NOTÍCIAS 2002
Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro
Resenha/comentário de livro
João Ribeiro Natário Neto (*)
Colaborador
Título da obra: |
Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro |
|
Autor: |
Morin, Edgar |
Editora: |
Cortez |
Local/Ano da publicação: |
São Paulo/SP, 2000 |
Número de páginas: |
118 |
Este livro de Morin parece ser o irmão gêmeo, mais velho, do
livro A Cabeça Bem Feita, do próprio autor, porque, também, está centrado principalmente
no ser humano, na educação e na reforma do pensamento. Os sete saberes são os sete capítulos do livro, que abordam:
1) as cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão;
2) os princípios do conhecimento pertinente;
3) ensinar a condição humana;
4) ensinar a identidade terrena;
5) enfrentar as incertezas;
6) ensinar a compreensão; e
7) a ética do gênero humano.
A seguir, resumimos e comentamos os principais tópicos, idéias e conceitos.
Todos os indivíduos conhecem, pensam e agem de acordo com os paradigmas inscritos
culturalmente neles. Além dos paradigmas e modelos explicativos, existe o determinismo de convicções e crenças, impondo a todos os
elementos de uma sociedade a força do sagrado, do dogma e do tabu, com poder imperativo e proibitivo, determinando idéias, crenças
aceitas sem exame e contestação, fazendo reinar o conformismo cognitivo e intelectual.
Portanto, precisamos desenvolver uma nova geração de teorias abertas, racionais, críticas,
reflexivas, prontas para se auto-reformar, encontrar metapontos de vista, o que só pode ocorrer com a ajuda de idéias complexas em
cooperação com as próprias mentes, e da criação de paradigma do conhecimento complexo.
Paradigmas - A verdade e o erro também estão presentes nos paradigmas das teorias e
isso deve ser considerado pela Educação. O paradigma permeia qualquer teoria, doutrina ou ideologia; é inconsciente, mas irriga o
consciente e o controla.
O paradigma complexo, que ainda não está presente na cultura científica, refere-se à
implicação/distinção/conjunção que permitirá a concepção de homem/natureza.
O paradigma cartesiano separa o sujeito e o objeto; de um lado, a filosofia e a
pesquisa reflexiva, e de outro lado, a ciência e a pesquisa objetiva, cuja dissociação está presente em todo o universo:
sujeito/objeto; alma/corpo; espírito/matéria; qualidade/quantidade; finalidade/causalidade; sentido/razão; liberdade/determinismo;
existência/essência. Um paradigma pode ao mesmo tempo elucidar e cegar, revelar e ocultar, esconder a verdade e o erro.
A Educação deve se dedicar à identificação da origem dos erros, das ilusões e cegueiras. A
racionalidade é a melhor proteção contra o erro e a ilusão. A verdadeira racionalidade é teórica, crítica e autocrítica.
Erro e ilusão - No século XXI, o ser humano não pode ser cobaia de más idéias e de
suas mentiras, e o dever da Educação será armar cada um de recursos para luta vital em busca da lucidez; necessitamos tomar
consciência do id e do ego e é preciso estar sempre alerta para detectar a mentira. As possibilidades de erro e ilusão
são inúmeras e permanentes, gerando sofrimento e desacertos históricos; por isso, o problema cognitivo é de importância
antropológica, política, social e histórica.
O mundo é o atual contexto do conhecimento político, econômico, antropológico, ecológico
etc., que é uma necessidade intelectual e vital; vivemos a era planetária, onde o nosso maior problema é ter acesso às informações
mundiais, articulá-las e organizá-las.
Como perceber e conceber o Contexto, o Global, o Multidimensional e o Complexo? Só
teremos a resposta educacional adequada com a reforma paradigmática e não programática do pensamento. Existe inadequação
entre os saberes desunidos, divididos, compartimentados por um lado e os problemas multidisciplinares, transversais,
multidimensionais, transnacionais, globais e planetários por outro.
Essa inadequação torna invisível: o contexto, o global (as relações entre o todo e as
partes), o multidimensional (o ser humano é biológico, psíquico, social, afetivo e racional. A sociedade possui dimensões histórica,
econômica, sociológica e religiosa. A economia traz em seu bojo necessidades, desejos e paixões humanas que vão além do aspecto
técnico), o complexo (interdependência e interatividade entre a política, a sociologia, a psicologia, a afetividade e o mito).
A Educação deve favorecer a formulação e a solução de problemas essenciais e estimular o uso
total da inteligência geral, através do exercício da curiosidade, tão presente durante a infância e a adolescência, mas que se
extingue com a instrução. A Educação do futuro deve utilizar os conhecimentos existentes, superar as antinomias (falta de vínculos
entre concidadãos) decorrentes do progresso nos conhecimentos especializados e identificar a falsa racionalidade.
