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Domingo, 18 de março de 2001
Invasão do Inglês: moda ou ameaça? 
Palavras e frases inglesas estão nas nossas ruas, casas, escritórios, escolas, academias... Para alguns se trata de uma ameaça à soberania nacional. Por Danilo Angrimani
Helvio Romero/AE 
Inglês domina cartazes, da primeira à última palavra
O repórter está em uma esquina nas proximidades das avenidas Pompéia e Sumaré. Ele entrevista pessoas sobre o uso indiscriminado de palavras estrangeiras no País. Principalmente inglês, claro. Ali, repórter e entrevistados estão cercados pelo “inimigo”. O português é submerso em cartazes de publicidade, portas de lojas, ofertas de serviços. O brasileiro se sente em terra estrangeira no meio de tantos happydent white, active plus (seja o que for, é “em três sabores”), jet wash, car wash, beauty line e centenas de outros.
Policarpo Quaresma, o personagem ultranacionalista de Lima Barreto, teria um enfarte se circulasse por São Paulo. Por onde se olha, o “inimigo” parece estar em toda parte. Até no peito das pessoas. O montador de móveis Carlos Eduardo da Silva, 21 anos, veste uma camiseta na qual se lê: “Property of North Eastern”. O que quer dizer? Silva dobra o pescoço, encara a inscrição, que parece ver pela primeira vez, e balança a cabeça: “Não tenho a menor idéia. Comprei por causa da cor (cinza)”.
Mesmo assim, a maioria dos entrevistados parece estar contente em trafegar pela floresta de anglicismos (palavras ou locuções inglesas introduzidas no português). Eles afirmam que, ao contrário do que se supõe, o inglês não veio “ocupar o lugar do português”, mas “enriquecê-lo”.
Soberania nacional O deputado federal Aldo Rebelo (PC do B) não pensa assim. Para ele, a avalanche de anglicismos representa uma ameaça à soberania nacional. Por isso, ele apresentou, em novembro de 1999, um projeto de lei, “em defesa da língua portuguesa contra os estrangeirismos”. O projeto tramita na Câmara Federal, em Brasília, e já foi aprovado pela Comissão de Educação, recebendo parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça.
A matéria prevê uma multa salgada de R$ 12,6 mil para quem abusar de palavras estrangeiras. Enquanto o projeto não vira lei, o deputado é favorável ao canibalismo dos estrangeirismos. Por exemplo, knock-out foi engolido pela língua portuguesa e transformado apropriadamente em “nocaute”. A propósito, Rebelo vai à lona, quando topa pela frente com “garranchos amargos, que turvam e enrolam a língua”, como “kümmel, steeple-chase, steward e groom”.
O deputado comunista certamente aprovou, quando o Novo Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa enriqueceu o idioma de Camões com a inclusão de termos como deletar e mouse, originários do informatês, e que foram devidamente canibalizados. “Bárbaro e nosso”, como diria Oswald de Andrade.
Voz rouca O projeto de lei de Rebelo saiu dos gabinetes da Câmara. Foi ouvir a voz rouca das ruas. Transformou-se em polêmica que se espalhou pelos jornais (em artigos pró e contra) e chegou à Internet, com igual receptividade. No site (ou sítio), do Movimento Nacional em Defesa da Língua Portuguesa, a professora Rosilma Menezes Roldan aprova integralmente o projeto de Rebelo. Vai mais longe: pretende “seduzir o povo brasileiro, motivando-o a achar sua língua a mais linda do mundo, e defendê-la, como os outros povos defendem as suas”.
O Movimento define como uma lástima a realização de congressos no Brasil “totalmente em inglês”, condena a utilização de anglicismos por instituições como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, e diz que não está havendo enriquecimento da língua portuguesa com a utilização de palavras alienígenas. Para a professora, “os estrangeirismos desfiguram a língua, dificultam a comunicação e distorcem a realidade”.
Do lado de lá, onde está o pessoal que critica o projeto de Rebelo, o professor John Robert Schmitz, de 64 anos, “brasileiro naturalizado”, questiona o projeto. “Cabe perguntar o porquê do interesse em proteger o idioma nacional. Quem são os inimigos dos quais a língua portuguesa precisa ser defendida?” Segundo Schmitz, “o que parece afligir o deputado é a pletora de vocábulos de língua inglesa na informática”, como “site, home page, on line e software”, que “refletem a globalização dos dias de hoje”.
A vendedora Thaís Barbosa, 18 anos, trabalha em um shopping da zona oeste, e sabe bem quando tropeça na globalização da informática. “Quando aparece no computador um monte de palavras que não sei o que significam, clico no ok e continuo”.
Apesar da dificuldade evidente de muita gente diante do idioma alienígena, Schmitz diz que “o que desnacionaliza um país é a desonestidade, a impunidade e a diferença de poder aquisitivo entre as classes sociais”. Sem falar dos estudantes “inimigos do idioma”, que escrevem nas redações palavras do tipo “interviu”, “esteje”, entre outras pérolas.
By the way Já o representante comercial Paulo Andrade, 54 anos, acredita que o brasileiro “abusa demais” dos anglicismos. Na camisa de Andrade, vê-se a prova pontual desse abuso: o nome de uma empresa em inglês. “A firma na qual eu trabalho é brasileira, mas os donos colocaram o nome em inglês”. E o nome da empresa está pregado bem ao lado do coração do seu Andrade.
O motoboy Cristiano Souza, 22 anos, faz delivery (entrega) de pizza à noite. Do alto de sua experiência, ele divide a aceitação da língua inglesa em classes sociais. “Se você for na periferia, ninguém sabe o que quer dizer delivery. Mas, no bairro de Pinheiros, onde eu trabalho, todo mundo sabe inglês e nem precisa traduzir. Delivery é delivery”.
Polêmicas à parte, o português é a terceira língua mais falada no Ocidente e pode ser ouvida em quatro continentes. Segundo a Unesco, de 180 milhões a 220 milhões de pessoas se comunicam na língua portuguesa.
By the way, a camiseta de Carlos Eduardo da Silva, entrevistado no início da reportagem dizia que ele era propriedade de uma empresa do nordeste dos EUA.





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