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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - BRAZ CUBAS
O primeiro garimpeiro (3)

Quase desconhecido em sua cidade natal...

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Braz Cubas nasceu na cidade do Porto, em Portugal, provavelmente em 1507. Porém, na sua cidade natal, ele é praticamente desconhecido, mesmo havendo ali uma rua com seu nome, na zona residencial de Antas (começando na Rua Fernão de Magalhães e terminando na Rua do Major David Magno). Os serviços de apoio ao turista não conhecem sua história, nem mesmo o situado junto à Sé Catedral do Porto, nas proximidades da qual existe ainda a Rua Escura, onde o pai de Braz Cubas possuía um conjunto de casas. Esforços da cidade do Porto (ocorridos em meados do século XX) em destacar essa figura ilustre parecem, portanto, não ter frutificado.

No acervo da Biblioteca Municipal dessa cidade portuguesa (instalada em 1842 como Real Biblioteca Pública e que teve o ilustre escritor Alexandre Herculano como um de seus bibliotecários) - examinado minuciosamente pelo editor de Novo Milênio em 21 de outubro de 2008, com o auxílio das bibliotecárias - foi encontrada apenas uma linha de texto referente a Braz Cubas, no livro História da Santa Casa da Misericórdia do Porto (de A. de Magalhães Basto, volume I - 1934, edição da Santa Casa da Misericórdia do Porto, página 456 - referência bibliotecária RJ-4057, legado dr. Ricardo Jorge):

"Menos de um século depois de fundada a primeira Misericórdia em Portugal, eram estes piedosos estabelecimentos já disseminados (...) e em numerosas povoações brasileiras, por exemplo no Rio de Janeiro, na Bahia, em Santos (esta fundada pelo portuense Brás Cubas) eram as Misericórdias (...)".

A respeito desse assunto, o jornal santista A Tribuna publicou, em 22 de novembro de 1952, artigo do pesquisador Jaime Caldas, relatando um encontro com esse autor portuense (ortografia atualizada nesta transcrição):

Folha-de-rosto do livro de A. de Magalhães Basto, conservado na Biblioteca Municipal do Porto

Foto-reprodução: Carlos Pimentel Mendes, em 21/10/2008

 

INSTANTÂNEOS D'ALÉM-MAR

Braz Cubas Portuense

 

Por Jaime Franco

Nos primeiros dias de agosto, tive oportunidade de visitar o dr. Fidelino de Figueiredo no Hospital da Santa Casa da Misericórdia do Porto, onde se internara a tratamento da doença que lhe não permite locomover-se à vontade. No quarto dum pavilhão externo, onde nos abraçamos comovidos, encontrava-se o dr. Artur de Magalhães Basto, também de visita ao eminente professor de Literatura na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Paulo.

O dr. Fidelino de Figueiredo, após as nossas efusões de amigos brasileiros, um nato, outro do coração, fez a apresentação do ilustre escritor e historiador dr. Artur de Magalhães Basto, grande amigo do Brasil pelos trabalhos de investigação histórica nos arquivos municipais do Porto sobre fatos e figuras da História Brasileira. O dr. A. de Magalhães Basto é diretor do Arquivo Distrital e chefe da Repartição dos Serviços Culturais e Sociais da Câmara Municipal do Porto.

Nesta visita ao prof. Fidelino de Figueiredo, fomos acompanhados pelo jornalista Jaime Brasil, nosso colega d'O Primeiro de Janeiro. Em pouco tempo, a conversa tomou vulto e o prof. Fidelino animou-se a falar, com humorismo, de certos episódios literários ocorridos no Brasil, e entrou também no campo histórico para falar do povoado de Enguaguaçu e dos seus fundadores, dentre os quais destacou o valoroso capitão-mor Braz Cubas.

Acompanhamos curiosos a dissertação do mestre, porque ele também gostaria de desvendar o mistério da vida de Braz Cubas, mas ao nosso lado estava um ilustre investigador, ainda silencioso mas atento, e desse ponto em diante o prof. Fidelino relembrou a noite em que falou, em Santos, na Sociedade dos Médicos, sobre o saudoso médico radiologista, dr. Ranulfo Prata, e da sua obra de romancista, e logo evocou a figura estonteante do maravilhoso Martins Fontes, irradiando talento como suor dos poros, durante as escaldantes palestras sob forte noroeste de verão.

