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BAIXADA SANTISTA - LIVROS - Docas de Santos
Capítulo 81

Clique aqui para ir ao índicePublicada em 1936 pela Typographia do Jornal do Commercio - Rodrigues & C., do Rio de Janeiro - mesma cidade onde tinha sede a então poderosa Companhia Docas de Santos (CDS), que construiu o porto de Santos e empresta seu nome ao título, esta obra de Helio Lobo, em 700 páginas, tem como título Docas de Santos - Suas Origens, Lutas e Realizações.

O exemplar pertencente à Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos/SP, pertenceu ao jornalista Francisco Azevedo (criador da coluna Porto & Mar do jornal santista A Tribuna), e foi cedido a Novo Milênio para digitalização, em maio de 2010, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, sendo em seguida transferido para o acervo da Fundação Arquivo e Memória de Santos. Assim, Novo Milênio apresenta nestas páginas a primeira edição digital integral da obra (ortografia atualizada nesta transcrição) - páginas 639 a 648:

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Docas de Santos

Suas origens, lutas e realizações

Helio Lobo

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SEXTA PARTE (1926-1935)

Capítulo LXXXI

Ainda os 2% ouro

No decênio em estudo, pôs a União em execução o disposto no orçamento federal aplicando a todos os portos do país a taxa de 2% ouro.

Referiu-se a isso o Relatório da Diretoria de 1932, nestes termos:

No decreto n. 20.852, de 26 de dezembro do ano próximo findo, que orça a receita geral da República, para o exercício corrente, encontra-se, na previsão da renda dos impostos, a seguinte disposição:

"9 – 2%, ouro, sobre o valor oficial de toda a importação réis 8.000:000$000".

O confronto dessa disposição orçamentária com a que se encontra, referindo-se à mesma taxa, no decreto n. 19.550, de 31 de dezembro de 1930, que orçou a receita do exercício de 1931, assim como nas leis do orçamento dos exercícios anteriores, evidenciou o propósito do Governo de estender a cobrança da referida taxa às Alfândegas de Santos e Manaus, que até então não a cobravam, por ser ela uma taxa portuária, destinada a produzir recursos para a execução de obras de melhoramentos de portos, ou para assegurar a garantia de juros a concessionários dessas obras, objetivos que não se apresentavam nos portos de Santos e Manaus, construídos, integralmente, com capital dos concessionários e sem garantia de juros.

A Companhia representou logo contra isso, fazendo-o também várias associações do comércio e indústria de São Paulo:

Esta diretoria tem acompanhado com grande interesse a ação das associações representativas do comércio e da indústria de São Paulo, que não tardaram em procurar o Governo Federal, a quem puderam mostrar a situação em que seria colocado o porto de Santos, em face do de Rio de Janeiro e a necessidade de providências complementares, tendentes a igualar, nesses dois portos, o preço dos serviços portuários, já que o orçamento da receita os equiparava em relação à tributação aduaneira.

O Governo Federal estuda as sugestões que lhe foram apresentadas, tendo suspendido temporariamente a aplicação da taxa de 2%, ouro, nas Alfândegas de Santos e Manaus.

Seria lamentável que o Governo exigisse de São Paulo, pelas taxas portuárias de nossa Companhia, a remuneração e a amortização do capital aplicado por ela nas obras e no aparelhamento do porto de Santos recolhendo, como receita aduaneira, o produto integral da taxa de 2%, ouro, enquanto que no Rio de Janeiro conservaria baixas as respectivas taxas portuárias, produzindo renda insuficiente para o serviço do capital, para o qual lançaria mão daquela renda aduaneira. O hinterland do porto de Santos seria grandemente prejudicado e nossa Companhia sofreria, indiretamente, pelo desvio de mercadorias para o porto vizinho.

Comentou a propósito o Jornal do Commercio (29 de abril de 1932):

Cabem aqui algumas palavras sobre a extensão da cobrança da taxa de dois por cento ouro às Alfândegas de Santos e Manaus, onde até agora não era exigido esse tributo.

Essa providência que o Governo tomou visando fazer desaparecer uma desigualdade contra a qual o comércio do Rio vem reclamando desde que se acentuou a baixa do câmbio, em virtude do privilégio que se criou a favor de Santos, daria sem dúvida lugar à inversão da situação relativa desses dois portos. Se adotada sem outras medidas corretivas, passaria o porto do Rio a gozar de um privilégio contra Santos, e Manaus teria que desaparecer da lista dos portos abertos ao comércio internacional.

