Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/baixada/bslivros08a19.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 08/04/13 20:51:41
Clique aqui para voltar à página inicial de Baixada Santista

BAIXADA SANTISTA - LIVROS - Docas de Santos
Capítulo 19

Clique aqui para ir ao índicePublicada em 1936 pela Typographia do Jornal do Commercio - Rodrigues & C., do Rio de Janeiro - mesma cidade onde tinha sede a então poderosa Companhia Docas de Santos (CDS), que construiu o porto de Santos e empresta seu nome ao título, esta obra de Helio Lobo, em 700 páginas, tem como título Docas de Santos - Suas Origens, Lutas e Realizações.

O exemplar pertencente à Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos/SP, pertenceu ao jornalista Francisco Azevedo (criador da coluna Porto & Mar do jornal santista A Tribuna), e foi cedido a Novo Milênio para digitalização, em maio de 2010, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, sendo em seguida transferido para o acervo da Fundação Arquivo e Memória de Santos. Assim, Novo Milênio apresenta nestas páginas a primeira edição digital integral da obra (ortografia atualizada nesta transcrição) - páginas 130 a 137:

Leva para a página anterior

Docas de Santos

Suas origens, lutas e realizações

Helio Lobo

Leva para a página anterior

SEGUNDA PARTE (1896-1905)

Capítulo XIX

Saneamento do porto. Cais supérfluo?

Escreveu a diretoria no Relatório de 1902:

As obras e serviços que a nossa Companhia contratou executar e custear, e que, por declarações que temos tido, satisfazem aos Poderes Públicos Federal, Estadual e Municipal, ao comércio, navegação e todos quantos deles se utilizam, têm, no entanto, chamado uma grande animosidade, provocando a grita dos que julgam seus interesses feridos pela nossa Companhia.

Compreende-se essa animosidade de parte de cartas classes que, vivendo do serviço local e só tendo em atenção o interesse próprio, o vêm atingido, eliminado ou reduzido.

A grita desses elementos que, tendo ligações com a imprensa local, a torna parcial, não nos admira nem mesmo nos molesta, por mais acres que sejam os seus ataques.

Alarmavam-se, de fato, certos interesses regionais, reagindo. Desapareceriam os comissários de café, fonte de vida para a cidade? Era grande o sentimento (Diario de Santos, 12 de julho de 1904):

O futuro desenha-nos a cidade de Santos substituída pela Companhia Docas, da qual será uma simples feitoria, tendo concentrado já em suas mãos, poderosas pelo ouro e pelo monopólio, a administração, o comércio a retalho, a importação e eliminado para sempre o comissário de café.

E a verdade é que esta classe, que nasceu com o comércio do café, que dele tem vivido, mas também deu vida e desenvolvimento à nossa principal e quase única fonte de renda, desaparecerá dentro em pouco tempo, devorado e suprimido pela gula absorvente da Companhia Docas, que nenhuma dificuldade encontrará ao apetite pantagruélico de devorar as forças construtoras e conservadoras da nossa cidade.

Não podiam atracar mais os canoeiros, que abasteciam ao mercado? A queixa não parecia menor (Tribuna, 22 de fevereiro de 1905):

A Companhia de Docas, este Estado no Estado, fechou de vez Santos, sem deixar aberta uma só frincha por onde possa passar uma mosca. A Câmara, no interesse das populações ribeirinhas, tem tentado em vão mover a Companhia do propósito em que está de não deixar no litoral um só trecho que sirva de doca às canoas que, de diversos lugares, nos trazem lenha, frutas, pescado, todos os produtos da sua lavoura.

Debalde se dizia que o interesse da empresa era o da cidade, sua salubridade, suas boas condições para os que nela residiam ou por ela passavam.

O próprio Diario de Santos, fazendo, aliás, justiça aos serviços prestados, reconhecia que a saúde do porto era condição de vida para a empresa [70], sem, contudo, deixar de escrever que, eximindo-se aos impostos locais, golpeando as profissões humildes, adiantando-se sem necessidade nas obras, numa onipotência que só favorecia aos seus acionistas, esta criava um "sistema de absorção lenta, gradual e inflexível, que seria fatalmente poderoso obstáculo ao desenvolvimento da cidade de Santos, acarretando consigo colossais prejuízos aos particulares, à Municipalidade e ao Governo Federal".

