As origens do Lloyd Real Holandês - Koninklijke-Hollandsche Lloyd (KHL) - remontam ao mês de julho de 1899, data
da fundação da Zuid-Amerika Lijn, companhia fundada em Amsterdã, com a finalidade de transportar carga entre a Holanda e a costa Leste da América do Sul e vice-versa. Para tanto, a Zuid-Amerika
ordenou, ao estaleiro escocês Russel & Co., do porto de Glasgow, a construção de três cargueiros de 4.150 toneladas cada um, cargueiros que foram lançados ao mar no decorrer do ano de 1900, e que levavam os nomes de Zaanland, Rijnland
e Amstelland.
Entre 1900 e 1903, este trio de navios transportou principalmente gado vivo de Buenos Aires para Londres e Dunquerque. Tal tráfego foi, porém, interrompido em julho de 1903 por um decreto do governo britânico que
proibia a importação de animais vivos, em conseqüência de um surto de epidemia de febre aftosa bovina.
Tal proibição obrigou a Zuid-Amerika a adaptar seus três cargueiros para o transporte de carga geral, aumentando-se assim a tonelagem de cada um desses navios para 5.400 toneladas de arqueação bruta.
Por volta de 1905, a demanda de tráfego de emigrantes - entre os países do Norte da Europa e a América Latina - havia aumentado de tal maneira que a direção da empresa decidiu participar do transporte de
passageiros; foram então os três navios modificados novamente, transformando-os em navios mistos, ao invés de simples cargueiros.
Foi o Zaanland que iniciou o serviço mensal regular de passageiros entre a Holanda, o Brasil e a Argentina, zarpando de Amsterdã em setembro de 1906 e sendo seguido pelo Rijnland em 23 de outubro e
pelo Amstelland em 23 de novembro do mesmo ano.
Novo nome - Um ano mais tarde, em dezembro de 1907, a Zuid-Amerika Lijn foi reformulada a fim de poder receber subvenções governamentais, sendo alterada a sua razão social para Koninklijke-Hollandsche Lloyd,
em janeiro de 1908. Tal reconstrução visava reforçar a capacidade de concorrência da companhia no lucrativo tráfego de emigrantes europeus para os países da América do Sul.
Com os subsídios que passou a receber, a KHL pôde imediatamente dar ordem aos estaleiros da A.Stephen & Sons, de Glasgow, e K.M.Scheld, de Vlisingen, para a construção de dois navios mistos destinados a servir a
Rota de Ouro e Prata.
A estes dois novos transatlânticos - lançados ao mar em 1909, respectivamente com os nomes de Hollandia e Frisia - se seguiria, no ano seguinte, um terceiro que recebeu o nome de Zeelandia e
que era basicamente do mesmo tipo que os dois precedentes.
Com esse novo trio, a KHL esperava competir honrosamente com as grandes empresas estabelecidas há muito tempo no tráfego da rota da América do Sul, empresas estas com renome comprovado, tais como a
Royal Mail (Grã-Bretanha), a NordDeutscher Lloyd (NDL) ou a Hamburg-Sud (Alemanha), e que eram baseadas em portos do Mar do Norte ou do Canal da Mancha.
Estes três navios tinham características semelhantes, podendo transportar um total de cerca de 2 mil passageiros, possuindo cinco conveses, dos dos quais ao longo de todo o casco e os outros três em superestrutura.
Cada navio possuía também quatro porões de carga, casco de fundo duplo e dividido transversalmente por sete bulkheads (paredes divisórias dos porões do navio). Os passageiros de primeira classe dispunham de
acomodação confortável, porém não luxuosa, na parte central superior; os de segunda classe eram instalados no castelo e no convés de popa (ré) e, enfim, os emigrantes, cujos dormitórios e refeitórios se situavam no convés inferior.
Só pequenos detalhes diferenciavam os três navios em suas aparências externas. O Hollandia, por exemplo, tinha sua chaminé de forma ovalada, enquanto que o Frisia a tinha de forma redonda.
No Zeelandia, a chaminé era mais centralizada na superestrutura que nos outros navios. Outra diferença consistia na tonelagem e no comprimento, que eram pouco maiores no Zeelandia (7.995 t.a.b. e 134
metros) em relação ao Frisia (7.442 t.a.b. e 129 metros) e deste em comparação ao Hollandia (7.291 t.a.b. e 128 metros).
O Frisia possuía cinco conveses, dois dos quais eram contínuos ao casco e três de superestrutura. Possuía quatro porões, sete divisões transversais, fundo de casco duplo e dois hélices ligados a duas
máquinas a vapor de tríplice expansão.
