Colheita do café, S. Paulo
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O café
café está quase, ainda, para a atualidade econômica do Brasil, como o ouro do tempo da descoberta e das primeiras explorações estava para os
interesses e preocupações econômicas dos colonizadores.
Absorvendo energias, capitais e atividades, esse produto chamou a si todos os
capitais que se dedicaram à agricultura, formando-se o problema econômico do Brasil sobre a base da monocultura, contra a qual o país luta com
esforços desesperados de seus sucessivos governos para dividir a sua atividade por outros campos de ação e outros ramos do trabalho, em face de uma
terra abençoada que tem mil formas de restituir em resultados centuplicados qualquer trabalho que nela se exercite.
Vasta, fecunda, com quase todos os climas e as variadas produções
correspondentes, essa é bem a terra da qual disse Pedro Vaz Caminha, o cronista da expedição feliz de Pedro Álvares Cabral, em 1500: "Em querendo
aproveitá-la, dar-se-á nela tudo". Entretanto, encontramos nos graus de porcentagem que ocupam os diversos produtos brasileiros, ao lado da
borracha, do cacau, do algodão, da cana-de-açúcar, dos cereais, do arroz, do fumo, do mate etc., o café nas seguintes proporções da exportação:
44,57 de 1839 a 1844 |
45,78 de 1849 a 1854 |
50,65 de 1859 a 1864 |
47,56 de 1869 a 1874 |
56,91 de 1879 a 1884 |
51,04 de 1903 a 1907 |
Ainda mais, os coeficientes de prosperidade dos vários estados demonstram, por
sua vez, como o Brasil ligou estreitamente o seu progresso, a sua evolução econômica, ao café. É assim que, por exemplo, no ano de 1906, foi o
estado de S. Paulo, foco de produção e de exportação do café, o que teve maior receita, avaliada esta em 218.037.000$ contra as do Amazonas e do
Pará, exclusivos produtores do segundo artigo em importância, a borracha, avaliadas respectivamente em 23.727.000$ e 15.395.000$ notando-se que
grande parte dessas receitas é produzida pelos impostos especiais sobre a exportação do café e da borracha.
Outra prova é a que resulta do balanço entre a receita e a despesa de S. Paulo,
em 1906, avaliada esta em 159.452.000$, notando-se que é um dos estados onde os serviços públicos e os melhoramentos mais avultam as somas a serem
gastas. Mais ainda: já em 1906, quando outras culturas se desenvolveram, progredindo, o valor total da exportação brasileira foi de Rs.
860.890:882$000, correndo por conta do café mais de metade, isto é, Rs. 453.780:826$000.
Sob outro ponto de vista, o café concorreu ainda para a diminuição do
significado de imigração. A cultura do café em geral não prende o imigrante ao solo, raramente o radica, promovendo o povoamento. A imigração grande
que provoca é quase totalmente adventícia, mantendo um nível estável pela continuidade e progresso da produção, como se verá mais adiante, quando
entrarmos nos detalhes da cultura do café, em suas relações com o trabalho dos cultivadores.
Um acidente qualquer, uma baixa de produção, tem logo repercussão nos números da
imigração. À falta do trabalho, o imigrante que só vem tirar proveitos do auxílio que presta à lavoura do café, sem intenção alguma de se fixar,
abandonará imediatamente os campos, deixando-os desertos.
Ainda aí encontramos a influência do braço escravo, como fator da malformação do
problema econômico brasileiro. Entregues os fazendeiros à cultura do café, os escravos reuniram todas as qualidades dos colonos; tendo, além de uma
submissão sem limites, o trabalho por muito mais baixo custo, que se cifrava apenas na manutenção.
Além disso, o colono só cultiva o café para o fazendeiro, pela letra de seus
contratos, fazendo pequenas plantações de cereais e de horta nos campos que lhes cedem os fazendeiros para residência provisória. Eles só cultivam
para as suas necessidades de alimentação ou de negócio pessoal, sem que com isso tenha a ver o fazendeiro. O escravo tudo fazia para o senhor, tendo
as regalias na proporção inversa, negativa de seus esforços. Ao lado do café, para cuja cultura difícil os senhores não sentiam o esforço que era
necessário, esses seres humanos mecanizados faziam grandes plantações de cana-de-açúcar, cereais, algodão, para a manutenção ou para novos negócios
do senhor.
A especialidade da terra para esse gênero de cultura, as facilidades do trabalho
gratuito, a exploração de um produto que deixa, mesmo sem essas condições favoráveis, imensas margens de lucro, levaram o café a uma expansão
formidável. A abolição da escravidão transtornou tudo, a subtaneidade desse ato abalou a riqueza dos que foram ou não podiam deixar de ser
imprevidentes, ante os prenúncios do 13 de Maio. Derrocou fortunas, e chegou a arruinar um estado inteiro, o do Rio de Janeiro, que só muito depois
começou a voltar a si da perigosa síncope que o acometera.
Ainda assim, tantos eram os interesses e capitais ligados ao café, tão
visceralmente ele se entranhara na economia nacional, que resistiu e se manteve até os nossos dias como o fator capital do problema econômico
brasileiro, o eixo da produção, a alma matter da exportação do Brasil.
Entretanto, ainda uma circunstância poderia equilibrar até certo ponto o efeito
da monocultura. Esta circunstância reside na espécie do artigo escolhido. Fosse ele o açúcar, o cacau, os cereais, qualquer produto peculiar às
terras brasileiras, mas de inadiável necessidade, as exigências do consumo melhorariam o aspecto das coisas. Mas, infelizmente, o café não está
nesse caso e, embora seja considerado um alimento de poupança, gênero quase de primeira necessidade, carece de uma propaganda especial, não bastando
a simples oferta pela venda.
Ao lado desta, tornou-se necessária a propaganda pelo gosto, pelo incremento do
hábito do café. Desta sorte, o Brasil ficou sendo um país cuja produção essencial é um gênero dispensável, embora rico de qualidades que
avaloram a sua incontestável utilidade.
Observem-se atentamente todos esses fenômenos, junte-se a essas observações uma
certa dose de imprevidência e teremos justificado o convênio de Taubaté, arriscado lance, cartada audaciosa que a pressão das contingências tornou
inadiável, como medida de salvação, mas que, em condições normais, é um verdadeiro contra-senso econômico, porque ele representa a inversão de todos
os princípios de boa economia, inversão sintetizada, como se verá mais adiante, na restrição forçada e violenta da oferta, pela superabundância da
produção, em vez da provocação paulatina e insistente da procura.
Tão bem o compreenderam os estados signatários do convênio, que se apressaram em
tomar providências tais que prevenissem e evitassem a reprodução da crise tremenda acarretada pelo barateamento do café em mercados estrangeiros.
Organizou-se um serviço e propaganda intensa, na Europa, que em geral se ocupava de todos os produtos brasileiros, quando executado por conta do
governo federal, mas que objetivava o café, correndo por conta dos estados de S. Paulo e Minas Gerais, imediato àquele na produção da rubiácea.
Força é confessar, aliás, que essa medida que representava uma solução
artificial, embora a única que o momento exigia, tem dado os melhores resultados não só imediatos como indiretos, pela medida complementar que
acarretou a restituição da sua verdadeira origem ao café brasileiro, cujas melhores qualidades, na Europa, eram anunciadas como de todas as
procedências, menos do Brasil.
Todos os compromissos que o convênio trouxe têm sido cumpridos, não se
justificado os prognósticos dos pessimistas que acolheram o convênio, como aliás era natural, com a desconfiança que inspiram as soluções
artificiais e contrárias aos bons princípios, assumindo, no momento, o papel de medida salvadora do fator mais importante da vida econômica do país.
Esses aspectos e conseqüências do exclusivismo da cultura do café impressionaram
felizmente os homens de governo do país, que empreenderam um trabalho gradual, tendendo para a policultura e que virá resolver, a um tempo, todas as
deficiências e desvios que o país sofreu com a monocultura, exposto aos perigos dessa situação de ligado a um produto só como sua principal fonte de
exportação.
A célebre sugestão de Pedro Vaz Caminha - em querendo aproveitá-la, dar-se-á
nela tudo - constitui hoje, no Brasil, um programa, uma linha de conduta, uma orientação dos governos que não mais se afastarão dessa rota.
O estabelecimento das colônias agrícolas, tentando o colono à fixação por
permitir-lhe a escolha do gênero de cultura que lhe seja familiar e adequado e não impor-lhe uma que lhe é estranha; os prêmios de animação à
implantação de culturas novas, como se dá com a do trigo, a do linho e outras; o estabelecimento de escolas de agricultura, divulgando conhecimentos
agrícolas e criando por assim dizer, no Brasil, para esse ramo da atividade, um caráter de função organizada e profissão generalizável, essas e
muitas outras medidas constituintes de uma enorme série, forçam a deslocação do problema econômico brasileiro dos vícios seculares sobre que se
baseou.
Mas esse trabalho não concorrerá certamente para a decadência da cultura do
café. Haverá apenas o desenvolvimento paralelo de muitas outras, pois muito vastas são as terras que esperam o arado e o suor do esforço do
cultivador, contando escapar à sorte comum dessa monocultura. Ainda está longe de se esgotar a capacidade receptora dos mercados consumidores do
café, que muito mais ainda pode produzir o Brasil, antes que chegue racionalmente à contingência do convênio que foi, como já vimos, a solução
artificial de uma dificuldade que absolutamente não se originou em nenhuma das causas lógicas que, em boa economia, determinam tais crises.
Com todos esses acidentes já enumerados e apesar das condições negativas que se
incorporam ao lado de suas vantagens, o café ainda deixa, em média, 20% de ganho ao capital nele empregado, muito folgadamente. Os lucros que
proporciona exercem os seus benéficos efeitos numa enorme esfera de ação, fonte pródiga e ainda pujante de riquezas e prosperidades. O café ainda é
o ouro negro do Brasil, e a chave fácil do enigma de seu desenvolvimento econômico.
O que é urgente e fatalmente acontecerá é que, sem deixar de prosseguir na
marcha natural de sua evolução, outros produtos de mais primordial necessidade, isto é, oferecendo melhores condições de aquisição, como a própria
borracha, se desenvolvam e evoluam até ocupar o lugar que lhes compete, com números de exportação superiores aos do café.
