Memória
Guerra no Iraque
ameaça patrimônio mundial (3)
Carlos Pimentel Mendes (*)
Uma das
estelas do Codex Hammurabi, no Museu Britânico (Londres)
Imagem: Enciclopédia
Mirador Internacional, 1980, ed. Encyclopaedia Britannica, Rio de Janeiro/RJ
Fontes do poder – O bronze
(liga de cobre e estanho) surgiu pela primeira vez no Oriente Próximo,
uns seis mil anos atrás. E transformou a própria arte da
guerra, ao destacar as poderosas elites, com armas e armaduras nesse metal,
acima das pessoas comuns que tinham apenas arco e flechas, maças
ou machados de pedra. A roda foi primeiro empregada nessa mesma época
pelos oleiros, para facilitar o preparo da cerâmica. Logo, supõe-se,
alguém imaginou usar a roda na criação das primeiras
carroças para o transporte da cerâmica vendida às aldeias
do Sul do Iraque.
E os povos que viviam no curso inferior
do Tigre e do Eufrates eram marinheiros: usaram jangadas simples por milhares
de anos, e aprenderam a construir embarcações com proas pontudas
e velas para descer pelo Golfo Pérsico. Em Uruc, 250 km a Sudeste
de Bagdad, "todos se vestem com vistosas roupas, onde todo dia é
feriado", contava o grande poema épico sumério Gilgamés,
exaltando a cidade próspera onde viviam as famílias de comerciantes,
proprietários de barcos que chegavam à Índia. Ali
surgiu o mito de uma cidade pavimentada com ouro - e o preconceito de que
o trabalhador rural é socialmente inferior ao citadino.
E ainda, a supremacia da vida religiosa
sobre as atividades comuns: surgiram ali os primeiros templos monumentais,
bem como o controle burocrático-executivo dos religiosos sobre as
atividades econômicas - raízes da idéia do direito
ao poder por atribuição divina aos ungidos - Gilgamés
que o diga. O primeiro título de autoridade citado num texto primitivo
- o de "En" ("senhor") consta numa inscrição encontrada em
Ur (entre Bagdad e Basra), de cinco mil anos atrás. Curiosamente,
foi atribuído a uma mulher, sacerdotisa.
Gilgamés,
rei de Uruc, em programa especial sobre o Mesopotâmia
Imagem: TV
5, de Paris, França, em 22/03/2003 às 11h35 (hora de Brasília)
Um paralelo curioso: o presidente
dos EUA, quase invocando uma guerra santa, atropelou as decisões
da ONU para iniciar o ataque. Gilgamés, que se dizia escolhido pelos
deuses para ser rei de Uruc, quando quis guerrear contra seus inimigos,
teve de buscar a aprovação dos anciãos da cidade.
Não a conseguindo, Gilgamés substituiu esses conselheiros
por homens mais jovens que imediatamente autorizaram o ataque...
Pela Mesopotâmia transitaram
- se não surgiram ali mesmo - os primeiros sinais da escrita e da
contabilização (números). Que nos permitiram conhecer
a história dos milênios seguintes, aqui resumida a poucas
palavras altamente significativas para o leitor: Babilônia (e seus
jardins suspensos), Fenícia (e seus navegantes), Hamurábi
(e seu código)...
Ruínas
em Mari, no Iraque, em programa especial sobre o Mesopotâmia
Imagem: TV
5, de Paris, França, em 22/03/2003 às 11h44 (hora de Brasília)
(*) Carlos
Pimentel Mendes é jornalista, editor do jornal eletrônico
Novo
Milênio.
Veja as partes [1],
[2]
e [4] desta matéria e também:
A
guerra visível e a guerra secreta |