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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - DESLIZamentos... (5)
Final de março de 1956: mais calamidade - B

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Terreno sedimentar, com fina capa de solo, quando enfrenta chuva forte e não tem mais cobertura vegetal que fixe o solo... o resultado é um deslizamento de terras, e quem estiver no caminho sofre as conseqüências. Nos morros santistas, ocorreram vários deslizamentos célebres, como o que soterrou um grupo de piratas holandeses (caso excepcionalmente atribuído a um milagre da santa padroeira da Cidade), ainda no século XVII. Outros casos destacados aconteceram em 1928, 1956 e na década de 1980, motivando enfim a realização de um amplo trabalho de contenção das encostas e monitoramento da situação geomórfica nos morros santistas.

Em uma terça-feira (o jornal na época não circulava às segundas-feiras), 27 de março de 1956, o jornal santista A Tribuna voltava a registrar, em várias páginas - ortografia atualizada nesta transcrição:


MARAPÉ, O BAIRRO SACRIFICADO - As fotos evidenciam a extensão do sinistro ocorrido no bairro do Marapé, lá no final da Rua Carvalho de Mendonça. Outras habitações foram destruídas, outras vidas inocentes imoladas pela mão da fatalidade
Fotos e legenda publicadas com a matéria

Santos abatida por outra imensa tragédia

Desmoronamentos parciais nos morros do Embaré, Santa Terezinha, S. Bento, Penha, Pacheco, Fontana e Monte Serrate ocasionaram mais de uma centena de vítimas, entre mortos e feridos, além de graves prejuízos materiais - A cidade ficou sem luz, força e transporte - Inundadas todas as ruas - Cenas confrangedoras - Luto oficial - Impressionantes manifestações de solidariedade - Balanço ainda não encerrado da tragédia: 37 mortos e 102 feridos

(Reportagem de Olao Rodrigues, Saulo Ramos e Luiz Soares e fotografias de Evaristo Pereira de Carvalho e J. Herrera)

Nova e imensa tragédia se abateu sobre Santos. Em menos de um mês, a cidade acolhedora e generosa experimentou dois golpes da fatalidade, tremendos e pungentes, pela dizimação de centenas e centenas de vidas.

Maior a tragédia atual, pela extensão material e física. Episódio brutalíssimo, permanecerá vívido no espírito do nosso povo, pelos lances dolorosos que o assinalaram, marcando pelo luto e pela desolação um hiato na tranqüilidade social desta terra, que é uma forja gigantesca de trabalho pelo bem comum e celeiro das mais honrosas tradições de civismo, cultura e benemerência.

Que outros golpes não se sucedam, tão grave e impressionantes foram as conseqüências dos dramas, quase gêmeos, que suportamos neste mês de março, também marcado, há 28 anos, por uma hecatombe que confrangeu todos os lares santistas e emocionou todos os lares brasileiros, pelo cortejo de sangue, dor e luto a que se seguiu.

Santos reviveu horas de amargura e compunção. O dilúvio - vai bem o termo - da noite de sábado e madrugada de domingo teve o efeito de calamidade pública. A cidade se transformou em mar imenso, que inundou todas as ruas, projetando-se as camadas de água por domicílios a dentro, havendo interrupção da energia elétrica e a desarticulação do serviço de transporte coletivo. Mas a tragédia, a grande tragédia, foi abater-se sobre lares humildes encravados na encosta dos morros, derruídos por avalanches de terra e pedra e, desgraçadamente, imolando tantas e tantas criaturas inocentes.

Choveu durante 16 horas - Jamais Santos foi atingida por chuvas violentas e insistentes como neste mês de março. No primeiro dia, por efeito do temporal, sobreveio a catástrofe do Morro de Santa Terezinha. Persistiu a intempérie. No penúltimo domingo, às últimas horas da tarde, choveu torrencialmente, as ruas ficaram inundadas, houve transbordamento dos canais, interrompeu-se a energia elétrica, ficou a população sem transporte, mas não ocorreram danos pessoais.

Gravíssimas, infelizmente, as conseqüências das chuvas de sábado. Eclodindo às 20,30 horas, intensificou-se pouco antes de 22 horas e, ininterruptamente, persistiu até as 12 horas de domingo. Coincidindo com o preamar, o que evitou que as águas dos canais se escoassem para o Estuário, verificou-se a inundação total da cidade, chegando a acumulação de águas a atingir a um metro da superfície do solo, nos trechos mais baixos do município. Grande número de habitações foi invadida pelas camadas líquidas, ocorrendo sérios prejuízos materiais.