Para isso converge a atenção dos governos, em medidas tendentes a preparar
esse futuro, como também para esse desideratum se orientam a palavra e o conselho dos espíritos esclarecidos e equilibrados do país,
substituindo progressivamente, sem abalos nem transições bruscas, os termos mal colocados do problema econômico brasileiro, restabelecendo-o sobre
as bases racionais que lhe convêm, termos estes ora empíricos demais, ora totalmente deslocados e na mais completa contradição com as leis fatais
que regem o assunto.
Igualmente a situação privilegiada do café do Brasil, nos mercados consumidores,
concorreu para dar segurança tentadora ao seu maior cultivo e à sua exportação. Com efeito, o Brasil é o maior fornecedor de café do mundo inteiro,
produzindo, ele só, mais café que todos os países que o produzam, reunidos.
Cultivo e preparação do café: 1)
Terreiro de secagem, Fazenda Santa Eugenia; 2) Fazenda perto de Campinas; 3) Engenho de pilagem
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A planta
– A planta do café é do gênero caffea, família das rubiáceas. Esta expressão genérica veio-lhe do nome de uma das regiões da Abissínia,
Caffa, onde a planta foi encontrada, em estado selvagem, numa vegetação exuberante. O cafeeiro divide-se em grande número de espécies.
Entretanto, é limitado a dez que são cultivadas. A espécie arabica L. é, no Brasil, a que mais geralmente se cultiva, notando-se, em uma que
outra cultura, alguns exemplares da espécie Liberica Hiern.
Entre as variedades cultivadas no Brasil contam-se: a do cafeeiro denominado
vulgarmente creoulo, que é o que provém das primeiras plantações que se introduziram no Brasil; o Bourbon, o Java, o
Botucatu ou amarelo, cujos primeiros exemplares foram encontrados no município paulista que lhe deu o nome, em 1871; e o Maragogipe,
encontrado no município baiano de Maragogipe. Há ainda a notar outras variedades, como a do cafeim Goiás, originário do estado brasileiro
deste nome, e a espécie rústica Bourbon-Maragogipe.
Graças aos trabalhos inteligentes e bem orientados do Instituto Agronômico de S.
Paulo, o produto resultante desse cruzamento foi obtido pela fecundação da flor do café Bourbon com o pólen do café Maragogipe. Esse
instituto, onde a agricultura atingiu a mais alta expressão do processo mais moderno e científico de aproveitar a fecundidade da terra, reúne 6.000
pés dessa espécie rústica, continuando sempre em experiências e tentativas para obter cruzamentos novos.
Arbusto de belo aspecto, o pé de café, no Brasil, segundo a variedade a que
pertence, clima e grau de cultura, pode atingir de 2,5 a 5 m; tem o tronco liso e direto, cuja espessura raramente ultrapassa de 10 a 12
centímetros. Do tronco irradiam ramos horizontais ou ligeiramente oblíquos, chegados, que começam a poucos centímetros acima do solo, diminuindo de
comprimento de baixo para cima.
As suas folhas são de um verde escuro e brilhante, opostas, com uma forma
elíptica semelhante à das folhas de loureiro, porém menos espessas e mais flexíveis. Pequenas, brancas, com um aroma que lembra o do jasmim, são as
flores do café. A sua enfloração vai ter à frutificação em frutos verdes, a princípio, amarelos, vermelho-cereja, finalmente, quando maduros,
exceção feita do café Botucatu, cujos frutos amadurecem amarelos, na segunda fase de sua evolução cromática.
Por analogia da cor, chamam-se cerejas aos frutos maduros e cocos
aos secos. O fruto tem um invólucro (epicarpo) que cobre uma polpa (metacarpo ligeiramente açucarada e viscosa, dentro da qual, envoltas ainda por
uma capa (endocarpo) que, seca, toma o aspecto de pergaminho, de que tira o nome, se acham duas favas (albúmem), que constituem os grãos do café e
são justapostas pelas faces planas fendidas longitudinalmente, sendo que cada uma dessas faces é riscada verticalmente por um sulco pronunciado; as
duas favas são cobertas, cada uma, por uma tênue película (texto).
Fugindo a esta regra, acontece, às vezes, que o fruto contenham uma só fava, em
forma elipsoidal, com a fenda descrita no sentido do maior risco. O grão formado desta maneira tem o nome de moka pela sua analogia com o
café dessa procedência. Quanto às dimensões do grão, variáveis, elas estão na relação das espécies originárias, da natureza do solo e também das
variações climatéricas da zona onde nasce.
São bem individualizadas por características evidentes as diferentes variedades
de café do Brasil, distinguindo-os ao simples aspecto. Assim, o cafeeiro crioulo e o cafeeiro Botucatu ou amarelo têm, ambos, a
horizontalidade dos ramos atenuada por uma pequena inclinação para o solo; uma diferencial distingue-os um do outro e consiste na cor do fruto que,
no crioulo, é vermelho e, no Botucatu, amarelo.
A obliqüidade, mais sensível, dos cafeeiros Java e Bourbon,
dirige-se, ao contrário, para cima, bem como os cafeeiros Maragogipe e Liberia. Os dois primeiros distinguem-se, entretanto, dos
outros dois, pelo maior desenvolvimento do arbusto e das folhas. Uma diferencial estabelece características individualizadoras para os dois
primeiros: os brotos do Java são esbranquiçados, ao passo que os do Bourbon são pardos; ainda uma outra diferenciação permite
distinguir o Maragogipe do Libéria: neste, as folhas são mais espessas e naquele os frutos têm a casca muito mais resistente,
característica que dificulta o seu beneficiamento, por meio de máquinas comuns.
Destes tipos, os cafeeiros crioulo, amarelo e Maragogipe
são mais rústicos, resistentes e duráveis do que o Bourbon e o Java, mas, em compensação, as exigências do cultivo destes últimos são
fartamente remuneradas por uma produção melhor e maior.
Do café, tudo se aproveita: o lenho é bom combustível; as folhas dão uma infusão
semelhante ao chá, muito usada pelos indígenas do arquipélago de Sonda; a polpa açucarada dos frutos dá um álcool agradável que se presta para
excelentes licores; finalmente, as cascas e resíduos dos frutos, ricos de elementos fertilizantes, dão excelente adubo.
Variedades de cafeeiros, cultivados no
Ministério da Agricultura, de S. Paulo
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Conhecida, por assim dizer, a anatomia da maravilhosa planta que, emigrada do
Oriente, veio estabelecer hegemonia no Brasil, com o decréscimo de importância do seu habitat primitivo, examinemos os seus fenômenos mais íntimos a
sua química e a sua ação fisiológica.
Começaremos por entrar no exame dos elementos vários que compõem a
individualidade química da planta. Os quadros que apareceram organizados em um estudo do dr. F. W. Dafert, competente especialista, e que
transcrevemos a seguir, servem de elemento orientador a quem queira se dedicar à cultura racional da opulenta rubiácea. A composição química média
das cinzas das diversas partes do cafeeiro dá o seguinte resultado:
Composição química média das cinzas das diversas partes do cafeeiro |
|
Raiz
% |
Tronco
% |
Galhos
% |
Folhas
% |
Polpa
% |
Pergaminho
% |
Grão
*
% |
Potassa |
29,24 |
41,63 |
49,20 |
56,48 |
58,49 |
19,23 |
65,25 |
Soda |
3,16 |
2,57 |
0,58 |
1,43 |
2,16 |
6,18 |
Nada |
Cal |
36,23 |
34,91 |
32,03 |
21,65 |
11,00 |
26,56 |
6,12 |
Magnésio |
9,51 |
12,16 |
7,62 |
6,57 |
3,26 |
5,59 |
11,00 |
Óxido de ferro |
11,92 |
2,38 |
2,08 |
0,90 |
5,61 |
8,62 |
0,52 |
Ácido fosfórico |
3,77 |
3,79 |
4,52 |
6,307 |
3,09 |
20,24 |
12,53 |
Ácido sulfúrico |
4,21 |
2,24 |
1,94 |
3,51 |
3,69 |
2,37 |
4,09 |
Ácido silícico |
-- |
-- |
0,83 |
2,17 |
11,10 |
11,21 |
0,11 |
Cloro |
1,44 |
0,25 |
0,61 |
0,51 |
0,60 |
traços |
0,55 |
Total |
99,48 |
99,93 |
99,41 |
99,29 |
99,60 |
100,00 |
100,17 |
* Além das matérias especificadas, a análise do grão revela traços de manganês |
Muito interessante é o estudo do peso do cafeeiro e das relações, também de
peso, que com ele mantêm os diversos órgãos, nos diferentes períodos de vegetação, estudo que, com os elementos fornecidos pelo quadro acima,
oferece valiosa contribuição para a cultura desta planta.
Reproduzimos do trabalho citado do dr. Dafert o quadro (A)
que fornece tais informações.
Quadro
A - Café ordinário (pesos médios
*) |
Idade |
Peso total em gramas |
Raiz % |
Tronco % |
Galhos % |
Folhas % |
1 ano |
14,0 |
20,2 |
25,0 |
-- |
54,2 |
2 anos |
69,6 |
30,1 |
23,6 |
16,1 |
28,2 |
3 anos |
827,5 |
24,9 |
20,1 |
20,8 |
33,5 |
4 anos |
2079,0 |
13,9 |
27,6 |
20,6 |
37,7 |
6 anos |
8114,5 |
14,2 |
37,1 |
20,4 |
28,4 |
8 anos |
14137,3 |
14,7 |
50,6 |
19,7 |
15,0 |
10 anos |
20160,0 |
14,9 |
56,0 |
19,4 |
9,7 |
15 anos |
24775,0 |
15,9 |
52,5 |
24,2 |
7,4 |
20 anos |
29390,0 |
16,7 |
50,0 |
27,2 |
5,7 |
25 anos |
34005,0 |
17,2 |
48,2 |
30,0 |
4,6 |
30 anos |
38620,0 |
17,6 |
47,4 |
31,8 |
3,2 |
35 anos |
43235,0 |
17,9 |
45,8 |
33,3 |
3,0 |
40 anos |
47850,0 |
18,2 |
45,0 |
34,4 |
2,4 |
*
Para as idades de 15, 25, 30 etc. calculadas por interpolação |
Finalmente, resumindo os conhecimentos sobre o assunto, o mesmo dr. Dafert
apresenta o quadro (B) indicando as necessidades alimentares, nas diversas idades, de cada árvore, num ano, para obter-se uma
vegetação normal.