Originara-se também reação do anunciado arrebentamento de uma mina para extração de pedra; da dificuldade do escoamento do lixo que, não podendo mais deitar-se ao canal, a Municipalidade fazia remover para o Saboó, chamando concorrência para a incineração; e, por último, da construção dos esgotos da cidade, coisa sem dúvida de primeira necessidade e complemento à construção do cais.

Bastava ler as epígrafes dos jornais locais para fazer ideia do alvoroço, em que andou a cidade por alguns dias, quanto à mina (novembro de 1902). "Grande perigo", "A projetada explosão", "A mina a explodir", tais as epigrafes de sensação. Até o referido Diario de Santos deixou-se impressionar, levantando seu protesto, uma vez que, segundo se alegava, as dimensões da referida mina iam de encontro às posturas municipais.

"Ao menor esforço de resistência por parte da soberana Companhia Docas – escreveu (10 de dezembro de 1902) -, o povo, que está acordado, e a autoridade vigilante, saberão usar de seus recursos…" Fez a autoridade municipal destruir a mina, promovendo a empresa uma vistoria judicial para ressalva de seus direitos. Em carta ao presidente do Estado, Bernardino de Campos, mostrou o da Companhia que nada daquilo procedia (25 de novembro de 1902):

Vejo que uma mina, para arrebentar pedras, que estamos fazendo no Jabaquara, tem provocado grande discussão pelos jornais de Santos e São Paulo, havendo também provocado diligências policiais, por intermédio do sr. intendente municipal de Santos.

Devido, sem dúvida, a algum mal-entendido, no domingo, 23 do corrente, por ordem da polícia, foi o nosso estabelecimento, no Jabaquara, invadido por força policial, mandada depois retirar.

A mina, que abrimos em reta, ainda não está pronta e, apesar de garantirem os nossos engenheiros que ela só seria levada a efeito depois de verificadas todas as condições de segurança, continua a grita levantada pela imprensa, para alarmar a laboriosa população de Santos, parecendo também nutrir receios a alta administração do Estado, de que possa esta Companhia provocar um desastre.

Venho garantir a v. ex. que nada haverá de arriscado e que, em caso algum, se fará explodir a mina antes de ir entender-me com v. ex.
[71].

O caso do lixo forneceria até argumento contra o prolongamento do cais, por supérfluo. Eram, no entanto, incessantes os apelos da Companhia às autoridades federais e estaduais – seus relatórios tocam sempre a mesma tecla, a salubridade do porto. Assim, entre outros, dizia o de 1898:

O Congresso do Estado de São Paulo autorizou o Governo do mesmo Estado a contratar as obras de esgotos da cidade de Santos, por cuja realização, há seis longos anos, temos envidado os maiores esforços.

Compenetrado, como está o Governo do Estado, da indeclinável necessidade de tais obras, acreditamos que elas serão levadas, agora, a efeito, garantindo-se, assim, à cidade e porto de Santos, a boa higiene, de que tanto carece, para ser o mais salubre dos portos da América Meridional e tomar o lugar que lhe compete, pelas facilidades que oferece ao comércio e navegação.

Além disso, a execução dessas obras trará ao Governo do Estado a economia das enormes somas que anualmente gasta com um deficiente serviço de higiene, ali executado, e acabará, de vez, com o terror que, apesar do muito que já se fez, Santos ainda inspira aos navegantes, pelo fato de se jogarem ao mar, pelas galerias de águas pluviais, as matérias fecais de grande parte da cidade.

As tripulações dos navios atracados junto aos bueiros são geralmente vitimadas, e as que logram escapar tornam-se os maiores detratores do nosso porto. Saneado o porto de Santos, terá o Estado de São Paulo garantida a higiene, não só desta cidade, como a do interior, pois é dali que partem todas as epidemias que invadem o Estado e que custam ao seu Tesouro, em um só ano, maior soma que a necessária para a completa rede de esgotos de Santos.

