R$ 1,4 MILHÃO O METRO
Túnel bilionário de Alckmin é o mais caro do planeta
O túnel que ligará as cidades de Santos a Guarujá, anunciado
no último dia 11, pelo governador Geraldo Alckmin, custará R$ 1,4 milhão o metro. A cifra é maior do que foi gasto por metro na construção do
Túnel Seikan, no Japão, que tem cerca de 54 quilômetros de extensão - o mais longo do mundo. O túnel do Estuário de Santos terá apenas 900 metros.
Engenheiro afirma que valor é "exagerado", já a Dersa diz que são obras "diferentes".
Imagem: reprodução das
páginas com a matéria
TÚNEL
SANTOS-GUARUJÁ
Dá para ser mais barato, governador?
Carlos Ratton
Depois
de muitas e demoradas discussões, idas e vindas para estudar o traçado e promessas antes, durante e depois de campanhas, finalmente, o governo de
São Paulo definiu: a travessia entre Santos e Guarujá será através de um túnel, que custará R$ 1,3 bilhão e
levará cinco anos para ser entregue. O anúncio foi feito pelo próprio governador do Estado, Geraldo Alckmin, no último dia 11.
Tudo estaria bom senão por um detalhe: o custo
do metro do túnel (R$ 1,4 milhão). Se comparado a outros ao redor do mundo, o bilionário túnel do governador Alckmin já pode ser considerado o
mais caro do planeta, embora na conta do equipamento conste desapropriações, compensações ambientais e demais obras viárias.
O túnel, que ligará
Outeirinhos (Santos) a Vicente de Carvalho (Guarujá) e terá apenas 900 metros de extensão, será composto
por perfis de concreto armado, que serão construídos em terra firme e depois transportados e afundados no traçado da travessia. Pelo túnel
passarão pedestres, bicicletas, motocicletas, carros, ônibus e até mesmo o veículo leve sobre trilhos VLT.
Vale a pena salientar que o túnel será pedagiado,
da mesma forma que é cobrado na balsa e ainda o governo do Estado irá gastar mais R$ 150 milhões para aperfeiçoar a travessia, além dos R$ 63
milhões que já vêm sendo gastos com os novos atracadouros.
Dá para acreditar? O túnel Seikan, no
Japão, tem cerca de 64 quilômetros de extensão e é o mais longo do mundo. O custo de construção do túnel,
com ainda uma ferrovia, foi de R$ 7 bilhões (US$ 4,7 bilhões). Ou seja, o metro deste verdadeiro gigante custou R$ 129,6 mil. Praticamente dez
vezes menos do que o túnel do Alckmin. Se o canal do estuário de Santos tivesse essa extensão, o governador anunciaria uma obra de R$ 75 milhões.
O Eurotúnel, que liga a
Inglaterra à França, com cerca de 50 quilômetros de comprimento e
com mais de 40 metros abaixo do solo do mar, custou pouco mais de R$ 22 bilhões (R$ 440 mil o metro). Ou seja, se uma obra como a do Eurotúnel
fosse feita pelo Governo de necessários R$ 70 bilhões para concluí-la.
Do túnel do Alckmin para a ponte do Serra
- Antes de ter batido o martelo sobre o túnel, o Governo de São Paulo havia anunciado uma ponte estaiada, projeto que, em março de 2010 (ano de
eleição presidencial), teve até maquete "inaugurada" pelo então governador José Serra. O complexo de 4,6 quilômetros iria custar R$ 700 milhões
(R$ 152,2 mil o metro).
Pois bem. A
China inaugurou recentemente a mais longa ponte sobre o mar do mundo, com 42 quilômetros de extensão, na cidade litorânea de Qingdao, ao custo
de R$ 3,6 bilhões (R$ 85,7 mil o metro). Se a ponte anunciada pelo Serra fosse igual à da China, custaria cerca de R$R 6,3 bilhões aos cofres de
São Paulo.
Quer outras comparações? Vamos lá: o complexo de
pontes Seto, no Japão, estende-se por 9,4 km do estreito entre as ilhas de Honshu e
Shikoku e também interliga várias ouras ilhas do mar interior de Seto. A construção das pontes envolveu
um investimento da ordem de cerca de R$ 11 bilhões (US$ 7,4 bilhões).
O Túnel de Base de Lôtschberg (Suíça)
é o maior túnel terrestre do mundo, com cerca de 35 quilômetros, localizado na região dos Alpes. O custo estimado do projeto é de 2,7 bilhões de
euros (R$ 65,9 bilhões).
Exemplo brasileiro - O leitor deve estar
se perguntando: existe um exemplo brasileiro mais barato do que o anunciado pelo governador Geraldo Alckmin? Sim. Um túnel passando por baixo da
baía de Vitória, ligando a capital a Vila Velha, que está sendo planejado pelo governo do Espírito Santo (ES). Dependendo das dimensões, um túnel
pode custar entre R$ 98 mil e R$ 117 mil o metro.
A
"inauguração da maquete" da ponte estaiada Santos/Guarujá pelo ex-governador José Serra, entre os prefeitos Maria Antonieta (Guarujá) e
João Paulo Tavares Papa (Santos)
Foto: arquivo,
publicada com a matéria
Houve exagero, com certeza - O diretor de
Portos, da Associação dos Engenheiros e Arquitetos de Santos, engenheiro Eduardo Lustoza, não tem dúvidas: "Para se compor custo é preciso
projeto. Sem dimensionamentos, análises de solo, nem medições de campo, enfim. Não sei como se chegou a esses números (valores)", disse o diretor.
