Indústrias
a evolução natural que leva da pastorícia e da agricultura á
indústria manufatureira, pode-se dizer que o Brasil, só agora - e isso mesmo graças à proteção de um regime fiscal verdadeiramente tirânico para as
indústrias estrangeiras - entra na fase da produção industrial, a única que constitui, realmente, a riqueza das nações no mundo contemporâneo.
A formação duma indústria manufatureira no Brasil é, a bem dizer, coisa de ontem; de sorte que, a
este respeito, não é dado fazer senão conjeturas para o futuro, assinalando apenas o início prometedor que oferecem os primeiros resultados.
Os recursos naturais do país são aliás uma garantia de futuro; e não é arriscado prever que um dia
virá, e não muito remoto, em que o país se tornará um dos grandes centros manufatureiros do mundo, utilizando especialmente a descomunal força
hidráulica dos seus rios para mover grandes fábricas, em que se transforme toda a matéria-prima do país, até há pouco exportada, quase toda, em
bruto, para o conveniente aproveitamento em fábricas estrangeiras.
Até aqui, a escassez de capitais, de mão-de-obra e de transportes, tem sido a causa do grande
atraso em que se encontra ainda a indústria manufatureira do país; mas, todos os anos, neste último lustro, os capitais têm afluído generosamente, a
imigração se desenvolve sensivelmente e os meios de transporte quase se têm multiplicado - o que, tudo combinado, assegura ao país as melhores
esperanças de um rápido desenvolvimento industrial.
De resto, era natural e perfeitamente conforme às leis de evolução econômica, que esse despertar
para as indústrias só se desse depois que se fizesse a exploração mais rudimentar dos recursos nacionais, isto é, a simples extração das riquezas
que o solo oferece ao primeiro que o procura, sem que fossem necessárias as dispendiosas instalações que requer a indústria manufatureira.
Nesse sentido é que foram, pois, aplicados os primeiros capitais introduzidos no
país; de sorte que o Brasil provia à Europa e aos Estados Unidos a matéria-prima de que necessitam os seus centros industriais, contentando-se com
reimportar, depois, os necessários objetos manufaturados com o seu próprio material.
Era natural, porém, que o país, com os progressos efetuados nos outros ramos da
sua atividade, aspirasse a alguma coisa mais do que ser um simples armazém de matéria bruta para as nações mais adiantadas; era preciso valorizar a
liberalidade da Natureza, a produtividade do solo, pelo esforço e o engenho do homem, aplicado às indústrias. Só assim, pode um país assegurar-se a
independência econômica, que deve ser o complemento necessário da independência política.
Se o despertar do país em geral, para essa independência econômica, só agora
começa a ter um encaminhamento decidido e com probabilidades de continuidade, convém todavia assinalar que as primeiras tentativas de indústria no
Brasil datam de mais dum século.
Já na primeira metade do século XVII, haviam sido fundadas no Rio de Janeiro
algumas fábricas de tecidos, especialmente de algodão, veludo e seda, bordados, cordas, bem como de azeite de peixe, sabões, chapéus de palha,
objeto de louça etc.
Ao seu desenvolvimento, porém, se opunha a política colonial do governo
português, que não via com bons olhos os progressos da sua colônia. Vários decretos e ordenações reais foram assim restringindo ou mesmo extinguindo
essas primeiras manifestações de prosperidade industrial.
Assim é que, em 1730, foi decretada a expulsão de todos os joalheiros dos
distritos de minas, ao que parece, para evitar a confecção local de jóias, o que importava em diminuição das rendas fiscais da metrópole.
Em 1785 foi ordenado que, dentro de dois meses, fossem fechadas todas as
fábricas da colônia, com exceção das de roupas grosseiras de algodão, para os escravos. Alegava a metrópole que a riqueza do país estava nos
recursos do próprio solo, e que era preciso pois desenvolver a agricultura, não a manufatura.
Além destes atos legislativos, contribuía para o estacionamento econômico da
colônia a circunstância de que o governo português proibia a entrada de outros países estrangeiros nos mercados do Brasil, conservando assim um
monopólio asfixiante.
