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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 07/03/01 22:46:28
Diário de Bordo (Recife-Manaus no navio Bianca) [10]
Do Capibaribe ao Amazonas

Entre o azul e o negro...

Carlos Pimentel Mendes (*)

Em plena madrugada, o navio avança. A trepidação aumentou, a velocidade diminuiu, agora o Bianca navega contra a correnteza. De resto, no passadiço, apenas o clic-clic do piloto automático corrigindo desvios de rumo e o blip do radar, ao completar o giro de 360 graus para registrar obstáculos distantes até 90 milhas. Eventualmente, o sinal do satellite navigator indicando desvios do rumo previsto. Alguns graus acima do Equador, o navio segue no rumo Sudoeste, deixando o mar atrás, com destino a Manaus.

Águas barrentas do Amazonas arrastam gravetos, animais e até pedaços da margem
O tanque de proa (que faz a diferença de calado entre popa e proa) é enchido, pois surgem troncos de árvores levados pelo rio, agora em época da vazante. De janeiro a julho, o período das chuvas, é "inverno" na região amazônica, e os rios estendem suas margens, tornam-se mais caudalosos, sobem 14 metros ou mais (como o Rio Negro, junto a Manaus). No "verão" (entre aspas porque não há mudança de temperatura, é sempre quente e úmido), ocorre a vazante, e as águas arrastam consigo árvores, capinzais, até pedaços inteiros das margens (assim surgiu a ilha de Marajó). Para evitar que esses troncos passem por debaixo do casco do navio, danificando-o, a proa é baixada, assim eles passam pelos lados.
Margem do rio é arrancada pela força das águas. Observe também as diferenças na cobertura vegetal
No domingo, o trabalho foi reduzido, os marinheiros tiveram quatro sessões de cinema, em vídeocassete (só em raras horas, apesar da antena direcional, é possível captar programas de televisão, e a armadora Aliança, por isso, possui um Departamento de Produções Audiovisuais que, a cada viagem, renova o estoque de programas em vídeo dos seus navios).
Agora, no da 20, uma segunda-feira, recomeçam as fainas de manutenção do navio: pintura de guindastes e mastros, por exemplo. O Bianca tenta avançar a 14 milhas por hora (14 nós), mas a correnteza contrária determina a velocidade de apenas 13,7 nós. E pode cair mais: as cartas náuticas indicam correntezas de dois nós ou mais, conforme a época.
Macapá, a capital do Amapá, avistada ao longe, a boreste
(*) O editor de Novo Milênio fez esta viagem quando atuava como jornalista responsável pelo caderno semanal Marinha Mercante, publicado com o jornal O Estado de São Paulo. Esta matéria foi escrita a bordo do navio e publicada em 4 de setembro de 1990.