
De Jacuípe a Arambepe são duas léguas, onde se perdeu a nau Santa Clara, que ia para a Índia, estando sobre amarra, e foi tanto o tempo que
sobreveio, que a fez ir à cácea, que foi forçado cortarem-lhe o mastro grande, o que não bastou para se remediar, e os oficiais da nau, desconfiados
da salvação, sendo meia-noite, deram à vela do traquete para ancorarem em terra e salvarem as vidas, o que lhe sucedeu pelo contrário; porque sendo
esta costa toda limpa, afastada dos arrecifes, foram varar por cima de uma laje, não se sabendo outra de Pernambuco até a Bahia, a qual laje está um
tiro de falcão ao mar dos arrecifes, onde se esta nau fez em pedaços, e morreram neste naufrágio passante de trezentos homens, com Luís de Alter de
Andrade, que ia por capitão.
Toda esta terra até o Rio de Joanne, três léguas do mar para o sertão, está povoada de currais de vacas de pessoas diversas; e nesta comarca, três
léguas do mar, têm os padres da companhia duas aldeias de índios forros tupinambás e de outras nações, nas quais terão setecentos homens de peleja
pelo menos; os quais os padres doutrinam, como fica dito, da aldeia de Santo Antônio. Essas outras se dizem, uma de Santo Espírito e a outra de São
João, onde têm grandes igrejas da mesma advocação e recolhimento para os padres, que nelas residem e para outros que muitas vezes se vão lá recrear.
E à sombra e circuito destas aldeias têm quatro ou cinco currais de vacas ou mais, que granjeiam, de que se ajudam a sustentar.
Por onde estas aldeias estão é a terra boa, onde se dão todos os mantimentos da terra muito bem, por ser muito fresca, com muitas ribeiras de
água; neste limite lança o mar fora todos os anos muito âmbar pelo inverno, que estes índios vão buscar, o qual dão aos padres. E corre-se esta
costa de Tatuapara até este Rio de Joanne Norte-Nordeste
Sul-Sudoeste. |