PRAIA GRANDE E SUA HISTÓRIA
Introdução
As primeiras notícias que se tem do lugar datam de 1510, ligadas intimamente à história da antiga
capitania de São Vicente. De 1510 a 1532, devido à colonização irregular de São Vicente, os colonizadores vieram para "Peabuçu" - palavra tupi que
significa Praia Grande: esses foram os primeiros habitantes do município. O povoamento fixo apareceu em meados do século XIX.
Praia Grande certamente foi percorrida por missões jesuíticas, formadas em São
Vicente; talvez tivessem feito um marco de catequeses na antiga "Peabuçu", na caminhada para Conceição de Itanhaém. Os registros históricos falham
muito, mas há indícios evidentes destas estadas, não só pela concentração populacional como pela distribuição de fazendas.
Os dados mais concretos datam do século XIX, quando em Praia Grande diversos
pescadores se radicaram. O lugar mais freqüentado pelos mesmos era do atual bairro do Boqueirão à ponta de Itaipu, que já no início do século XX era
ocupado por trabalhadores que iriam construir a Fortaleza de Itaipu.
Nos aspectos históricos de Mongaguá vamos encontrar as seguintes referências: "A
história propriamente dita de Praia Grande, então lugarejo de São Vicente, inicia-se com a formação da Cia. de Melhoramentos de Praia Grande, em
1913: seus proprietários pretendiam um loteamento modelo, acima da concepção corrente, mas, aos costumes da então paulicéia, ainda não se fixara a
idéia de fim de semana e férias no litoral, não alcançando portanto o empreendimento a receptividade idealizada".
Entretanto, considera-se como um dos iniciadores da construção civil na zona praiagrandense o dr. Fernando Arens. Ele mudou-se para Praia Grande no
ano de 1910, para dedicar-se à criação de macacos e pássaros.
Segundo Jaime Mesquita Caldas, do Instituto Mesquita Caldas, do Instituto Histórico e
Geográfico de São Vicente, precisamente no dia 21 de junho de 1914 era inaugurada em São Vicente a Ponte Pênsil, que
veio acelerar o desenvolvimento de Praia Grande, encurtando e facilitando o acesso à região.
Na formação de Praia Grande, o aparecimento de vilas populacionais teve papel
preponderante. Justo é que se destaque a importância de núcleos, como Vila Mirim, Vila Caiçara, Solemar, Balneário Flórida, Boqueirão, Jardim
Guilhermina e Cidade Ocian na formação da cidade. Em cada um desses locais, sempre se destacaram alguns cidadãos, autênticos pioneiros, que a
exemplo dos bandeirantes e outras eras, à custa de grandes sacrifícios, colaboraram para o crescimento dessas vilas, e conseqüentemente de toda
Praia Grande.
1946: Fila de passageiros curiosos que queriam a todo custo ver a baleia fictícia em
Praia Grande
Foto publicada com a matéria
As narrativas de Antonio Augusto de Sá Lopes
Em setembro de 1961, um livro impresso pela Editora Obelisco chega às livrarias de
todo o país com a história de um município: "A Odisséia de um motorista". O título, de certa maneira, esconde os dados históricos relevantes
que ele contém. O autor foi o pioneiro do turismo e transportes de Praia Grande, e narra de um modo simples o que foi a região nas décadas de 20, 30
e 40.
Na página 19 notamos que o autor denomina Praia Grande à faixa compreendida entre a
Ponta de Itaipu até Conceição de Itanhaém.
Na página 24, assim escreve Antonio Augusto: "Depois da
Revolução de 30, exatamente em julho de 1933, para o presidente Getúlio Vargas passar e tomar o avião no
Campo da Air France, a estrada foi arrumada e empedrada em 30 dias apenas".
Aqui o autor narra as más condições da entrada que ligava a São Vicente. O então presidente da Nação aqui pousou, pois veio fazer uma visita a
Santos.
"Na década de 20, a população do então lugarejo de São
Vicente restringia-se mais do Boqueirão à Fortaleza de Itaipu". Ainda o autor: "Contava o
saudoso Mansuetto que na época safara desse rio o carro do Presidente Washington Luís. E como se orgulhava
dessa façanha!" (Trata-se do Rio Mongaguá). Resta saber se o presidente estava no automóvel.
