III – Malária
b) Diagnósticos etiológicos
No período de 1922 a 1939 as verificações dos casos de malária eram
confirmadas pelo exame de sangue, porém nenhum estudo epidemiológico foi realizado, muito embora houvesse serviço de combate aos mosquitos em geral,
iniciado pouco antes, conforme relatório do dr. Ulisses Barbuda [5],
que diz: "Não alcançamos, ainda, a meta dos nossos desejos de acordo com as bases da campanha
há quatro anos encetada, com a extinção dos focos, porque implicaria isso num saneamento radical da cidade, instrução eficiente do povo a esse
respeito, e intensa propaganda dos recursos com que a população se orienta quanto ao modo de impedir a procriação dos mosquitos"
(... ...) "Do muito conseguido, ainda resta quase tudo por fazer e convencemo-nos disso, no golpe de vista em
que percorreremos a superfície do solo das duas terças partes do perímetro da cidade e encontramo-la cheia de depressões, lagoas, trechos de
córregos, rios, brejos, valas, terrenos baixos etc." [5].
Referindo-se de um modo especial à malária e principalmente ao combate ao
anófeles, o mesmo autor [5]
escreve: "A ninguém será dado refutar a origem do sezonismo, nesta cidade, uma vez que perquira
do estado em que se acha a quase totalidade de superfície não edificada da mesma através de notáveis viveiros de culicídios, pelas suas
consideráveis dimensões".
"Assim ficará provada, sem contestações, a possibilidade do aparecimento de
casos de sezonismo, havendo portadores de germes e transmissores, conforme afirmam os exames de sangue de doentes de residências diversas, da minha
clínica particular e de ilustres clínicos desta cidade que tiveram a gentileza de nos oferecerem as relações juntas, que eloqüentemente vêm
demonstrar o que documentamos e donde se pode concluir que as formas mais comuns de sezonismo na cidade e arredores é a terçã benigna (Plasmodium
vivax)".
"É inadiável, portanto, que se empreguem todos os recursos para emancipar a
cidade dessa calamidade que por si só basta para desmerecer no progresso que vamos observando".
(...) "Dos exames de sangue, para sezonismo, feitos durante o corrente ano em doentes
procedentes da cidade e circunvizinhanças, internados na Santa Casa de Misericórdia, foram positivos 837, conforme informa o seu registro clínico"
[5].
Eis as relações dos casos de malária contidos no trabalho
[3] citado:
Do dr. Ulisses Barbuda: |
Exames de sangue positivos para sezonismo – 1925 |
|
Trav. H. Ablas |
– P. vivax |
Chico de Paula (Saboó) |
– P. vivax |
Ponta da Praia |
– P. vivax |
São Sebastião |
– P. vivax |
(+) São Sebastião |
– P. vivax |
(+) Esteve 3 meses no Cubatão |
|
Do dr. Napoleão La Terza: |
Exames de sangue positivos para sezonismo – 1923 |
|
Ponta da Praia |
– P. vivax |
Santos Dumont |
– P. vivax |
Bertioga |
– P. vivax (+) |
Pensão Atlântica (3 casos) |
– P. vivax |
Juquiá |
– P. vivax (+) |
|
Da clínica hospitalar dos drs. Silvio Lobo Viana e Constâncio
Martins Sampaio: |
Exames de sangue positivos para sezonismo – 1923 |
|
João Macuco 307 |
– P. vivax |
Cap. Mór Aguiar (S. Vicente) |
– P. vivax (+) |
Guaramá – P. Grande (S. Vicente) |
– P. vivax (+) |
São Sebastião |
– P. falciparum (+) |
F. Moóca – Interior |
– P. vivax (+) |
|