O grande ato de d. João VI, ao transferir a Corte portuguesa para o Brasil,
abrindo os portos brasileiros ao comércio e navegação de todas as nações do mundo (1808), marca, pois, o início do desenvolvimento econômico do
país. Logo em seguida à franquia dos portos, começaram a surgir em diferentes pontos os estabelecimentos manufatureiros que, apesar das suas
pequenas proporções e dos seus processos rudimentares, representam a verdadeira base do Brasil industrial.
Dentro de poucos anos, fundaram-se no Rio de Janeiro fábricas de algodão e seda,
papel, couros, gêneros alimentícios, fundições de metais etc. A agitação política do tempo não era, porém, de molde a favorecer muito o seu
progresso; e ainda as duas primeiras décadas do Império não contribuíram grandemente para o seu desenvolvimento.
Não obstante, já uma porção de indústrias menores – tais como a fabricação de
cigarros e charutos, móveis, velas, tinta de escrever e cordoalha – se haviam então juntado às primeiras.
O ano de 1840, porém, marca uma nova era de expansão econômica, devida à
substituição das primeiras máquinas rudimentares pela máquina a vapor, assim como à introdução de hábeis artífices trazidos da Europa, os quais, não
somente superintendiam as fábricas, mas ainda instruíam os do país.
De todas as indústrias, a que mais se desenvolveu foi, talvez, a de chapéus para
homens; pelo meado do século, havia nada menos de umas 50 fábricas de chapéus. Também a tecelagem de algodão recebeu grande incremento, e a fundição
de metais atingiu considerável importância, não só pelos grandes capitais nela empregados, como pelas importantes encomendas que já recebiam do
governo algumas fábricas. Também a indústria de mobiliário progrediu à sombra da proteção oficial; e, sendo o cavalo o meio normal de transporte, as
indústrias relativas ao ajaezamento ocuparam muitos estabelecimentos.
Passado, porém, o impulso da primeira hora, o progresso industrial foi-se
fazendo lentamente, até que a proclamação da República lhe trouxe um novo despertar. Muitas influências contribuíram para esta nova aceleração de
atividade, mas sobretudo duas foram decisivas; o aumento das pautas alfandegárias, destinado a fornecer rendas com que fazer face ao aumento de
despesas nacionais, determinado pela mudança de governo; e a facilidade de crédito resultante das excessivas emissões de papel-moeda.
A cidade de São Paulo, um dos grandes
centros industriais do país
Foto publicada com o texto, página 333.
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A melhor demonstração do progresso atingido pelas indústrias no Brasil, depois
de proclamada a República, é-nos fornecida pelo resultado do inquérito a que procedeu, em 1907, o Centro Industrial do Brasil.
Dele se depreende, entre outros fatos, que, de 30 importantes artigos, já mais
de três quartas partes eram produzidas no país; a saber: tecidos de algodão, de lã e de seda, preparados de couro, sacos, gravatas de seda,
mobiliário de madeira, louças, calçados, perfumaria, chapéus de cabeça e de sol, charutos e cigarros, flores artificiais, tinta de escrever e de
imprimir, fósforos, malas e baús, luvas, objetos de cerâmica, cordoalha, açúcar, banha e toucinho, biscoitos, cerveja, chocolate e confeitos,
vinagre, carne seca, massas alimentícias, sal, manteiga e queijo. Desses, os únicos artigos cuja importação excedeu a produção nacional foram
tecidos de lã e de seda, perfumarias, vinagre, queijo e manteiga.
