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OBSTÁCULO
Pedra do Teffé começa a ser retirada em 3 meses
A remoção permitirá atracação de navios de maior calado
Da Reportagem
A próxima temporada de verão contará ainda com uma pedra
no caminho dos navios de passageiros que chegarão à Cidade. Batizada de Pedra do Teffé, ela está, entretanto, com seus dias contados. Os trabalhos
preparatórios começarão em três meses. A pedra deverá permanecer no canal do porto, na região do cais dos armazéns 25 e 26, até junho de 1999,
quando provavelmente estará retirada. O processo que envolve medição, batimetria e implosão custará R$ 5 milhões.
A iniciativa privada é a responsável pelo trabalho. A Multicargo, que arrendou os
silos da Codesp - localizados naquele trecho do porto - deverá começar a implodir a pedra em até 90 dias, no início de dezembro. A empresa iniciou
contatos com três firmas especializadas em implosão. "Vão ser feitas batimetrias sísmica e geotécnica", adiantou Virgílio Gonçalves Pina Filho,
presidente da Multicargo.
Segundo ele, as implosões devem ocorrer na região central do estuário, onde estão
localizados dois picos da pedra. Neste trecho, o canal oferece calados distintos, de 9,80 metros e de 10,30 metros de profundidade. O problema
também pode ser observado na região próxima ao cais do Armazém 25, onde o calado ainda é menor, variando de sete a oito metros, ao longo de 100
metros.
"Ao invés de demolir a pedra na parte perto do cais, vamos avançar com o cais para
cima dela", disse Pina. "A retirada do obstáculo segue um plano de gerenciamento ambiental". Para iniciar os trabalhos, a Multicargo deverá receber
a aprovação da Codesp e de órgãos ligados à proteção do meio-ambiente.
Maior calado - A retirada do obstáculo também permitirá que transatlânticos de
maior calado possam atracar no cais do Armazém Frigorífico, que fica ao lado do cais do Armazém 25 e integra parte do Terminal Turístico de
Passageiros do Porto.
Na próxima temporada, praticamente só um transatlântico do calado do Funchal
poderá encostar no cais do Armazém Frigorífico ou no cais do Armazém 25, onde o Consórcio Concais instalará a estação de atracação de navios de
passageiros, que pretende inaugurar em 1º de dezembro.
Ainda que inaugurada a estação de passageiros no Armazém 25, um navio como o
Rembrandt, por exemplo, não poderá atracar. Terá de esperar a remoção da Pedra do Teffé e as obras complementares posteriores para encostar
naquele trecho do porto.
Há 122 anos, a pedra era um obstáculo muito maior do que hoje, a ponto de dificultar a
navegação do estuário, como conta o pesquisador J. Muniz Júnior.
A empresa Multicargo, que arrendou os silos da
Codesp,
vai se encarregar dos trabalhos de demolição
Foto: Carlos Nogueira - 16/7/1997, publicada com a matéria
Laje dificultava acesso ao porto
J. Muniz Júnior (*)
Colaborador
Em tempos idos, os navios veleiros que adentravam pelo
canal da barra demoravam para chegar ao porto, uma vez que dependiam de ventos favoráveis ou tinham que ser rebocados dos escaleres impulsionados a
remo, cujo percurso era entrecortado por pequenas enseadas dotadas de perigosos bancos de areia ou lajes submersas, que provocavam grossas avarias
nas embarcações.
O primitivo atracadouro ficava entre as imediações do Outeiro de
Santa Catarina e Valongo, sendo que muitos capitães tiveram seus barcos perfurados pelos temíveis obstáculos naturais
do estuário, que infundiam temor entre a marujada.
Assim é que, no sítio dos Outeirinhos, de propriedade de José
Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca, havia um penhasco ou recife que se estendia até o mar, onde sobressaíam picos à flor da água (com a
maré rasa), prejudicando assim o tráfego normal das embarcações, cujas companhias reclamavam, pedindo a demolição urgente daquele empecilho
intransponível.
O caso parecia irremediável e, uma vez pressionada pelos comerciantes que dependiam
das mercadorias trazidas pelos barcos que transitavam pelo porto, coube à Associação Comercial de Santos recorrer ao setor
de Hidrografia do Império, que resultou na chegada, no decorrer de 1876, do navio Lamêgo, sob o comando do capitão-de-fragata Antônio Luiz
Von Hoonholtz, diretor da repartição hidrográfica, com o objetivo de remover a ameaçadora e inabalável laje submarina.
Após efetuar um levantamento da área portuária, o oficial da Marinha conseguiu
destruir parte do embaraçoso obstáculo, isso depois de 156 dias de exaustivo trabalho. Segundo relatório da época, a rocha foi perfurada através de
várias rodadas, de acordo com a sua elevação, com brocas maiores de um metro de profundidade, quando foram implantadas 98 minas em tubos
especializados, carregados com pólvora granulada de artilharia raiada, explodindo pelo sistema elétrico.
Com as explosões, um amontoado de pedrouços foi deslocado para o fundo do estuário,
tendo sido alçadas 339 lingadas com lajedos e blocos rochosos, além de 244 caixões de fragmentos, num total de 750 toneladas de matérias sólidas. É
válido ressaltar que, naquele serviço, foi empregado, pela primeira vez, um sino hidráulico, acoplado ao casco de um iate.
No final daquele memorável ano, a Associação Comercial de Santos oficiou ao comandante
Von Hoonholtz, elogiando-o pelo notável trabalho e agradecendo, em nome da Cidade, cujo porto ficou livre daquela perigosa laje submersa, que tantos
danos vinha causando à navegação.
Convém lembrar que o ilustre oficial da Marinha Imperial brasileira destacou-se,
através de longa carreira, como marinheiro, astrônomo, hidrógrafo, cientista, polemista, geógrafo, historiador, diplomata e escritor. Foi o criador
do Serviço de Hidrografia do Ministério da Marinha, além de organizador, na Marinha, dos serviços de meteorologia no Brasil. E, além de alcançar o
posto de almirante, foi agraciado pelo Governo Imperial com o título nobiliárquico de Barão de Teffé.
Desde então, ao longo dos anos, foram removidos obstáculos que prejudicavam seriamente
o acesso ao porto, cujas muralhas de pedra foram assentadas a partir de 1888. Tanto é que, ainda em 1903, a
Companhia Docas de Santos (CDS) executou o arrasamento total daquele mesmo trecho, utilizando, igualmente, um sino hidráulico. E, na descida do
aparelho ao fundo do mar, os tripulantes do mesmo, engenheiros da CDS, Guilherme Weinschenck, Ulrico Mursa, Victor de Lamare e Gama Lobo, brindaram
o acontecimento com taças de champanhe, completamente submersos.
Quanto ao local onde existiu o Outeirinho, com suas rochas
pontiagudas junto ao mar, ficava nas imediações do atual Armazém 25, onde está sendo instalado o novo Terminal de Passageiros.
(*) J. Muniz Jr. é jornalista, pesquisador de
História, escritor e Amigo da Marinha (turma/1983) |