O grande desafio é unir a parte ao todo; a análise à síntese e conjugar todos esses
aspectos, conduzindo à compreensão global. A educação do futuro deverá ser centrada na condição humana, integrando a Filosofia, a
História, a Literatura, as poesias, as artes etc.
Antagonismos - O século XXI será marcado pelo homem complexo antagônico: sábio e
louco; trabalhador e lúdico; empírico e imaginário; econômico e consumista; prosaico e poético. No ser humano, o desenvolvimento do
conhecimento racional, empírico, técnico não anulou o conhecimento simbólico, mítico, mágico ou poético. A Educação deve mostrar o
destino multifacetado do humano, o destino social, individual, histórico; todos entrelaçados e inseparáveis.
A História é criadora e destruidora, os grandes fatos históricos ocorreram, no século XX, de
forma imprevista, como a 1ª Guerra Mundial, revolução comunista, 2ª Guerra Mundial, crise econômica, Guerra Fria, queda do império
soviético e guerra do Golfo. Inventos como a imprensa, bússola, máquina a vapor, cinema, computador etc. foram inovações que
ajudaram o desenvolvimento.
A História não é linear, é feita de turbulências, bifurcações, desvios, êxtases, períodos
de latência seguidos de períodos de virulências, imprevistos, incertezas, evoluções, involuções, progressões, regressões e rupturas.
A incerteza presente na humanidade é o prosseguimento da incerteza do cosmo, e a educação do futuro deve estar voltada para as
incertezas ligadas ao conhecimento.
Os meios para enfrentar a incerteza da ação são dois: a aposta consciente e o uso da
estratégia (exame das certezas e incertezas, as possibilidades e as impossibilidades. O cenário é modificado de acordo com as
situações; às vezes deve-se usar a prudência, às vezes a audácia; se possível, deve-se usar as duas ao mesmo tempo.
A História nos mostra que o impossível se torna possível assim como também o inesperado pode
se realizar. Precisamos esperar o inesperado e trabalhar pelo improvável.
Avanço acelerado - A incompreensão avança de forma mais acelerada - apesar de todos
os avanços na comunicação (telefonia móvel, Internet, fax etc.) - do que a compreensão, que é uma das finalidades da Educação do
futuro, visando garantir a solidariedade intelectual e moral da humanidade.
As duas compreensões são:
a) intelectual ou objetiva (aprender o texto e seu contexto, as partes e o todo, o uno e o
múltiplo, passando pela inteligibilidade e pela explicação);
b) compreensão humana e intersubjetiva (processo que envolve empatia, identificação e
projeção).
Entre os principais obstáculos à compreensão estão: a indiferença; o egocentrismo; o
etnocentrismo, que se colocam como centro do mundo e relegam a segundo plano tudo o que é estranho ou distante, ruído na
transmissão.
A compreensão intelectual encontra vários obstáculos: ruído na transmissão da informação; o
sentido do que é transmitido é entendido de outra forma; a ignorância dos ritos e costumes do outro; incompreensão dos valores
existentes no seio de outra cultura; incompreensão da ética própria da outra cultura; impossibilidade de compreender as idéias
contidas em outra visão do mundo; incompreensão de uma estrutura mental em relação a outra.
O pensamento dominante reduz e simplifica a um único aspecto o conhecimento do complexo. As
incompreensões intelectual, humana, individual, coletiva, são os maiores obstáculos para a melhoria das relações entre indivíduos,
grupos, povos, nações; e, para facilitar a compreensão, existem as vias jurídicas, econômicas, sociais e culturais, mas também é
preciso recorrer às vias intelectuais e éticas.
Kant dizia que a finitude geográfica de nossa Terra impõe a seus habitantes o princípio
de hospitalidade universal, que reconhece ao outro o direito de não ser tratado como inimigo. Temos que ir à busca da hominização na
humanização, pelo acesso à cidadania terrena, por uma comunidade planetária organizada.
(*) João Ribeiro Natário Neto é jornalista e
publicitário em Santos/SP, mestrando em Gestão de Negócios, MBA em Administração com Pesquisa em Comércio Exterior, contador,
relações-públicas, assessor em Câmbio e Comércio exterior, e ex-gerente geral de Câmbio em uma das principais instituições
financeiras do Brasil.
Trabalho apresentado no curso de pós-graduação em Gestão de Negócios - Teoria das
Organizações, orientado pela professora Maria Aparecida Ferreira de Aguiar, na Universidade Católica de Santos (Unisantos).
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