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O "Diamante de Porter" em estudo exploratório multicaso no setor pesqueiro exportador de Santos
João Ribeiro Natário Neto
2.7 Aglomerados/Clusters
Muitas das vantagens competitivas duradouras num mundo globalizado dependem de fatores locais, sendo que o agrupamento ou aglomeração de empresas, indústrias ou setores rivais sobre uma determinada região gera condições propícias para a criação e multiplicação de fatores especializados ou adiantados, além daqueles tradicionais (PORTER, 1993).
A competição global vem forçando a reestruturação das economias nacionais em clusters, entendidos, na sua forma mais genérica e simples, como agrupamentos ou aglomerações de empresas que operam em áreas com ramos de atividades afins, que podem envolver poucas ou muitas empresas, competitivas na localidade e internacionalmente, nos mercados competitivos.
Essa aglomeração pode ser de empresas de grande porte, médio ou pequeno, ou ainda somente com pequenas e médias, que pressionam autoridades municipais, estaduais e federais para direcionar políticas públicas, visando eliminar obstáculos e entraves ao desenvolvimento e crescimento econômico em determinadas regiões, para atingir a competitividade diante da globalização e dos blocos comerciais.
Para Kotler (1997), cluster industrial é um grupo de segmentos industriais que compartilham encadeamentos verticais e horizontais positivos, que abrange a indústria central e as relacionadas e de apoio. Encadeamentos verticais são os relacionamentos entre a indústria central e as de apoio, e os horizontais são os elos entre a indústria focal e outras indústrias que têm complementariedades com a indústria central em tecnologia e ou marketing.
Para Porter (1993), um cluster industrial é um conjunto de indústrias relacionadas através de relacionamentos nas cadeias comprador/fornecedor e fornecedor/comprador, ou por tecnologias comuns, ou canais de distribuição, ou postos de trabalho.
No relatório do Boosting Innovation: The Cluster Approach (1999) - "Focus Group on Cluster Mapping and Cluster Policy" da OCDE, clusters são definidos como redes de produção de empresas fortemente interdependentes (incluindo fornecedores especializados) ligadas entre si numa cadeia de produção de valor.
Os clusters também podem fazer parcerias com empresas e universidades, institutos de pesquisa, escolas técnicas, agentes de interface (assessores, agentes comerciais, corretores, consultores) e clientes.
Em Bologna, no 2000 SME Conference Business Symposium, os clusters foram definidos em quatro tipos (quadro 1):
1. Micro cluster ou local - é um conjunto geograficamente próximo de empresas e instituições, inter-relacionadas por elementos comuns e complementares, atuando em uma atividade comum (no mesmo ramo ou no mesmo segmento de um setor). Essas empresas simultaneamente são concorrentes e são capazes de cooperar entre si, e com isto aumentam a competitividade local. Exemplo: distritos industriais italianos, em que o foco para um leque reduzido de atividades ou de segmentos de atividades é uma característica-chave.
2. Cluster industrial ou cluster - é um conjunto de empresas inter-relacionadas, de fornecedores especializados, de prestadores de serviços, de empresas pertencentes a indústrias relacionadas e de instituições associadas (desde universidades a centros de certificação de qualidade e a associações comerciais) que desenvolvem a sua atividade em ramos de atividades diferentes, recorrendo a tecnologias distintas mas complementares, e que pela inovação que umas geram se concretizam benefícios para as outras, todas se beneficiam da melhoria na competitividade.
3. Cluster regional - É na essência um cluster industrial cujas articulações principais funcionam em um determinado espaço geográfico regional. Essas articulações podem repetir-se total ou parcialmente em outras regiões do País, próximas geograficamente, cuja dinâmica de interação poderá levar a competitividade e a inovação a todo o conjunto.
4. Mega cluster - é um conjunto de atividades distintas, mas cujos bens ou serviços satisfazem a procura de uma mesma grande Área Funcional da Procura Final, recorrendo às competências básicas complementares que podem explorar vantagens de interligação e articulação em rede, entre si e com outras entidades, destacando as que permitem acumulação do "capital imaterial" para o conjunto das empresas envolvidas.
Os clusters estão focados na existência dos conhecimentos e saberes que permeiam as várias indústrias e atividades. Esses conhecimentos e saberes podem ser estendidos, como um facilitador, aos trabalhadores qualificados, às relações com fornecedores e com empresas em indústrias relacionadas, às instituições ligadas à ciência e à tecnologia, e são cada vez mais importantes para a competição.