Ia captar a empresa, para as necessidades de suas instalações elétricas, as quedas mais próximas; e seu primeiro cuidado,quando a Medicina tropical mal se desvendava, foi pedir a Francisco Fajardo, um dos maiores então nesse campo de experimentação, e Carlos Chagas, o futuro sucessor de Oswaldo Cruz no Instituto de seu nome, tão cedo também roubado à ciência, a profilaxia contra a malária. Sobre o que foi a confirmação da teoria pela prática, mostra este trecho do relatório Carlos Chagas (março de 1906):

Realizados os primeiros estudos, indispensáveis ao início da campanha, desde logo instituímos as primeiras medidas profiláticas, começando pelo isolamento e tratamento dos impaludados e pelo emprego preventivo da quinina.

No mês de dezembro não apareceu conclusão alguma à eficácia das medidas, apenas em início. No correr de janeiro houve 16 doentes de impaludismo, quase todos na primeira quinzena do mês, sendo 6 de primeira infecção e os restantes casos de recaídas em antigos impaludados. Em fins de janeiro estavam em prática regular as principais medidas de profilaxia, cuja eficácia poder-se-ia avaliar no correr de fevereiro. E assim foi: em fevereiro houve um doente no dia 3, decorrendo-se depois 20 dias sem que houvesse nenhum outro caso. A 23 tivemos dois novos doentes, sendo de notar que estes três doentes, únicos no correr de fevereiro, o mês de maior intensidade epidêmica nos anos anteriores, foram indivíduos que residiam na mesma casa, desprovida de proteção contra o anopheles.

Desde 23 de fevereiro, e está a findar a época epidêmica, não houve outro doente de impaludismo na zona paludosa, sob o domínio das medidas profiláticas. E devemos entrar em consideração com as condições propícias ao desenvolvimento de epidemias de impaludismo, ocasionadas pela grande abundância de chuvas na presente estação.

Tal resultado demonstra de modo irrecusável a eficácia das medidas profiláticas realizadas. E, no ponto de vista científico, não poderíamos esperar melhor êxito para uma tentativa que importa na demonstração prática de verdades teóricas incontestáveis.

Junto da muralha do cais, mesmo,não eram menores os cuidados da Companhia, pois o escoamento de matérias fecais urbanas se vinha fazendo, como disse a diretoria acima, para os bueiros, com grave dano para as tripulações dos navios atracados, quando não para a cidade. Foi quando reapareceu a febre amarela, com 343 óbitos em 1898, contra 34 no ano anterior.

Jornais de fora, comparando entretanto o presente ao passado, já advertiam que Santos deixara de ser "a Tunísia da América do Sul" [72], para louvar a obra do cais na sua reabilitação e insistindo pelos esgotos. Em Londres, a Syren and Shipping havia escrito (Jornal do Commercio, 18 de novembro de 1899):

Houve um tempo em que o porto de Santos era uma verdadeira necrópole do homem branco. O armador ousado que para lá mandava os seus navios chegava a ser considerado por muitos críticos como um monstro que procurava lucros ímpios, para referir as palavras de um homem de Estado que agora, dizem, se mostra arrependido de suas críticas ignorantes sobre negócios de navegação… Era um lugar infernal!

E efetivamente. Os navios ancoravam em fila em um rio que era a principal cloaca da cidade; tão juntos uns dos outros ficavam que formavam uma espécie de quebra-mar, ajuntando em torno de si imundícies indizíveis.

Depois, a dragagem para os melhoramentos do porto e a escavação para colocar os alicerces do cais ainda mais aumentaram as imundícies em um lugar em que os princípios rudimentares de saneamento eram totalmente desconhecidos.

Felizmente tudo isso hoje já pertence ao passado. As novas obras efetuaram uma transformação, o lodo dragado do rio é levado b em para fora da barra em batelões e a febre amarela fugiu para lugar mais conveniente para ela.

Havia dado alarme a Brazilian Review. E em 31 de maio de 1900 insistiu a Companhia junto ao Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas, para que Santos fosse sanado, uma vez que como porto, já tinha o primeiro lugar na América do Sul:

Causas complexas, algumas de remoção difícil e lenta, só com o tempo podem desaparecer e felizmente parece chegado o momento em que os seus efeitos tendem a declinar.