Não nos lembramos, pelo menos nos últimos tempos, de tão volumosa carga de águas pluviais nas ruas de Santos, pois as galerias, ainda que funcionassem corretamente, o que de há muito não se verifica, não teriam capacidade para escoamento regular.

Santos está precariamente provida de rede coletora de águas pluviais, razão do desnível que se verifica a qualquer intensidade de chuvas.

Santos às escuras e sem transportes - O temporal trouxe outras conseqüências, além da inundação de todas as vias públicas, sobretudo na orla marítima, onde as águas chegaram a atingir o ajardinamento. Não demorou e a cidade ficou em trevas. E, com a interrupção da energia elétrica, os bondes não mais trafegaram. Permaneceram onde se encontravam, abandonados pelos passageiros e pelos próprios motorneiros e condutores. Um elétrico da linha 37 ficou imobilizado na Avenida Pinheiro Machado desde as 22 horas de sábado até as primeiras horas da tarde de ontem. E, como esse, outros.

Os ônibus, em face da infiltração das águas, também não puderam trafegar, ficando, pois, a cidade completamente desprovida de transporte coletivo. Nem mesmo os automóveis de aluguel circularam. Os motoristas de Santos que, a qualquer chuvinha, se recusam a servir aos passageiros e os que se dispõem a servir costumam cobrar preços exagerados, tiveram motivo, dessa feita, para cruzar os braços.


INUNDADA A VILA MATIAS, A CIDADE FICOU SEM LUZ E SEM TRANSPORTE - O Monte Serrate foi o morro que sofreu, nesse último temporal, maior número de desabamentos (3). Na Vila Mathias atingiu os fundos do prédio onde se encontram instalados os geradores da Companhia City. Ainda na encosta, diversas grandes pedras deslocadas ameaçam ruir. A cidade ficou sem energia elétrica, porque diversos setores tiveram de ser desligados, principalmente nos locais onde as avalanchas atingiram os fios de alta tensão. A casa de máquinas da Companhia City foi inundada e os fios de transmissão de alta voltagem tiveram de ser desligados. Somente ontem pôde ser feito o escoamento e a secagem das ligações. Entretanto, a encosta continua ameaçando as instalações da companhia. A parte que está mais ameaçada, pelas pedras deslocadas e que ainda se encontram ao longo de toda a escarpa do Monte Serrate, naquela altura, é justamente o gerador central. Se vier a ser atingido, provocará, por muito tempo, a paralisação quase total de Santos. Ontem mesmo a City iniciou os serviços de proteção à sua unidade central. Está depositando entre o morro e o gerador uma enorme quantidade de pedra britada, a fim de amortecer os blocos que possivelmente poderão rolar da encosta. Após essa providência, construirá, ainda, um forte muro de arrimo e, com auxílio de elevadores, removerá as pedras suspensas na escarpa
Fotos e legenda publicadas com a matéria




Detalhamento do painel fotográfico acima

Suspensas as aulas, nas escolas municipais e estaduais, até o dia 2

Não haverá aulas, durante toda esta semana, nas escolas primárias municipais e estaduais, de acordo com os comunicados enviados à redação de A Tribuna

Delegacia Regional do Ensino

Suspensão de aulas - Considerando a proximidade dos feriados da Semana Santa e a circunstância de ainda não estar inteiramente normalizada a situação, deliberou-se que as aulas das escolas primárias estaduais de Santos, São Vicente, Cubatão e Guarujá só se reabram na próxima segunda-feira, dia 2 de abril.

Os diretores e o pessoal administrativo desses estabelecimentos devem, todavia, continuar em exercício, nos dias 27 e 28, para qualquer eventualidade.

Quanto às escolas primárias particulares, renova a Delegacia o conselho de que também mantenham as aulas suspensas durante esse período.

Departamento da Educação da Prefeitura

Por determinação do prefeito municipal, o Departamento de Educação da Prefeitura determinou a suspensão das aulas nos grupos escolares municipais e parques infantis, até o dia 2 de abril próximo.


Imagem: reprodução parcial da matéria original

Urgência para o projeto que concede auxílio aos desabrigados de Santos

Requerimento apresentado ontem à Assembléia Legislativa pelo sr. Athié Jorge Coury - Diversos oradores aludiram aos últimos desmoronamentos nos morros

São Paulo, 26 (Asapress) - Na sessão de hoje da Assembléia Legislativa, o sr. Cid Franco criticou a voluntária falta de número no Palácio 9 de Julho, o que impede a votação de matérias constantes da Ordem do Dia, entre as quais vetos apostos pelo governador a diversos projetos de lei e que têm prazo fatal para serem votados, sob pena de serem considerados aceitos pelo decurso do prazo. Disse o orador que os deputados que assim procedem, beneficiando o Poder Executivo com a sua retirada ou ausência, fazem o Legislativo curvar-se num silêncio subserviente perante a vontade de outro poder.