O prof. Fidelino de Figueiredo levantou-se da poltrona, apoiado a grossa bengala, ante a estupefação da própria esposa que entrara há poucos instantes, e começou a andar no quarto enquanto falava com vibração de assuntos do Brasil. O prof. Fidelino de Figueiredo referiu-se aos meus estudos sobre a figura saudosa do grande poeta Martins Fontes, e a crônicas de assuntos históricos referentes aos primeiros anos do Povoado de Enguaguaçu, de que outros escritores santistas, como Francisco Martins dos Santos, José Pereira Caldas, Costa e Silva Sobrinho, têm tratado, no sentido de esclarecer certas dúvidas.

O dr. A. de Magalhães Basto tomou interesse na palestra e passou a citar também os seus estudos sobre algumas personagens da História do Brasil, de que já publicara um livro com o título Porto e Brasil (figuras e fatos da história luso-brasileira).

Ora, a conversa terminou por incidir sobre o misterioso Braz Cubas que acompanhou o seu amo, Martim Afonso de Sousa, ao Brasil, em 1532, na qualidade de jovem escudeiro, ficou na Capitania de São Vicente com outros emigrantes, recebeu um lote de terra para cultivar, depois obteve outro e comprou mais alguns nas margens do Lagamar de Enguaguaçu, o patrão outorgou-lhe poderes para gerir os seus negócios nas funções de feitor, e daí em diante contribuiu para o desenvolvimento do Povoado, em cooperação com os companheiros lutou como um bravo contra os piratas, foi nomeado capitão-mor, mandou construir o primeiro Hospital das Américas, excursionou pelo sertão em busca do ouro, e morreu nonagenário.

De tanto esforço para a criação da Vila do Porto de Santos, Braz Cubas mereceu a homenagem dos santistas, que lhe ergueram bela e marmórea estátua na Praça da República, em que aparece vestido com a indumentária de Cavaleiro Fidalgo da Casa Real, quando melhor seria se estivesse com a farda de capitão-mor, conforme o pintou o inolvidável pintor Benedito Calixto, cujo retrato inteiro podemos ver na Biblioteca Municipal de Santos.

O prof. Fidelino de Figueiredo acompanhou-nos desde o quarto ao vestíbulo de saída, satisfeito pela visita dos amigos e admiradores, apoiado á bengala, proferindo frases graciosas; eu, o dr. Magalhães Basto e Jaime Brasil. O jornalista Jaime Brasil tomou o rumo do jornal O Primeiro de Janeiro. Eu e o dr. A. Magalhães Basto, num ligeiro táxi, fomos à Biblioteca Municipal para uma visita às suas dependências.

O dr. A. de Magalhães Basto, autor da História da Santa Casa da Misericórdia do Porto, teve a amabilidade de mostrar, na Biblioteca, as seções de livros raros, dos manuscritos precisos e o museu de recordações literárias com muitas cartas e originais de alguns escritores, como sejam: Antônio Nobre, Arnaldo Gama, Camilo Castelo Branco, Alexandre Herculano, Sampaio Bruno.

Passamos alguns instantes enlevados no manuseio de ricos pergaminhos e alvarás dos primeiros séculos na nacionalidade portuguesa. Referimo-nos à possibilidade de uma investigação sobre o passado de Braz Cubas. Para atender à nossa curiosidade, o dr. Magalhães Basto prometeu enviar o seu livro Porto e Brasil, onde trata do assunto, e lembrou que na cidade do Porto há uma rua com o nome de Brás Cubas, em homenagem a Santos e ao Brasil. Com pontualidade, no dia seguinte, o correio entregava a brochura do dr. A. de Magalhães Basto.

O livro do ilustre historiador tripeiro (N.E.: alcunha dos portuenses, relacionada com suas preferências alimentares) reúne artigos de vulgarização, e, como diz no prefácio, "escrito com escrupulosa preocupação de rigor histórico e documentadamente, mas sem alaridos de erudição nem plano prévio estabelecido".

O dr. A. de Magalhães Basto quis só contribuir, "ainda que minimamente, para pôr em relevo o lugar que o Porto e os portugueses ocupam na história política, econômica, social e literária da grande república sul-americana e chamar a atenção para as ligações que, em muitos pontos, existem entre a história do Porto e a do Brasil".