Outras há, porém, que só dependem do zelo e da boa atividade e principalmente da boa compreensão dos seus deveres dos governos: são as que dizem respeito às condições de higiene e de salubridade do porto de Santos… Exemplo frisante dessa verdade se manifestou no próprio porto, para onde os fretes marítimos passaram de 50 a 75 shillings que eram antigamente, a 25 e 30 shillings, quando as obras do cais se estenderam por toda a porção do litoral que constituía a causa principal das epidemias que assolavam aquela cidade.

Esses fretes, porém, não são os que devem ser. Eles deveriam estar reduzidos a 15 e 20 shillings por tonelada de mercadoria entrada naquele porto, graças às enormes facilidades ali oferecidas ao carregamento, descarga e aprovisionamento de tudo o que é necessário ao navio, se não fora a influência exercida sobre todos os elementos componentes do frete pela má fama de insalubridade de que ainda goza aquela cidade.

Adiante:

Todo e qualquer sacrifício feito pelas autoridades competentes para a minoração das causas de insalubridade daquele porto se impõe, não somente como dever moral pela economia de vidas humanas que daí pode resultar, mas ainda como medida econômica, pela diferença de frete que necessariamente se dará e que, em relação ao movimento total do porto, representará soma muito superior à importância que necessitam os melhoramentos exigidos pela higiene.

A Companhia Docas de Santos reclamando constantemente, desde muitos anos, esses melhoramentos, não defende, portanto, unicamente os seus próprios interesses, que são, aliás, os da União Federal, visto que é a Companhia apenas usufrutuária das obras do cais; ela defende, com esse procedimento, interesses do porto e da cidade de Santos e, principalmente, os de todo o Estado de São Paulo.

Protestando contra o lançamento, nos bueiros que construiu, exclusivamente destinados ao escoamento das águas pluviais, das matérias fecais provenientes dos esgotos da cidade, ela usa de um direito, é verdade, mas cumpre também um dever moral porque esse fato é hoje senão a principal causa, pelo menos um dos principais elementos causadores da insalubridade daquele porto, o que tem sido por diversas vezes demonstrado e ainda provado pelos casos de febre amarela, manifestados justamente no pessoal dos navios atracados em frente às bocas daqueles bueiros e que, no entanto, não aparecem em outros navios existentes no porto e nem tampouco dentro da cidade
[73].

Havia o Club de Engenharia do Rio de Janeiro visitado o cais (24 de maio de 1900), votando moção para que se iniciasse, com urgência, a construção da rede de esgotos da cidade, complemento indispensável do mesmo cais.

A Secretaria da Agricultura do Estado abriu, em mensagem especial (22 de julho de 1900) um crédito de cem contos de reis para esse saneamento. Seguiram-se, afinal, os trabalhos de execução, sob a direção do dr. José Pereira Rebouças, inspetor geral da Mogiana. Exultou, com isso, a Companhia (Relatório da Diretoria, 1903):

Felizmente podemos comunicar-vos que o Governo do Estado de São Paulo resolveu mandar executar as obras de canalização e esgotos de matérias fecais em Santos, obra que, como sabeis, é indispensável à boa higiene daquela cidade e seu importante porto.

A execução de tais obras está a cargo do notável engenheiro dr. José Pereira Rebouças, o que é uma garantia de sua boa execução.

O Estado de São Paulo e, principalmente, a cidade de Santos, devem mais esse importante serviço ao benemérito presidente dr. Bernardino de Campos que, desde a sua posse, no Governo do Estado, tratou de resolver esta questão, considerando-a de urgente necessidade para a higiene do Estado.

Nem aí, porém, deixou de haver impugnação, pois a questão dos esgotos se ligava à da prolongação do cais. Na Câmara Estadual, o dr. Cesario Bastos, entre outras considerações, havia dito:

E se agora fizermos um estudo comparativo e procurarmos conhecer qual o aumento de tonelagem no porto de Santos, chegaremos a este resultado: só em futuro muito remoto, em 1950, será ocupada toda a extensão do cais do Valongo aos Outeirinhos; com efeito, admitindo-se o aumento progressivo de 12 em 12 anos, conforme os cálculos que eu fiz, citados pelo dr. Saboia, a importação e exportação, só em 1914 poderão precisar de mais um metro de cais além do existente, ficando esses 3 quilômetros dos Outeirinhos completamente desocupados.