Quadro B
(medidas em gramas) |
Idade |
Cal |
Magnésia |
Ácido fosfórico |
Potassa |
Azoto
* |
1 ano |
0,057 |
0,019 |
0,013 |
0,119 |
0,215 |
2 anos |
0,253 |
0,089 |
0,120 |
0,433 |
0,271 |
3 anos |
3,434 |
1,150 |
0,653 |
6,292 |
0,345 |
4 anos |
5,030 |
1,574 |
1,041 |
9,805 |
10,674 |
6 anos |
12,045 |
3,910 |
2,390 |
21,673 |
18,106 |
10 anos |
11,268 |
3,619 |
1,778 |
16,011 |
18,066 |
40 anos |
4,138 |
1,283 |
0,663 |
6,056 |
5,538 |
*
Os algarismos sobre o azoto podem sofrer modificações |
Estes algarismos representam apenas médias, podendo variar de acordo com a
intensidade de cultura, condições naturais e de preparo do solo etc. Pode-se concluir, entretanto, daí,um conjunto dos elementos hauridos do solo
pelo café. Assim se verifica que, em média, um quilograma de café comum, colhido, retira do solo:
Cal |
1,47 g |
Magnésio |
3,24 g |
Potassa |
7,88 g |
Ácido fosfórico |
4,02 g |
Entre as várias análises que determinam a natureza e as porcentagens das
matérias orgânicas contidas no café, é uma das mais acatadas e aceitas a do eminente químico dr. Payen. Segundo o ilustre cientista, o café
considerado normal deve contar:
Legumina, cafeína etc. |
10,000% |
Cafeína livre |
0,800% |
Matérias graxas |
3,000% |
Glucose, dextrina, ácido vegetal indeterminado |
13,000% |
Clorogenato de potassa e de cafeína |
15,500% |
Óleo essencial concreto e insolúvel |
5,000% |
Essência aromática solúvel e de aroma suave |
0,060% |
Celulose |
0,002% |
Substâncias minerais: potassas, magnésio, cal, ácidos fosfórico,
silício, sulfúrico e cloro |
6,697% |
Água higrométrica |
12,000% |
Exame tão minucioso do café deu ainda, em resultado, a descoberta da cafeína
longamente empregada na terapêutica, notando-se ainda o ácido caféico, os óleos essenciais que dão ao café o perfume e o sabor que o tornam
apreciado. Estes elementos também se acham nas flores e folhas do cafeeiro. O aroma do café é dado pelo princípio denominado caféona.
A comparação de tantas qualidades com as correspondentes dos cafés não
brasileiros tem deixado evidente a superioridade em relação aos concorrentes estrangeiros, o que sobejamente justifica a sua grande supremacia
quantitativa, nos mercados, resultante lógica de sua excelência qualitativa. Planta por excelência dos climas quentes, o café, que, na Arábia,
apenas prolifera entre os paralelos 28º N e 30º S, suporta, no Brasil, temperaturas que descem até 0º centígrado.
Cultivo do café em S. Paulo: 1 e 4) Nos
cafezais; 2) Um cafeeiro na Fazenda Santa Gertrudes, do conde de Prates; 3 e 5) Tratamento dos cafezais na Fazenda Santa Eugênia, de Prado, Chaves &
Cia.
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Condições de solo
– Como é lógico, a composição química do café está em relação imediata com a do solo,onde ele floresce. Assim, as zonas mais aptas para a cultura da
afamada rubiácea são geologicamente constituídas dos elementos que preponderam na individualidade química do café.
Em regra geral, entretanto, o cafeeiro não é muito exigente quanto à natureza do
solo no seu potencial fertilizador. Com efeito, respeitados os limites climatéricos e mais certas condições gerais da permeabilidade do solo, em
todos os solos ele dá, com vigor variável. Há, entretanto, terrenos preferíveis, onde os expoentes de produtividade são maiores do que em
outros. Nestas condições se encontram os terrenos humosos, provenientes de antigas florestas, tendo por base terras de origem vulcânica, como é o
caso das afamadas terras roxas do Estado de S. Paulo. Entre as terras mais aptas para o café contam-se:
a) A terra roxa, à qual se atribui a grande produtividade cafeeira de S.
Paulo – no que não deixa de haver certo exagero. É uma terra argilosa, ferruginosa, de origem diabásica e de cor vermelho escura, de onde lhe vem a
sua denominação;
b) o massapé, originário da decomposição das rochas gnaissico-graníticas,
constituído por grande proporção de argila. Quando preto, é melhor, porque esta cor denota presença mais abundante de húmus;
c) O salmourão, que serve bem para o café, mas não para os cereais;
d) A de pedregulho, em que se misturam muitas pedras , vegetando aí bem o
cafeeiro, quando a base de sua constituição é a terra massapé.
Em um relatório do ilustre dr. Joaquim Murtinho, feito em 1878, sobre a
distribuição das terras de S. Paulo, encontramos estas preciosas notas:
"São,
pois, duas as grandes zonas de terras aráveis que observamos na província de São Paulo: a zona do massapé e a zona da terra roxa. A
primeira tem dois ramos: um parte de um ponto situado entre S. Roque e Sorocaba, atravessa a linha ituana, passa à direita de Itu, segue para
Campinas, Mogi-Mirim, Casa Branca, Cajuru, Mato Grosso, Franca e Uberaba, e segundo informações recolhidas pelo sr. Tibyriçá, atravessa o Triângulo
Mineiro, para ir ter às proximidades de Cuiabá; a segunda segue a linha de São Paulo-Rio de Janeiro. A zona de terra roxa começa em Ipanema,
segue por Piracicaba, Limeira, Araras, Pirassununga, Santa Rita, São Simão, Ribeirão Preto, Batatais, para se reunir à primeira zona. O massapé
constitui uma zona contínua; a terra roxa, não, manifesta-se antes como ilhas, mais ou menos ligadas, como as que constituem a zona que acima
descrevemos, ou como manchas isoladas como se observam no Jaú, Botucatu, São Carlos do Pinhal, Araraquara etc.".
Das rochas que se originam as terras roxas, dá-nos o mesmo dr. Joaquim
Murtinho a seguinte análise:
Ácido silícico |
52,30% |
Óxido de ferro |
11,48% |
Alumina, ácido fosfórico e óxido de manganês |
13,04% |
Cal |
3,86% |
Magnésio |
5,75% |
Potassa e soda |
3,90% |
Observa-se com a cultura do café, ainda, que, em certas regiões, ele frutifica e
produz melhor em terrenos onde vegetam certas árvores ou arbustos, sendo menos intensa a sua produtividade onde não existem tais vegetais.
É assim que, nos estados de S. Paulo e do Rio de Janeiro, as terras melhores ara
a cultura são aquelas em que o cafeeiro é plantado no local onde floresceram os seguintes vegetais: Balsamo (Capaifera langsdorfii,
Mart.), Pau d'alho (Yallesia yorazema, Moquim), Cedro branco (Cedrella fissilis, Vellozo), Palmito branco (Martiona
Sb.), Ortiguinha (Urera subpellata, Meig.), Jangada brava (Heliocarpos americanus), Figueira branca (Urostigura
doliarum Mig.), Folha larga (Salvertia convallariacodora, St., Hil.), Cambará (Lontana brasiliensis Link., L.
Coman, Linneo, L.nivea Vent.), Embaúba verde (Ceeropia capituliflora Friu.)
Esses vegetais são conhecidos pela denominação de padrões, isto é,
aspectos característicos das terras onde a derrubada encontrará melhores condições de desenvolvimento para o café. O critério dos padrões não
pode ser, está claro, um critério absoluto, porque freqüentemente eles não existem, sem que, contudo, a terra deixe de ser apropriada.
Variam as exigências de altitude do terreno para a melhor produtividade do café,
no Brasil. Em S. Paulo, a experiência demonstrou que os limites da altitude mais conveniente oscilam entre 500 e 800metros, enquanto que, nos
estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e do Espírito Santo, esses limites são mais baixos, geralmente. Muito contribui a periodicidade das chuvas
na zona cafeeira mais importante do Brasil (S. Paulo, Minas, Rio e Espírito Santo) para a prosperidade da cultura do café. Por causa dessa
regularidade, o ano cultural fica dividido em duas fases: de setembro a março, a das águas; de abril a agosto, a da seca. Entre setembro e dezembro
é que, nesta zona, se manifesta a floração do café.
As chuvas ativam a florescência e apressam e auxiliam a eclosão e maturação dos
frutos. As chuvas inesperadas e muito demoradas muito concorrem, seguidas de grandes baixas de temperatura, para prejudicar a floração; antes e
depois dela, bem como durante a maturação, a falta de chuvas prejudica profundamente a lavoura do café, impedindo a seca e evolução dos frutos.
A abundância das chuvas também causa prejuízos à colheita que se opera de abril
em diante. Os ventos insistentes e demorados, numa só direção, são também causa de graves problemas ao café, determinando, nos arbustos novos, a
ruptura da casca no colo da raiz e, no adulto, a queda das folhas. As zonas cafeeiras são poupadas pelos grandes temporais, ali pouco freqüentes.
O café é plantado numa larga zona do Brasil, zona que se pode dividir em duas
partes: a das plantações intensas e extensas, nos estados cafeeiros, que produzem para a larga exportação, e a das plantações menos numerosas, dando
contingente mínimo à exportação e reduzindo-se, em geral, às necessidades do seu próprio consumo interno.
Deste modo, a cultura do café se faz desde o Ceará até Santa Catarina, indo
também ao estado de Goiás, em todos eles com uma tendência pronunciada para se expandir. No Ceará, as zonas próprias para o seu cultivo são as das
serras de Baturité, Maranguape e Aratanha e os municípios de Crato, Pacatuba, Viçosa e outros. Só a exportação cearense do café atingiu, em
1891, a 2.599.751 quilogramas, sendo de esperar que esse estado se tornasse o fornecedor da zona setentrional do Brasil, se não fossem as secas que
lhe prejudicam toda a lavoura, agravada da crise comercial do café.