Da enfermaria de clínica de crianças – Santa Casa de Misericórdia de
Santos – Chefe de clínica – dr. Ciro Werneck |
Ano 1921 |
|
Procedência |
– P. vivax |
Alemoa |
– 1 caso |
Av. Ana Costa 442 |
– 1 caso |
R. Ângela Macuco 40 |
– 1 caso |
Bacia do Macuco 18 |
– 2 casos |
R. Braz Cubas 200 |
– 2 casos |
Av. Bartolomeu Gusmão 76 |
– 2 casos |
Cubatão (bairro) M. Santos |
– 2 casos (+) |
Conceiçãozinha (M. Guarujá) |
– 2 casos (+) |
Guarujá |
– 3 casos |
Itaipú |
– 1 caso |
Linha Juquiá |
– 1 caso |
R. Luiz Gama 275 |
– 1 caso |
Morro São Bento |
– 1 caso |
Monte Cabrão |
– 1 caso |
Ponta da Praia |
– 1 caso |
Santa Maria |
– 2 casos |
Itapema |
– 1 caso (+) |
Ano de 1922 |
|
R. Alexandre Herculano 227 |
- 3 casos |
Av. Antonio Emmerick 142 (S. V.) |
– 1 caso (+) |
Canal 1 |
– 1 caso |
Av. Cons. Nébias |
– 1 caso |
Fazenda Mocchi |
– 2 casos (+) |
Itapema |
– 1 caso (+) |
Iguape |
– 1 caso (+) |
Matadouro |
– 2 casos |
Praia Grande |
– 1 caso (+) |
R. Princesa Isabel 76 |
– 1 caso |
Peruíbe |
– 1 caso (+) |
Piassaguera (M. Santos) |
– 2 casos |
São Vicente |
– 2 casos (+) |
Ano de 1923 |
|
Morro do Pacheco |
– 1 caso |
Av. Ana Costa 211 |
– 1 caso |
Alemoa |
– 2 casos |
R. Braz Cubas |
– 1 caso |
Bocaina |
– 4 casos (+) |
Bertioga (M. de Santos) |
– 1 caso |
Bacia Macuco 254 |
– 1 caso |
Bacia do Macuco s/nº |
– 1 caso |
Campo Grande |
– 1 caso |
Cubatão (bairro) (M. Santos) |
– 4 casos |
Conceiçãozinha |
– 4 casos (+) |
Canal 1 |
– 1 caso |
Caminho Velho 67 |
– 1 caso |
Cons. Nébias 34 |
– 3 casos |
Sítio Diana |
– 1 caso (falcip.) |
R. Dr. Manoel Tourinho 28 |
– 1 caso |
Guarujá |
– 6 casos (+) |
Itaipu |
– 2 casos (+) |
Icanhema |
– 1 caso |
Itapira |
– 1 caso (+) |
Ilha Barnabé |
– 1 caso |
Itapema |
– 2 casos (+) |
Itanhaém |
– 2 casos (+) |
Juquiá |
– 5 casos (+) |
R. Luiz Gama |
– 1 caso |
Morro Alto (Guarujá) |
– 1 caso (+) |
Praia Grande |
– 5 vivax (+) |
Praia Grande |
– 1 falcip. (+) |
Ponta da Praia |
– 4 casos |
Piassaguera (M. de Santos) |
– 2 casos |
Quilombo |
– 1 caso |
R. Barão de Paranapiacaba |
– 1 caso |
Rio Santi |
– 1 caso |
São Vicente |
– 3 casos (+) |
Sítio Morrão (M. Santos) |
– 2 casos (+) |
Sítio das Neves (M. Santos) |
– 1 caso (+) |
Sítio Ubatuba (M. Santos) |
– 1 caso (+) |
Sítio Rio Branco (M. Santos) |
– 2 casos |
R. Amador Bueno 456 |
– 1 caso |
Sítio Bento Pedro (M. de Santos) |
– 1 caso |
Santa Maria |
– 1 caso (falcip.) |
R. Santos Dumont |
– 1 caso (falcip.) |
R. Senador Feijó |
– 2 casos |
Ilha Barnabé |
– 1 caso |
Vargem Grande (Guarujá) |
– 1 caso (+) |
Viscondessa de Embaré |
– 1 caso |
|
Da clínica civil do dr. Leão de Moura – 1923 |
Exames de sangue positivos para sezonismo |
|
Av. Bartolomeu Gusmão |
– P. vivax |
Av. Bartolomeu Gusmão |
– P. vivax |
Av. Bartolomeu Gusmão |
– P. vivax |
Av. Bartolomeu Gusmão |
– P. vivax |
Av. Cons. Nébias |
– P. vivax |
Av. Cons. Nébias |
– P. vivax |
R. Marechal Pego Jr. |
– P. falciparum |
Porto Tumiaru – São Vicente |
– P. vivax (+) |
Porto Tumiaru – São Vicente |
– P. vivax (+) |
Porto Tumiaru – São Vicente |
– P. vivax (+) |
Porto Tumiaru – São Vicente |
– P. vivax (+) |
R. XV de Novembro |
– P. vivax |
Av. Campos Sales |
– P. vivax |
Av. Ana Costa |
– P. vivax |
(+) Casos importados. |
(.) "O doente J. G.