Entre os estados, o Distrito Federal ocupa o primeiro lugar como centro
industrial, contando (em 1907) 662 dos 3.120 grandes estabelecimentos manufatureiros do país, e 34.850 dos 149.018 empregados nessa atividade. A
relativa posição dos estados, nesse tempo, é indicada pela seguinte estatística:
Estados |
Número de es- tabelecimentos |
Número de operários |
Capital, contos |
Valor da pro- dução, contos |
Distrito Federal |
662 |
34.850 |
167.120 |
218.345 |
São Paulo |
326 |
24.186 |
127.702 |
118.087 |
Rio Grande do Sul |
314 |
15.426 |
48.206 |
99.779 |
Rio de Janeiro |
207 |
13.632 |
85.795 |
56.002 |
Pernambuco |
118 |
12.042 |
58.724 |
55.206 |
Paraná |
297 |
4.724 |
20.841 |
33.085 |
Minas Gerais |
529 |
9.405 |
26.820 |
31.880 |
Bahia |
78 |
9.964 |
27.643 |
25.078 |
Pará |
54 |
2.539 |
11.483 |
18.203 |
Sergipe |
103 |
3.027 |
14.173 |
14.811 |
Santa Catarina |
163 |
2.102 |
9.674 |
14.144 |
Amazonas |
92 |
1.168 |
5.484 |
13.962 |
Alagoas |
45 |
3.775 |
10.788 |
10.066 |
Maranhão |
18 |
4.545 |
13.245 |
6.840 |
Mato Grosso |
15 |
3.870 |
13.650 |
4.450 |
Paraíba |
42 |
1.461 |
4.984 |
4.388 |
Ceará |
18 |
1.207 |
3.521 |
2.951 |
Piauí |
3 |
355 |
1.311 |
1.193 |
Rio Grande do Norte |
14 |
560 |
1.913 |
1.886 |
Espírito Santo |
4 |
90 |
298 |
579 |
Goiás |
18 |
90 |
180 |
357 |
Total |
3.120 |
149.018 |
653.556 |
731.292 |
Num dos Boletins da Pan American Union, o número de estabelecimentos
manufatureiros, existentes, no fim de 1910, é calculado em 3.400, com 160.000 empregados. Não temos dados mais recentes, que possam ser aceitos com
segurança; mas é evidente que a proporção de aumento tem crescido bastante nestes dois anos, especialmente no Distrito Federal e nos estados de S.
Paulo e Rio Grande do Sul. Quanto ao capital empregado nas diversas indústrias, o inquérito de 1907 assinalava que 359.599:590$, ou 66,24% do
capital total, eram empregados sob a forma de sociedades anônimas.
Distribuindo-as por estados, as mais importantes indústrias do Brasil são as
seguintes:
Alagoas
– tecidos de algodão e açúcar;
Amazonas
– fundições, malas e baús, biscoitos, confeitos, produtos químicos, serrarias;
Bahia
–fiação e tecidos de algodão, preparo do fumo, açúcar e chapéus;
Ceará
– tecidos de algodão;
Distrito
Federal – tecidos de algodão, moinhos de trigo, serrarias, carpintarias, fábricas de calçado, refinações de açúcar, fundições e trabalhos em metais,
material de transporte, cervejarias, móveis e tapeçarias, produtos químicos, bebidas alcoólicas e gasosas, chapéus para homens, chapéus de sol;
Espírito
Santo – tecidos e algodão;
Goiás
– açúcar, manteiga, queijo, bebidas, fumo;
Maranhão
– tecidos de algodão e açúcar; Mato Grosso – mate, extrato de carne, carne seca, açúcar;
Minas
Gerais – tecidos de algodão, manteiga e queijo, fundições e trabalhos em metal, cerveja, couros preparados, moinhos, cerâmica;
Pará
– serrarias, carpintarias, cerveja, cerâmica, fundições e trabalhos em metais, chocolate;
Paraíba
– tecidos de algodão e açúcar;
Paraná
– mate, fósforos, serrarias e carpintarias;
Pernambuco
– açúcar, tecidos de algodão, sabão e velas, cal e cimento, fundições e trabalhos em metais, fumo, refinações de açúcar e produtos químicos;
Piauí
– tecidos de algodão;
Rio
Grande do Norte – sal, tecidos de algodão e açúcar;
Rio
Grande do Sul – carne seca, toucinho, tecidos de lã, couro, vinhos, chapéus, moinhos de trigo, cerveja, fumo, tecidos de algodão, calçado, conservas
de carne e peixe, fundições e trabalhos em metal, sabão, velas, móveis e tapeçarias;
Rio
de Janeiro – tecidos de algodão, açúcar, fósforos, sal, fundições e trabalhos em metal, fumo, construções navais, couros;
Santa
Catarina – mate, toucinho, queijo e manteiga, fundições e trabalhos em metal;
São
Paulo – tecidos de algodão e de juta, moinhos de trigo, fundições e trabalhos em metal, açúcar, calçado, objetos de cerâmica, chapéus, cerveja,
serrarias, carpintarias, fósforos, couro, papel e papelão, vidro e cristal;
Sergipe
– açúcar e tecidos de algodão.
