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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - Clubes
Dois clubes masculinos

Em comum, a ausência do elemento feminino. A matéria sobre estes dois curiosos clubes santistas foi publicada em 6 de julho de 1991 no caderno AT Especial do jornal A Tribuna:

Clubes do Bolinha ainda têm vez. Em Santos funcionam pelo menos dois clubes com regularidade e descontração

Nestes clubes, meninas não entram

Ivani Maria Cardoso

Sem gosto de pecado, é normal grupos de homens se reunirem para conversar, comer ou praticar esportes. Pequenos prazeres para ajudar a descontrair depois de um dia de trabalho, nem que seja pelo menos uma vez por semana, a cada quinze dias ou uma vez por mês.

Se para eles é comum, para as mulheres é mais difícil. Principalmente porque tentam a cada instante conciliar a vida profissional com a vida familiar e fica sempre a sensação que estão devendo com os filhos, com a casa ou com o marido. Assim, do trabalho direto para a casa é a norma.

Os homens são mais tranqüilos e não sentem remorso em dedicar algumas horas aos amigos, como mostram os componentes de dois clubes masculinos que há anos funcionam em Santos: o Clube dos Inconvenientes e o 2ª Feira Futebol e Comida. De comum entre eles, uma regra que não deve ser desobedecida, sob pena de expulsão: as reuniões não podem servir como desculpa para escapadas irregulares.

Segunda-feira é um dia sagrado para os 20 integrantes do clube 2ª Feira Futebol e Comida, que há seis anos se reúnem para jogar futebol e jantar, em clima de muita tranqüilidade. Alguns palavrões durante o jogo também fazem parte da festa, afinal ninguém é de ferro.

São empresários, executivos e outros profissionais que resolveram tirar um dia por semana para aliviar as tensões do dia-a-dia. Inicialmente os encontros eram no Jabaquara Atlético Clube, passaram depois para o Vasquinho e agora estão na Gota de Leite.

A faixa de idade varia dos 35 aos 50 anos, mas todos suam as camisas (camisetas amarelas e azuis com o emblema do clube, uma bola em cima do prato, garfo e faca) com a mesma disposição. Quando termina o jogo, cada um leva sua camiseta para casa, lava e traz prontinha na próxima reunião.

O melhor vem depois do jogo e eles não abrem mão de um cardápio variado e muitas vezes sofisticado. Dizem que o jantar mais caprichado foi durante a comemoração do aniversário do presidente atual, Dráusio Luís Lopes, que só não trouxe faisão porque não conseguiu encontrar no mercado. Geralmente não são eles que cozinham. O cozinheiro oficial é o mestre Arlindo, imbatível para preparar frutos do mar.

Outro indispensável é o churrasqueiro Abdalla, conhecido pela sardinha recheada que ninguém consegue fazer igual. E para a noite árabe, programada para este mês, eles já contrataram dona Margô, cozinheira do Clube Sírio. E não dá para esquecer a fantástica carne seca com abóbora preparada pelo Chem, um dos componentes do clube.

"Nossa finalidade é descontrair", diz Dráusio, que é agente de seguros e um dos fundadores do clube, ao lado de Washington Luís Prado, proprietário da distribuidora de bebidas Praiamar, dos empresários Martone Medea, Antonio Roberto Cury ou de Manoel Marques Cação, proprietário do restaurante Boa Vista.

Para eles, o futebol e a comida são apenas desculpas para manter os vínculos de amizade. O clube funciona como um local de encontro entre amigos, sem rivalidades. Difícil uma dividida violenta de bola e se alguém se machuca, há sempre outro por perto para estender a mão.

Carniceiro, Chorão, Soneca, Maneco Jóia são alguns dos apelidos usados a todo instante. Eles pagam uma mensalidade e garantem que a receita é ideal para curar o stress.

O comparecimento é obrigatório, salvo motivo justo. A diretoria é formada pelo presidente, tesoureiro e diretor social, com eleições anuais e quase sempre com duas chapas, para manter o clima.

