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Publicado em 7 de setembro de 1992 no jornal santista A Tribuna
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 02/26/03 16:39:47
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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - CIDADE FESTIVA
A música e os músicos de Santos (2)

Bandeira Jr. (*)
Colaborador

O maestro Giuseppe Vetró nasceu na Itália em 1895, onde fez seus primeiros estudos musicais. Veio ao Brasil muito jovem, depois de uma tournée pela América do Sul, como violino spalla da Companhia Lírica Italiana. Em São Paulo - la picola Itália - Vetró continuou se aperfeiçoando na Academia Musical de São Paulo, na qual completou todos os cursos de composição, instrumentação e regência.

Contratado para a direção musical do Miramar, estabeleceu-se definitivamente nesta cidade, regendo por muito tempo os concertos nessa casa de diversão - na época, a maior da América do Sul. Nessa função, ele conseguiu também remodelar a música dançante com a formação de conjunto moderno, com bateria, na época chamada jazz-band.

Com o fechamento do cassino Miramar, Vetró passou para a direção artística da Rádio Clube de Santos - a quarta emissora do País; em 1934, foi nomeado professor de música do Instituto Dona Escolástica Rosa e, sucessivamente, do Liceu Feminino e da Associação Instrutiva José Bonifácio, dirigindo ainda a Orquestra Sinfônica local por mais de dez anos. Faleceu aqui em 25/10/1988, onde deixou muitos amigos (sobretudo ex-alunos) e várias composições eruditas e sacras, inclusive uma Ode a Santos, poema sinfônico para orquestra e coro.

Depois da Miramar, outra orquestra de boa qualidade foi montada pelo pistonista Cepo, que arrebanhou os melhores profissionais e alguns amadores, como o saxofonista Dante, o Joãozinho (Amaral) do banjo e o baterista Doca (Nélson Soares de Oliveira), e ganhou logo a preferência dos melhores clubes dançantes da Baixada.

Damos a seguir a biografia de Cepo, redigida pelo seu amigo e camarada Raphael Sampaio Filho - causídico da nossa Comarca, também já falecido:

João de Oliveira Mattos nasceu em Capela, cidade do Estado de Sergipe, em 3 de maio de 1909. Foram seus pais sr. Alfredo de Oliveira Mattos e d. Antonina Oliveira Mattos, já falecidos.

Fez o curso primário na cidade de seu nascimento e alguma parte do curso ginasial, tendo se iniciado no estudo da música, tornando-se mais tarde grande pistonista e trompista, vindo a compor o elenco de várias orquestras, logo que transferiu sua residência para Santos, em 1924.

Logo que chegou a Santos, passou a trabalhar na firma de despacho de seu tio Vilobaldo Manoel de Oliveira, nela continuando quando a mesma passou a ser dirigida pelo seu irmão Demócrito de Oliveira Mattos, auxiliando-o também como despachante da General Motors do Brasil, passando a ser, após o falecimento de seu irmão, o despachante dessa empresa norte-americana - que manifestou, por ocasião de sua nomeação, os maiores elogios pela sua capacidade e correção.

João de Oliveira Mattos exerceu outras atividades, fundando a empresa Transportes Cepo, que era seu apelido quando bem antes jogava futebol no Santos, no tempo do amadorismo, sendo apreciado meia-esquerda, jogando no segundo e no primeiro times.

De várias orquestras de Santos o biografado fez parte com grande sucesso, tocando piston e trompa, sendo que já bem mais tarde, quando foi organizada a Orquestra Sinfônica, regida pelo maestro Moacir Serra, passou a fazer dela parte como trompista, demonstrando grande valor e conhecimento de música e do instrumento que tocava.

João de Oliveira Mattos foi uma personalidade muito rara, pois que aliava com uma bondade e uma generosidade incomparáveis dotes intelectuais, porque era ele quem elaborava todas as defesas por infração que a Recebedoria Federal às vezes lavrava por motivo de supostas infrações de pautas alfandegárias, redigindo de um jacto e sem necessidade de correção ou emendas as alegações num vernáculo puro e claro.