declara que há mais de dois anos não sai de casa senão para ir ao trabalho, numa garage que fica na Vila Nova, onde desempenha as funções de
lavador de automóveis; os demais passeavam freqüentemente até as praias"
[5].
Ainda no mesmo relatório são encontradas referências sobre o serviço de polícia
de focos:
"... viveiros de
culicídios encontrados em terrenos e ruas em que foram executadas medidas de efeito larvicida." [5].
Infelizmente, esse relatório, contendo dados tão interessantes, valiosos e
ilustrativos de uma época em que se iniciavam os serviços de saúde pública com medidas verdadeiramente úteis de saneamento, omite qualquer
referência às espécies de anofelinos encontradas na cidade de Santos e seus arredores.
Os dados oferecidos pelo autor
[5] foram colhidos no Laboratório da Santa
Casa de Misericórdia de Santos, onde trabalharam os drs. Napoleão La Terza e S. A. Leão de Moura.
Anteriormente, outros médicos exerceram atividades de laboratório na Santa Casa
e na cidade de Santos, como José Dias de Morais, hoje dedicado a outras atividades médicas. Infelizmente, este último nenhum dado guardou em seu
arquivo, que na atualidade seria de valor inestimável.
Prosseguindo nas pesquisas sobre o passado malárico da cidade de Santos, novas
contribuições foram obtidas no arquivo particular do Laboratório de Análises Clínicas do dr. S. A. Leão de Moura, que registra doentes a partir de
1923, conforme se vê no quadro nº 3:
QUADRO Nº 3:
Casos de malária identificados pelo
Laboratório de Análises Clínicas do dr. Leão de
Moura |
Ano |
P.vivax |
P.falciparum |
Ass. |
1923 |
4 |
0 |
|
1924 |
2 |
0 |
|
1925 |
7 |
1 |
|
1926 |
8 |
0 |
|
1927 |
14 |
0 |
|
1928 |
9 |
0 |
|
1929 |
4 |
0 |
|
1930 |
10 |
0 |
|
1931 |
12 |
0 |
|
1932 |
5 |
0 |
|
1933 |
8 |
0 |
|
1934 |
2 |
0 |
|
1935 |
6 |
0 |
|
1936 |
21 |
1 |
|
1937 |
29 |
0 |
|
1938 |
21 |
0 |
|
1939 |
20 |
2 |
|
1940 |
102 |
0 |
|
1941 |
91 |
12 |
|
1942 |
20 |
1 |
|
1943 |
15 |
3 |
|
1944 |
14 |
1 |
1 |
Preciosas informações poderiam ser colhidas e joeiradas no arquivo da vetusta
Santa Casa de Misericórdia de Santos, não só nos registros clínicos como do seu Laboratório de Análises Clínicas.
Infelizmente, não foi dada esta sorte aos autores desta publicação quando
bateram às suas portas, pois uma de suas administrações, desconhecendo o valor inestimável que representariam, para a geração presente e futuras, os
arquivos clínicos e de análises, mandou destruí-los para desocupar espaço! Coisas de administrações leigas.