Das 38 indústrias supra-mencionadas, a da tecelagem é, com grande diferença, a
mais importante: ela absorve mais de 40% do capital e 23% do pessoal empregado em todas as indústrias, assim como representou mais de 23% do valor
de produção total.
Estes dados, relativos a 1907, devem ser ainda consideravelmente aumentados para
a atualidade, não sendo exagerado calcular-se em 40% a proporção da indústria de tecelagem no total da produção nacional. De 1900 para cá, máquinas
para essa indústria têm sido adquiridas, num valor de mais de £2.500.000, calculando-se em um milhão o número de fusos e em 36.000 o de teares
existentes; as fábricas existentes sobem a cerca de 165 com mais de 50.000 empregados.
As fábricas estão geralmente instaladas em edifícios dum só pavimento, tendo
esta disposição se manifestado tão conveniente que algumas das últimas fábricas de Lancashire têm adotado o mesmo plano.
Só no estado de S. Paulo, as fábricas de tecidos consomem cerca de 14.000
toneladas de algodão em rama, por ano. Com exceção dos tecidos mais finos, feitos com fio superior ao nº 60, muitas fábricas brasileiras estão
fabricando com êxito uma grande variedade de tecidos, tendo algumas obtido esplêndidos resultados com o fio nº 80, em musselinas lisas e bordadas,
fazendas mercerizadas, estamparia etc.
Devido a tais progressos da tecelagem nacional, as importações de tecidos
estrangeiros têm decrescido consideravelmente e, provavelmente, continuarão a decrescer ainda, até desaparecerem quase por completo. "Enviando,
a países que produzem a matéria prima, as suas melhores máquinas e competentes artífices
– diz um dos suplementos sul-americanos do Times de 1911 -, a Europa
criou ao mesmo tempo poderosos núcleos de competência às suas próprias indústrias; e não é de admirar que as suas exportações dum certo número de
produtos tenham de diminuir de ano para ano".
O cônsul britânico em Pernambuco confirmava essas apreensões, no seu relatório
de 1911, assinalando que 75% dos tecidos de algodão mais comuns, vendidos no Recife, são de produção nacional. "As fábricas de tecidos de algodão – continuou o relatório –
surgem em todos os pontos, muitas vezes sob direção estrangeira, com fiadores e tecelões de Lancashire. E uma grande proporção do capital
industrial do país é empregada na indústria, que deixa margem fácil a grandes lucros. Excelente material é empregado, e os últimos modelos e
desenhos ingleses são cuidadosamente copiados. Com os impostos proibitivos sobre os artigos importados, será difícil, para os artigos de Manchester,
a não ser as melhores classes de tecidos, manter, de futuro, a sua posição no Brasil".
Também as outras industrias têxteis revelam prosperidade. Durante o ano de 1910,
as fábricas de tecidos de lã do Rio Grande do Sul aumentaram consideravelmente a sua produção. Em S. Paulo, só um estabelecimento de fiação e
tecelagem de juta aumentou, no mesmo ano, de 10 para 15.000 o número de seus fusos – o que dá para a produção de todo o tecido de juta consumido no
Brasil.
O governo de S. Paulo está, também, estimulando ativamente a indústria da seda,
tendo sido assinado, em fins de 1911, um contrato com os srs. A. Marcondes & Cia., em virtude do qual esta firma se compromete a fundar, dentro dum
ano, um viveiro de amoreiras; instalar, dentro de dois anos, um laboratório para criação de bichos da seda com o fim de fazer distribuição gratuita de
ovos; e ter montada, dentro de três anos, uma fiação e tecelagem de seda.
O governo federal, por sua vez, está autorizado, pelo orçamento de 1912, a distribuir 15 contos de réis em prêmios a criadores de
casulos. A produção de roupas brancas, em geral, em 1907, subiu a mais de seis mil contos, contribuindo o Distrito Federal com mais da metade; e as
importações de fio para tecelagem costumam, presentemente, ir além de sessenta contos de réis.
Depois da fiação e tecelagem do algodão, aparece, em ordem de importância, a
indústria açucareira, que ocupa alguns milhares de instalações, entre grandes usinas, engenhos e engenhocas ou banguês, como são denominados
em Pernambuco, principal centro da indústria de açúcar.