Na cidade de Santos não havia ninguém que, conhecendo João de Oliveira Mattos, o Cepo, como era conhecido no Santos Futebol Clube, não se tornasse seu amigo e admirador.

Em 17 de julho de 1973, ele que já vinha sofrendo repetidos ataques de angina-péctoris, veio a falecer de enfarte, não obstante não lhe terem faltado o carinho e a atenção dos seus familiares, amigos e médicos que o assistiam.

Seu desaparecimento deixou um vazio na sociedade santista, dado que João de Oliveira Mattos, além de ser um cavalheiro, era criatura caridosa no extremo. Tanto isso é certo que, no testamento que mandou lavrar pouco antes de sua morte, deixou uma série enorme de legados para a Santa Casa da Misericórdia de Santos, Asilo dos Inválidos, para manutenção de escola primária gratuita para crianças pobres, sem distinção de raças, cores ou nacionalidades, mantidas pela Loja Maçônica Fraternidade de Santos e de Aracaju, além de outros legados para organizações espíritas, o que fez generosamente, pois que ele era espírita convicto. Seu testemunho comprova sua generosidade.

Homens de sua personalidade, que são raros, deveriam ter seu nome perpetuado nesta cidade, por qualquer modo que fosse, como reconhecimento do povo de uma cidade a que ele serviu com o espírito, com o coração e com o seu patrimônio, produto do seu trabalho honrado, sendo bastante que seja obtida uma certidão do seu testamento no Cartório do 7º Ofício cível (Praça da Independência), quando por ele analisará quem foi, em verdade, João de Oliveira Mattos, que deixou saudades em todos os que com ele conviveram.

A sua bondade, o seu carinho e a sua solicitude como filho, irmão, amigo e amoroso da cidade de Santos, que ele tanto dignificou e amou, tornam João de Oliveira Mattos merecedor de ser aqui sempre lembrado e o seu nome aqui perpetuado.


Grupo embrionário da Orquestra Pepe & Idilberto, em foto tirada no Carnaval de 1936

Ainda na década de 30, o conjunto do Cepo ia ter sério concorrente. No Carnaval de 1936, os donos da Galeria Sotero (Rua Frei Gaspar, 79), com outros músicos, formam banda momística para animar a folia do Brasil Futebol Clube, cujo salão ficava no sobrado da referida galeria. Os músicos da Banda Escudero & Idilberto, antes dos bailes, participavam do corso automobilístico nas ruas da Cidade.

Foi tal o sucesso do grupo musical, no salão e nas ruas, que os dois sócios decidiram, com a experiência e musicalidade de Pepe (José Moschariello), aperfeiçoar a banda nos moldes da americana Paul Whitmann - primeira big band a levar música americana para a Europa. No filme biográfico, o grande band leader contou que, sempre que seus músicos executavam o Saint Louis Blues, as platéias européias se punham de pé, em reverente silêncio. Eles pensavam que a melodia do genial compositor negro W. C. Handy fosse o Hino americano!

Mas, voltando à primeira banda santista (com organização comercial e artística - seus componentes usavam uniformes de gala, de verão, de inverno etc., e ensaiavam semanalmente repertório exclusivo), durante 20 anos, foi o conjunto mais requisitado da Baixada Santista, devido aos excelentes músicos e ao naipe de crooners: Raul de Barros, Cabral Júnior, Pedro Andrade e Rossi (Balalaica) e a lady-crooner Edite Esteves. A mudança do nome para Pepe & Idilberto só aumentou o prestígio da nossa orquestra número um.


Orquestra Pepe & Idilberto já com sua formação definitiva, em 1943

(*) Bandeira Jr. é historiador e escritor em Santos. Este artigo foi publicado em três partes, nas edições de 31 de agosto, 7 e 14 de setembro de 1992, no jornal santista A Tribuna. As imagens são reproduções do arquivo do autor.

Veja as partes [1] e [3] desta série