Em 1931 Alcides Prado [6]
refere-se à Ponta da Praia como bairro onde a malária grassa com certa intensidade:
"...
tive ocasião de verificar o seguinte: Ao longo das avenidas Epitácio Pessoa e Rei Alberto, existem numerosas habitações, todas pequenas, modestas.
Seus quintais são enormes e se estendem para os fundos. Há, aí, hortas e plantações de bananeiras. Como o terreno é baixo e de natureza alagadiça,
foram construídas valas para sua dessecação. Todas essas valas, construídas para fins de agricultura, não obedecem às regras de saneamento; não
tendo largura nem declividade uniforme, além de outros defeitos, retêm água em seu interior. Exceção feita das valas marginais às avenidas,
construídas pelo Serviço de Profilaxia local, e onde as águas correm normalmente, todas as outras constituem ótimos criadouros de mosquitos.
Numerosas foram as larvas de anofelinos, pequenas e grandes, apanhadas por mim nas valas dos bananais".
Com referência ao exame da população, esse autor
[6]
nos diz: "... passei a examinar um certo número de pessoas, com o resultado seguinte: Casos
de febre – Entre 100 pessoas examinadas apenas duas se achavam febris. Formas da doença – Alguns corados de sangue, revelaram a presença
do Plasmodium vivax e do Plasmodium falciparum."
O índice de baço, relativo a 100 pessoas examinadas, nos dá o seguinte quadro:
Classe de idades |
Baço 0 |
Baço 1 |
Baço 2 |
Baço 3 |
Baço 4 |
-1 |
3 |
2 |
0 |
0 |
0 |
5 - 9 |
29 |
6 |
1 |
0 |
0 |
2 - 4 |
13 |
4 |
0 |
0 |
0 |
15 -14 |
19 |
5 |
3 |
2 |
0 |
15- 19 |
7 |
2 |
0 |
0 |
0 |
20 -49 |
4 |
0 |
0 |
0 |
0 |
+50 |
1 |
0 |
0 |
0 |
0 |
Total |
75 |
19 |
4 |
2 |
0 |
N.E.: SIC. Notado que a soma da
coluna Baço 0 deveria ser 76.
Notadas as discrepâncias de ordem e numeração na coluna Classe de idades |
Sobre os focos larvários encontrados na sua inspeção, o autor
[6]
apresenta Anoplheles (Nyssorhynchus) tarsimaculatus de Goeldi e Anopheles (Anopheles) maculipes, Theobald.
Em outro relatório do mesmo ano, da Seção de Moscas, Mosquitos e Ratos de
Santos [7], apresentado em novembro, encontramos algumas referências à
malária, aqui transcritas ipsis litteris. "A turma de malária:
para não distrair a atuação das turmas de profilaxia da febre amarela, empregando-a em outros serviços, propomos a criação de uma turma de malária
composta de 10 homens".
Possivelmente esses 10 homens devem ter sido contratados, se é que o foram,
para pesquisas especiais e destruição de focos larvários de anofelinos, visto como as turmas do saneamento anti-amarílico pesquisavam focos de
stegomyia e destruíam-nos, empregando uma rotina de serviço bem diversa da malária, pela própria natureza dos focos.
Lamentavelmente, no relatório citado
[7]
não se encontram dados referentes aos resultados dos trabalhos dessa turma especializada.
Neste mesmo relatório [7]
há um esboço para a organização do Serviço de Malária [8]. Criava os
Postos de Malária de São Vicente, Guarujá, Prainha, Serviço Itinerante da Estrada de Ferro Sorocabana, ramal Santos-Juquiá, além dos Postos de
Malária da Ponta da Praia, com 2 microscopistas, 2 enfermeiros e 15 trabalhadores; e os Postos do Cubatão e da Bocaina.
No mesmo esboço se acha uma sugestão para a organização de dois Hospitais
Regionais de Malária: um em Iguape e outro em São Sebastião.
