Comportamento
Em construção,
a nova mulher
Lutadora e romântica,
a nova imagem feminina é uma síntese das últimas décadas
Carlos Pimentel Mendes (*)
De
escrava, passou a dominadora, mas esse papel não a satisfez. Agora,
o mundo caminha para um novo equilíbrio de forças, em que
os papéis tradicionais do homem e da mulher vão sendo redefinidos,
e nesse processo é forçosa uma revisão de conceitos
até milenares. Mas ainda há muito a ser feito para que esse
movimento pendular entre radicalismos à direita e à esquerda
termine, completando o ciclo da emancipação feminina e plena
igualdade de condições sociais.
Um casal entra no bar, e pede uma
cerveja para ela e um suco de laranja para ele. É quase certo que
o garçom entregará o suco a ela e a cerveja ao homem. Este
é um exemplo de como certos conceitos e preconceitos estão
arraigados na mente das pessoas, e de como há muito o que fazer
nesse campo.
Quarenta anos depois de queimarem
sutiãs em manifestações públicas para afirmarem
sua igualdade com os homens, as mulheres começam a perceber que
querem ser tratadas como desiguais. Diferentes, não inferiores ou
superiores, apenas diferentes.
E nesta nova era, em que velhas atividades
vão sendo relegadas às máquinas, em que a competição
começa a ser em nível cerebral e não mais em termos
de esforço físico, em que habilidades tipicamente femininas
vão ganhando importância no mundo empresarial, há um
mundo de oportunidades para que velhos conceitos sejam demolidos e a mulher
crie um novo papel para si.
É enfim a oportunidade da
mulher atingir o ideal bíblico original de ser a companheira do
homem, como citado no Gênesis (1, 27), ou ainda como disse Paulo
de Tarso - "...não há varão nem fêmea..." (Gal.
3, 28) - antes que seu papel fosse interpretado e subvertido a partir
de normas circunstanciais desse apóstolo: "A mulher aprenda em silêncio
com toda sujeição... porque Adão foi formado primeiro,
depois Eva; Adão não foi enganado, mas a mulher, sendo seduzida..."
(I Tim. 3, 11-15).
Mulheres
de mãos dadas: mural em Windhoek, Namibia Foto: Nações
Unidas
História - Não
cabe aqui historiar vários milênios de preconceito e sujeição,
e é desnecessário demonstrar o resultado de tão largo
período de dominação, ou relembrar as lutas feministas,
desde as sufragistas londrinas de 1868 até os modernos movimentos
de libertação feminina.
Mesmo porque a própria origem
da data é hoje colocada em dúvida, pois o episódio
em que 130 mulheres grevistas teriam morrido queimadas numa indústria
têxtil em New York não tem documentação histórica:
foi em 8/3/1857, como se decidiu aceitar na conferência internacional
de mulheres realizada em 1910 na Dinamarca, que criou a homenagem? Ou em
25/3/1911, quando de fato ocorreu um incêndio na fábrica têxtil
Triangle Shirtwaist Company, com a morte de muitas mulheres (principalmente
jovens imigrantes)? Ou ainda num domingo (dia incomum para uma greve),
8/3/1908, quando se conta que várias grevistas teriam morrido na
fábrica Cotton em New York?
Presume-se hoje que a história
do incêndio tenha sido forjada em 1955 para tirar o caráter
comunista que o movimento das trabalhadoras começava a ganhar (pois
o Woman’s Day foi criado por mulheres socialistas em 1909), e que na verdade
a origem do Dia Internacional da Mulher teria sido uma passeata de 15 mil
trabalhadoras novaiorquinas em 1908 ou 1911.
De
75% a 80% dos 27 milhões de refugiados do mundo são mulheres
e crianças:vietnamita
e criança num acampamento de refugiados na ilha Koh Paed, Laeom
Sing, TailândiaFoto: Nações
Unidas
Novo
papel - Ao mesmo tempo em que demograficamente vão se tornando
maioria, e cada vez mais exercem atividades até agora reservadas
aos homens, indo ao extremo de se masculinizarem num grau maior ou menor,
as mulheres voltam a suspirar por tempos em que tinham privilégios
e recebiam cuidados cavalheirescos hoje quase desaparecidos.