No estado da Paraíba do Norte, o desengano da lavoura da cana-de-açúcar fez
voltarem os agricultores as suas vistas para o café, cuja cultura vai prosperando principalmente nos municípios de Romaneiros, Araruma, Alagoa
Grande, Alagoa Nova, Guarabira, Campina e Areia, calculando-se a sua produção, que abastece os estados vizinhos pelas fronteiras, numa média
de cerca de 100.000 sacas.
Em Pernambuco – que, aliás, também se serve do café da Paraíba do Norte -, a
cultura anda pouco além de 1.500.000 pés, que, entretanto, tendem a aumentar. A Paraíba do Norte exportou pelo porto de Cabedelo, de julho de 1905 a
maio de 1906, apenas 803 sacas. Enorme zona da Bahia, para o interior, oferece condições excepcionais para a cultura do café, que, entretanto, têm
regredido, descendo a sua exportação a quase a metade do que foi em 1901, um total, então, de 10.005.050 quilogramas de café.
Ainda à crise comercial do café se pode filiar a causa dessa baixa de produção,
sem esquecer a colaboração da falta de braços, falta ressentida em todo o país.
Van Delden Learne divide, com muita justeza, a região cafeeira dos estados do
Espírito Santo, Rio de Janeiro, Minas e São Paulo, em duas grandes zonas, bem caracterizadas pelo seu clima: em uma delas predomina o clima
marítimo, na outra o continental.
Na primeira zona ficam compreendidos os estados do Espírito Santo, Rio de
Janeiro e os territórios de Minas e São Paulo pertencentes à bacia hidrográfica do Rio Paraíba e seus afluentes; na segunda estão compreendidos os
terrenos do grande planalto do Oeste e Sudoeste de São Paulo e parte Sudeste de Minas, abrigados dos ventos marinhos pela Serra do Mar.
A zona do Rio de Janeiro se subdivide em duas partes bem distintas: a alta,
compreendida pela bacia do Paraíba e seus afluentes, e a baixa, situada entre a Serra do Mar e o oceano. A cultura do cafeeiro, nesta zona,
está limitada entre as altitudes de 200 e 550 metros. Nas terras mais altas, a produção é muito irregular e tardia e nas mais baixas é de qualidade
notavelmente inferior.
Todavia, em municípios como o de Cantagalo, prosperam bem cafezais plantados a
120 e 150 metros acima do nível do mar, enquanto que os situados acima de 450 metros pouco produzem, apesar de seu belo aspecto, segundo o
testemunho de van Delden Learne.
Na parte montanhosa desta zona, o grão de maior ou menor insolação dos terrenos
dá lugar a uma subdivisão destes, em terrenos soalheiros e noruegas. Os primeiros são os que recebem durante maior número de horas por
dia os raios diretos do sol: estão nas vertentes voltadas para Norte, Noroeste, Oeste e Sudoeste. Os segundos têm orientação contrária: as terras
são consideradas mais frias, a floração e a maturação dos frutos são aqui mais tardias. Na zona de São Paulo, o limite de cultura do cafeeiro
é estabelecido, em rigor, pelas geadas, que variam um tanto de altitude conforme a situação e o abrigo das terras.
Como se vê, os climas em que vive o cafeeiro das duas grandes zonas, do Rio de
Janeiro e São Paulo, variam entre os limites correspondentes aos das regiões temperadas.
Nos domínios do coronel Schmidt, o "rei
do café", em Ribeirão Preto
Foto publicada com o texto, página 342.
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O café, agente fisiológico – Antes de ser um fato reconhecido e proclamado pelas verificações exatas e argumentadas da ciência, a observação individual já fixara
definitivamente o café excelente agente terapêutico. Basta lembrar, em apoio deste asserto, que nada menos de três lendas nos informam de como e por
quê a ingestão do café se incorpora nos hábitos humanos, não pela busca de um deleite novo, ou no gozo de um vício extravagante, mas sim pela
evidência de sua influência como agente fisiológico, como estimulante e reforçador de energias depauperadas, enfim, como um novo utensílio para a
vida.
Uma dessas lendas conta que o uso do café fora sugerido a um pastor pelo aspecto
vivo e lépido de suas ovelhas, quando comiam a planta Kaffa, a qual lhes espertava a vivacidade, como que recuperando-a; outra mostra o café
servindo de auxílio poderoso para a vigília dos monges nos conventos; a terceira lenda, finalmente, nos explica que o uso do café foi inaugurado por
um moleiro que, com essa bebida, se reconfortava do cansaço.
A ciência veio depois e explicou com as fórmulas o que o empirismo da observação
avisada já demonstrara. Em seu trabalho sobre Higiene, Michel Levy, tratando da introdução do café em França, no reinado de Luiz XIV, nota como ele
se tornou rapidamente na primeira refeição dos homens, auxiliar da digestão, específico contra a ação do calor, excitante do trabalho intelectual.
Mostra, em seguida, a sua ação de excitante funcional dos velhos; como
reativo contra o frio, mantenedor do movimento eliminatório nas localidades palustres, como amargo sobre os órgãos digestivos e excitante geral da
economia orgânica, nos países quentes, como facilitador da digestão de alimentos secos e salgados, a bordo dos navios, nos acampamentos militares.
Ainda mesmo que seja tomado em excesso, o café não produz os efeitos maléficos
de outros excitantes, como por exemplo o álcool, e serve até de antídoto contra a embriaguez, quer pelo álcool, quer pelo ópio. O café puro, sem
açúcar, é um remédio clássico contra a embriaguez. É ainda Michel Levy quem o aconselha contra a asma, as febres intermitentes, as diarréias
atônicas etc. E por cima de tudo isso aparece a qualidade medicinal máxima do café, que é a de ser um excelente alimento de poupança.
Segundo Payen, 100 gramas de café torrado, em pó, em infusão em 1.000 d'água,
dão a esta 19 gramas de substância sólida dissolvida, sendo 9,06 g de compostos azotados e 9,94 g de matérias graxas, salinas e açucaradas e,
segundo Koenig, citado por Brouardel (Tratado de Higiene), tomando-se por base 15 gramas de café por pessoa, uma xícara desta infusão contém:
Cafeína |
0,3 g |
Cafeona |
0,8 g |
Extrato não azotado |
2,6 g |
Substâncias minerais |
0,6 g |
Referindo-se a esta propriedade do café, diz G. Morache (Tratado de Hygiene
Militar):
"A ração
de açúcar e café, posto que fraca, pode, pois, ser considerada como um alimento real, plástico e calorífico; aumentaria muito em rendimento não
levando a torrefação além da cor alourada, mas é difícil persuadir sobre este ponto os consumidores.
"Se esta ração não possuísse, de resto, mais do que estas propriedades, seria
fácil de substituir por uma outra que, sem necessitar uma preparação relativamente tão complicada como a do café, tivesse ao menos propriedades
alimentares. Mas o café goza de outras virtudes ainda mais preciosas: em todos os tempos, tem sido considerado um excitante do cérebro, donde o nome
de bebida intelectual que lhe tem sido dado e o uso que dele fazem as pessoas aplicadas aos trabalhos de gabinete; ele possui, além disto, a
faculdade de sustentar as forças do homem sujeito a rudes trabalhos, isto é incontestável e a observação de todos os dias o demonstra
abundantemente.
"Gasparin,
um dos primeiros que notaram as maravilhosas propriedades do café, sustentava mesmo que, sob a sua influência, se podia temporariamente diminuir de
20 a 30 por cento a quantidade de alimentos dados a homens ocupados em um trabalho mecânico. Os militares têm podido certamente fazer a observação
em si mesmos: quantas vezes se vê os soldados marcharem uma parte do dia, resistirem à fadiga, combaterem mesmo, sendo sustentados apenas pela ração
do café ingerido pela manhã e pela fraca provisão conservada no pequeno cantil!"
Becker e Lehmann observaram que, sob a influência do café, a quantidade de uréia
diminui de quase metade, em igualdade de condições para os indivíduos sujeitos à experiência.
Gasparin, estudando o regime alimentar dos mineiros de Charleroi, diz que eles
se nutrem bem, conservam a saúde e grande vigor de força muscular, com uma nutrição menor na metade, em princípios nutritivos, do que a das outras
populações da Europa. Ele atribui, com boas razões, este fato ao uso do café como base da alimentação e com o qual fazem os mineiros uma sopa a que
adicionam o pão e que lhes permite reduzir de 25% a quantidade de alimentos de que careceriam outros indivíduo sujeitos ao mesmo penoso trabalho.
O reconhecimento destas inestimáveis propriedades do café o tem feito introduzir
nas marinhas e nos exércitos.
Exaltando os benefícios que de seu uso retiram as tropas, diz Morache: "Os
serviços que ele (o café) tem prestado são incontestáveis: sem ele, não se teria certamente sempre suportados as fadigas dessas penosas campanhas,
empreendidas em países onde os transportes e os abastecimentos encontram imensas dificuldades".
"Desde
então – acrescenta -,
a experiência tornou-se ainda mais convincente: as campanhas da Criméia, da Itália e do México fazem a prova. Em 1857, o barão H. Larrey recomendou
o uso do café para as tropas da guarda, reunidas no campo de Chalons. Na última guerra, enfim, nossos soldados não tiveram muitas vezes outro
alimento senão café: era algumas vezes, com biscoitos, a única distribuição que se fazia regularmente. O soldado conhece muito bem a excelência
desta bebida e ele a reclama com instância: em marcha ele toma o café pelas quatro horas da manhã, e, com biscoito, faz uma espécie de sopa que é sã
e saborosa".
Tomado com leite, o café é, além de delicioso, extremamente apropriado aos
organismos delicados das mulheres, velhos e crianças e, auxiliado pelo pão, constitui um almoço saudável e bastante nutriente, pois, segundo Payen,
um litro de café com leite, em partes iguais, adoçado com 75 gramas de açúcar, contém 154 gramas de substância sólida. E, em síntese, as qualidades
fisiológicas do café, infelizmente ainda não são conhecidas quanto merece a importância dos serviços que pode prestar e da utilidade de seu uso.