É louvável a presteza da ação desenvolvida pelas associações de classe de São Paulo e digna de leitura a respectiva representação largamente distribuída, vazada em linguagem clara, fartamente documentada, em que se observa o esforço desenvolvido, não para a conservação do privilégio, que a baixa cambial criou para o hinterland de Santos, mas unicamente visando impedir que se crie um novo privilégio, agora contra esse mesmo hinterland.

Colocada a questão em termos elevados e patrióticos por aqueles a quem toca a responsabilidade dos magnos interesses da economia paulista, logrou a campanha da sua associação o apoio das associações congêneres do Rio, o que levou o Governo a retomar o estudo da matéria que terá, segundo fomos informados, dentro em breve, solução justa e conveniente.

Mas o Governo perseverou no seu propósito, excetuando da cobrança só as mercadorias que se achassem nos armazéns ou tivessem sido expedidas ou reexpedidas antes de 10 de outubro de 1932. Foi o que exarou a diretoria em seu Relatório de 1933:

Em nosso Relatório anterior, levamos a vosso conhecimento haver o Governo Federal estendido a cobrança da taxa de 2%, ouro, às Alfândegas de Santos e Manaus, mas que, com o fim de melhor estudar as sugestões que lhe haviam sido apresentadas, o mesmo Governo resolvera suspender, temporariamente, a aplicação daquela resolução.

Efetivamente, continuou o porto de Santos isento da referida taxa, enquanto se faziam os estudos das sugestões mencionadas, mas, em princípios de outubro do ano findo, sem que se tivesse concluído esses estudos, resolveu o Governo efetivar a cobrança que suspendera, só mantendo a isenção para as mercadorias que já estivessem nos armazéns da Companhia e para as que tivessem sido embarcadas ou reembarcadas, até 10 daquele mês. Foi o que determinou o decreto n. 21.955, que reproduzimos em seguida.

Só o intuito de obter renda, num período de poderes discricionários, podia explicar essa medida. E como já acontecera na questão do abarrotamento do porto, estudou-a Oscar Weinschenck num folheto que a esgotou em todos seus aspectos. Numa resenha, como esta, não pode deixar de figurar em resumo essa argumentação, tanto mais necessária quanto ela é um estudo completo sobre o financiamento dos portos do Brasil [29].

Para isso, classificou o autor nossos portos em três tipos:

Tipo A – Santos e Manaus – com taxas portuárias normais, como base única de seu financiamento, sem garantia de juros, com capital reconhecido em papel.

Tipo B – Pará, Bahia e Rio Grande (este depois de encampado) -, com taxas portuárias normais, como principal de seu financiamento; sujeitos à taxa de 2%, ouro, cujo produto constitui renda complementar; com garantia de juros em ouro e capital reconhecido em ouro.

Tipo C – Rio de Janeiro, Recife, Niterói e Angra dos Reis -, com taxas portuárias muito reduzidas, cujo produto constitui renda complementar; sujeitos à taxa de 2%, ouro, cujo produto constitui a base principal da exploração.

A diversidade desses regimes criou distinções que assim se resumem:

a) A favor da importação do estrangeiro:

I – em Santos e Manaus, contra todos os demais portos, por não ser ali cobrada a taxa de 2%, ouro;

II – no Rio de Janeiro, Recife, Niterói e Angra dos Reis, contra Pará, Bahia e Rio Grande, por serem ali muito menores as taxas portuárias, propriamente ditas.

b) A favor da exportação e das mercadorias de cabotagem: no Rio de Janeiro, Recife, Niterói e Angra dos Reis, contra todos os portos,inclusive Santos e Manaus, por serem ínfimas as taxas portuárias aplicáveis a essas mercadorias.

c) A favor da navegação: no Rio de Janeiro, Recife, Niterói e Angra dos Reis, contra todos os demais portos melhorados, porque a navegação está, praticamente, isenta de taxas, naqueles portos.