No mesmo ano, em dezembro, o relatório da Delegacia de Saúde de Santos traz:
"Inspeção preliminar sobre a malária em Santos", realizado por Moura
Gogliano [9] que nos oferece dados interessantes:
A inspeção foi realizada nos terrenos situados além do canal VI e que terminam
no mar. Foram examinadas 2.861 pessoas. Os resultados obtidos na inspeção foram os seguintes: número de casas, 547; número de habitantes, 2.861.
Idades: 0 a 1 ano, 124; 2 a 10 anos, 846; 11 a 20 anos, 517; 21 a 49 anos, 1.179; mais de 50 anos, 195. Impaludados (+) 735. Com febre há menos de
12 meses, 559. Índice de febre: 22,7. Índice de baço: idades 2 a 10 anos, 11,7%; 2 a 15 anos, 12,5%; geral 7,1%.
O que esse autor chama Impaludados (+) possivelmente são aqueles que
relataram passado malárico, visto como diz textualmente "infelizmente não se pôde verificar
o índice parasitário, por motivos fáceis de compreender. Parece que, geralmente, são os acessos de terçã benigna, e pelo menos clinicamente o são".
"... a interpretação destes dados não é muito fácil, dada a situação particular desta região.
Não se trata de uma zona rural, onde uma população, entregue a si mesma, apresenta em um dado momento os dados epidemiológicos acima com vestígios
de uma epidemia que por ela tivesse passado ou uma endemia que a venha assolando".
A parte da cidade em que se realizou a inspeção preliminar foi dividida em 3
zonas: a 1ª zona foi fixada entre a Av. Rei Alberto e a Ponta da Praia, indo até o mar; a 2ª zona, entre a Av. Rei Alberto e o Canal VI (Av.
Montenegro); a 3ª zona, até o Canal V e acima da Av. Pedro Lessa.
O autor da inspeção chama a atenção para o fato seguinte: "é
pois de suspeitar que a endemia exista há mais tempo na Ponta da Praia (1ª zona) e só recentemente vem se infiltrando nas outras zonas".
Infelizmente só encontrou um foco de anófeles, de cuja espécie não dá a
determinação.
No ano de 1933, no Serviço de Moscas, Mosquitos e Ratos de Santos
[10], procurou-se obter a notificação dos casos de malária, havendo-se, para
tanto, distribuído entre os clínicos da cidade cartões de notificação.
O seu inspetor chefe relata: "Houve
notificações de casos de malária em pontos situados no centro residencial da cidade como Rua Goiás, onde foi encontrado o foco gerador numa lagoa na
Rua Paraguai; na Rua Marechal Hermes, onde foram localizados focos geradores em quatro grandes lagoas, entre as ruas Osvaldo Cruz, Professor Torres
Homem, Marechal Hermes e Afonso Pena.
"As demais notificações provieram dos bairros do Marapé e Nova Cintra. No
bairro de Nova Cintra encontrou-se um grande foco gerador na Lagoa da Saúde. Os focos do Marapé originaram-se no represamento das águas para cultura
de hortaliças".
E mais:
"No
decorrer do ano, foram encontrados os seguintes focos de anofelinos:
Cidade |
– 30 focos |
Morros |
– 21 focos |
Ponta da Praia |
– 12 focos |
Marapé |
– 84 focos |
Saboó-Chico de Paula |
– 61 focos |
Nova Cintra |
– 86 focos" |
Infelizmente, trabalho tão circunstanciado deixa de oferecer a inestimável
contribuição da identificação das espécies das larvas colhidas nesses 294 focos larvários citados.
Em relatório de 1934, A. Leal [11]
oferece 20 casos de malária, ocorridos na Ponta da Praia entre junho de 1933 e maio de 1934. Dez deles (ou 50%) eram infecções primárias.
Quanto ao número de focos larvários encontrados, o autor declara terem sido em
pequeno número; liga este fato à possibilidade da malária ser originária dos focos de anofelinos existentes na ilha fronteiriça de Santo Amaro, onde
existiam na ocasião numerosos doentes e onde foram encontrados não só os focos como capturados os insetos adultos.
Infelizmente, esse autor não dá notícias das espécies de Plasmódios
diagnosticados nos doentes, nem as espécies de anofelinos capturados em estado adulto, ou larvar.