Uma estatística recente acusava a existência de 139 grandes usinas, das quais 46
em Pernambuco, 31 no Rio de Janeiro, 20 em S. Paulo, 15 em Sergipe. Os engenhos e engenhocas são inumeráveis e distribuídos por quase todo o
território da República: só em Pernambuco, contam-se mais de 1.500 banguês.
No artigo desta obra relativo ao açúcar, encontram-se
dados minuciosos sobre o histórico da indústria açucareira e sua presente situação. Basta assinalar aqui que o governo federal, bem como os dos
estados, se acha empenhado em melhorar as condições desta indústria, que era a mais própria do país e que, hoje, devido ao pouco adiantamento nos
processos e maquinismos empregados, não oferece mais os resultados que há de oferecer dentro em breve; isto é, satisfazer inteiramente as
necessidades locais, extinguindo por completo a pequena importação que ainda se faz, e deixando margem para larga exportação de um bom produto, em
vez da relativamente pequena exportação de qualidades inferiores, como se dá atualmente.
Em 1911, a exportação de açúcar do Brasil foi de 36.208 toneladas (22.615 menos
que em 1910) dum valor de 6.132 contos de réis, papel, o que coloca o açúcar no último lugar dos nove principais artigos de exportação do país.
As cervejarias aumentaram continuamente a sua produção, o que corresponde ao
rápido aumento do seu consumo em todo o país, merecendo assinalar-se que o aumento de produção tem sido acompanhado pela melhoria da qualidade.
Os principais centros da indústria são os estados de S. Paulo (segundo a
estatística de 1907, com 55 cervejarias, representando um capital de quase 11.000 contos) e Minas Gerais (36 fábricas, com cerca de 7.500 contos) e
o Distrito Federal (24 fábricas, com cerca de 700 contos). Em fins de 1911, S. Paulo contava 52 fábricas, representando um capital de 17.000 contos
e com uma produção do valor de quase 19.000 contos.
A indústria siderúrgica merece especial referência, não pelo que ela representa
de momento, mas pelo que promete ser o seu futuro, sabido, como é, que o Brasil dispõe dos mais vastos e mais ricos minérios de ferro de todo o
mundo.
Graças aos favores concedidos pelo governo – os quais estão enumerados no
capítulo sobre Recursos Minerais – é de esperar que, dentro de alguns anos, a indústria siderúrgica no Brasil produzirá ao menos o ferro necessário
para trilhos de estradas de ferro e para as obras públicas do país – material esse que entra em parcelas avultadas nas importações do Brasil.
Faz-se, atualmente, um consumo de ferro e aço, no país, superior a 250.000
toneladas – e este consumo só tende a aumentar com o desenvolvimento de construções e obras públicas de toda espécie, que anima o país.
No artigo sobre Recursos Minerais, referimo-nos aos
favores concedidos pelo governo federal, e às facilidades de transporte, por ele providenciadas. Convém assinalar que muitas concessões e
autorizações têm sido dadas, não só pelo governo federal, como pelos estados; mas, como elas datam todas de um ano apenas, e não estão ainda a
funcionar, é impossível, por enquanto, contar com estatísticas a respeito.
Pelo inquérito de 1907, as fundições e outras fábricas para trabalhar em metais,
eram em número de 169, empregando 6.861 operários e 22.964 contos de réis, com uma produção anual do valor de 31.625 contos. Os centros mais
importantes eram o Distrito Federal (43 fábricas), Minas Gerais (30) e S. Paulo (24), sendo,porém, que S. Paulo contribuía com a maior importância
de capital.
Em 1911 – segundo se lê no relatório do cônsul britânico em S. Paulo – o número
de fábricas, neste estado, havia já subido a 38 (um aumento de 14 em 4 anos) com um capital de £808.883 (em comparação com £63.260 em 1907). Convém
dizer, todavia, que quase todos os maquinismos para fundições são ainda importados.
As fábricas de fósforos, as maiores das quais se encontram nos estados do Rio de
Janeiro e S. Paulo, usam, geralmente, madeira do Paraná e Santa Catarina. Em 1907, havia 18 estabelecimentos (dos quais 4 em S. Paulo, 3 em Rio de
Janeiro e Paraná, e 2 no Distrito Federal), empregando 3.969 operários e 17.060 contos, com uma produção do valor de 21.275 contos.
