A arrecadação tributária de Bertioga é semelhante à de outras cidades litorâneas,
segundo avaliou o Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal
Foto: Rubens Onofre, publicada com a matéria
BERTIOGA E O FUTURO
Perfil econômico definirá rumos para o progresso
Humberto Challoub
O
volume de receitas tributárias arrecadado pelo Distrito se assemelha ao de pelo menos 200 municípios paulistas. O dinheiro captado, no entanto,
nunca retornou do Município-sede na mesma proporção. Esse foi um dos principais argumentos utilizados na luta pela emancipação. A essa tese ainda se
acrescentaram os argumentos de que, a partir da autonomia, Bertioga terá suas receitas elevadas em 50%, em função das transferências federais e
estaduais a que têm direito os municípios.
Passado o período de luta pela emancipação, as atenções se voltam agora às questões
fundamentais de sobrevivência de qualquer cidade. Dentre essas questões, uma em particular preocupa os bertioguenses: o perfil econômico e a
capacidade de arrecadação tributária serão suficientes para manter os serviços essenciais e para a realização das obras de infra-estrutura básica?
No ramo de construção civil, a maior fonte de captação de receitas tributárias
Foto: Rubens Onofre, publicada com a matéria
A realidade financeira de Bertioga só poderá ser
conhecida efetivamente quando o governador do Estado, Luiz Antônio Fleury Filho, assinar a lei permitindo a criação do município. A partir daí,
conforme estabelece a Lei Complementar nº 651, a contabilidade do Distrito emancipado passará a ser feita em separado pelo Município-sede. Com isso,
além do acesso ao quadro real da relação receita-despesa, os bertioguenses poderão dimensionar investimentos, seguindo critérios de prioridades.
Estudos preliminares, desenvolvidos pelo Escritório Regional de Planejamento do Estado
e pelo Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal (Cepam), avaliaram a potencialidade econômica do Distrito. Os indicadores de
atividade revelaram a hegemonia do setor de serviços sobre os outros segmentos, uma vez que se pôde constatar um grande número de profissionais que
prestam serviço na área da construção civil, seja de forma direta ou por meio de empresas que comercializam gêneros do ramo.
É certo que ambos os estudos, que colheram informações no período de 88 e 89, foram
influenciados pela expansão imobiliária promovida pela implantação da Riviera de São Lourenço. O reflexo disso aparece na divisão do mercado de
trabalho do Distrito. Das cerca de 10 mil pessoas que trabalhavam em Bertioga no referido período, aproximadamente 6,5 mil atuavam na construção
civil, enquanto 2,8 mil exerciam atividades da indústria, comércio e outros serviços, 1,4 mil na pesca e 300 na atividade rural.
O ramo pesqueiro dentro desse contexto ainda figura como um setor de grande
importância para a economia de Bertioga. A atividade vem sendo desenvolvida por empresas de grande porte e também por grupos autônomos de
pescadores.
Já as atividades industriais e de agricultura não têm peso significativo na economia
global. Na indústria, das poucas existentes (35 no total), muitas estão ligadas à construção civil, que inclui a extração de areia, usina de
concreto e blocos e artefatos de cimento. O setor agrícola, por sua vez, compreende apenas os plantios de subsistência onde se destaca o cultivo da
banana.
O comércio também contribui pouco e está concentrado basicamente no centro do
Distrito, sobretudo ao longo das avenidas Tomé de Souza e Anchieta. A exceção fica por conta dos estabelecimentos que comercializam material de
construção, postos de gasolina e restaurantes, situados ao longo dos principais eixos viários.
Ilustração: Seri, publicada com a matéria
As cidades litorâneas de pequeno e médio portes, ao
contrário do que ocorre com a maioria dos municípios paulistas, têm na arrecadação de taxas e tributos próprios a fatia maior da composição
orçamentária. Enquanto que, em outras cidades, os recursos provenientes das transferências estaduais (ICMS, IPVA, Adicional do IR e imposto sobre
transmissão de causa mortis representam, em média 50% do bolo arrecadado, eles significam, para uma cidade como Ubatuba, por exemplo, apenas
16%.
O Distrito, conforme projeções feitas pelo Cepam, não foge à regra. A simulação
orçamentária feita pelo órgão, considerando Bertioga como uma cidade constituída, apontam as receitas próprias (IPTU, ISS, IVVC, ITBI, e outras)
como a principal fonte de arrecadação (66,5%).
As transferências estaduais, por sua vez, representariam 20%; as federais (Fundo e
Participação dos Municípios, Imposto Territorial Rural e IR na Fonte), 9,9%; enquanto que as receitas diversas equivaleriam a apenas 3,6% do total.
O IPTU, dentro desse contexto, aparece como fonte prioritária. Esse fato poderá criar
distorções no futuro, tendo em vista que a arrecadação proveniente do pagamento do Imposto Territorial corresponde a dez vezes o valor captado com o
recolhimento do Imposto Predial.