Mas, continuando a progredir sempre o movimento do porto, só em 1950 poderá haver a tonelagem necessária para ser ocupado todo o cais.

É, porventura, a extensão da linha do cais que atesta o desenvolvimento do porto de Santos? E o que impede que com o mesmo tratamento que se vai dar aos esgotados que vão ter à Ilha Porchat, possam ser eles despejados no canal, quando o dr. Rebouças é o primeiro a confessar que isto é o plano mais econômico, quando o grande Fuertes declarou que nãohavia inconveniente nisso? Quando se vê que os próprios esgotados na Ilha Porchat também vão sofrer o mesmo tratamento, vai-se ter a cautela de fazer os esgotos durante a vazante
[74].

Ligando a construção de armazéns à do saneamento, assim comentou o Diario de Santos, por outro lado, o "açodamento de ir aos Outeirinhos" (15 de julho de 1904):

A Companhia, com a tenacidade da previdência e da segurança do seu destino, prossegue em obras desnecessárias, prolonga o seu cais, constrói novos armazéns e prepara-se para a sua missão de ser o rei do café.

Não há muito tempo, o ilustrado senador dr. Cesario Bastos, em importante discurso a propósito das obras do saneamento, que infelizmente não possuímos, discorreu sobre a Companhia Docas e demonstrou que ela as realiza com antecedência de dezenas de anos, quer em relação às cláusulas do seu contrato, quer em relação às necessidades do nosso comércio de importação e exportação.

O ilustre senador referiu-se a uma questão, alheia à de que tratamos; mas, com o seu espírito lúcido e ilustrado, se é que nos lê, compreenderá que esse açodamento em ir aos Outeirinhos e em construir outros armazéns, quando os atuais sobram para as necessidades de agora, nada mais significa que a realização de um plano, que tem por fim chamar a si o monopólio do comércio de café.

A Companhia Docas deve dezenas de milhares de contos ao Banco da República e realiza obras desnecessárias.

Que significa esta pressa? Que açodamento é esse? Por quê esse dispêndio aparentemente inútil?
[75]

Em defesa do Governo de São Paulo, falou o senador Siqueira Campos que, entre outras coisas, disse:

Antes, mesmo, já se faziam estudos sobre o melhoramento do porto e da cidade de Santos. Daí para cá esse assunto tem sido objeto da preocupação constante de todos os governos. Engenheiros notáveis têm sido consultados a respeito.

Mandou-se procurar uma notabilidade nos Estados Unidos para estudar o problema do saneamento de Santos. O seu trabalho foi publicado mas infelizmente não pôde ser executado, e a questão foi procrastinada.

Por este ou aquele motivo, por esta ou aquela dificuldade, passaram-se dez anos depois dos primeiros estudos, e agora, quando o ilustre presidente do Estado, esse benemérito cidadão a quem São Paulo tanto deve desde a sua primeira administração, porque os principais melhoramentos que aqui se vêm, são devidos à sua iniciativa,quando s. ex. trata de levar a efeito a momentosa obra, que há tantos anos se estuda, não se atribui ao seu procedimento outro intuito senão o de fazer favores à empresa do cais!

Outras obras haveriam de vir, outras oposições surgiriam. O que se increpava de supérfluo ia ser depois acusado de insuficiente. Para a construção do seu cais, de seus aparelhos, de seus armazéns, não faltava à Companhia confiança, certa de que seu esforço corresponderia ao que o porto iria pedir dentro de alguns anos. Analisando um dos relatórios da empresa, diria a respeito, mais tarde, em 1918, o Estado de São Paulo (3 de maio):

Todos os que se interessam não somente pelo progresso do Estado, como pelo desenvolvimento moral e material da União, conhecem os serviços prestados pela Companhia Docas de Santos,cujas obras representam um capital aproximadamente de cem mil contos.

Mas que ela não tivesse contribuído para extinguir as fraudes e os contrabandos daquele porto, aumentando consideravelmente a renda da Alfândega, bastava seu concurso no saneamento de Santos, para que mereça a nossa gratidão.

