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HISTÓRIAS E LENDAS DE GUARUJÁ - BARRA GRANDE
Um vento vermelho na capela da fortaleza (15)

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Unindo patrimônios histórico e artístico, numa simbiose entre passado, presente e futuro, um painel abstracionista de Manabu Mabe surge no interior da centenária Fortaleza de Santo Amaro da Barra Grande, surpreendendo por sua atualidade os visitantes que ali talvez esperassem encontrar um altar. O forte, por algum tempo, ficou entregue à Sociedade Amigos da Marinha (Soamar). É dessa época esta matéria, publicada no antigo jornal santista Cidade de Santos, em em 16 de janeiro de 1984:
 

Restauração do Forte da Barra: hoje, a 1ª etapa

A real situação das antigas instalações da Fortaleza de Santo Amaro, ou Forte da Barra Grande, ou ainda Forte São Miguel, começa a ser conhecida a partir de hoje, quando o Escritório Regional da Sudelpa na Baixada Santista inicia o serviço de desmatamento e limpeza da área onde existam edificações. Esta etapa dá início à restauração daquelas instalações tombadas pelo patrimônio histórico - atualmente no mais completo abandono -, que será feita em conjunto pela Secretaria de Estado da Cultura, através da Delegacia Regional da Cultura, Sudelpa e Soamar - Sociedade Amigos da Marinha.

A Soamar vem somando esforços junto à Capitania dos Portos do Estado de São Paulo e sociedades da Baixada Santista, visando captar recursos financeiros necessários à recuperação e restauração do patrimônio, para que posteriormente ali seja instalado um museu e se transforme em mais um ponto de atração turística e de estudos para a juventude da região. A Delegacia Regional da Cultura vem atuando na área de coordenação do projeto, que está aliado ao da recuperação e restauração das ruínas do Forte São Felipe, da Igreja Santo Antonio do Guaibê e da primeira indústria de óleo de baleia do país, ao longo do Canal da Bertioga.

A Sudelpa e a Delegacia Regional da Cultura estão unidas na tentativa de sensibilizar os órgãos diretamente ligados à área - Condephaat e Sphan - com o sentido de colaborarem com a parte técnica, na tarefa de restaurar e preservar estes monumentos e outros como o Museu João Ramalho, no Forte João Baptista, no distrito de Bertioga.

A imprensa e empresários interessados em participar estão convidados a prestigiar a iniciativa e, para tanto, a Secretaria da Cultura vai fornecer transporte com saída às 9 horas, da ponte do Clube de Pesca. Ao início dos trabalhos estarão presentes os representantes da Soamar, da Delegacia Regional da Cultura, da Sudelpa, da Capitania dos Portos e Prefeitura de Guarujá.

O início dos trabalhos de recuperação da fortaleza, com a visita de autoridades e jornalistas à fortaleza, foi documentado fotograficamente pelo jornal Cidade de Santos, em 16 de janeiro de 1984, com imagens de Wilson Melo, aqui reproduzidas de antigo copião fotográfico (contato direto do filme com o papel foto-sensível) do extinto jornal:









Fotos: reproduzidas de pesquisa do historiador Waldir Rueda nos arquivos do jornal,
mantidos no acervo da Unisantos

No dia seguinte, 17 de janeiro de 1984, o jornal santista A Tribuna registrou:

Com foices, operários recuperam a fortaleza

Armados de foices, picaretas e enxadas, nove funcionários da Superintendência de Desenvolvimento do Litoral - Sudelpa - invadiram ontem a Fortaleza de Santo Amaro da Barra Grande, ou Forte de Santo Amaro, para combater um dos muitos inimigos da velha fortificação: o mato. Essa é a primeira iniciativa para a reconquista daquele monumento histórico, que desde o século XVI vem guardando a Cidade (N.E.: a referência é à cidade de Santos, onde fica a sede do jornal) e, depois de suportar o ataque de piratas ingleses, caiu diante de uma força irresistível, o abandono.

Até que o monumento volte a se constituir num orgulho para os santistas levará tempo. Abandonado pelo Poder Público depois de tombado pela extinta Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - SPHAN -, o forte não resistiu à ação dos vândalos e do próprio tempo. O que até a saída do Círculo Militar - em 1950 - foi um prédio bonito, amplo e confortável, não passa hoje de um amontoado de ruínas entre grossas paredes, sem telhado, sem piso e com o madeiramento apodrecido.

O tombamento aconteceu em 1969, o que comprometeu ainda mais a fortaleza. Uma vez tombado, um prédio não pode ser reformado, sem autorização expressa do órgão tombador ou por sua própria iniciativa. O SPHAN manteve o forte no rol de propriedades sob sua "segurança" até 81, quando pressionado por vários outros organismos decidiu restituir a propriedade ao Ministério da Marinha. Foi então que surgiu a possibilidade de restaurá-lo, desde que cedido às Sociedades de Amigos da Marinha - Soamares -, que obtiveram concessão para utilizá-lo pelo prazo de 30 anos, a partir de agosto passado.

O mais importante - Para o capitão dos Portos, capitão-de-mar-e-guerra Thiago de Moraes, a fortificação é o bem histórico mais importante de Santos, por ter se constituído na garantia de progresso da Vila de Santos, ao impedir invasões e saques de corsários, principalmente ingleses. Embora essa opinião seja clara, para a população santista a fortaleza não passa de um prédio "estranho" na entrada do Estuário. "Acredito que só a médio prazo a população passará a dar o devido valor àquele imóvel", sentencia o comandante da Capitania dos Portos.