Enquanto todos se divertem inocentemente, as mulheres ficam em casa e só podem participar nas reuniões festivas como a confraternização de Natal. Para elas, Washington manda uma mensagem: "É verdade que por trás de todo homem que está bem na vida existe uma grande mulher. As nossas esposas nos ajudam com a paciência".

Futebol e comida, programa de segunda-feira
Foto: Adalberto Marques

Mentir para a esposa e justificar ausência dando como desculpa reunião do clube é a única inconveniência que não é permitida no Clube dos Inconvenientes. Fundado em 1984 com 14 sócios iniciais, hoje eles estão em 22, a maior parte integrante do Rotary Clube de Santos, embora façam questão de afirmar que não há qualquer tipo de vinculação com o clube. Apenas coincidência.

O presidente atual é José Carlos Otero Quaresma, que resume bem o espírito divertido do clube: "Fui eleito em uma reunião em que não estava presente. Quer inconveniência maior?"

Na ata de fundação do Clube dos Inconvenientes estão impressos para a posteridade os objetivos principais dos associados: "Catorze guapos varões, amancebados com o prazer de saber viver, muito amigos entre si, e que abominam as tristezas, maledicências, falsidade, o stress, o FMI, a velhacaria e os xavecos em geral, repimparam-se em solerte e opíparo ágape, acontecido no restaurante Vista ao Mar". Deu para sentir a seriedade?

As definições sobre inconveniências são muitas. Alguns membros ficam preocupados com a divulgação da entidade e se apressam em explicar: "Somos inconvenientes no bom sentido, porque nos dias de hoje ser inconveniente é estar ao lado do que é direito". Outros riem e dizem que não é nada disso...

A idéia inicial era formar um clube de gourmets, com pessoas que soubessem apreciar o prazer de uma boa mesa, de bons vinhos. Resolveram manter essa idéia com um envolvimento maior no clima de irreverência, amizade e muitas gozações. A cada reunião, por exemplo, é eleito um inconveniente; no final do ano, o inconveniente máximo. Por consenso, resolveram não divulgar os nomes dos inconvenientes. "Questões ideológicas e políticas dividem o grupo", explicaram.

Há o cargo de presidente e outros menos usuais: o guardião de segredos (eles não revelam quem ocupa o cargo, é segredo), o diretor de bons exemplos, o tesoureiro de risco e o diretor espiritual. A cada reunião há um tema escolhido previamente, relatado por um dos membros. As reuniões são realizadas em locais diferentes a cada segunda quarta-feira do mês.

Há reuniões abertas em que podem levar convidados (homens, claro) e duas ou três por ano em que as mulheres participam: confraternizações de Dia das Mães, Natal, e o Simpósio Inconveniental da Região Inter-Lagos, realizado anualmente em São Pedro da Aldeia, no Rio de Janeiro, no mês de novembro.

Para quem ficou curioso, a revelação dos associados do fechadíssimo clube: Alberto Augusto Guimarães Gonçalves, Antonio de Freitas Ferreira, Constantino Michaello Conde, Edmundo Ribeiro de Mendonça Neto, Elias Abib Elias, João Carlos Grottone, José Carlos Quaresma, José Francisco Rollemberg, Manuel Leopoldo Montero, Modesto Quintas Vilanova, Hélio Affonso Dell'artino, Henrique Lellis, Nelson Otero, Nelson Rodrigues Teixeira, Roberto Luiz Barroso, Sérgio Garcia, Sylvio Feliciano Filho, Hélio Cesário Cardoso, Francisco Nogueira Filho, Vitor de Souza, Sílvio Donatelli e Guilherme Tedesco.

Mas nem tudo é brincadeira. O clube também é responsável por eventos anônimos em benefício de obras assistenciais da Cidade, como organização de festas com excelente arrecadação.

Faltam inconvenientes na foto. Não chegaram a tempo
Foto: Arnaldo Giaxa