Fazenda Morro Azul, em Limeira
Foto publicada com o texto, página 343.
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Notícia histórica – Perde-se na noite dos tempos a notícia exata do primeiro uso do café pelos homens, sabendo-se, apenas, que é na Etiópia que tem a sua origem.
Só depois de meados do século XIV ele começou a ser conhecido na Europa e, ainda assim, por notícias de viajantes que regressavam do Oriente, entre
os quais se conta o médico e botânico alemão Leonardo Raunolf. Tão afastado está o tempo do seu uso como bebida que a sua origem se apresenta sob a
forma brumosa da lenda. No ano de 875, já era vulgar na Pérsia.
Várias foram as versões que a fantasia lendária criou em torno da origem do uso
do café. Entre elas, tinha maior curso a seguinte: um pastor vigiava o seu rebanho, quando notou que este, em certas ocasiões, se mostrava mais
alegre, saltando com grande vivacidade. A repetição do fato aguçou-lhe a observação e o pastor notou que a vivacidade de suas ovelhas assim se
manifestava quando elas pastavam essas terras onde abundava uma determinada planta, cujo fruto comiam.
Instintivamente compreendeu que aquilo era efeito da ingestão de tal planta.
Curioso, fez uma experiência em si próprio, bebendo uma infusão que fez com os frutos da planta referida. Logo depois, sentiu um reforço de
energias, bom humor, alegria, melhor disposição para o trabalho, desaparecendo, ao mesmo tempo, o sono de que era atacado quando em serviço. Essa
bebida era o café e assim começou, segundo a lenda, a ser usado.
Supôs-se a princípio que o cafeeiro fosse originário da Arábia; e a
classificação arabica - que lhe foi dada por Linneu, mostra que ele também estava nesta convicção. Estudos posteriores fixaram, porém,
definitivamente a pátria do café na Abissínia, em Kaffa. Daí é que ele foi levado para a Arábia, no século XV, onde se usou em uma infusão
denominada kahwah ou cahué.
O café teve inimigos incoercíveis mesmo entre os árabes, pretendendo alguns que
era uma bebida contrária às leis do Profeta. O café, porém, venceu essa resistência; e já um escritor árabe dizia dele que as suas propriedades eram
consideradas pelos doutores do Alcorão como "maravilhosa para
favorecer a digestão, alegrar o espírito, afastar o sono".
Da Arábia, foi o café instalar-se no Cairo, onde ainda sofreu grandes
vicissitudes. Um sacerdote maometano, em 1534, levantou, ali, tão terrível campanha de prédicas contra o café, que, à saída de um de seus inflamados
sermões, o povo destruiu todas as casas onde se tomava aquela bebida. Uma consulta em regra, feita a um tribunal de doutores teólogos, decidiu
finalmente o caso, tranqüilizando a consciência dos bebedores de café.
Em 1554 introduziu-se ele em Constantinopla e também aí teve de lutar com a
exploração da crendice e do fanatismo, feita pelos sacerdotes muçulmanos que conseguiram a proibição de seu uso. Tão saborosa, entretanto, é essa
bebida, tornada mais atraente pela proibição, que os próprios guardas, encarregados da fiscalização da lei rigorosa, eram os primeiros a
transgredi-la, afrouxando a disciplina, em troca de alguns goles da deliciosa infusão.
Disto soube tirar partido o sultão que, em vista da consagração do café como
bebida preferida, decretou impostos altíssimos sobre as casas de café, o que não diminuiu absolutamente o seu consumo, que foi reencetado
largamente, depois da revogação da lei proibitiva. Depois da guerra entre os turcos e venezianos, a irritação do povo contra os soldados do sultão
derrotados deu lugar a conflitos que determinaram o fechamento de cafés, como medida de ordem pública.
Pela Itália, entrou finalmente o café na Europa católica. A sua introdução na Inglaterra foi feita pelo negociante inglês
Daniel Edwards, que fazia servir a saborosa bebida às suas visitas, preparada por um criado grego que com ele viera de Smirna e que se chamava
Posqua. Tantas visitas atraiu o café à casa de Edwards que ele se viu forçado a abrir um estabelecimento, para a venda da gostosa infusão, confiando
a sua direção a Posqua e Ritt, cocheiro de seu genro. Esse estabelecimento foi instalado na Avenida Newman's Court, Cornhill, onde mais tarde se
estabeleceu a Virginia Coffee-house. Os lucros
foram tão animadores que os dois sócios se separaram para fundar cada
um o seu estabelecimento.
Recomendando-se por si mesmo, o café desenvolveu-se na Inglaterra, ao ponto de
inspirar ao Parlamento a criação de uma nova fonte de renda para o
Estado, com a criação de um imposto especial. Ainda na Inglaterra o
café sofreu guerra movida pelos cervejeiros e vendedores de outras bebidas alcoólicas, receosos da concorrência, e pelos moralistas extremados que
viam no café um pretexto para ausências do lar e conseqüente dissolução dos costumes.
A campanha foi a tal intensidade e teve tais efeitos que, em 1674, as senhoras
inglesas dirigiram ao governo uma petição contra o café, acusando-o de desregrar os chefes de família, e gastar a força vital dos homens. Não
pouparam o café os panfletos e as sátiras, muitos dos quais espirituosos, mas ele se impôs, malgrado mesmo os ataques de Carlos II. Na Inglaterra,
porém, tem o café competidor sério no chá, que domina naturalmente nas casas inglesas, pelos interesses comerciais que levam razoavelmente a
Grã-Bretanha a advogar o seu uso.
A estréia francesa do café foi em Marselha, onde se abriu o primeiro
estabelecimento em 1671; logo depois, outros se abriam em Lion e Paris. Encarregou-se de fazer-lhe um reclame estrondoso, em Paris, o embaixador de
Mahomet IV junto à corte de Luiz XIV, Solimão Aga, que o fazia servir, na embaixada, por escravos ricamente trajados e em chávenas de finíssima
porcelana, tornando-se o café elegante e especialidade da moda, o que lhe foi bastante para conquistar Paris.
Em França, foi ainda o café alvo de perseguições, sendo seus inimigos certos
médicos que o anatematizaram como prejudicial à saúde. Mas tal campanha não logrou prejudicar o café. Grandes expedições trouxeram cargas da
rubiácea de Moka, a princípio vendida por alto preço; depois, cedendo à concorrência, baixou seu valor de venda ao consumidor.
Data de 1672 o estabelecimento de casas de café que dela tomaram o nome,
enchendo-se de extraordinária freqüência. Abundaram logo os cafés para todas as classes, notabilizando-se e fazendo tradição os Cafés
literários, centros de homens de letras, artistas etc. Ficaram célebres o Café Procopio, freqüentado por Fontenelle, J.-R. Rousseau, Diderot e
outros, e o Café de la Régence, freqüentado por Voltaire, Richelieu e outros notáveis.
A introdução do café nos países germânicos data de 1663, estabelecendo-se em
Viena com esse ramo de negocio um soldado de nome Kotchinsky que, como prêmio da sua bravura na batalha contra os turcos, recebeu uma grande
quantidade da rubiácea.
Em seguida, Leipzig adotou a rubiácea. Na Alemanha, porém, o café sofreu a
guerra de Hoffmann, que lhe atribuía a febre miliar, e Hahnmann, o fundador da homeopatia, que o acusava de produzir enfraquecimento moral e
intelectual. Outros impedimentos sofreu o café na Alemanha e só muito tempo depois é que ali foi tolerado. Desde então, porém, cresceu rapidamente o
seu consumo. Da Alemanha, passou à Suíça, à Dinamarca, à Escandinávia, à Rússia, a Portugal e à Espanha, de onde, através das possessões ibéricas na
América, se introduziu nos Estados Unidos. Finalmente, penetrou no Brasil.
Segundo a tradição, as primeiras sementes de café introduzidas no Brasil foram
trazidas da Guiana Francesa, em 1723, por um brasileiro de nome Palheto. Plantadas na cidade de Belém do Pará, delas se originam as primeiras
plantas, de que saíram outras cultivadas no Pará, Amazonas e Maranhão. Do Maranhão, foi o cafeeiro trazido para o Rio de Janeiro no ano de 1770,
pelo magistrado J. A. Castello Branco.
Fizeram-se então plantações na chácara dos frades Barbadinhos e na quinta do
holandês Hoppmann, na cidade do Rio de Janeiro. Anos depois, com as mudas saídas da chácara dos Barbadinhos, um bispo e vários padres fizeram
culturas em suas fazendas situadas nos arredores de Inhaúma, Campo Grande e Rezende, donde as plantas se propagaram pelos territórios que hoje
constituem os estados do Rio de Janeiro e de S. Paulo.
Em fins do século décimo-oitavo, ainda era o café considerado um medicamento na
cidade de S. Paulo: vendia-se nas farmácias em pequenas quantidades. Nessa época, entretanto, o sargento-mor Santos Prado iniciava uma pequena
plantação na sua chácara de Jundiaí, mesmo no começo da região em que o cafeeiro se ia tornar um poderoso elemento de riqueza. Dessas plantas se
derivaram as sementes da primeira cultura regular, feita em Campinas pelo tenente Antonio Francisco de Andrade, que abandonou a sua propriedade,
pouco depois, para tomar parte nas guerras contra os espanhóis do Rio da Prata.
Em 1817, formou-se uma segunda plantação no município de Campinas, por
iniciativa do capitão Francisco de Paula Camargo, que do Rio de Janeiro trouxe algumas sementes. Verificada a facilidade com que o cafeeiro se
reproduzia em Campinas, vários fazendeiros fizeram maiores culturas nesse município.
De 1834 em diante, começou a produção a aumentar e as plantações de
cana-de-açúcar foram cedendo o lugar a outras do famoso arbusto africano, que proporcionavam maiores lucros. Assim, em pouco tempo, Campinas se
tornava o principal centro produtor. Daí, as plantações se propagaram rapidamente pelo interior, formando verdadeiros "oceanos de café".