O capitão acredita que apenas depois de recuperado, com o início da visitação, é que a população em geral formará uma nova mentalidade a respeito do imóvel. Mas a inexistência de um senso de valores não é exclusividade dos que desconhecem o papel que teve a fortaleza no desenvolvimento de Santos. Até mesmo o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Arquitetônico - Condephaat - do Estado parece não relevar o monumento, quando sua função básica é defender a manutenção da memória estadual.

Desde que as Soamares conseguiram a concessão do forte, em agosto, vem-se tentando trazer técnicos do Condephaat para visitá-lo. Essa vistoria foi adiada diversas vezes, e está prevista - sujeita a confirmação - para a próxima sexta-feira. Até que se conseguisse sensibilizar o órgão, foram necessários muitos encontros, envolvendo inclusive a Delegacia de Cultura do Litoral - que coordena a recuperação ao lado das Soamares -, e ainda assim não se sabe como o órgão poderá ou quererá agir.

Recuperação - Felício Agostinho da Purificação Souza, presidente da Soamar/Santos, explica que o trabalho de reconstrução da fortaleza não deve ficar submetido a burocracias, e nesse sentido conta com o apoio da Sudelpa, da Delegacia de Cultura e da própria Capitania dos Portos. O problema é como recuperá-lo. O empreendimento não será barato, embora existam muitas empresas particulares dispostas a auxiliar com material.

"Estamos correndo atrás de recursos, de auxílio. Já conseguimos o apoio da Sudelpa, e há várias firmas dispostas a ajudar com telhas, madeiras e outros produtos", salienta Felício. Conjugando esses esforços, e realizando a reconstrução em forma de mutirão, a Soamar espera que dentro de mais alguns meses o prédio já esteja em condições de uso.

Com o início das atividades dos funcionários da Sudelpa - fornecidos pelo Escritório Regional da Baixada - já se poderá, dentro de mais alguns dias, andar pela área externa da fortaleza sem temor de se encontrar uma cobra pelo caminho; ou ingressar no prédio olhando para o chão e não para o alto, como que aguardando a queda de uma telha do telhado apodrecido.

Essas pequenas medidas de segurança serão tomadas preparando o local para, no dia 4 próximo, receber o ministro da Marinha, Maximiliano da Fonseca. Essa visita deverá ser muito importante para o imóvel, pois existe a possibilidade de o Ministério da Marinha auxiliar financeiramente na reconstrução. Essa possibilidade não é confirmada pelo capitão dos Portos, mas existe.

Imposto de Renda - De forma alguma se pode dizer que a Soamar ficou parada desde que conseguiu a concessão da fortaleza. Nesses seis meses, além dos contatos com diversos organismos estaduais para se formar um plano de recuperação, se conseguiu encaminhar junto ao Ministério da Fazenda um processo que permita liberar as doações que forem feitas para a reforma, a partir de agora, do Imposto de Renda.

"Já foram estabelecidos contatos com o Ministério, e a isenção parece possível, embora se deva fazer alguma alteração nos estatutos das Soamares", informa o capitão Thiago de Moraes. Confirmada a isenção, automaticamente aumentará o interesse de firmas em colaborar com a empreitada, o que, por conseqüência, diminuirá os custos de reforma.

Esses seis meses a partir da concessão serviram, também, para que os organismos diretamente envolvidos estudassem documentos informando sobre as características originais da fortaleza, que se quer ver reconstituídas. "Provavelmente não poderemos chegar à sua forma inicial, mas pelo menos o mais próximo possível da época de sua última reconstrução", diz o comandante Thiago de Moraes, referindo-se às obras ocorridas no século XVIII.

Depredações - Além do abandono físico, que provocou a ruína do imóvel, também o vandalismo e as depredações colaboraram para deixá-lo no estado em que se encontra. Para se ter uma idéia do abandono, basta dizer que a velha capela que se situa ao lado do prédio principal do forte, construída originalmente por volta de 1508 e reerguida em 1955, teve sua porta arrombada há alguns meses. Os invasores que fizeram o "serviço" levaram, de recordação, uma imagem de santa muito antiga, que com uma imagem de Santo Antônio dividia o altar decorado com azulejos portugueses pintados à mão.

Para evitar que tais fatos se repitam, o forte deverá ser policiado ininterruptamente - já há negociações nesse sentido com a Polícia Militar -, e está nas cogitações da Capitania dos Portos recomendar à Soamar que retire, da capela, a imagem remanescente, para que também ela não desapareça.

Com a presença de guarda, se poderá impedir que outros crimes se cometam como a retirada de canhões que guarneciam o forte originalmente. As bases dos canhões estão vazias, e apenas duas peças de artilharia são visíveis no forte: uma está no patamar inferior, jogada há uns três metros da base, e o outro canhão está semi-enterrado nas proximidades do prédio principal. Um terceiro canhão, que pertenceria ao forte, foi encontrado há algum tempo nas águas da Barra, e está apreendido na Polícia Federal,segundo o delegado de Cultura, Carlos Pinto.

Na visita que realizaram ontem pela manhã à fortaleza, dirigentes da Soamar, da Sudelpa e da Delegacia de Cultura confirmaram o estado de deterioração em que se encontra o imóvel, e garantiram que o processo de restauração - iniciado com a capinagem do mato - será permanente. Ainda não há previsões de custo ou prazo para que as obras terminem, e as Soamares também estão discutindo prováveis utilizações para o local, além de sede dessas entidades.

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