O Distrito Federal é o centro da indústria de moagem do trigo, tendo
contribuído, em 1907, com mais de metade da produção total do país; e de 1907 para cá, esta indústria tem sido ali desenvolvida, tendo-se fundado,
em 1910, um novo moinho. A maior parte do grão é importada da República Argentina. O total dos suprimentos de trigo, em grão, em 1911, foi de
3.112.678 sacos, contra 2.808.139 em 1910.
Em conseqüência do aumento na importação do trigo em grão, tem-se dado uma
sensível diminuição nas importações da farinha de trigo, que vem, principalmente, dos Estados Unidos: assim é que, em 1911, foram importadas 45.041
barricas de farinha, contra 92.153 em 1910.
Os favores e estímulos dos governos para o desenvolvimento da cultura do trigo,
especialmente no Rio Grande do Sul e São Paulo, prometem liberar o Brasil, no futuro, de grande parte dessas importações, alimentando-se os moinhos
do país com o trigo nacional.
Em. S. Paulo, a produção de farinha que, em 1907, foi do valor de menos de 12
mil contos (aproximadamente metade da produção do Distrito Federal), subiu a quase 17 mil contos no ano de 1911.
As serrarias estão distribuídas por todos os estados. As maiores e mais bem
montadas se encontram no Rio de Janeiro e Pará, mas o Paraná é que conta maior número de estabelecimentos: nada menos de 108 dos 196 recenseados em
1907. De então para cá, muitos estabelecimentos se têm aberto e algumas companhias estrangeiras têm sido fundadas para a exploração da riqueza
florestal do Brasil.
Anexa á indústria da serraria, deve ser mencionada a de móveis, que tem assumido
grande desenvolvimento, revelando-se grande desenvolvimento, revelando já grande progresso na confecção de mobiliário. Em 1907, já havia, só no
Distrito Federal, 28 fábricas, em S. Paulo 17, em Minas Gerais 12 – ao todo 85, empregando 2.843 operários e 6.033 contos, com uma produção do valor
de 11.760 contos. Em S. Paulo, esta indústria tem aumentado na proporção de 50%, nos cinco anos de 1907 para cá; e o Rio Grande do Sul, que contava
apenas 6 estabelecimentos em 1907, ocupa hoje o terceiro lugar.
Os centros mais importantes de manufaturas de chapéu são ainda o Distrito
Federal e S. Paulo; só em 1911, este estado produziu artigos no valor de quase 6.900 contos de réis. Vem logo em seguida o Rio Grande do Sul, que,
em 1907, contava 13 fábricas, enquanto S. Paulo contava apenas 12 e o Distrito Federal 15 – do total de 46 (chapéus para homens).
Pernambuco está à frente dos estados produtores de cal e cimento; mas já S.
Paulo começa a fomentar também essa indústria.
As indústrias anexas à pastorícia têm no Rio Grande do Sul o seu mais importante
centro. O couro preparado nos 22 curtumes, ali existentes em 1907, foi avaliado em quase 4.200 contos, dos 11.000 que produziram os 106 curtumes
espalhados por todo o país. Em 1911, a exportação de couros curtidos (não incluindo peles cruas, no valor de quase 10.000 contos) subiu a 34.059
toneladas, no valor de 27.015 contos de réis.
Paralelamente, as fábricas de calçados progridem em todo o país, não só pela
quantidade produzida, como pela qualidade do produto fabricado, sobretudo nos grandes centros industriais. Em 1907, só o Rio de Janeiro produziu
calçado no valor de quase 15.000 contos, o que representava 55% da produção total do país. S. Paulo vinha em segundo lugar, com cerca de 7.000
contos.
Ainda anexa à pastorícia, é a indústria de velas e sabões, disseminada, em 1907,
por todos os estados, com exceção de Mato Grosso. A produção do Rio de Janeiro, porém (11.400 contos), era igual à de todos os estados reunidos.
Há ainda uma pequena indústria de cola, principalmente na Bahia, Minas e Santa
Catarina, cuja produção total não excedia, em 1907, o valor de 80 contos de réis.