Já então o cafeeiro era bastante cultivado nos municípios da região chamada do
"Norte de S. Paulo". Areias, Pindamonhangaba, Taubaté, Guaratinguetá, Jacareí etc., produziam milhares de sacas e enviavam o produto para os portos
do Rio de Janeiro e de Ubatuba. Em 1870, avançando as estradas de ferro na direção de Ribeirão Preto, estabeleceram-se grandes fazendas nesse
município. Não tardou este em se tornar o maior centro produtor, não só do Brasil, como de todo o mundo, exportando anualmente cerca de 600 mil
sacas.
O ano de 1885 marca a origem de uma grande febre na plantação de café. Durante
os quinze anos que se seguiram, houve um ativo movimento de especulação sobre terras, atraindo a imigração de colonos europeus, principalmente
italianos. Derrubaram-se largas extensões de florestas virgens, para se plantarem cafeeiros, formaram-se extensas fazendas e a região denominada
"Oeste de S. Paulo" tornou-se um novo "El Dorado", on se fizeram grandes fortunas.
Quase na mesma ocasião, a cultura tomava incremento no estado de Minas Gerais.
Hoje, é esse o segundo estado produtor, ficando em terceiro lugar o estado do Rio de Janeiro.
Atualmente, o cafeeiro vive e produz em quase todos os estados do Brasil, desde
o Pará até o Rio Grande do Sul. A maior parte deles colhe pequenas quantidades para consumo local. Mas Espírito Santo, Bahia e Pernambuco são também
exportadores. Enfim, em nenhum outro território o cafeeiro encontrou condições tão propícias como no Brasil. Por isso, desde 1822, um ramo dessa
plana figura como símbolo nacional no escudo de armas da nação brasileira.
Apesar dos impostos com que é sobrecarregado o seu consumo, na maioria dos
países da Europa, a sua importação, nestes países, tem geralmente aumentado, e assim é que, em 1852-53, sendo esta importação na França de 463.054
sacos de 60 quilogramas, na Alemanha de 788.254, na Áustria-Hungria de 338.795, na Suíça de 113.830, na Inglaterra de 280.000, na Noruega de 73.158
e na Bélgica de 347.357, conforme se vê dos quadros estatísticos da interessante obra de van Delden Learn – Le Brésil et Java -, em 1906, a
importação nestes países foi respectivamente: França, 2.714.993 sacas de 60 quilogramas (sendo 1.475.626 do Brasil); Alemanha, 3.108.816 (sendo
2.072.133 do Brasil); Áustria-Hungria, 920.224 (dados referentes unicamente à importação de café brasileiro pelos portos de Trieste e Fiume); Suíça,
186.076 (sendo 126.653 do Brasil); Inglaterra, 647.758 (sendo 13;008 do Brasil); Noruega, 213.571 e Bélgica, 958.466 (sendo 471.200 do Brasil).
Na Suécia, a importação, que foi, em 1860, conforme aquele autor, de 131.830,
elevou-se, em 1905, a 500.925 sacas.
Nos Estados Unidos da América, onde o café tem tido livre entrada, salvo no
período de 1861-72, a sua importação total em 1852-53 foi de 1.507.500 sacos, enquanto que, em 1906, somente o consumo se elevou a cerca de
6.500.000 sacos.
Do Rio de janeiro foi o cafeeiro levado para a Bahia por missionários italianos
Barbadinhos, em 1788; e da Bahia passou para Pernambuco, onde a sua cultura não tem tido o desenvolvimento que se poderia esperar, dadas as
condições favoráveis, demonstradas em muitas zonas do Estado, por bons cafezais ali existentes.
De Pernambuco foi a rubiácea levada para a Paraíba do Norte, onde se procura dar
desenvolvimento à respectiva lavoura. No Ceará, esta cultura parece ter começado em 1822, de sementes levadas de Pernambuco para Cariri e daí para
Baturité. Desenvolveu-se, a princípio, nas serras de Baturité, Maranguape e Arantanha, apropriadas ao seu cultivo, pois são de elevação mediana,
clima benigno e solo fértil; mas as crises climatéricas freqüentes por que passa este estado, determinando as constantes emigrações, têm
naturalmente concorrido para a decadência das lavouras. De 2.106.519 quilogramas de café em que montou a exportação em 1895, baixou esta a 3.248 em
1905.
Muito provavelmente, foi de S. Paulo que o cafeeiro passou aos estados do Paraná
e Santa Catarina, onde a sua cultura, consideradas as condições climatéricas da região, jamais poderá ser tão extensa e vantajosamente produtiva
como nas zonas de S. Paulo, Minas, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Não obstante, Santa Catarina chegou a exportar, em 1902, 1.282.938 quilogramas
de café, baixando, porém, daí em diante a exportação que, em 1905, foi de 379.224 quilogramas.
Em Mato Grosso e Goiás, também encontra o precioso arbusto clima favorável ao
seu desenvolvimento e produção. A exploração, porém, da cultura é ali naturalmente dificultada pela deficiência, se não carência, de meios de
transporte até os nossos mercados de exportação. Todavia, Goiás tem a sua exportação para as fronteiras de Mato Grosso e Pará - exportação que, em
1906, foi de 3.817 quilogramas.
Coube aos holandeses, em primeiro lugar, o estabelecimento de um movimento
inter-oceânico regular, de importação do café para a Europa, tendo posto na Holanda, em 1743, 3.555.877 libras de café de Java. Eles introduziram o
café desta procedência na Europa, transplantaram-no para Ceilão, enquanto os ingle,ses o aclimatavam em Madras.
A França fez o mesmo, com relação às suas colônias, sendo o café levado para a
Martinica pelo oficial de Marinha
Derclieuse,
daí irradiando para Guadalupe, S. Domingo e outras Antilhas Francesas. Coube ao francês Mourgues a introdução do café em Caiena, de onde foi
transplantado para o Brasil.
Em fins do século XVIII, começou o café a ser cultivado em Cuba, Porto Rico,
Equador e Venezuela. Não foi, pois, sem tropeços, que o café conquistou o mundo, mas contra todas as campanhas venceu a demonstração evidente das
suas excelentes qualidades.
3º Congresso de Agricultura, Amparo,
1911
Foto publicada com o texto, página 344.
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A cultura
– Das numerosas variedades de cafeeiros, as mais cultivadas no estado de S. Paulo são as seguintes: o cafeeiro comum ou nacional, de
frutos vermelhos; o cafeeiro amarelo, ou de Botucatu, de frutos amarelos; e o cafeeiro Bourbon que é pouco resistente. Além
dessas, se cultivam o Maragogipe, descoberto na cidade do mesmo nome, no estado da Bahia; o híbrido Bourbon-Maragogipe, obtido no
Instituto Agronômico de Campinas; o Murta e outras espécies menos importantes.
Em S. Paulo o cafeeiro nacional predomina nas antigas plantações e é
preferido porque é mais robusto e dura mais tempo. Nas plantações novas, porém, preferiu-se o Bourbon, por motivo de produzir mais. No
estado de Minas, está sendo muito recomendado o cafeeiro Conillon, como o mais próprio para as terras esgotadas. Um adiantado fazendeiro de
Além-Paraíba já cultiva 17 mil pés dessa espécie, que proporcionam colheitas bem mais abundantes.
Há duas maneiras de estabelecer uma plantação de café: por semeação ou por
transplantação de pequenas mudas. Este último sistema é o mais usado no estado de S. Paulo e exige muito cuidado. É opinião corrente, entre os
agricultores, que os cafeeiros plantados nas planícies, ou expostos ao poente, dão colheitas medíocres. Por isso, os cafezais estão geralmente
situados em colinas, que ficam de 600 a 800 metros de altitude. Contudo, encontram-se em planícies e até à margem dos rios, contanto que as
terras não sejam encharcadas, algumas plantações que fornecem boas colheitas médias.
A semeação e a plantação se fazem em qualquer época do ano, desde que não haja
grande seca. Entre os buracos onde se põem os grãos, ou entre as plantas, deixa-se uma distância de 2,60 m a 3,15 m. A transplantação se efetua
sempre em tempo de chuva: arrancam-se as mudas com bastante cuidado e, depois de replantadas, são elas cortadas de modo que fiquem com cerca de onze
centímetros acima do solo.
Depois da transplantação, tornam-se necessários quatro anos para que o cafezal
fique formado. No quinto ano ele começa a remunerar o trabalho do agricultor. Embora já produzam desde o terceiro ano, os cafeeiros só dão
produção regular depois do quinto. Aos trinta anos, entram em decadência, apesar de se conhecerem exemplares que vivem até cem anos, quando
bem tratados. Os cafeeiros são podados e
capinados
todos os anos.
A floração do café no estado de S. Paulo vem geralmente de setembro a novembro e
por várias vezes. Cada floração se opera em quatro ou cinco dias e fica prejudicada se durante esse período as chuvas são fortes e prolongadas, ou
acompanhadas de ventania: as chuvas benéficas são as constantes e fracas. A seca durante dois anos anteriores ao aparecimento das flores prejudica o
desenvolvimento da planta e conseqüentemente as colheitas.
A colheita do café faz-se de maio a junho, quando cessa o período das chuvas e
um belo sol permite permite secar o café nos terreiros. Ela traz a alegria e grande atividade nas fazendas: homens, mulheres e crianças lhe
prestam o seu concurso, colhendo as cerejas. Os frutos são postos em cestos contendo de 40 a 50 litros; os trabalhadores recebem de 400 a 600 réis
por uma destas medidas denominadas alqueires e chegam a ganhar diariamente de
4$000 a
8$000.
No estado de S. Paulo, a produção de café vai de 50 a 150 arrobas (uma arroba
tem quinze quilos) de café beneficiado por mil pés; a média mais geral é de 80 arrobas por mil pés. Nos estados de Minas, Rio de Janeiro etc., a
média baixa a 35 arrobas por mil pés e até a menos. Depois de colhido, o café é sujeito às operações de lavagem, secagem e beneficiamento. Estas
operações se efetuam nas próprias fazendas, possuindo a maioria dos plantadores as instalações e máquinas necessárias.