Isso se deve a uma política tributária que visa o incentivo à construção em detrimento
da especulação imobiliária, ao mesmo tempo em que favorece o desenvolvimento urbano.
Em um cenário de ocupação plena, a parcela de Imposto Territorial será bastante
reduzida e o total arrecadado com o IPTU será inferior ao valor atual, visto que a alíquota referente ao Imposto Predial é muito menor.
Além disso, com as construções concluídas, os atuais proprietários de terrenos que
atualmente não utilizam os serviços públicos passarão a fazê-lo, gerando mais gastos ao município. Em contrapartida pagarão, proporcionalmente, um
imposto inferior ao de hoje, o que resultará na redução da capacidade de investimentos.
Essa política, obrigatoriamente, terá que ser revista a médio prazo, a partir do
quadro de ocupação urbana e da criação de meios que permitam a alteração do perfil tributário de Bertioga.
Ilustração: Bar, publicada com a matéria
O impacto da população flutuante sobre as finanças
públicas de Bertioga foi medido, no ano passado, por meio de um levantamento desenvolvido pela JNS Engenharia, Consultoria e Gerenciamento, por
solicitação do Governo Estadual. O trabalho, na verdade, teve como principal objetivo contribuir para o macrozoneamento ambiental do Litoral Norte,
a partir de um diagnóstico sobre a qualidade de vida da população que habita aquela região.
Com base na realidade verificada em municípios do Litoral paulista, o estudo
considerou várias hipóteses para avaliar a representatividade desse segmento nas receitas municipais, definindo dois itens como fatores básicos:
renda e sazonalidade. A conclusão, definida através de simulações, foi de que a população flutuante é responsável por 65% dos recursos arrecadados.
A participação nas despesas também foi medida pela empresa de consultoria, que fez a
avaliação considerando Bertioga já emancipada (foram incluídos custos da administração direta, legislativo e outros serviços públicos essenciais).
Observou-se que a parcela referente à população flutuante, também considerando aspectos de sazonalidade e renda, situa-se em torno de 50%,
favorecendo os cofres públicos com um superávit médio de 15%.
Se a diferença a maior pode ser considerada como um aspecto positivo, o mesmo não se
pode dizer da participação da população flutuante no pagamento das tarifas públicas. O problema causado por esse tipo de habitante, conforme aponta
o estudo, está na recuperação dos investimentos municipais realizados por meio de tarifas, que são cobradas em função do uso de determinado serviço.
Nessas condições, o valor da tarifa é calculado por meio de uma parcela referente ao
investimento já caracterizado, e outra parcela relativa ao custo de operação. Como a utilização dos serviços ocorre de forma sazonal, na maior parte
do ano o consumo é mínimo.
Contudo, como o investimento foi projetado em função do consumo máximo, que só ocorre em alguns
períodos do ano, a população fixa arca com parte das despesas geradas pelos habitantes flutuantes.
Estimativa de população
|
Período/ano
|
Fixa
|
Flutuante
|
Total
|
1990
|
16.506
|
41.884
|
50.390
|
1991
|
16.915
|
43.720
|
60.635
|
1992
|
17.358
|
45.673
|
63.031
|
1993
|
17.829
|
45.752
|
65.581
|
1994
|
18.330
|
49.963
|
68.293
|
1995
|
18.863
|
52.316
|
71.179
|
1996
|
19.430
|
54.819
|
74.249
|
1997
|
20.033
|
57.483
|
77.516
|
1998
|
20.676
|
60.318
|
80.994
|
1999
|
21.359
|
63.333
|
84.692
|
2000
|
22.086
|
66.541
|
88.627
|
Fonte: ERP e Engevix
|
O sucesso financeiro de qualquer município também está
diretamente ligado à sua capacidade de atrair novos investimentos, a partir da adoção de políticas de incentivos fiscais ou da exploração de
atividades econômicas geradas por suas aptidões naturais.
Ao se observar a situação das cidades situadas no entorno do Porto de Santos e do pólo
industrial de Cubatão, pode-se concluir que os municípios têm uma vocação totalmente diferenciada, ou seja, o turismo é apenas uma das atividades e
hoje, com certeza, não é a mais importante. Já para as cidades fora desse perímetro, a única base econômica importante é a exploração da atividade
turística.
O Cepam qualifica o turismo como uma vocação econômica "natural" de Bertioga, seja
pela beleza das praias e regiões nativas que atraem principalmente os turistas de um dia, seja pela presença marcante da população flutuante,
estimada em mais de 60 mil pessoas até o ano 2000 (ver quadro).
Para a exploração desse setor, no entanto, serão necessários grandes investimentos na
criação de infra-estrutura, visto que Bertioga não dispõe sequer de uma rede de hotéis adequada para abrigar novos visitantes.
As idéias para o incremento econômico são muitas, e vão desde a criação de um distrito
industrial, para empresas que lidam com materiais não poluentes (como a de montagem de equipamentos eletrônicos, por exemplo), até a transformação
de Bertioga em uma cidade propícia à instalação de universidades e institutos de pesquisas marinhas. |