Finalizou declarando que esse é um estratagema que desrespeita o princípio constitucional da harmonia e independência dos poderes e vem provocar o desprestígio da Assembléia, pois a verdade é que mal se disfarça um atentado contra o livre exercício do poder legislativo.

O sr. Farabuline Júnior fez um apelo à Câmara Municipal para que aprove o projeto de lei que ali se encontra e que dispõe sobre a majoração de tarifas do gás, a fim de possibilitar à companhia de gás conceder aumento de salário a seus empregados. Declarou o orador que esses trabalhadores vão realizar uma assembléia geral na próxima segunda-feira, para debate do problema que lhes interessa tão de perto, e daí a conveniência da edilidade apreciar a propositura a que se referiu. Lembrou que há tempos os mesmos trabalhadores entraram em greve devido à demora em serem atendidas suas reivindicações, com graves prejuízos para a população.

Depois de longos debates, aprovou a Assembléia Legislativa, em sua sessão de hoje, requerimento apresentado pelo sr. Guilherme Gomes e outros "propondo a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito para apurar as causas e responsabilidades das catástrofes que abalaram a cidade de Santos, roubando a vida de numerosas pessoas, principalmente crianças".

Encaminhado à votação, falaram os srs. Wlson Bahal, Francisco Nogueira Sampaio, Abreu Sodré, Homero Silva, Luciano Nogueira Filho e Alfredo Faraht.

Verba para os desabrigados de Santos - Sobre a nova tragédia ocorrida em Santos, que veio enlutar numerosos lares, falaram vários deputados. O primeiro a tratar do assunto foi o sr. Athié Jorge Coury, que pediu a suspensão dos trabalhos em homenagem à memória das vítimas do desmoronamento de terras, requerimento que posteriormente retirou, a fim de possibilitar a votação do projeto de sua autoria que dispõe sobre a concessão de auxílio de 10 milhões de cruzeiros para a construção de casas para os trabalhadores que perderam seus bens nas duas catástrofes. Para esse projeto o orador pediu urgência para sua discussão e votação.

O sr. Carlos Kherlakian também pediu urgência para a discussão de outro projeto, de que é autor, dispondo sobre a concessão de auxílio de 2 milhões à Prefeitura de Santos, para reparação dos prejuízos causados aos trabalhadores que perderam suas casas nos desmoronamentos.

O sr. Franco Montoro, por sua vez, declarou que pretende apresentar à Mesa um requerimento propondo a constituição de uma comissão de deputados para apurar as causas dos desabamentos de morros na vizinha cidade praiana. Os srs. Homero Silva e Ralph Zumbano fizeram apelos às autoridades competentes para que tomem providências concretas visando evitar a repetição de fatos como os ocorridos e que tantas desgraças provocaram.

Também falaram sobre o assunto os srs. Rocha Mendes Filho e Pinheiro Júnior, que lamentaram o sucedido e disseram da conveniência de serem votados com urgência os projetos dos srs. Athié Jorge Coury e Carlos Kherlakian.

Comissão Parlamentar de Inquérito - Posteriormente, o sr. Cantídio Sampaio apresentou à Mesa um requerimento com 26 assinaturas pedindo a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito destinada a apurar as causas do segundo desabamento de morros ocorrido em Santos e sugeriu medidas de segurança tendentes a evitar novos desastres e verificar se as autoridades responsáveis tomaram as providências que se impunham para impedir a repetição dos desastres e do sacrifício de vidas que deles resultou.

Falando sobre o aumento do custo dos gêneros de primeira necessidade, que continuam em ascensão permanente, o sr. Pinheiro Júnior disse da necessidade de os governos tomarem providências, pois do contrário poderemos ter dias tumultuosos que poderão trazer conseqüências imprevisíveis com ameaça ao próprio regime e à estabilidade de nossas instituições.

Declarou o orador que o povo é vilmente explorado nas feiras-livres e nos mercados e compreendendo a situação criada para os consumidores o governador já estuda a possibilidade de serem majorados os vencimentos dos componentes da Guarda Civil e da Força Pública, acrescentando que espera que em breve o sr. Jânio Quadros resolva que não são apenas esses os servidores públicos que necessitam de melhores vencimentos, mas os demais funcionários.