Adotada como geral a taxa de 2%, ouro, as posições se transformaram deste modo:

A favor da importação do estrangeiro: no Rio de Janeiro, Recife, Niterói e Angra dos Reis, contra todos os demais portos melhorados, porque naqueles portos as taxas portuárias sobre as mercadorias dessa natureza são mais baixas e a navegação é isenta de taxas, permitindo fretes menores;

A favor da exportação e das mercadorias de cabotagem: no Rio de Janeiro, Recife, Niterói e Angra dos Reis, contra todos os demais portos melhorados, porque naqueles portos as taxas portuárias sobre mercadorias dessa natureza são muito mais baixas e a navegação é praticamente isenta de taxas, permitindo fretes menores;

A favor da navegação: no Rio de Janeiro, Recife, Niterói e Angra dos Reis, contra todos os demais portos melhorados, porque naqueles portos a navegação é praticamente isenta de qualquer taxa.

Essa profunda modificação na situação dos portos teria efeitos desastrosos sobre os de Santos e Manaus, isto é, aqueles justamente que se construíram com capital, papel, nacional, sem onerar a mercadoria com a taxa ouro e sem garantia de juros. Assim, quanto a Manaus:

Manaus, porto interior, ficará nas mesmas condições que Belém, porto marítimo, quanto à importância das contribuições exigidas da navegação e das mercadorias. Desaparecerá a vantagem que aquele atualmente oferece à importação do estrangeiro, vantagem que ainda atraía algum tráfego dessa natureza, que para ali se dirigia, apesar do percurso maior, subindo o Rio Amazonas.

Desaparecia a vantagem referida, a importação do estrangeiro ficará em Belém, que se transformará em centro distribuidor. O porto da capital do Amazonas ficará limitado à cabotagem, perdendo seu valor como entreposto. Avançará Rio Amazonas acima o limite da zona de influência de Belém, ao mesmo tempo que, da fronteira para baixo, caminhará a região abastecida por contrabando, pelo comércio das povoações fronteiriças, que prospera sujeito a taxas aduaneiras muito mais baixas que as nossas.

A Manaus Harbour C. Ltd., concessionária do porto de Manaus, hoje já em situação difícil, devido ao colapso econômico da região amazônica, receberá o "tiro de graça".

Por sua vez, quanto a Santos:

Santos, transformado em porto do tipo B, isto é, do tipo mais oneroso, distante apenas 2123 milhas do porto do Rio de Janeiro, ficará em flagrante desigualdade. Naquele se exigirá contribuição muito mais elevada do que neste, não só da navegação, como das mercadorias, sejam estas de importação do estrangeiro ou de exportação ou cabotagem.

E, de dia para dia, essa desigualdade poderá se agravar, porque o capital aplicado no porto do Rio de Janeiro é considerado como capital morto ou já amortizado, dispensando remuneração.

As taxas portuárias podem ser quaisquer, ainda mais baixas que as atuais, pois serão suficientes as que bastem apenas para cobrir o custo dos serviços de conservação e tráfego.

Nem mesmo se cuidará de reservas para atender à depreciação ou a melhoramentos, porque os serviços industriais do Estado estão sujeitos à legislação controladora da despesa pública que não prevê nem permite a formação de tais reservas. A renovação ou o melhoramento das instalações encontrarão recursos nas dotações da lei de despesa e a renda geral do país fornecerá tais recursos.

Santos continuará explorado por uma empresa concessionária, cujo capital exige amortização e remuneração e é, unicamente, no produto das taxas portuárias que a referida empresa encontra os recursos para cobrir o custo dos serviços de reparação e de tráfego e para cobrir o custo das renovações, assim como para remunerar e amortizar seu capital.

O produto da nova contribuição que se vai exigir não reverte em favor direto do contribuinte, permitindo a redução das taxas portuárias ou fornecendo recursos para renovações e melhoramentos nas instalações do porto.

Esse produto vai beneficiar outrem e as taxas portuárias de Santos não podem ser reduzidas porque todos os encargos ficam sobre a empresa concessionária, que não dispõe de outros recursos que o produto dessas taxas.

É evidente a injustiça com que será tratado o hinterland de Santos, se a cobrança da taxa de 2%, ouro, for para lá estendida, simplesmente, sem que outras medidas complementares sejam postas em prática para evitar a desigualdade irritante, que se criará entre aquele porto e o do Rio de Janeiro, a favor deste.