Uma vez lavado nos
lavadouros
e seco nos terreiros, o café passa por uma série de máquinas que o descascam, limpam e separam pelos tamanhos dos grãos. Se o lavrador não
possui as máquinas precisas para tudo isto, pode enviar o seu produto para ser beneficiado num dos muitos engenhos centrais existentes no país. Das
máquinas de beneficiar, o café sai separado nos seguintes tipos usuais: chato, chato grande, chato miúdo, chatinho,
moka, moka grande, moka miúdo e mokinha. Mas em Santos estas qualidades são novamente misturadas para constituírem novos
tipos comerciais, numerados de 1 a 9, de acordo com a classificação da Bolsa de Nova York. E nas praças européias se formam ainda outros tipos com
eles, vendendo-se-os como cafés de Moka, Java, Porto Rico etc.
Pouco atendidos, a princípio, os cuidados especiais que devem presidir à escolha
das sementeiras e viveiros, a experiência finalmente demonstrou aos cultivadores a sua importância, verificando-se que a semente, para conter mais
intensas faculdades germinativas, não deve ser apanhada a esmo, mas sim escolhida por um critério já bem determinado para a seleção. Assim, os mais
belos e vigorosos arbustos são eleitos para o fornecimento das sementes, da mesma sorte que só certos cavalos de determinadas qualidades podem
servir de garanhões. Os
frutos são
colhidos para o fim a que se destinam, bem maduros, dentre os maiores e os que nascem na parte média dos galhos situados na região central da
planta. Esses
frutos,
depois de secos ao sol, são despolpados à mão, sendo em seguida semeados com os respectivos pergaminhos.
Também se usa secá-los à sombra, conservando-os em sítio arejado, espalhados e
revestidos da casca; alguns agricultores conservam o costume de mergulhar os frutos secos por esse processo, em água, durante algumas horas,
assim facilitando a ruptura do invólucro. Segundo a qualidade do café, de onde se tiram as sementes, é estabelecida a quantidade destas. Assim, para
se obter um quilograma de sementes preparadas são necessários 2.530 gramas de café Nacional; 2.600 de Bourbon; 3.125 de Botucatu; e 1.210 de
Maragogipe.
Estabelecem-se as sementeiras em clareiras de capoeiras ou matas, em
razão da chuva, ou húmus, do respectivo terreno. O viveiro assim feito exige cuidados escrupulosos de limpeza, regularidade das regas,
sombra etc.
Nos canteiros, são as sementes enterradas a 2 centímetros de profundidade e guardando entre si a distância de 2 a 3 centímetros. Em quatro ou cinco
semanas, sob condições favoráveis, germinam as sementeiras. Faz-se então a plantação definitiva dos campos destinados aos cafezais.
Além desse, há o processo chamado de caroço, que consiste na inumação das
sementes no próprio cafezal, destinando-se uma das covas para a plantação das sementes. Alguns agricultores preconizam este processo por evitar a
transplantação. Finalmente, há a classe dos viveiros espontâneos, cuja aplicação tem contra si o parecer experiente dos conhecedores, que não julgam
que dêem bom cafezal as mudas desses viveiros a que chamam de capoeira. O caso é que o seu emprego se reduz cada vez mais. Nas dificuldades
de fazer-se o trabalho de seleção, a muda de capoeira, entretanto, não é completamente condenada.
O primeiro trabalho a fazer-se na zona destinada ao cafezal é o seu
desbastamento, infelizmente nem sempre obedecendo a um critério justo e razoável. Enquanto se abandonam terras velhas que a moderna agricultura
consegue, por processos vários, revigorar, a foice, o machado e o fogo derrubam florestas. Este modo de agir tem sido modificado gradualmente,
graças ao esclarecimento da agricultura, que já vai compreendendo o seu erro.
A derrubada do terreno faz-se igualmente de abril em diante. Neste trabalho, que
oferece, aliás, sérios perigos, são empregados trabalhadores nacionais, que agem nesta primeira fase do trabalho do cultivo do café, chamada
roçagem. Derrubada a mata, é deixada a secar até agosto, ocasião propícia para a queimada, quando se deita fogo aos destroços das árvores
postas abaixo. Esse serviço é contratado por 170$000 a 200$000 cada 5 hectares.
Procede-se, então, ao trabalho de alinhamento que já é feito por outra turma de
trabalhadores, ainda nacionais. Essa turma toma conta do terreno, instala-se e só deixa o café quatro anos depois. O seu trabalho é pago à razão de
200$000 por milheiro de pés tratados, no fim desse prazo. Durante ele, o plantador cultiva para si cereais, leguminosas e tubérculos, vendendo o
produto para seu lucro pessoal. É uma concessão de todos os contratos de plantação de café. Terminados os quatro anos, os plantadores entregam os
cafezais aos fazendeiros, prontos para darem frutos, recebendo 200$000 por cada mil pés que deixam adultos.
Os plantadores acompanham, com uma assistência diária de cuidados, o
desenvolvimento da planta, na sua infância e puberdade: fazendo as capinas, resguardando-a dos rigores e desequilíbrios das estações, como
mestres-escolas preparam crianças para o curso secundário, que, no caso do café, é a colheita.
Eis como eles operam: alinhado o terreno por meio de cordões, as covas que
receberão o cafeeiro são demarcadas por sinais, covas que são separadas por espaços que medeiam entre 2,64 m, 3,05 m e 4,05 m, sendo preferíveis
estas últimas distâncias, que estão sendo as mais adotadas. Abertas as covas, dão-se-lhes 0,40 m a 0,50 m de profundidade, de corte geralmente
quadrado.
Tendo já visto como se faz o processo do caroço, vamos ver agora o da
transplantação. Cuidadosamente são as plantas tiradas dos viveiros levadas para as covas, onde são enterradas depois de despontarem o peão
(raiz mestra), as pequenas raízes e a haste. Tem-se todo o cuidado em não forçar a posição do peão e em dar-se à cova uma disposição que
permita o fácil escoamento da água excessiva.
Em seguida, as terras plantadas são abrigadas por cobertas feitas geralmente com
palha de milho, usando-se também a plantação prévia de milho, mamona, mandioca, a fim de que a sombra de sua folhagem proteja e abrigue as plantas
de café nessa crise difícil que é a da péga. Em seguida é comprimida sobre as raízes, depois de cheio o espaço livre das covas.
Um dos processos mais aconselháveis é o da transplantação feita de sorte que as
mudas levem para a cova a raiz envolta na terra do viveiro de onde vieram, com o intuito de evitar-lhes a transição brusca do ambiente subterrâneo.
Em boas condições atmosféricas e com os cuidados indispensáveis, os futuros
cafeeiros pegam em poucos dias. Nos casos em que a terra onde se planta seja velha ou não de mata, usa-se estrumá-la. As plantações são
feitas, em geral, entre novembro e fevereiro. Forma-se agora uma forte corrente contra o processo de devastação florestal, para o plantio do café,
mostrando-se os inconvenientes desse processo, quando basta manter nos campos velhos grandes manadas de gado, indústria também produtiva, e
que, além dos lucros de pastagem que oferece, se encarrega da estrumagem dessas terras esgotadas e que precisam tonificar-se, auxiliando-se assim,
mutuamente, duas indústrias igualmente remuneradoras.
Um dos maiores cuidados da cultura do cafezal é a mais absoluta limpeza do
terreno de quaisquer vegetações. Os cafezais sofrem muito mais as geadas e intempéries quando o terreno está sujo. Dos vários processos próprios
para a limpeza destaca-se o da coroação, que consiste em deixar um grande círculo limpo em volta de cada cafeeiro.
Além do processo de empreitada, para as culturas, usa-se também o de jornal,
pagando-se ao trabalhador de 800 réis a 1$200, com comida, e de 1$600 a 2$000 desde que este se alimente à sua custa.
No trabalho da cultura, às vezes, já intervém o colono, em geral italiano, sendo
que a sua ação é mais geral na colheita. Os proprietários fornecem casas ao colono, matas para suas culturas particulares e até pequenos pastos.
Chegada que é a época da colheita, as fazendas enchem-se de animação, aplicando-se a esse serviço homens, mulheres e crianças, enfim, todos os que
possam dar algum trabalho, fornecer uma parcela de atividade. Para se iniciar esse trabalho, é indispensável esperar que os frutos estejam bem
formados e amadurecidos.
Em cafezais bem carregados, um homem pode colher 400 a 450 litros, 8 a 9 medidas
de 50 litros de café em cerejas. São precisos ordinariamente 120 litros de cerejas para produzir 15 quilogramas de café preparado. A colheita por
árvore é muito variável, calculando o sr. van Delden Learn, especialista no assunto, em 344 gramas a capacidade de produção de cada pé de café, por
colheita, na zona do estado do Rio de Janeiro, ou 33 ½ arrobas por mil pés; e em 805 gramas a do cafeeiro das zonas de S. Paulo, ou 55 arrobas por
1.000 pés.
A colheita se faz, tendo o trabalhador preso ao pescoço, por cordas, um cesto ou
peneira em que caem os frutos que ele vai derriçando. Em São Paulo, adotam-se também lençóis de algodão estendidos e convenientemente esticados
sobre o terreno e onde são reunidos os frutos que vão caindo. Quando árvores são altas, os operários servem-se de uma pequena escada de mão para
melhor fazerem o trabalho. Colhida certa porção, com o auxílio da própria peneira, o trabalhador a expurga das folhas, paus etc., e recolhe a
montes para ser posteriormente medida.
A colheita dos frutos caídos no chão é feita à mão, varrendo-se o terreno, e
depois de desembaraçados de todo o cisco, pedras etc., são eles lavados, no local ou em lavadouros apropriados, na fazenda, para serem expurgados da
terra e de outros detritos que, porventura, ainda contenham. Assim preparado, é o café medido e transportado para os terreiros.
Em janeiro de 1906, o sr. Antonio de Milita, inspetor de Agricultura do estado
de São Paulo, obteve privilégio para uma série de aparelhos de sua invenção, destinados a aventar, peneirar e separar por dimensões e peso os frutos
do cafeeiro, eliminando os corpos estranhos. Alguns destes aparelhos funcionam nos próprios cafezais, outros nos terreiros.