No relatório de 1935 da mesma seção de Moscas, Mosquitos e Ratos,
Carvalho Franco [12], não se encontram referências detalhadas sobre a
presença dos vetores da malária em Santos; apenas no quadro gráfico que ilustra o seu trabalho pôde ser vista a representação de 120 focos larvários
colhidos entre janeiro e 31 de outubro de 1934.
Daí por diante, informações especiais são obtidas sobre a malária em Santos em
virtude da criação da Inspetoria do Impaludismo.
Em 1937, Neckyr Teles [13]
se refere à Ponta da Praia, onde foram matriculados naquele ano:
48 casos de malária
autóctones da zona urbana,
31 casos de malária
autóctones da zona rural e
42 casos de malária
importados.
Desses 121, apenas 33 eram infecções primárias.
Dá-nos também um quadro interessante referente à colheita de sangue em 238
escolares.
Desses, acusaram malária 72, assim distribuídos pelos diversos anos:
1926 –
1
1928 –
2
1929 –
1
1931 –
2
1933 –
1
1934 –
8
1935 –
41
1936 –
16
"O exame de sangue colhido
em gota espessa denunciou apenas 1 portador de esquizontes de P. vivax".
"A pesquisa de esplenomegalia entre os mesmos foi negativa".
Com relação aos transmissores, o autor informa: "Realizamos,
por vários dias, nesse local, capturas de alados em estábulos próximos às avenidas Rei Alberto e Epitácio Pessoa. O número de exemplares de
mosquitos transmissores capturados foi relativamente abundante, no total de 460".
As espécies de alados identificados foram:
Arribalzagaia
intermedius 218
A. (N.)
tarsimaculatus 6
Encontrou também um foco do A. (N.) tarsimaculatus com 2 larvas.
Os dados estatísticos sobre a incidência da malária na cidade de Santos por nós
colhidos até 1940 são deficientes e imprecisos na sua maioria. Muitos remontam a época em que nenhum valor se dava à Ciência, e os interesses do
cidadão se restringiam ao que lhe trouxesse utilidade ou resultado imediatos, pouco se preocupando com obras, projetos, de resultados remotos.
Os primeiros passos para o saneamento de Santos foram iniciados em 1893 com a
criação da Comissão de Desinfecção, mais tarde Comissão Sanitária. Até então, nunca se pensou em pôr cobro às endemias devastadoras reinantes;
bastava acudir aos pestosos, tíficos, impaludados etc., consolando-os e, quase sempre, enterrando-os nas valas comuns da indigência. Os números
estatísticos que compilamos, pelo menos os referentes à malária, são, até 1923, destituídos de base para o diagnóstico parasitário da doença.
Os dados anteriores a 1920 não se referem à morbilidade, mas à mortalidade pela
malária, o que nos faz supor que a primeira fosse sempre constante e elevada.
É de crer que boa porcentagem desses óbitos que apresentam como causa mortis
tifo-malária, sezões, impaludismo, febres palustres, febres de mau caráter etc. Tenham tido outra etiologia.
Não resta dúvida, porém, que a cidade de Santos, pela configuração geográfica
do solo e condições climatológicas, tenha sido sempre assolada pelos surtos periódicos de malária, estado endêmico que em épocas remotas deve ter
sido grave. Pouco a pouco, porém, foi melhorando, com o crescimento da cidade, e seu saneamento.
Somente em 1931 se deparam as primeiras medidas tendentes à profilaxia da
malária, com a criação de uma turma de saneamento anti-malárico e um interessante esboço de assistência especializada.
Quanto aos diagnósticos realizados pelos laboratórios, só oferecem o valor
etiológico dos casos; epidemiologicamente, a situação é a mesma até 1939, quando o Serviço de Profilaxia da Malária do Estado de São Paulo, já
senhor de conhecimentos e experiências próprias, começa a funcionar sob regime de trabalho rigorosamente científico. Nessa data foi iniciada a
colheita dos dados para este trabalho. |