Baseando-se em empreendimentos semelhantes
feitos no mundo, o engenheiro acredita que o valor anunciado por Alckmin está fora da realidade. "Aparentemente, está exagerado. Trouxemos, na
Associação, um especialista internacional e nessa apresentação houve uma análise de túneis em várias partes do mundo", revela.
O engenheiro explica que antes de se anunciar
valores, é preciso que houvesse comparações técnicas em nível mundial. "Como é que se chuta um valor? No mínimo, é preciso buscar projeções
internacionais e balizar em quem tem experiência. O exemplo do Espírito Santo é razoável", comenta.
Sobre o diâmetro do túnel para acomodar
pedestres, bicicletas, motocicletas, carros, ônibus e até mesmo o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), o engenheiro chamou a atenção sobre a
inclinação do equipamento, que terá que ser muito estudada.
"O declive tem que ser muito suave. Acho
otimista, com todo esse multiuso, o túnel ficar condicionado a 9090 metros. Será preciso alongar esse túnel para comportar o VLT, bicicletas,
enfim. O que posso afirmar é que, comparado com padrões internacionais, esse túnel está caro. É o Custo Brasil", ironizou.
Especialista - Membro do Conselho
Executivo da Associação Internacional de Túneis, o engenheiro Tarcísio Barreto Celestino afirma que o valor anunciado pelo governador pode estar
próximo do real, em função da complexidade do terreno de Santos e região. Ele não se arriscou em valores, mas garantiu que a obra será diferente
da que foi feita na Europa e no Japão.
"Não será um túnel nos moldes do Eurotúnel, por
exemplo. O que será construído na Baixada será imerso e não escavado, o que implica em custos maiores. Tudo em função da geologia diferente
existente na Baixada Santista. Portanto, não posso lhe afirmar, sem um estudo maior, se a obra é cara ou não", revelou.
O especialista conclui alertando que no valor
anunciado por Alckmin devem estar embutidos os custos com rampas de acesso e valas que, segundo ele, tornam a obra onerosa. "Também deve ser
levada em conta a largura do equipamento que, para atender o fluxo de veículos, bicicletas, pessoas e ainda o VLT, terá que ter, no mínimo, 30
metros de diâmetro".
Enquanto túnel não sai do papel, motoristas enfrentam fila quilométrica na hora de atravessar para Santos ou Guarujá
Foto: arquivo,
publicada com a matéria
Dersa - A Assessoria de Imprensa da
Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa) confirma o que disse o especialista, ratificando que não é possível uma comparação direta entre o túnel de
Seikan e o do Eurotúnel com o túnel submerso que ligará o município de Santos com o de Guarujá, pois tratam-se de obras completamente diferentes.
As duas primeiras são obras para a passagem de trens, escavadas em rocha.
Segundo a empresa responsável pela futura obra,
especificamente o túnel de Seikan comporta duas linhas de trem, que para tal é suficiente uma seção transversal de aproximadamente 70 metros
quadrados, sendo sua extensão 53,9 quilômetros, com 23,5 abaixo do nível do mar.
A obra prevista na ligação Santos/Guarujá é uma
obra viária para tráfego de automóveis e caminhões, com três faixas por sentido, estando previsto, ainda, o compartilhamento de uma faixa com a
futura linha do VLT, além de uma célula central para a passagem de pedestres e ciclistas. A seção transversal interna desta estrutura é de 240
metros quadrados, ou seja, 3,4 vezes maior que a estrutura do túnel Seikan, além de uma concepção de obra totalmente diferente.
Ainda conforme a Dersa, para a composição dos
custos da obra foram consideradas todas as demais obras envolvidas, tais como rampas de acesso a serem executadas pelo método "cut and cover"
em paredes diafragma, reformulação do sistema viário do lado de Santos e do lado Guarujá, a implantação de um complexo viário para ligação com a
avenida perimetral, transposição em desnível da Avenida Santos Dumont e ligação com a Avenida Duque de Caxias, permitindo futura ligação com o
aeroporto, Petrobrás e Rodovia Conego Domênico Rangoni.
Finalizando, a empresa explica que a definição
deste tipo de obra se deu em função da geologia local, da urbanização e das limitações geométricas para implantação do empreendimento que tornaram
inviável a implantação de uma obra similar á dos túneis que serviram como comparação.
Comparação rápida |
Túnel entre Santos e Guarujá
(Brasil)
Terá 900 metros
de extensão e custará R$ 1,3 bilhão
(R$ 1,4 milhão o metro) |
Túnel Seikan (Japão)
Tem cerca de 54
quilômetros (54 mil metros) de extensão e é o mais longo do mundo. O custo de construção do túnel com ainda uma ferrovia foi cerca de R$ 7
bilhões
(aproximadamente R$ 129,6 mil o metro) |
O Eurotúnel (Inglaterra/França)
Tem cerca de 50
quilômetros (50 mil metros) de extensão e custou pouco mais de R$ 22 bilhões
(R$ 440 mil o metro) |
A Ponte do Serra (Brasil)
Teria 4,6
quilômetros (quatro mil e seiscentos metros)
e iria custar R$ 700 milhões
(aproximadamente R$ 152,2 mil o metro) |
Ponte de Qingdao
(China)
A mais
longa ponte sobre o mar do mundo, com 42 quilômetros de extensão (42 mil metros) e custou R$ 3,6 bilhões)
(aproximadamente R$ 85,7 mil o metro) |
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Governador Geraldo Alckmin
Foto: arquivo,
publicada com a matéria |