Lembrando a reclamação do comércio do Rio de Janeiro em 1909, quando da decretação de suas taxas e exposta atrás, e, depois, de Santos em face do mesmo Rio, também objeto de exame anterior, Oscar Weinschenck passou a mostrar o financiamento de ambos, com dados precisos:

Tomando o ano de 930, as estatísticas do porto do Rio de Janeiro acusam o seguinte:

a) renda bruta decorrente das taxas portuárias

20.649:969$142

 

b) remuneração contratual à arrendatária da exploração do tráfego do cais

10.703:462$637

 

c) renda líquida auferida pelo Governo, das taxas portuárias

9.946:506$505

Confrontada essa importância c com a que foi determinada como necessária ao serviço de juros e amortização do capital atual, aplicado nas instalações do porto (25.699:910$761), verifica-se a insuficiência de réis 15.753:404$256.

Assim se constata que as taxas portuárias, em vigor no porto do Rio de Janeiro, não produzem renda suficiente para a remuneração e amortização do capital empregado nas instalações desse porto e que, portanto, uma parcela da renda recorrente da taxa de 2%, ouro, tem de ser utilizada como receita ordinária do porto, para suprir aquela insuficiência.

Mais:

Em 1930, a taxa de 2%, ouro, produziu réis 6.493:686$668, em mil réis ouro.

Convertendo-se essa importância em mil réis papel, ao câmbio atual, isto é, a 8%684 por mil réis ouro, obtém-se como renda papel

51.949:493$344

 

Dos quais se deve deduzir a parcela que é complementar da renda ordinária do porto, cujo valor é

15.753:404$256

 

Donde o saldo de

36.196:089$088

Vê-se, portanto, que a renda da taxa de 2%, ouro, se compõe de duas parcelas:

a) de 15.753:404$256 ou 30, 32%, que constituem renda ordinária do poro, necessária para completar a soma indispensável ao serviço de juros e amortização do capital aplicado no porto, e

b) de 36.196:089$088 ou 69,68%, que têm evidentemente o caráter de imposto aduaneiro, sobre a importação do estrangeiro, imposto de que o comércio de Santos está isento.

Nessas condições, ao câmbio atual, para fazer desaparecer a desigualdade, que de fato existe, entre os portos de Rio e Santos, sem alterar as taxas portuárias em vigor nos dois portos e sem criar outra desigualdade que seria contra o comércio de São Paulo, será necessário:

a) conservar, no Rio de Janeiro, a cobrança da taxa de 2%, ouro, como se faz presentemente, e

b) estabelecer em Santos a cobrança de uma taxa ouro, cujo valor será de 69,68% de 2, isto é, de 1,39%, ouro.

Relembrando o ocorrido em 1926, disse o autor que não se podia comparar, como de novo haviam feito as associações paulistas, um porto com outro, quanto à contribuição exigida do comércio. E depois de confrontar, com igual fidelidade, as taxas portuárias do Rio e Santos, escreveu:

Todos os confrontos que têm aparecido em representações dirigidas ao Governo, quanto à contribuição exigida do comércio, no Rio de Janeiro e em Santos, como despesas portuárias, estão grosseiramente errados.

Em geral, são indicadas e confrontadas, como contribuição média do comércio, por tonelada de mercadorias movimentadas, importâncias que resultam da divisão da renda bruta arrecadada, em Santos, pela companhia concessionária e no Rio de Janeiro pela companhia arrendatária, pela tonelagem das mercadorias embarcadas ou desembarcadas, respectivamente, em Santos e no Rio de Janeiro.

Por esse processo, são confrontadas quantidades heterogêneas, porque, na renda bruta de Santos, entram parcelas que provêm:

a) do fornecimento de energia elétrica às cidades de Santos e São Vicente, que no Rio de Janeiro é renda da Light & Power;

b) do serviço de estiva dos navios, que no Rio de Janeiro é renda da União dos Estivadores;

c) dos transportes nas linhas do cais, que em Santos atinge a 80% da tonelagem das mercadorias movimentadas no porto, enquanto que, no Rio, isso se dá, apenas, com 20% do total;

d) do armazenamento frigorífico, do armazenamento de óleo combustível, gasolina, querosene e outros inflamáveis, assim como de explosivos e corrosivos, renda que no Rio pertence a terceiros;

e) do serviço de oficinas para o Lloyd Brasileiro e outros serviços, que no Rio a companhia arrendatária não realiza.

