HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS
1929: crise da Bolsa e incineração do café (1)
Até que ponto a grande quebra da Bolsa de
Valores de New York, em 29 de outubro de 1929, afetou os negócios no Brasil? Da mesma forma que 80 anos depois outra crise abalaria a economia mundial,
mas pouco seria sentida em Santos, assim também ocorreu em 1929, quando a pauta de preocupações santistas no aspecto econômico era bem diferente, e já
se manifestava muitos anos antes. Era o declínio na comercialização do café, após o auge verificado em 1922 (quando surgiu a
Bolsa do Café de Santos).
O problema com essa então monocultura cafeeira já se manifestava desde o início
do século, e a crise de 1929 quase nem foi notada na imprensa local, mais interessada na exportação da rubiácia - cujos
problemas levariam ao início em 1931 da queima de montanhas de café, promovida pelo governo numa área junto ao porto
santista. Eis algumas notícias publicadas pelo jornal santista A Tribuna a respeito (ortografia atualizada
nestas transcrições) - a primeira delas estampada como pequena nota na primeira página da edição de terça-feira, 29 de outubro de 1929:
Imagem: reprodução da publicação original
Novamente agitada a Bolsa de Títulos de Nova
York
Mais uma considerável baixa sofrida pelo mercado de títulos - Os prejuízos
são calculados em vários bilhões de dólares
NOVA YORK, 28 - A Bolsa de Títulos esteve bastante
agitada. A situação tornou-se tão séria que os principais banqueiros de Nova York reuniram-se às 13,30 horas no escritório de Morgan e C., para
examinar a situação. A baixa das cotações das principais emissões era de uma quarenta pontos, elevando-se os prejuízos verificados nos valores de
títulos e ações a alguns bilhões de dólares.
Na reunião dos banqueiros foi decidido amparar o
mercado, observando-se em seguida uma rápida e acentuada tendência para a alta. - U.P.
NOVA YORK, 28 - O mercado de títulos sofreu, hoje, uma
nova baixa, registrando-se formidáveis prejuízos, que foram avaliados em vários bilhões de dólares, apesar do apoio dado ao mercado pelo grupo
bancário chefiado por Morgan e cia.
A Bolsa de Títulos experimentou hoje o pior dia de que
há memória, desde a sua existência. Verificou-se uma queda de dez até 60 pontos, abaixo do nível do encerramento de sábado. Os banqueiros, depois de
terem tentado impedir a baixa, pouco depois do meio dia, abandonaram os seus esforços, permitindo que os preços seguissem o seu curso natural. Os
títulos de dez das principais companhias, tendo à frente a General Motor, caíram 1.454.800.500 dólares. - U.P.
(N.E.: UP era a sigla da agência de notícias United Press). |
No dia seguinte, quarta-feira, 30 de outubro de 1929, o noticiário, embora ampliado, já
tinha caído para a terceira página do mesmo jornal:
Imagem: reprodução da publicação original
É grave a situação na
Bolsa de Títulos de Nova York
As cotações, na abertura, baixaram sensivelmente, subindo os prejuízos a
dez bilhões de dólares - Quase no encerramento, porém, começaram a restabelecer-se os preços, com espanto geral
NOVA YORK, 29 - A Bolsa de Títulos abriu com uma baixa
de proporções sem precedentes. Porém, logo a seguir, manifestaram-se os primeiros efeitos do mais poderoso apoio bancário que jamais fora prestado
ao mercado. As cotações estabilizaram-se e chegaram mesmo a verificar-se algumas altas. Mais de 3.250.000 ações foram vendidas nas primeiras horas
de funcionamento do mercado.
A firma corretora Jones J. Bell, não conseguindo
enfrentar os compromissos assumidos, suspendeu as suas transações. É esta a primeira falência de uma casa de corretagens, ocorrida em conseqüência
da crise atual. - U.P.
NOVA YORK, 29 - As vendas na Bolsa de Títulos subiram a
23.596.330 ações, envolvendo prejuízos que foram calculados, aproximadamente, em 10 bilhões de dólares. - U.P.
NOVA YORK, 29 - Os diretores de seis das maiores
instituições financeiras desta praça, com recursos que somam aproximadamente 7 bilhões de dólares, reuniram-se, às primeiras horas de ontem, nos
escritórios do sr. J. P. Morgan, para discutir a situação da Bolsa, em face das últimas baixas das cotações dos títulos. Foi noticiado que nessa
reunião foi deliberado prepararem-se planos de mobilização de toda a potencialidade financeira daquelas instituições, a fim de evitar novos
desastres. - U.P.
NOVA YORK, 29 - Importantíssimos estabelecimentos de
crédito e eminentíssimas personalidades bancárias prestaram o seu concurso para dissipar o pânico causado desde o dia 24 pela baixa dos valores na
Bolsa de Nova York e que teve funda repercussão nos mercados de Chicago, Philadelphia, Montreal, S. Francisco, Nova Orleans e outros.
Os srs. Morgan, Mamout, Mitchell, Wigin, Baker e outros
banqueiros tiveram longa conferência ao meio dia.
O pânico estava à tarde ligeiramente atenuado.
O total das transações, que aliás constituíram um
recorde, foi de 16.410.030 ações nas bolsas de Nova York.
O Conselho do Federal Reserve Bank esteve reunido em
Washington, às 6 horas, para tratar da baixa na Bolsa.
Apesar de não terem sido comunicados ao público os
resultados da reunião, sabe-se que o Conselho reconheceu que a situação econômica do país estava intacta e sã. - H.
