Trecho do capítulo, na edição de 1938 da Biblioteca Pública Alberto Sousa
PRIMEIRA PARTE - ROTEIRO GERAL DA COSTA BRASÍLICA
Capítulo I
Em que se declara quem foram os primeiros descobridores
da província do Brasil, e como está arrumada.
A província do Brasil está situada além da linha equinocial da parte do Sul, debaixo da qual começa ela a correr junto do rio que se diz das
Amazonas, onde se principia o Norte da linha de demarcação e repartição; e vai correndo esta linha pelo sertão desta província até 45 graus, pouco
mais ou menos.
Esta terra se descobriu aos 25 dias do mês de abril de 1500 anos por Pedro Álvares Cabral, que neste tempo ia por capitão-mor para a Índia por
mandado de el-rei d. Manuel, em cujo nome tomou posse desta província, onde agora é a capitania de Porto Seguro, no lugar onde já esteve a vila de
Santa Cruz, que assim se chamou por se aqui arvorar uma muito grande, por mando de Pedro Álvares Cabral, ao pé da qual mandou dizer, em seu dia, a 3
de maio, uma solene missa, com muita festa, pelo qual respeito se chama a vila do mesmo nome, e a província muitos anos foi nomeada por de Santa
Cruz e de muitos Nova Lusitânia; e para solenidade desta posse plantou este capitão no mesmo lugar um padrão com as armas de Portugal, dos que
trazia para o descobrimento da Índia, para onde levava sua derrota.
A estas partes foi depois mandado por Sua Alteza Gonçalo Coelho com três caravelas de armada, para que descobrisse esta costa, com as quais andou
por elas muitos meses buscando-lhe os portos e rios, em muitos dos quais entrou e assentou marcos dos que para este descobrimento levava, no que
passou grandes trabalhos pela pouca experiência e informação que se até então tinha de como a costa corria, e do curso dos ventos com que se
navegava.
E recolhendo-se Gonçalo Coelho com perda de dois navios, com as informações que pôde alcançar, as veio dar a el-rei d. João, o III, que já neste
tempo reinava, o qual logo ordenou outra armada de caravelas que mandou a estas conquistas, a qual entregou a Cristóvão Jacques, fidalgo da sua casa
que nela foi por capitão-mor, o qual foi continuando no descobrimento desta costa e trabalhou um bom pedaço sobre aclarar a navegação dela, e
plantou em muitas partes padrões que para isso levava.
Contestando com a obrigação do seu regimento, e andando correndo a costa, foi dar com a boca da Bahia, a que pôs o nome de Todos os Santos, pela
qual entrou dentro, e andou especulando por ela todos os seus recôncavos, em um dos quais, a que chamam o Rio do Paraguaçu, achou duas naus
francesas que estavam ancoradas resgatando com o gentio, com as quais se pôs às bombardas, e as meteu no fundo, com o que se satisfez, e se recolheu
para o Reino, onde deu suas informações a Sua Alteza, que, com elas, e com as primeiras e outras que lhe tinha dado Pedro Lopes de Sousa, que por
esta costa também tinha andado com outra armada, ordenou de fazer povoar essa província, e repartir a terra dela por capitães e pessoas que se
ofereceram a meter nisso todo o cabedal de suas fazendas, do que faremos particular menção em seu lugar. |