Por outro lado, na tonelagem de mercadorias carregadas e descarregadas no cais do Rio de Janeiro, figuram, por defeito de estatística:

a) os produtos dos moinhos de trigo, exportados por terra, em vagões das estradas de ferro;

b) todas as mercadorias de cabotagem carregadas e descarregadas, diretamente, pelas empresas de navegação, cuja renda portuária, decorrente dessas operações, não é computada na renda bruta da companhia arrendatária.

Nessas condições, evidentemente, os valores assim determinados como renda bruta média, por tonelada de mercadoria movimentada no cais, são valores heterogêneos, que não podem ser comparados e que nada representam, quanto à importância relativa das despesas portuárias nos dois portos.

O porto do Rio de Janeiro carecia de novos métodos de administração, e para isso, Oscar Weinschenck não viu, depois de longa exposição, senão os remédios abaixo:

Para conseguir o objetivo visado, isto é, para que a renda líquida das taxas portuárias do Rio de Janeiro produza a renda líquida de 25.000 contos de réis, necessária para os encargos do capital aplicado nas obras e no aparelhamento do porto, é preciso modificar o regime em que o tráfego desse porto vem sendo feito, fazendo desaparecer as anormalidades que se criaram atendendo às conveniências de terceiros, pela forma mais simples, ainda que com o prejuízo da unidade administrativa e das rendas portuárias.

Como já disse, arrecadando o Governo, pela taxa de 2%, ouro, renda muito superior à necessária para os juros e amortização do capital aplicado no porto, não tinha argumento para negar-se às concessões que lhe eram solicitadas, em geral, com o apoio do comércio ou da política.

Para corrigir a situação, são necessárias as seguintes providências:

1ª) Restituir, à companhia arrendatária do tráfego do cais, os armazéns hoje arrendados a diversas companhias nacionais de navegação, passando a ser feito, pela referida arrendatária, o serviço portuário par essas companhias de navegação, como se faz em todos os outros portos brasileiros.

2ª) Suprimir o serviço de trânsito do café, que hoje se faz, entregando o embarque desse produto à companhia arrendatária.

3ª) Não permitir que sejam firmados contratos estabelecendo a administração de terceiros nos serviços de tráfego do cais.

4ª) Pôr em vigor no porto do Rio de Janeiro as disposições contidas no projeto de lei, em substituição à de n. 4.729, de 2 de junho de 1921, submetido à aprovação do sr. ministro da Viação, com o ofício n. 2.458, de 15 de outubro de 1931, do inspetor federal de Portos, Rios e Canais.

5ª) Aplicar no Rio de Janeiro as taxas em vigor no porto de Santos, depois de uma revisão que será feita de forma a não afetar a renda bruta arrecadada pela concessionária desse porto, onde as taxas devidas serão, igualmente, aplicadas, ficando os dois portos, Rio de Janeiro e Santos, em idênticas condições quanto às despesas portuárias a que neles ficarão sujeitos o comércio e a navegação, atendendo-se, ao mesmo tempo, tanto quanto possível, à conservação das vantagens relativas de que gozam, presentemente, no Rio de Janeiro, a cabotagem e a exportação nacionais, as quais serão, assim, estendidas a Santos.

Tinham as Associações Comerciais de São Paulo e Rio de Janeiro chegado a um acordo sobre a questão, pleiteando a transformação da taxa de 2%, ouro, que incidia sobre o valor oficial dos direitos, bem como a aplicação ao Rio de Janeiro das taxas em vigor em Santos. Era das cláusulas desse acordo:

Unificação das tarifas portuárias do Rio de Janeiro e Santos. Esta medida, que acaba de ser deliberada pelo Governo, conforme declarações feitas por este aos delegados das classes interessadas paulistas, já foi pleiteada pela Associação Comercial do Rio de Janeiro, na sua representação de 27 de novembro de 1930, endereçada ao chefe do Governo Provisório.

É uma providência que se impõe como indispensável para a coexistência de dois grandes portos vizinhos, como são Rio de Janeiro e Santos. Vigentes nestes ancoradouros taxas portuárias estabelecidas em níveis muito diferentes, continuaria a se operar o desvio do tráfego de um deles para o outro, com consequências grandemente funestas para a economia do país.

A unificação proposta pela Associação Comercial do Rio de Janeiro previa a adoção, nesta capital, da tarifa portuária de Santos, a fim de ser oferecida uma compensação parcial para a supressão da taxa de 2%, ouro, se ela elevava algumas despesas portuárias, abolia o encargo insuportável decorrente daquela taxa.