(N.E.: H. era a sigla da agência de notícias Havas).
NOVA YORK, 29 - O mercado de títulos, nos últimos três
minutos no maior dia da sua história, no meio do espanto geral, começou a restabelecer os seus preços, em conseqüência dos efeitos causados pelos
milhões de dólares do apoio dado pelos banqueiros e também pelas declarações de confiança dos financistas, depois de um dia inteiro de transações em
baixa sucessiva.
A maioria das cotações fecharam a preços superiores à
baixa mínima de hoje, embora ainda inferiores às quedas de ontem.
Foram vendidas 16.410.050 ações, sendo batido o recorde
em comparação com o dia de quinta-feira, em que atingiram um pouco mais de 12 milhões de ações. - U.P. |
No dia 31 de outubro de 1929, uma quinta-feira, A Tribuna registrava, na página 4:
Imagem: reprodução da publicação original
Grandes prejuízos na Bolsa Holandesa
AMSTERDAM, 30 - Registraram-se, ontem, na Bolsa desta
cidade, grandes prejuízos, tendo quase todas as ações experimentado uma baixa de 50 pontos.
Os entendidos dizem que esta queda foi a maior que se
tem registrado aqui. - U.P. |
Ainda na mesma edição de 31 de outubro de 1929, na última página (que na época era
reservada para as notícias chegadas próximo do fechamento da edição):
Imagem: reprodução da publicação original
Bolsa de Títulos de Nova York
Na abertura, ontem, registrou-se uma ligeira alta
O fechamento deu-se consideravelmente mais alto - O sr. Rockefeller faz
declarações sobre a cotação de títulos - Grandes compras de ações
NOVA YORK, 30 - A maioria dos títulos sul-americanos
sofreu, ontem, uma baixa no mercado desta cidade. Os títulos brasileiros de 6,5%, do empréstimo contraído em 1926, a vencer-se em 1957, fecharam a
80. Os títulos da mesma taxa, do empréstimo contraído em 1927, a vencer-se em 1957, fecharam a 80, registrando-se uma baixa de 2 1/2 pontos.
A maioria dos títulos argentinos declinou 1/4 de ponto.
- U.P.
NOVA YORK, 30 - Esta manhã, à hora da abertura das
vendas na Bolsa de Títulos, registrou-se uma ligeira alta e uma certa melhoria, devido à qual o mercado, que ontem à última hora se encontrava na
mais crítica situação, sentiu um certo alívio, tendo se realizado importantes negócios de compras de valores em blocos de cinco mil a vinte mil
ações, com as cotações melhoradas.
As vendas na primeira meia hora da sessão de hoje
elevaram-se a 1.945.900 ações, em comparação com 3.259.800 no mesmo período de tempo de ontem. - U.P.
NOVA YORK, 30 - Os governadores da Bolsa decidiram que
a abertura do mercado, amanhã, só se fará depois do meio dia.
Em virtude do grande acúmulo de trabalho, a Bolsa não
funcionará sexta-feira e sábado próximo.
As Bolsas de Chicago, Boston e Philadelphia seguirão o
exemplo da de Nova York. - U. P.
NOVA YORK, 30 - O mercado de títulos abriu com alguns
títulos em alta. Os títulos da Electric Bond and Share foram cotados, na abertura, com a alta de 10 5/8, e os da Cities Service também com a alta de
4 1/8. Os títulos da Brazilian Traction perderam 5 1/4 pontos. A firma Lynch Companyh, membros da Bolsa, não podendo enfrentar os seus compromissos,
resolveu abandonar o seu lugar. - U. P.
NOVA YORK, 30 - O mercado de títulos fechou
consideravelmente mais alto, registrando-se grandes compras de ações, que serviram para fazer estacionar a queda. Nos últimos minutos de negócios,
havia sido aparentemente restaurada a confiança. As vendas de hoje atingiram 10.727.320 ações. - U. P.
NOVA YORK, 30 - O sr. Jone D. Rockefeller Seniors
declarou que as condições dos negócios lhe pareciam boas, e que as cotações dos títulos se encontravam demasiado baixas, acrescentando que tanto ele
como seu filho estavam procurando inverter os seus capitais na aquisição de títulos bons. - U. P. |
Mais abaixo, na mesma página final da edição de 31/10/2009:
Imagem: reprodução da publicação original
Os portadores de títulos alemães
descarregam no mercado ações de valores nacionais
Declinam gradualmente as cotações da Bolsa - A situação é de pânico
BERLIM, 30 - Os portadores de títulos alemães, que
especulam nos Estados Unidos, começaram a descarregar no mercado ações de valores nacionais, estando os corretores convencidos de que as vendas são
inevitáveis, devido à urgente necessidade de fundos que sente a Wall Street, a fim de poder enfrentar a liquidação das diferenças provocadas pelos
últimos acontecimentos.
O apreciável aumento de vendas de valores americanos,
nesta capital, dará em resultado uma nova baixa no mercado alemão, que é extraordinariamente sensível, estando já a experimentar os efeitos da
depressão. - U. P.
BERLIM, 30 - As cotações da Bolsa de Títulos
continuaram a declinar gradualmente, mantendo-se a situação de pânico. Os títulos industriais foram os que sofreram maior queda. - U. P.
BERLIM, 30 - Falando na comissão dos orçamentos do
Reichstag, o sr. Hilferding expôs, com otimismo, a situação financeira do governo. - U. P. |
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