Na página 69 (ano 1946), o autor narra as suas realizações profissionais como
desbravador da região no setor de transporte e conseqüentemente do turismo; adquiriu diversos ônibus e realizou a primeira linha regular
Santos-Praia Grande, dando assim [início a] todo um processo de desenvolvimento que viria
mais tarde. Vai abaixo o texto na íntegra:
"Coloquei junto à Fonte
Luminosa uma placa indicativa e, num domingo e sol, dei a saída no primeiro horário. Partiram os dois carros inteiramente lotados com os
passageiros como se fossem sardinhas em lata. Quando vi aquilo, pensei logo: Que mina de ouro que descobri! É a árvore das patacas! Que pena serem
são poucos os lugares do carro! Dava somente para vinte e seis passageiros entre sentados e em pé. Os veranistas, que vinham a Santos passar o fim
de semana, queriam todos conhecer a tão falada Praia Grande e assistir à saída da rede de pesca.
"O itinerário era o seguinte: José Menino,
Praia de Itararé, Av. Presidente Wilson, Av. Rodrigues Alves, caminho da Biquinha de
Anchieta, Ponte Pênsil depois seguia pela estrada até o Forte; em seguida tomava a praia até o Campo de Aviação; dali voltava de novo pela praia
até o Boqueirão, onde fazia uma parada de meia hora no bar do Sérgio, que estava todo remodelado, com outra aparência. Os passageiros aproveitavam o
intervalo para assistir à pesca, comprar peixes de rede e apreciar o magnífico panorama daquelas praias sem fim. Os estrangeiros principalmente eram
os que ficavam mais embasbacados com aquela beleza: de um lado, o mar inquieto a se perder de vista, com suas ilhas como se fossem obedientes
sentinelas; do outro, a extensa baixada, limitada ao longe pela moldura da Serra do Mar; e ali, bem perto, os morros do Forte, cobertos de marta
virgem com o seu verde escuro contrastando com a cor azulada das águas".
O autor narra nas páginas seguintes, à septuagésima nona, o que talvez de mais
pitoresco haja no livro. Trata-se de seu golpe comercial de inventar que uma grande baleia tinha surgido nas águas de Praia Grande e assim conseguiu
trazer turistas de Santos, curiosos em conhecer o grande mamífero.
Antonio Augusto de Sá Lopes, mais tarde, estendeu suas linhas de ônibus até Itanhaém,
que ganhou com isso uma aproximação maior com Santos e São Vicente. Por esta e outras razões, foi agraciado em 1961 com o título de Cidadão
Itanhaense.
Resta-nos dizer que "A Odisséia de um Motorista" não é só uma autobiografia de
um dos heróis do desbravamento do Litoral Paulista, mas sim, também, a história de uma região e de um povo, que tem suas lutas, aspirações,
tristezas e felicidades tão bem descritas pelo então motorista.
Os pioneiros do Turismo
Em 1922 chegava a Praia Grande o pioneiro Heitor Sanchez, que, encantado com a beleza
selvagem do lugar, fundou o loteamento do Jardim Guilhermina, oportunidade em que a família Guinle, proprietária da
Cia. Docas de Santos, pagou pela gleba a vultosa importância de 250 contos de réis. Eram 660 metros frente ao mar por 1.800 metros de fundos. Na
época foi apontado como inconseqüente, mas como todo pioneiro, acreditava no local, tanto que contribuiu conforme recibo...
Imagem publicada com a matéria
...para a compra de um ônibus, cuja linha mais tarde seria explorada pelo motorista
Antonio de Sá Lopes.
Sempre acreditando no progresso da cidade, lançou com seu irmão Cristovam o Jardim
Mathilde (em homenagem ao nome de sua mãe - Mathilde B. Sanchez).
Em 1927 fundou com alguns companheiros, entre eles Nestor Ferreira da Rocha, a
Companhia Territorial Praia Grande, responsável pelo lançamento e venda dos loteamentos: Jardim Caçula, Vila Circe, Balneário Flórida, Flórida Mirim
e Planetário, estes últimos localizados em Mongaguá.
Ainda em 1927, época em que a Cia. Air France estudava a construção do Campo da
Aviação, para em seguida construí-lo, a Cia. Antarctica Paulista de Bebidas, através da filial em Santos, construiu um hotel entre o Jardim
Guilhermina e o Boqueirão, sendo seus proprietários os senhores Roberto Kook e Margarida Kook, naquele tempo sua esposa e com a qual possuía duas
filhas.
O hotel (hoje propriedade da família Pedroso Horta, e que por várias vezes recebeu a
visita do então Governador Jânio Quadros, localiza-se na Av. Castelo Branco) era usado e freqüentado pelo pessoal
da Fortaleza de Itaipu, pelo pessoal do Campo de Aviação e pelos corretores de imóveis, que na época vendiam os loteamentos de Vila Guilhermina.