A proposta da Associação Comercial de São Paulo prevê a adoção da mesma medida, sem a abolição da taxa de 2%, ouro, em vista de não concordar o Governo com essa abolição. Mas sugere que, com a maior receita obtida com a aplicação das taxas de Santos ao Rio de Janeiro, seja aquela taxa reduzida.

Mais:

Esta proposta comporta uma alteração, que não afeta a sua substância, e que melhor consultará os interesses do comércio de ambos os portos. Em vez de se transportar para o Distrito Federal a tarifa portuária de Santos, elaborar-se-á uma nova tarifa que a uma e outra substitua, organizada com as taxas mínimas necessárias para o custeio dos serviços portuários e remuneração razoável das empresas que os exploram, de modo que não seja o comércio sacrificado.

Uma tarifa assim calculada trará benefícios a esta praça, onde alguns serviços portuários não são executados pela empresa arrendatária do cais, porque esta, não podendo prestá-los com lucro pelas taxas oficiais, prefere que deles se encarreguem terceiros, a preços mais altos, com prejuízo para a mesma empresa, para o comércio e para o Governo.

Evitados estes desvios de renda, a receita do porto crescerá, sem dúvida, em proporção avultada, pois só na exportação do café o desvio se eleva atualmente a mais de mil contos por ano. O aumento da arrecadação assim obtido pelo Governo fornecerá compensação para se fazer a redução necessária e inadiável da taxa de 2%, ouro.

Ainda:

Transformação da taxa de 2%, ouro. Não bastará, porém, reduzir a taxa de 2%, ouro, sobre o valor oficial da importação. Este imposto tem organização defeituosa, que o torna iníquo e intolerável, pois acarreta uma agravação muito desigual e às vezes exorbitante da taxação aduaneira. De fato, representa desde menos de 3% até mais de 60% dos direitos, donde resulta que pesa muito mais sobre umas mercadorias do que sobre outras.

Propõe a Associação Comercial de São Paulo que passe a ser calculado, não mais sobre o valor oficial da importação, mas sobre os próprios direitos efetivamente pagos, com o que se removerá aquele inconveniente, tornando-se o referido tributo mais suave e mais equitativo, por se distribuir com igualdade pelas diferentes mercadorias, sem sacrificar a nenhuma. Assim, ao menos, já que não pode ser evitada no momento, a agravação que a referida taxa acarreta no nível da taxação aduaneira será moderada e uniforme.

A comissão não pode deixar de adotar esta ideia e de salientar o alto alcance dessa providência, que trará um grande alívio nos encargos a que está sujeito o comércio importador, por uma melhor distribuição dos mesmos.

Também:

Solução definitiva do problema. Das duas medidas precedentemente expostas, só a primeira deverá ser adotada em caráter permanente.

A segunda é uma providência de emergência destinada a vigorar apenas até que seja decretada a nova tarifa aduaneira, que deve acarretar a abolição definitiva da taxa de 2%, ouro, pois os novos direitos poderão talvez ser calculados de maneira que produzam uma receita igual à arrecadação alfandegária somada à de todas as taxas adicionais cobradas nas alfândegas sobre a importação, as quais deverão então ser suprimidas
[30].

Nada porém se decidiu antes de 1934, quando, pelo decreto n. 24.343, de 5 de julho, foi mandada por em vigor a nova tarifa das alfândegas, que extinguiu várias taxas cobradas nessas repartições, entre as quais a de 2%, ouro, sobre as importações do estrangeiro, substituindo-as por um adicional de 10%, cobrada sobre a importância dos direitos aduaneiros devidos.

Pelo decreto n. 24.577, de 4 de julho de 1934, também do regime provisório, foi extinta a taxa portuária de 0,7%, sobre a importação do estrangeiro, que era cobrada nas alfândegas de alguns portos nacionais, substituindo-se em suas aplicações especiais o produto da outra taxa portuária de 2%, ouro, extinta pelo decreto n. 24.343, já citado, pelo produto do adicional de 10% sobre os direitos devidos, criado por esse mesmo decreto. Era fazer permanente a injustiça ocasional. Declarou o Relatório da Diretoria de 1935:

Com o decreto n. 24.343, o Governo Provisório, além de mandar por em vigor a nova tarifa das alfândegas, transformou em imposto aduaneiro de importação a taxa portuária de 2%, ouro, cuja cobrança havia sido indevidamente estendida aos portos de Santos e Manaus, por serem portos financiados, integralmente, pelos respectivos concessionários.

