CULTURA/ESPORTE NA
BAIXADA SANTISTA - F. Montenegro
Fábio Montenegro (2)
Fábio Montenegro publicava seus poemas em
jornal, constantemente. Como este, publicado no jornal santista A Tribuna, numa segunda-feira, 21 de
abril de 1913 (página 1 - ortografia atualizada nesta transcrição):
Tiradentes
Cercou-te a fronte ardente o halo de uma glória,
Proto-mártir da terra! ouviste a grita rouca
De uma pátria sofrendo à sombra merencória
Da opressão que vergasta e à própria ruína touca.
E uma lembrança, então, povoa-te a memória
Na apoteose de um sol. Na tua idéia louca
A Liberdade canta aos mármores da História
Com lampejos no olhar e carícias na boca!
Ei-la agora extinguindo a treva em seu clarão
E tu, batalhador, não viste enriquecida,
Abrir-se a flor do riso à nova geração!
Embora! não morreste. O teu nome altaneiro
Viverá sempre, sempre, após nossa subida
Enquanto houver no mundo um peito brasileiro!
Santos, 913
Fábio Montenegro.
Imagem: reprodução do original publicado no jornal A Tribuna em 21/4/1913
|
Poema publicado em A Tribuna em 21 de setembro de 1913 (página 2 - ortografia atualizada nesta transcrição):
Abstração
(Inédito)
Segredos de noivado. A flórea natureza
Mil farrapos de sombra idílica desfralda.
Sonho... Indolência... o céu é um cofre de turquesa
Entesourando a terra - Oceano de esmeralda.
A alma suave da noite espiritual, da acesa
Via-Láctea que aponta, as cousas engrinalda,
Anda de mundo em mundo, e vibra com realeza,
E vai de monte em monte, vai de fralda em
fralda...
Noite. Calma. Mistério. A lua, alva Atalanta,
Leve, irradia, foge, às carícias, por certo,
De alguém que diz amor - amor que fulge e canta...
Volúpia. E ela a fugir. Hipomene, lá pelas
Nuvens, chama-a talvez, busca-a, e, tendo-a já perto,
Para alcançá-la espalha o pomo das estrelas!...
Santos, 1913
Fábio Montenegro.
Imagem: reprodução do original publicado no jornal A Tribuna em 21/9/1913
|
Outro poema publicado por Fábio Montenegro no jornal A Tribuna, em 26 de março de 1913 (página 2 -
ortografia atualizada nesta transcrição):
Os nelumbos
A Euclides Andrade.
Da redoma do céu opalescente e liso
Envolto no estendal broslado de luares,
Desce a noite mostrando um fúnebre sorriso
À célica mudez das matas seculares.
Enlutam o silêncio uns místicos cantares
D'alguma solidão que eu busco e não diviso:
São perguntas aos céus que vão destes lugares,
São respostas de Deus que vêm do paraíso...
Sobre o espelho de um rio imensamente claro
Valseia a hóstia da lua, à feição de um avaro
Sonho, que vem e vai, e acadinha, e arrebata...
E, enquanto o rio estua aos beijos do luar
Vem-lhe à tona um nelumbo, e outro mais a brilhar,
Como bolhas de leite em bacia de prata!
Santos, 913.
Fábio Montenegro.
Imagem: reprodução do original publicado no jornal A Tribuna em 26/3/1913
|
Poema publicado por Fábio Montenegro no jornal santista A Tribuna, num domingo, 4 de janeiro de 1914 (página 3
- ortografia atualizada nesta transcrição):
Divagações
Gaivotas entre a bruma... Uns flóculos de neve
Lembra, peregrinando... adeuses... Indecisos
Lenços, que vão e vêm, numa loucura breve
Entre mágoas e dor, e prantos e sorrisos.
Aurora de cristal! Do sol o flavo e leve
Brilho esvai-se... lampeja. É dia. Sobre os frisos
Da água, onde a vaga é mansa e onde o vento descreve
Ondulações, em malta, as gaivotas vêem. Lisos
São os céus. O mar geme, e canta, e rumoreja...
Ó mar, eu bem que ausculto o seio teu que arqueja,
Entregue ao tempo, entregue a mil desolações!
Gaivotas... ilusões.. Ó mar, ó meu amigo,
Na conquista do Ideal, também, ó mar, abrigo
As gaivotas gazis das minhas ilusões!...
Santos.
Fábio Montenegro.
Imagem: reprodução do original publicado no jornal A Tribuna em 4/1/1914
|
|