Segundo depoimento de Dona Maria Francisca dos Santos (Maria do Forte), que na época fora convidada para cozinhar para o pessoal que construía o
Campo da Aviação, a única casa construída no Boqueirão era a do sr. Luiz Caiaffa, havia ainda o Bar do Sérgio, a "birosca" do sr. Açúcar
(Organizador do Carnaval da Cidade) e alguns índios que se misturavam entre caiçaras, pescadores, corredores, militares e alguns turistas.
A única manifestação de Turismo organizado eram as Festas de São Pedro, até hoje o
verdadeiro Padroeiro da Cidade e que em 1977 - graças ao incentivo dado pelo vigário padre Pedro Ferreira, pela sra. Maria Francisca dos Santos
(Maria do Forte) pela equipe da Associação Centro de Estudos Amazônicos, pelos pescadores da Colônia de Pesca e pela sra. Layde Rodrigues Reis Lória
(que mandou restaurar a primitiva imagem de São Pedro) - foi realizada depois de 20 anos a referida procissão. O dia 15 de outubro também era
comemorado, pois era dia de Santana. O arrastão era uma tradição natural.
Em 1946, não haviam técnicas predeterminadas, simpósios, congressos, teses, estudos e
pesquisas, e o praiagrandense só contava com a imensidão da praia, a vastidão do mar, a brancura da areia, e um sol brilhante.
Consideramos, também, como um dos pioneiros do turismo de Praia Grande o sr. Antonio
Augsto de Sá Lopes, pois, usando de imaginação e picardia, engendrou o que ele próprio cognominou de "o truque da baleia", conforme seu depoimento
no livro de sua autoria "A Odisséia de um Motorista".
"Enquanto não vinha licença para uma nova linha
funcionar, os ônibus para o Boqueirão de Santos estavam deficitários, havia então necessidade de se criar algo novo.
"Na hora pensei promover uma excursão a Itanhaém, mas como interessar pessoas com um
tempo feio? De uma hora para outra, sem anúncio e sem reclame?
"Foi então que chamei um pequeno vendedor de jornais, e por dez cruzeiros ele foi no
Café Atlântico e começou a gritar que havia uma baleia na Praia Grande. Daí a pouco, o carro estava lotado com mais de cinqüenta passageiros, todos
curiosos por verem o enorme cetáceo.
"Mas quando chegávamos ao ponto final da viagem que era o Campo de Aviação, outra
desculpa era dada, e a viagem prolongava-se até Itanhaém". (transcrito do livro "A Odisséia de um Motorista").
E assim Praia Grande ficou conhecida, tudo por causa de uma baleia!
Segundo depoimento de dona Wanda Apparecida Dione de Oliveira, esposa do dr. José
Carlos de Oliveira, já falecido, que durante 10 anos consecutivos [foi] subprefeito de
Praia Grande, "além da pesca - que naquela altura dos acontecimentos (1947) se constituía um verdadeiro espetáculo,
atraindo turistas, curiosos e compradores de peixe -, Praia Grande estava cotada no mercado turístico, pela abundância do pescado, e pelos tipos
populares e simples que freqüentavam o Boqueirão como o Açúcar, Nézinho, Diogo etc."
Devido à correnteza marítima em julho de 1948 (época considerada como a que mais frio
fez no litoral), vieram dar em Praia Grande inúmeros icebergs e, quando os grandes blocos de gelo se dissolviam, os pingüins que haviam
viajado nos icebergs, procedidos do Sul, eram facilmente apanhados pelos pescadores e conduzidos para o Entreposto de Pesca, que ficava
instalado na Rua Siqueira Campos, depois Tupiniquins e hoje av. Costa e Silva, no local onde está construído o prédio Long Beach.
Um cercado foi providenciado, e durante algum tempo dona Wanda carinhosamente tratava
dos animais, tornando-se assim uma atração turística. Além dos pingüins, havia tartarugas de grande porte que também chamavam atenção.
Certa noite, para tristeza da tratadora (que a essa altura já se havia afeiçoado aos
animais), os mesmos foram roubados, e não se descobriu por quem; desgostosa com esse fato, tomou a deliberação de doar, todos os animais que
aparecessem na praia, para o Aquário de Santos.
Até mesmo um leão marinho, que aportara dias depois, cometendo a travessura de morder
a mão de um dos pescadores: Manoel dos Santos (Nézinho), que ganhou uma grande cicatriz e muitas histórias para contar.
Extensas filas formavam rapidamente para verem a baleia fictícia,
entre eles muitos turistas estrangeiros
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