Muitas lutam agora contra as próprias
companheiras mais radicais, pelo direito de serem apenas donas de
casa e cuidarem de seus filhos, sem que isso implique em serem rotuladas
como conservadoras ou desinteressadas. Afinal, esse é um trabalho
tão importante e necessário como os demais.
Diferencial - Nas atividades
econômicas, diante de uma competição pelo mercado em
níveis nunca vistos antes, qualquer diferencial bem aproveitado
pode ser o segredo do sucesso. E as empresas estão descobrindo que
as mulheres, embora enfrentem problemas no exercício da liderança
dentro de padrões masculinos, têm, entretanto, seus trunfos
nessa disputa, na forma de habilidades inatas ao gênero feminino. Cabe às empresas inteligentes
somar o melhor de dois mundos, tirando partido das diferenças existentes
e combinando as habilidades próprias de cada sexo. Às mulheres,
cabe tirar proveito de suas próprias características comportamentais,
mesmo as porventura resultantes do processo cultural de dominação
masculina. Que, na pesquisa feita pela escritora Norma Carr-Ruffino (A
Mulher Bem Sucedida, Editora Market Books Brasil, São Paulo/SP,
2000), são, para a mulher gerente (na opinião dos próprios
colegas homens e mulheres):
Habilidades masculinas |
Gênero neutro |
Habilidades femininas |
Assertiva Independente Analítica Competitiva Dominante Autocrática Agressiva Dura |
Adaptável Diplomática Sincera Comprometida Inovadora Inspirada Confiável Sistemática Eficaz |
Gentil, educada Compreensiva Piedosa Sensível Emotiva Sentimental Submissa Dependente Irritável |
Norma cita que Alice Sargent (autora
de Androgynous Manager) descobriu, em recente pesquisa, que executivos
e executivas bem sucedidos se descreveram como uma mistura igual de características
que foram consideradas femininas e masculinas. Assim, cabe às mulheres
desenvolverem pontos fortes que negligenciaram porque não eram tipicamente
esperados delas na comunidade. Mas, sem esquecerem das características
femininas inatas: "compreensão, compaixão, sensibilidade
e educação são importantes para dar apoio ao crescimento
e à realização do trabalhador. Quando essas características
são traduzidas em bom relacionamento com os colegas de trabalho
e no estabelecimento de uma comunicação de duas vias eficaz,
uma distinta vantagem é fornecida para as mulheres".
Mulher senegalesa Foto: Nações
Unidas Sexo
- Também no comportamento relacionado ao prazer sexual houve evolução
sensível, embora ainda incompleta. De objeto do desejo sexual masculino,
artificialmente erotizada para a venda de todo tipo de produtos, a mulher
passou ao papel de ser assexuado, negando sua libido em favor de uma participação
maior no mercado de trabalho e da igualdade de competição
com os concorrentes masculinos. Já em anos recentes, as mulheres
redescobrem os encantos de serem femininas, mesmo sem abrir mão
de serem feministas.
Nos últimos anos, até
as pesquisas científicas vêm provando que a mulher nasceu
para ter prazer no sexo, que sua vocação para a monogamia
é decorrente apenas de imposição cultural, e que ela
gosta tanto do prazer sexual quanto o homem. Curioso: só em 1998
a ginecologista Helen O’Connell, do Hospital Real de Melbourne (Austrália)
descobriu que o clitóris mede até 9 cm, quase o dobro do
que antes se imaginava. E tem 8.000 fibras nervosas, a maior concentração
dessas fibras num corpo humano, capacitando a mulher a uma sofisticação
bem maior que a masculina, na busca pelo prazer.
Essas constatações,
e os avanços científicos em termos de contraceptivos, abrem
o caminho para a construção de uma nova mulher, também
nesse aspecto. Assim, depois de milênios de convivência - não
obstante o descompasso na evolução humana entre as diversas
regiões do mundo -, pode ser que, enfim, homens e mulheres estejam
próximos de se reconhecerem como os companheiros de viagem que são,
neste Universo tão desconhecido em que vivemos.
(*) Carlos
Pimentel Mendes é editor do jornal eletrônico Novo
Milênio
A mulher
em Soweto, na África do Sul: revisão de conceitos milenares
Foto: Nações
Unidas
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