Mais adiante declarou o sr. Pinheiro Júnior que as entidades de classe que congregam os servidores do Estado, compreendendo essa situação, estão em assembléia permanente para debate do assunto, por entenderem que a majoração de vencimentos é uma medida imperiosa e inadiável.

Respondendo à questão de ordem levantada pelo sr. Cid Franco em sessão anterior, o presidente Rui de Almeida Barbosa declarou que a Mesa não pôde representar ao Ministério Público no sentido de ser movida ação penal contra diretores do Banco do Estado que fizeram ameaça ao deputado Figueiredo Ferraz, por lhe faltar qualidade jurídica para esse fim. Entretanto, está inteiramente à disposição daquele parlamentar se ele mover ação contra aqueles banqueiros.

Ocupando a tribuna a seguir, o sr. Carlos Kherlakian combateu o veto governamental ao projeto que eleva para 30 dias anuais o período de férias dos componentes da Guarda Civil.

O sr. Pinheiro Júnior incluiu, no projeto que concede gratificação por risco de vida e de saúde, os trabalhadores do Departamento de Água e Esgotos e que fazem limpeza de esgotos.

Foi aprovado em regime de urgência requerimento do sr. Pinheiro Júnior para que não haja trabalho no Palácio 9 de Julho quinta-feira Santa e Sexta-feira da Paixão.

Veto aprovado - Não foi votado por falta de número, constatado em verificação de votação, o veto total aposto pelo governador ao projeto de lei aumentando por 30 dias o período de férias dos componentes da Guarda Civil. Em votação simbólica, o veto foi mantido.

Devido à falta de número, os demais itens da Pauta, inclusive um outro que, como aquele, termina o prazo para sua apreciação amanhã, não puderam ser votados.

A seguir, foram encerrados os trabalhos.

Urgência para o auxílio estadual - S. PAULO, 26 (Da Sucursal) - É o seguinte o requerimento do sr. Athié Jorge Coury, sobre o auxílio às vítimas de Santos:

"Senhor Presidente:

"Requeiro à Mesa, na forma regimental, ouvido o plenário, seja solicitado às Colendas Comissões desta Assembléia, dar caráter de urgência ao projeto de lei n. .... de 1956, que autoriza o Governo do Estado a conceder uma verba de Cr$ 10.000.000,00 para cooperar com a construção de casas do tipo popular às vítimas das catástrofes do Morro de Santa Terezinha ocorridas em 1º de março e ontem na cidade de Santos, tendo em vista que o número de vítimas desalojadas atinge a um número mais ou menos de um milheiro de famílias que perderam seus bens, além de sofrerem ferimentos graves em conseqüências daqueles desmoronamentos.

"Esta medida será também uma colaboração da Assembléia Legislativa, tendo em vista a calamidade pública ocasionada pelas hecatombes ocorridas neste mês de março, com reais danos à população em geral".


Recomendações à população

Medidas preventivas pelo bem da saúde pública recomendadas pela Secretaria da Saúde de São Paulo

O secretário da Saúde, dr. Marcílio Cunha Fonseca, esteve em Santos, com uma grande equipe de auxiliares, a fim de tomar as providências necessárias à proteção da saúde pública, diante do perigoso estado sanitário a que a cidade foi atirada pelas inundações.

Além das medidas de limpeza, vacinação e profilaxia, já tomadas pelo Estado, o secretário da Saúde pede a colaboração do povo, fazendo-lhe as seguintes recomendações:

- Não comer verduras cruas
- Utilizar-se apenas de água fervida
- Combate sem trégua às moscas
- Remoção de todos os detritos
- Não tomar banho de mar

Comunicado da Delegacia de Saúde - "A Delegacia de Saúde de Santos, tendo em vista o desmoronamento verificado em alguns morros adjacentes à cidade, e o transbordamento dos canais de saneamento, e tendo em mira prevenir o eventual aparecimento de infecções do aparelho gastro-intestinal (tifo, desinterias), aconselha a população culta desta cidade, e das localidades vizinhas, principalmente aqueles em cujas habitações forem precárias as instalações sanitárias (falta de esgoto), procurar as unidades sanitárias, abaixo relacionadas, que estão providas de vacinas e medicamentos quimioterápicos destinados à prevenção das referidas doenças: - Sub-Centro de Saúde do Saboó, Avenida Nossa Senhora de Fátima, 177; Centro de Saúde de Santos; Centro de Saúde de São Vicente; Centro de Saúde do Guarujá e Sub-Centro de Saúde de Vicente de Carvalho. - (a) dr. Benedito de Castro Simões, delegado de Saúde".

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