Afugentar para sempre a febre amarela, que reinava de larga data e epidemicamente em Santos, é tornar franca a porta de entrada aos emigrantes, que demandam nosso Estado.

Foi no decênio, em estudo, que celebrou a empresa seus dez primeiros anos de construção. Convidando ao conselheiro Antonio Prado para visitar as obras, de que fazia rápida exposição, escrevia-lhe com orgulho Candido Gaffrée (9 de julho de 1898):

Recordando estes fatos a v. ex. a quem cabe a glória de haver prestado ao país relevante serviço, dotando-o de tão importante melhoramento, tem o abaixo-assinado por fim convidar a v. ex., em nome da diretoria da Companhia Docas de Santos, para, a 12 do corrente, data em que se completa o primeiro decênio da expedição do decreto n. 9.979, de sua referência, dignar-se visitar as obras do porto de Santos e julgar de visu se tem sido ou não cumpridos os compromissos perante v. ex. tomados pelos construtores.

Será isso mais um motivo de animação àqueles que tudo têm empregado para levar a termo tão grandioso cometimento, devido à iniciativa de v. ex. e até hoje executado com capitais nacionais, administração, direção técnica e comercial exclusivamente nacionais.

Imagem: reprodução parcial da página 130


[70] "Se a Companhia Docas de Santos tem incontestáveis interesses ligados a Santos, se aqui reside seu pessoal superior, se é imenso o capital empregado em obras que nos engrandecem, parece claro que o problema da saúde pública lhe merece especial atenção". Diario de Santos, 28 de fevereiro de 1905.

[71] O ministro da Viação, a quem a empresa expôs o atraso que disso advinha, oficiou ao presidente do Estado (26 de fevereiro de 1903) sobre o violento proceder da autoridade municipal, glosando-se em São Paulo essa intervenção como contrária à autonomia local.

Disse o Diario de Santos (28 de fevereiro de 1903): "E tanto encobriu a verdade que obrigou o Ministério a esquecer a autonomia municipal, como se daí viesse a conseguir seus fins. Enganou-se a Companhia das Docas, a mina não explodiu e não explodirá; sirva-lhe a queixa para outra vez".

[72] "A cidade e o porto de Santos, de que se dizia ser a Tusinia
[N. E.: SIC: Tunísia] da América, ficaram saneados com as obras executadas naquele importante porto. Segundo estamos informados, estão novamente ameaçados de retomar o nome, que por tantos anos tiveram, de empestados e isso, sem dúvida, acontecerá, se os Poderes Públicos do Estado de São Paulo não tomarem providências enérgicas que ponham termo ao reaparecimento, ali, de forte epidemia de febre amarela e a continuação dos estragos às obras do porto, com o lançamento de matérias fecais nos bueiros que atravessam o cais, e que foram construídos para receber as águas pluviais e as de diversos cursos que vêm ter ao litoral". – Jornal do Commercio, 14 de julho de 1899.

[73] Antes já havia escrito: "O Governo do Estado de São Paulo, compenetrado da necessidade de sanear a cidade de Santos, já chamou concorrentes à construção de uma perfeita rede de canalização de esgotos, para as matérias fecais e águas fluviais".

"Procede agora ao estudo das propostas apresentadas e temos certeza que a escolha será feita com acerto e as obras encetadas no mais curto prazo possível, tal a convicção que sabemos tem o mesmo Governo, de que não se deve perder mais tempo na execução de obra tão necessária ao completo saneamento de Santos, garantia segura da boa higiene de todo o Estado.

"Saneada a cidade, retirados dos bueiros do cais os perigosos encanamentos de matérias fecais, que tanto o prejudicam, apavorando com os seus perniciosos efeitos a navegação e a todos os que trabalham no litoral e ali recebem os germes de epidemias que, só devido a essa causa, ainda aí fazem estação, veremos imediatamente os benefícios que resultarão dessa imprescindível obra, pela execução da qual a cidade de Santos renderá graças ao Governo do Estado". Relatório da Diretoria, 1899.

[74] Correio Paulistano, 28 de outubro de 1903.

[75] Correio Paulistano, 30 de outubro de 1903.