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CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - Ribeiro Couto - BIBLIOTECA NM
Rui Ribeiro Couto (16-[24])

Clique na imagem para ir ao índice desta obraUma das principais obras de Rui Ribeiro Couto é o romance Cabocla, aqui transcrito em primeira edição digital, a partir do livro publicado em 1945 (terceira edição) pela Livraria Sá da costa Editora, de Lisboa, Portugal, com prefácio de João de Barros, sendo todos os exemplares autenticados com as rubricas do autor e editores. A obra faz parte do acervo de Rafael Moraes transferido à Secretaria Municipal de Cultura de Santos e cedida a Novo Milênio pelo secretário Raul Christiano para digitação/digitalização (ortografia atualizada nesta transcrição - páginas 134 a 136):

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Cabocla

Ribeiro Couto

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XXIII - De Joaquim Vieira Pires, na fazenda do Córrego Fundo, ao dr. Edmundo Esteves, na Capital Federal

Meu distinto amigo dr. Edmundo Esteves.

O Jerónimo está muito abatido, mas não sabe do pior. Continua com a mania de comprar terras e viver no sertão, como um bicho. O dr. Teles, médico de Vila da Mata, me pareceu um moço muito criterioso. Foi assistente do professor Pedrosa. Disse-me que do lado esquerdo parece ter aparecido qualquer coisa, mas em todo caso só o direito, a bem dizer, tem uma lesão que não deixa dúvidas, o que para nós não é infelizmente novidade. Vai lhe enviar um boletim de observação e acha que é preciso internar o rapaz num sanatório, submetê-lo a método e disciplina.

Aqui andava a cavalo, apanhava sol e tomava chuva. Felizmente, não há elemento feminino, senão as extravagâncias teriam sido muito mais graves, talvez fatais.

Nunca quis me separar dele para tão longe, mas hoje me arrependo de não o ter enviado desde logo para a Suíça. Agora estou resignado.

Doutor, é o meu único filho, e sou viúvo, quase velho, já do meio dia para a tarde no caminho da vida! É triste, não é, doutor: Enfim, estes dois últimos anos foram os mais duros da minha vida; num perdi minha falecida mulher, noutro tive prejuízos enormes com a baixa do açúcar e vi meu filho, tão cheio de vida, ficar afetado do pulmão!

Doutor, vou levá-lo para o Rio e ele fica confiado ao senhor. Se achar indispensável a Suíça, procurarei acompanhá-lo eu mesmo, embora tenha que abandonar os negócios. Vão-se os anéis e fiquem-se os dedos. O que não é possível é que ele permaneça nesta fazenda, longe das minhas vistas. A experiência não deu resultado. E quis evitar essas localidades próximas do Rio, onde os doentes vão se tratar e passam o tempo em pândega e em jogo de cartas; afinal este menino é tão sem juízo que arranjou meios de piorar com outras extravagâncias! Imagine que a congestão foi causada por um passeio a cavalo num dia de chuva!

O dr. Teles é de opinião que eu espere uns dias, até a febre descer, e que a viagem, se possível, seja feita por etapas. Ah, se houvesse uma estrada de automóvel daqui até o Rio! Quando é que este país há de possuir estradas?

Enfim, doutor, nessas horas é que eu, apesar de ateu, tenho inveja dos que creem. Faz-me falta uma fé para suportar tantas aflições.

Bem, isto já é outro assunto e percebo que me estou alongando inutilmente.

Seu muito grato cro. atto. venr.

Joaquim Vieira Pires.

Mandei despachar hoje para o doutor um jacá de excelentes queijos da fazenda do meu primo. Desculpe a insignificância do presente, mas lembrei-me de que o doutor gosta muito de queijo e aí pelo Rio nem sempre se encontra do bom.

O mesmo.