Com linhas e formas clássicas para a arquitetura naval da época, o trio da KHL era de navios de construção sólida e de características operacionais onde se sobrepunham a praticidade e a simplicidade.
O Frisia, na época de sua viagem inaugural, era o maior navio de passageiros de bandeira holandesa a servir a Rota de Ouro e Prata
Foto: reprodução de cartão postal da coleção de José Carlos Rossini, publicada com a matéria
Provas - O Frisia realizou suas provas de mar, ao largo da costa holandesa, no dia 10 de julho de 1909, fazendo diversas passagens e alcançando a velocidade máxima de 15 nós.
Saiu em seguida de Amsterdã na viagem inaugural para o Brasil e o Prata em 21 de julho, com escalas em Boulogne, Plymouth, La Coruña, Lisboa, Las Palmas, Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro, Santos, Montevidéu e
Buenos Aires. Nesta primeira viagem tinha o casco pintado de cinza, bem como os mastros. Pouco tempo depois, o casco teria a cor preta, e os mastros, cor branca.
Em 1914, quando eclodiu a Primeira Guerra Mundial, a armadora KHL possuía, além do Frisia, quatro outros navios em serviço na Rota de Ouro e Prata. Além do Hollandia e do Zeelandia, haviam sido
lançados na linha, em 1913 e 1914, respectivamente, o Gelria e o Tubantia, de cerca de 14 mil t.a.b. cada um.
Na condição de país neutro, os navios da KHL gozavam praticamente da exclusividade de serviço para a América do Sul. Seus navios levavam, em ambos lados de bordo, uma enorme bandeira pintada em vermelho, branco e
azul, com a inscrição do nome de cada um e do porto de registro, Amsterdã, em grandes letras brancas.
A finalidade era de bem identificar a nacionalidade do navio e sua condição de neutro. Apesar disso, o Tubantia foi torpedeado e afundado ao largo da costa holandesa em março de 1916 pelo submarino alemão
U-13.
Não houve perdas humanas e, diga-se de passagem, o Tubantia levava a bordo um importante carregamento de ouro, tesouro este que seria recuperado anos mais tarde.
Findo o conflito, a KHL adquiriu outros dois navios, ex-alemães que entrariam em serviço com os nomes de Barbantia e Limburgia. Além desses dois grandes transatlânticos, outros dois navios foram
entregues por estaleiros ingleses, o Flandria e o Orama.
No início de 1922, a empresa holandesa encontrava-se em má situação. Seus navios não se beneficiavam de suficiente volume de carga e número de passageiros para justificar sua utilização na Rota de Ouro e Prata. Foi
assim necessário proceder-se à venda do Frisia e do Hollandia para a companhia alemã Hamburg Amerika Linie (Hapag).
Antes do início do conflito de 1914-1918, a Hapag era proprietária de uma gigantesca frota de 442 navios. A grande maioria foi perdida durante a guerra, seja por apresamento, afundamento ou implosão proposital.
Restrições - A partir de 1918, com o fim das hostilidades, a Hapag procurou reconstruir seus serviços de linha, mas foi impedida por cláusulas restritivas do Tratado de Versalhes, tratado este que havia
ordenado a situação europeia após a rendição alemã.
Foi somente em 1921 que as autoridades aliadas relaxaram a proibição que impedia a Alemanha de reconstruir sua frota mercante e, em consequência disto, a Hapag apressou-se em readquirir alguns de seus antigos
navios, que haviam sido apresados durante o conflito, e a comprar outros, de propriedade de armadores em dificuldades financeiras.
O Frisia foi rebatizado Holsatia, saindo de Amsterdã para Hamburgo, em março de 1922, para ser readaptado às necessidades da Hapag. Foi, em seguida, utilizado no serviço quinzenal entre Alemanha, Cuba
e México, não tendo sofrido nenhuma modificação externa, a não ser a pintura da chaminé, que passou a ser amarelo ouro.
O Holsatia serviu nessa rota por mais seis anos, até o momento em que foi decidida a sua demolição, visto que a Hapag recebia então nova tonelagem, recentemente construída, e podia dispensar os navios
veteranos.
O ex-Frisia foi assim demolido, pela empresa Adler, no porto de Hamburgo. Quanto ao ex-Hollandia, também comprado pela Hapag e rebatizado Hammonia, seu fim seria menos prosaico: tendo colidido
com um recife submerso e não indicado nas cartas marítimas, a 75 milhas a Oeste de Vigo, afundou em 9 de setembro de 1922. O Zeelandia, por sua vez, sobreviveu até 1936, quando foi também demolido, após realizar sua última viagem na Rota
de Ouro e Prata, em janeiro de 1935. |