CLUSTERS |
PRINCIPAL UTILIDADE PARA INOVAÇÃO |
MICRO OU LOCAL |
Identificar as necessidades de inovação para manter a competitividade no seu atual perfil de produtos e/ou iniciar uma exploração de atividades conexas adaptadas as competências básicas existentes |
INDUSTRIAL |
Identificar as oportunidades de especialização, expansão e densificação de atividades e complementariedades no interior do cluster, deslocar o seu centro de gravidade para atividades menos susceptíveis à concorrência de economias emergentes ou a eventuais decisões de deslocalização de operadores empresariais com um papel chave no cluster; identificar atividades emergentes que possam ter vantagem na clusterização. |
REGIONAL |
Identificar as possibilidades de um maior aproveitamento das economias de aglomeração nos clusters mais enraizados numa região; identificar as oportunidades de diversificação a partir das competências básicas e da exploração da sinergia entre dois ou mais clusters regionais. |
MEGA |
Identificar a posição do país ou da região no conjunto
de atividades que materializam uma dada área funcional, facilitando o diálogo entre os atores empresariais, o Estado, as universidades e institutos tecnológicos sobre eventuais concentrações de esforços para reforçar posições numa área funcional com procura dinâmica e/ou para ascender na cadeia de valor e enriquecer a presença já existente numa área funcional. |
Quadro 1: Programa Integrado de Apoio à Inovação - Proinov - Julho/2001 Fonte: Adaptado do Departamento de Prospectiva e Planejamento (DPP) - Portugal (2002)
A educação e qualificação profissional de baixo nível, as insuficiências tecnológicas, as dificuldades para obtenção de crédito/capital, o subdesenvolvimento das instituições e as políticas públicas são fatores que retardam o desenvolvimento de aglomerados em países em desenvolvimento, como o Brasil, e não permitem a evolução para uma economia avançada.
O setor pesqueiro não consegue formar aglomerado na RMBS, quer pela escassez de recursos, quer por falta de investimentos, quer pela utilização de tecnologia tradicional e deficiente - que opera com maior número de empregados, cujos níveis educacionais e de qualificação são considerados baixos -, quer pela falta de competências, pesquisas, de escolas, institutos e universidades parceiras, quer pela fraca presença de associações e sindicato na vida política da Região, e pela dificuldade e lastro para utilizar de linhas de crédito.
"Nas economias em desenvolvimento, a formação de aglomerados é inibida pelo baixo nível de educação e de qualificação do pessoal local, pelas deficiências tecnológicas, pela falta de acesso ao capital e pelo subdesenvolvimento das instituições. Às vezes, as políticas governamentais também atuam contra a formação dos aglomerados. As restrições relativas à localização industrial e aos subsídios provocam uma dispersão artificial das empresas. Os currículos das universidades e das escolas técnicas, estabelecidos por órgãos centrais, não se adaptam às necessidades dos aglomerados. Finalmente, protegidas da competição, as empresas se envolvem em comportamentos monopolistas que retardam ainda mais o desenvolvimento dos aglomerados." (PORTER, 1999, p.245)
Para Porter (1999, p.248) a escassez dos aglomerados nos países em desenvolvimento não os impedem de competir, porém os impedem de aumentar a produtividade e o aprimoramento. As exportações crescerão durante algum tempo, com base no baixo custo da mão-de-obra local e na exploração de recursos naturais com tecnologia importada, porém de forma restritiva, porque não será possível aumentar a produtividade e o valor do produto.
"Para melhorar os lucros, os salários e o padrão de vida, o desafio, ao longo do tempo, consiste em elevar a produtividade e aumentar o valor dos produtos. Para permitir que uma localidade se torne mais produtiva, desenvolva a capacidade local de melhorar processos e produtos e, em última instância, promova a inovação, é fundamental que, gradualmente, se desenvolvam os aglomerados. Do contrário, não será possível contrabalançar a tendência natural de aumento dos custos locais ao longo do tempo; e outras localidades com custos dos fatores mais baixos, ou maiores subsídios, assumirão a produção. Assim, a ampliação e o aprofundamento bem sucedido dos aglomerados são essenciais para o êxito do processo de desenvolvimento econômico."
Segundo Schmitz (1997), a formação de clusters não garante crescimento e competitividade, ganhos econômicos de forma automática, mas é apenas um facilitador para se atingir esses objetivos, através da divisão do trabalho e especialização entre os pequenos produtores; surgimento de fornecedores de matérias-primas ou componentes, bem como de máquinas novas e usadas; serviços de manutenção; aparecimento de agentes comerciais para o mercado interno e externo; surgimento de prestadores de serviços especializados como contábil, financeiros, técnicos e de mercado; aparecimento de um grupo de trabalhadores com habilidades setoriais específicas; ação conjunta dos produtores locais.
As empresas que fazem parte do cluster possuem menores custos no acesso a informações, maior freqüência e estabilidade nas transações, bem como importantes relações informais, criando um ambiente de menor incerteza nos investimentos em ativos específicos, fundamentais para o aumento da eficiência econômica dos produtores, fazendo com que cada um que pertence ao cluster se beneficie de economias externas de forma mais eficiente do que um produtor semelhante que esteja fora do cluster (SCHMITZ, 1997).
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