De grande importância, entretanto, e com melhores perspectivas para um próximo
futuro, é a preparação de carne, cujo centro é ainda o Rio Grande do Sul. Em 1907, havia ali 24 das 26 charqueadas do país, as quais
empregavam 3.782 operários e 6.277 contos,com uma produção de 38.770 contos. As outras 2 charqueadas estavam estabelecidas em Mato Grosso,
sendo que numa delas se produz grande quantidade de extrato de carne. Produzem também, esses estabelecimentos, grande quantidade de toucinho,
banhas, presunto e conservas de carne, mas não em quantidade bastante para suprir o consumo local, dispensando as importações desses produtos, que
ainda figuram com parcelas muito consideráveis.
A indústria da pesca merece especial referência, pelo enorme futuro que lhe está
reservado. O tenente Frederico Villar, o mais ardente propugnador pelo seu estabelecimento em condições técnicas modernas, acredita mesmo que essa
virá a ser, em poucos anos de exploração racional, a maior riqueza do Brasil. Só agora, porém, é que a atenção dos governos e dos particulares está
se voltando, com verdadeiro interesse, para essa imensa riqueza das infindáveis costas e dos inumeráveis rios do Brasil, umas e outros abandonados
até aqui à pesca rudimentar.
As importações de bacalhau e ouros peixes salgados e em conserva, feitas pelo
Brasil, chegam a ser exorbitantes, quando se pensa na imensa quantidade de peixe de que o país dispõe e que não aproveita. Nestes dois últimos anos,
porém, graças sobretudo à ativa propaganda do comandante Villar, a pesca começa a ser uma verdadeira indústria, com diversas companhias nacionais e
estrangeiras perfeitamente organizadas em bases técnicas, e já funcionando com os mais garantidores resultados financeiros.
No orçamento federal de 1912, estão consignadas várias medidas para o
desenvolvimento e fomento das indústrias da pesca, entre as quais: o estabelecimento de estações de pesca, a formação de viveiros, concessões de
zonas para pescaria, estabelecimento de depósitos, privilégios e vantagens para a importação de navios de pesca etc. E na sua mensagem presidencial
de 1912, o marechal Hermes se referiu à decisão de nomear um inspetor do Departamento de Pesca, fornecendo
outros pormenores sobre a organização do Serviço de Pescarias, sob a superintendência do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio.
Tais são, em resumo, as manifestações mais importantes da atividade industrial
no Brasil. Os algarismos aqui utilizados, geralmente em atraso de alguns anos, não dão, porém, uma exata idéia da presente situação das indústrias
brasileiras, que, justamente nestes quatro ou cinco anos últimos, têm feito o mais rápido progresso.
O aumento, de ano para ano, das entradas de capital estrangeiro, o grande
desenvolvimento da rede ferroviária, os progressos crescentes da imigração e, particularmente, a introdução de novas máquinas aperfeiçoadas e
operários competentes – tais são os principais fatores do presente progresso, que só tem razões para continuar.
Algumas outras indústrias não enumeradas acima – a dos objetos de borracha,
entre outras – têm ainda largo campo para se implantar no país, podendo contar com a mais abundante matéria-prima, à mão. Não há, pois, razão para
descrer do futuro industrial do Brasil, sobretudo quando o carvão existente nos estados meridionais começar a ser devidamente explorado, e quando as
inumeráveis cachoeiras, que interrompem a navegação dos rios, forem utilizadas para a transformação da sua força hidráulica em energia elétrica.
Nesse dia, em que as fábricas possam ser alimentadas com combustível local,
dispensando a enorme importação de carvão de pedra estrangeiro, bastará que a agricultura se desenvolva paralelamente, de modo a fornecer toda a
matéria-prima que o solo dá com facilidade, para que o Brasil adquira a sua perfeita independência econômica, vivendo, não já duma agricultura
rotineira, mas também duma indústria realmente próspera, com vida própria, e não sustentada, um pouco artificialmente, como até aqui, pela proteção
exagerada de tarifas proibitivas.
E não é preciso lembrar que a propriedade das indústrias trará, só por si, uma
proteção eficaz à agricultura, dando a esta mercado seguro e vantajoso – por não acarretar as despesas da exportação em bruto – para os seus
produtos. |