Para demonstração da sua tese, o dr. Magalhães Basto refere-se a vários vultos da História do Brasil e em especial aos santistas Bartolomeu e Alexandre de Gusmão, a José Bonifácio de Andrada e Silva (que foi intendente da Polícia do Porto). Então, trata de Braz Cubas, louvando o Grupo de Estudos Brasileiros, do Porto, que arrancou do esquecimento, em Portugal, essa "grande figura portuense" que deve ser incluída na Galeria dos Portuenses Ilustres, porque Braz Cubas se transformou em símbolo do esforço de milhares de portugueses que emigraram para o Brasil e onde criaram essa "obra maravilhosa da criação dessa oitava maravilha - que é o Brasil hodierno".

Sem mais contestação, o dr. A. de Magalhães Basto prova que Braz Cubas nasceu na cidade do Porto. Talvez para isso bastaria tirar uma certidão do registro de nascimento no Arquivo Distrital que possui os livros de registro paroquial de todo o distrito do Porto, desde o século XVI. Teríamos assim a confirmação de que Braz Cubas embarcou para o Brasil com a idade de 22 anos, em 1532, tendo portanto nascido no ano de 1510 (?). O dr. Magalhães Basto parece que encontrou uma pista segura para essa investigação: - certa referência ao avô materno de Braz Cubas, Nuno Rodrigues, pai de Isabel Nunes, que casou com João Pires Cubas. Nuno Rodrigues, em 1517, era mordomo da Misericórdia e levava comida aos presos, porque era homem bom, caridoso, ativo, simples e modesto. Quando cumpria essa missão, talvez já levasse pela mão o netinho Braz, de sete anos, ao qual deu exemplo destas virtudes.

O dr. Magalhães Basto quis chegar a esta definição de sentimentos morais de Braz Cubas, herdados do avô, para demonstrar "a concordância ou semelhança de caracteres psicológicos, de índole, de modo de ser, que tão flagrantemente se verifica entre paulistas e portuenses", em vista da notável percentagem de portuenses que entraram na constituição da primeira sociedade paulista.

Outra prova do tripeirismo de Braz Cubas estava no fato de ter designado a povoação construída nos terrenos que ele adquirira de Pascoal Fernandes e Domingos Pires, pelo simples nome de Porto. Assim, encarar-se-ia a hipótese "de Braz Cubas ter dado aquele nome ao povoado que fundou lembrando-se também da cidade portuguesa distante em que tinha nascido".

É aceitável a idéia ocorrida ao dr. Artur de Magalhães Basto que pode contribuir para dissipar a nebulosa sobre a ascendência de Braz Cubas em suas investigações nos arquivos preciosos da cidade do Porto.

Porto, 22 de outubro.

Imagem: reprodução parcial da matéria original de A Tribuna de 22/11/1952

Cidade do Porto, sua biblioteca e a Rua de Brás Cubas


Placa de identificação do monumento: "CONVENTO DE SANTO ANTÓNIO DA CIDADE (BIBLIOTECA PÚBLICA MUNICIPAL DO PORTO) - Hospício franciscano de Santo António da Cidade (1780-1789), foi depois transformado em convento. Durante as Invasões Francesas serviu de depósito militar e de hospital. Abandonado pelos religiosos em 1832, à entrada do Exército Liberal, foi ocupado por tropas inglesas e francesas. Em 1842 nele passou a funcionar a Real Biblioteca Pública, que fora criada em 1833 pelo Regente D. Pedro. Entre os seus bibliotecários contou-se Alexandre Herculano."
Foto: Carlos Pimentel Mendes, em 21/10/2008


Entrada principal da Biblioteca Pública do Porto, situada na Rua D. João IV.
Foto: Carlos Pimentel Mendes, em 21/10/2008


Painel de azulejos do século XVIII, na entrada da Biblioteca Pública do Porto
Foto: Carlos Pimentel Mendes, em 21/10/2008


Interior da principal sala de leitura da Biblioteca Pública do Porto
Foto: Carlos Pimentel Mendes, em 21/10/2008


Retrato de D. Pedro IV, em óleo de João Baptista Ribeiro, do século XIX, no salão principal de leitura da Biblioteca Pública do Porto
Foto: Carlos Pimentel Mendes, em 21/10/2008


Pátio interno da Biblioteca Pública do Porto
Foto: Carlos Pimentel Mendes, em 21/10/2008


Rua de Bras Cubas, na cidade do Porto, vista por satélite
Imagem: Google Maps, em 2008

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