Essa providência, porém, não corrigiu a situação de flagrante desigualdade no tratamento, que do Governo passaram a receber os hinterlands desses portos, pois continuam prejudicados, onerados, agora, pela cobrança do adicional sobre os direitos, cujo produto, nos demais portos, atende a seu financiamento, reduzindo os encargos da receita decorrentes das taxas portuárias, que assim podem ser mais módicas.

É essa aplicação especial que tinha a taxa portuária extinta, que o Governo transferiu para o imposto adicional criado, expedindo o decreto-lei n. 24.577, que foi acima citado.

Nossa Companhia é, indiretamente, afetada pela repercussão que tem, sobre o comércio importador de São Paulo, a condição de privilégio de que desfruta o porto do Rio de Janeiro, porto vizinho, distante apenas 212 milhas do de Santos e cujo hinterland se confunde com o deste.

Com relação aos 2% ouro, julgou-os Oscar Weinschenck, como taxa aduaneira, impróprios e inconvenientes:

Adotada a providência que mostrei ser a única que, tecnicamente, conduzirá à justa equiparação dos portos do Rio de Janeiro e Santos, em relação à contribuição que, do comércio e da navegação, se exigirá, em cada um deles, para o custeio dos serviços portuários e para a amortização e remuneração do capital neles aplicado nas respectivas obras e aparelhamento, a taxa de 2%, ouro, perde o caráter de taxa portuária, transformando-se em imposto aduaneiro, isto é, em uma simples agravação dos direitos cobrados sobre a importação do estrangeiro.

Mas, incidindo sobre o valor oficial das mercadorias, essa taxa as onera uniformemente, sem atender ao critério a que obedece a tarifa das alfândegas, isto é, em desacordo com a política aduaneira, que o Governo, desde longa data, vem seguindo.

Nessas condições, a taxa de 2%, ouro, como taxa aduaneira, destinada a produzir uma renda adicional, de que a Nação necessita, é imprópria e inconveniente.

Com efeito, a organização da tarifa das Alfândegas é, caracteristicamente, protecionista à indústria nacional. Ela tributa fortemente os produtos manufaturados e grava com modicidade a matéria-prima. Para aqueles produtos é alta a relação entre o valor do direito, ou taxa aduaneira, e o dos mesmos produtos (relação a que na tarifa é dado o nome de "razão"), enquanto que, para a matéria-prima, essa razão é baixa.

A taxa de 2%, ouro, onerando uniformemente todas as mercadorias, agrava muito mais a tributação aduaneira da matéria-prima, do que a dos produtos manufaturados.

Concluindo:

Esse imposto não deve ser mantido e o Governo não necessita dele para obter a renda adicional de que precisa.

Com efeito, é fácil a determinação de uma taxa adicional, que seja aplicada sobre o valor dos direitos e que produza a importância que resultaria da cobrança do imposto de 2%, ouro. Dessa forma, a renda adicional, pretendida pelo Governo, seria obtida, sem perturbar a política aduaneira, que inspirou a organização da tarifa das Alfândegas.

No quinquênio, que abrange os anos de 1926 a 1930, foram os seguintes os resultados da arrecadação realizada pelas Alfândegas, convertida em ouro a parcela papel dos direitos, pelo câmbio médio de cada ano:

Anos

A

B

Relação de

A para B

Direitos-ouro

Taxa 2%, ouro

1926

164.204.230.805 9.057.297.978 5,52%

1927

180.983.381.248 9.617.463.651 5,31%

1928

203.897.517.212 9.863.660.696 4,48%

1929

200.924.176.885 10.837.501.769 5,39%

1930

123.361.443.593 6.900.036.260 5,59%

Médias

174.674.149.949 9.255.192.071 5,30%

Imagem: reprodução parcial da página 639


[29] O. Weinschenck, A taxa de 2%, ouro, e sua extensão aos portos de Santos e Manaus. Rio de Janeiro. Tipografia do Jornal do Commercio, Rodrigues & C., 1932, 57 págs.

[30] Idem. Ver no fim do volume o comentário que o autor faz a essa proposição.