Foto publicada na página 83 do Almanaque de Santos para 1959
Despedida
Cassiano Nunes
E AQUI vos digo adeus, caros leitores. A leitura de um livro também não é uma viagem que os
leitores realizam com o autor?... Penso não me enganar, identificando na maioria dos que me lêem, pessoas que desejam viajar, que anseiam
interromper o curso do cotidiano, e partir para outras terras à cata do inédito, do imprevisto...
A elas me dirijo em confidência, na última página deste volume, dizendo: "Não invejeis quem
viajou, ou quem vos conta as suas viagens, pois, mesmo perambulando em remotas terras, esse indivíduo levou consigo as suas preocupações, os seus
problemas, os seus dramas. Por mais que se tenha distanciado de sua terra, ficou a ela encadeado pelas suas lembranças, pelo seu passado. Além
disso, o peregrino também não logrou escapar à sua natureza, ao seu modo de ser...
Considerando bem, todas as jornadas não passam de circunvoluções em torno de um eixo inabalável: o
nosso eu. Desejo ainda fazer notar que embora vivamos escravizados ao concreto, o que para nós mais importa é a realidade interior. Por conseguinte,
a nossa ventura é uma armação que nós próprios temos de construir... Quando lograrmos a realização deste anseio, tudo se tornará festa, e Paris e o
nosso quarto passarão a valer o mesmo.
Terdes ido em carne e osso à Europa ou à Ásia não é o principal. O principal é que valorizeis a
vossa imaginação, cinematógrafo íntimo... Por meio da imaginação possuireis este mundo - e os outros também... Para atingirdes tal objetivo,
entretanto, não precisais de dinheiro, passaporte ou barco. De pijama, numa poltrona, pois conquistar a Terra, caros amigos. O abracadabra, a
palavra mágica, é: personalidade. Eu vos convoco, meus amigos, para esta romagem hipotética, em que cada um será o Colombo das Índias que
jazem, adormecidas e perfumadas, dentro de sua Alma... Eu me despeço finalmente, deixando-vos como um presente, a máxima das máximas: "Criai a vossa
felicidade!"
(Do livro Seduções da Europa) |