São eles em número de seis, dos quais três ventilam e peneiram o café colhido na
árvore, deixando-o cair sobre lençóis, estendidos em volta desta, assim como o proveniente da varredura do terreno, que é reunido àquele. Dos outros
três aparelhos, dois servem para ventilar, peneirar e separar os pequenos seixos e fragmentos de madeira, terra, areia grossa, grãos chochos e
quaisquer corpos estranhos porventura misturados ao café colhido, separando também os grãos ou frutos, segundo as suas dimensões, e lançando fora o
café imprestável; finalmente, o sexto aparelho serve para ventilar o café colhido à mão e faz a separação dos grãos em maiores e menores no momento
da colheita.
Vem depois o trabalho de seca, a que já nos referimos. É a colheita o termo
final do trabalho propriamente agrícola e de liquidação das transações entre os fazendeiros e os colonos, cujas relações econômicas já apontamos.
Quando o contrato é de meação, divide-se o café colhido, sucedendo que o fazendeiro compra a parte do colono, quando este não queira vendê-lo
diretamente.
As moléstias que atacam o café são geralmente de origem parasitária. Muitas
vezes, porém, são devidas ao calor demasiado, às baixas temperaturas e outras intempéries. Dos insetos, vermes e parasitas vegetais, são peculiares
ao cafeeiro brasileiro a Raulana Goeldiana, que macula as folhas, e outros, vários, que atacam as raízes, insetos que perfuram folhas, ou destroem,
enfezam o tronco, certa casta de formigas, como as saúvas e o cupim etc.
Entre os parasitas que mais mal causam ao café, principalmente no Brasil,
destacam-se uns vermes nematóides, pertencentes ao grupo das anguillulas. São estas as principais causas da moléstia dos cafeeiros,
tornando-se necessárias todas as precauções para evitar ou circunscrever o mal que chega a destruir plantações inteiras.
Preparado, escolhido, separado e beneficiado o café, restam ainda três operações
que antecedem o seu destino final. Queremos falar da torração, a moagem e a decocção. A torração é a mera operação que, sob a sua simplicidade
aparente, exige grande cuidado para que não aconteça ao grão torrar-se demais nem ficar deficientemente torrado.
A pessoa que a tal operação procede deve providenciar para que o café receba a
ação do calor em todos os seus grãos, igualmente, até que estes adquiram uma cor de havana especial, peculiar ao produto, conhecida por "cor de
café", um castanho avermelhado. Desde que tal resultado comece a se manifestar e se sintam as primeiras exalações características do café
torrado, é tempo de cessar a torração, que já está completa. É preciso não deixar que a torração vá até os grãos começarem a secretar um líquido
oleaginoso, porque isso já é um começo de perda das suas propriedades essenciais.
Em seguida à torração, vem a moagem que reduz o grão a pó, trabalho mecânico que
não exige grandes atenções. Finalmente, a decocção, operação final, precisa ser feita com um critério de proporção entre a quantidade de pó e a de
água, a fim de que o café não fique demasiadamente forte nem tampouco fraco, conhecendo-se no Brasil por estes qualificativos os dois
aspectos da infusão resultante da proporção entre o pó e a água.
Muitas e variadas máquinas existem para o preparo de decocção, produzindo o
líquido com maior ou menor proporção. O processo do "saco", entretanto, ainda é o melhor, sendo o mais primitivo. Esses sacos são de tecido
grosso de algodão trançado, e têm a forma cônica, terminando em geral em bico, ao fundo. Aí se deita o pó, enquanto o saco é mantido numa tripeça
por um arco de arame que lhe mantém a boca aberta.
Feito isso, deita-se lentamente, sobre o pó, água a ferver, mexendo-se a papa
assim feita, para que a água entre em contato íntimo e completo com o café, filtrando-se através do pó. Nessa filtração, a água tinge-se de negro e
arrasta, em dissolução, todos os princípios solúveis existentes no café. E está pronta a deliciosa bebida que, adicionada do açúcar necessário para
lhe desfazer o amargor, reúne a um tempo a delícia do olfato e a delícia do paladar.
Amparo, centro da zona cafeeira
Foto publicada com o texto, página 345.
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Estado de S. Paulo – Pelo recenseamento agrícola levantado no ano de 1904-05, o estado de S. Paulo tinha 875.002 hectares plantados com 688.845.410 cafeeiros, dos
quais se consideram velhos 98.950.000. A produção total nesse ano foi de 36.355.288 arrobas (uma arroba tem 15 quilos), repartidas assim pelos cinco
distritos agrícolas do estado:
Distritos |
Cafeeiros |
Arrobas |
Primeiro |
107.595.339 |
3.726.078 |
Segundo |
307.646.153 |
16.321.469 |
Terceiro |
201.342.589 |
10.963.925 |
Quarto |
70.440.522 |
5.262.315 |
Quinto |
1.820.810 |
82.041 |
No primeiro distrito, percorrido pelas estradas de ferro Central do Brasil e S.
Paulo Railway Co., se encontra a mais velha região cafeeira do estado; os seus cafezais estão em decadência, mal produzindo 25 arrobas, em média,
por 1.000 pés. O segundo e o terceiro distritos constituem uma zona de forte produção, proporcionando 80% das colheitas anuais e dando de 50 a 100
arrobas por mil pés; esses dois distritos são servidos pelas vias férreas Mogiana e Paulista, com seus ramais.
O quarto distrito, percorrido pela estrada de ferro Sorocabana, é a região de
cafezais mais novos e, por isso, a sua produção tende a aumentar, alcançando as médias de 80 a 100 arrobas por 1.000 pés. O quinto distrito, no
litoral marítimo, não influi na produção do café, que não é própria à região.
Nas duas safras mais recentes, a produção total foi: em 1909-10, 12.285.224
sacas; em 1910-11, 8.880.145 sacas de quatro arrobas, ou 60 quilos. Os principais municípios produtores são os seguintes, com o número de cafeeiros
e a produção média anual:
|
Cafeeiros |
Arrobas |
Ribeirão Preto |
29.094.365 |
2.300.000 |
S. Simão |
26.782.000 |
1.460.000 |
Jaú |
22.749.494 |
1.450.000 |
S. Carlos |
25.049.217 |
1.100.000 |
Amparo |
18.763.800 |
900.000 |
Tais municípios e outros de menos importância ficam numa região ideal para o
café, que aí encontrou condições sem iguais em todo o mundo. De clima muito favorável à planta, ainda possuem um solo excelente, a famosa terra
roxa, produzida pela decomposição de rochas de origem vulcânica e enriquecida pelo húmus de florestas seculares. Favorecido por esse
conjunto de propícias circunstâncias, o estado de S. Paulo viu a sua produção cafeeira progredir com admirável rapidez. É o que demonstram os
algarismos da exportação, abaixo mencionados:
Anos |
Quilos |
Valor |
1900 |
366.700.935 |
266.780:394$ |
1901 |
602.005.632 |
290.482:447$ |
1902 |
508.290.160 |
226.588:204$ |
1903 |
473.667.486 |
201.324:425$ |
1904 |
380.080.210 |
224.835:631$ |
1905 |
450.731.848 |
213.789:473$ |
1906 |
616.683.973 |
291.055:726$ |
1907 |
674.863.571 |
310.904:607$ |
1908 |
496.028.650 |
246.551:044$ |
1909 |
802.190.738 |
369.007:739$ |
1910 |
421.992.494 |
194.116:547$ |
Essa exportação se efetuou tanto por Santos, como pelas fronteiras terrestres, e
se dirigiu para os países estrangeiros e para os demais estados brasileiros. Todavia, compreende somente o café produzido no estado de S. Paulo. De
modo que dá uma idéia exata da marcha seguida pela produção no último decênio.
Nota-se nesse quadro estatístico que a exportação varia muito de ano para ano,
posto que, desde 1903, o número de cafeeiros existentes quase não sofresse alteração, por motivo da lei impedindo novas plantações, com um imposto
proibitivo.
Verifica-se, porém, que a um ano de grande colheita se segue outro de pequena colheita, explicada pelo enfraquecimento das árvores. O estado cobra
sobre o café exportado um imposto de 9% ad valorem e mais cinco francos por saca.
Estado de Minas Gerais – A segunda região produtora, o estado de Minas Gerais, fornece quase dois terços do café que se exporta pelo porto do Rio de Janeiro. Avalia-se
que existam ali cerca de 451.000 hectares plantados com cafezais, contendo
315.622.000
cafeeiros, mais ou menos.
Na principal zona produtora, a de Leste, ou da
Mata, a
colheita do ano agrícola de 1904-5 foi oficialmente avaliada em 8.556.464 arrobas, ou 2.139.117 sacas de 60 quilos. Na zona do Sul, que exporta seus
cafés por Santos, a produção excedeu de 3.040.000 arrobas, ou 760.000 sacas. Com as outras
zonas
restantes, apurou-se uma colheita
total de
12.960.132 arrobas, ou 3.240.033 sacas, das quais se exportaram 2.290.033. Num ano mais recente e de produção maior, o de 1909-10, chegou-se ao
resultado seguinte:
Leste |
9.600.888 arrobas |
Sul |
4.480.000 arrobas |
Oeste |
744.000 arrobas |
Norte e
Centro |
440.000 arrobas |
Total |
15.264.888 arrobas |
Essa produção equivale a 3.816.222 sacas. Destas, exportaram-se 2.786.247, sendo
1.739.950 para o porto do Rio de Janeiro. O resto, ou 1.029.975 sacas, ficou para atender ao consumo interno, que é grande. A safra seguinte, de
1910-11, bem menor, rendeu 3.043.149 sacas, das quais 1.992.679 foram exportadas.
Na zona de Leste, em terreno montanhoso, proporcionando de 36 a 40 arrobas por
1.000 pés e excepcionalmente 50, os principais municípios produtores são estes, com a sua produção média anual: S. Paulo de Muriaé, 1.165.000
arrobas; Cataguazes, 810.000; Carangola, 700.000; e Juiz de Fora, 609.420.
Na zona do Sul, cujos 60.800.000 cafeeiros fornecem de 50 a 80 arrobas por mil
pés, os principais municípios são: S. Sebastião do Paraíso, 525.000 arrobas; Cabo Verde, 465.000; e Guaranésia, 418.000.
O progresso da lavoura cafeeira em Minas Gerais está perfeitamente revelado
pelos algarismos oficiais da exportação, desde alguns decênios atrás. Em 1830 o estado, então província, exportava 1.221.000 quilos. Em 1850, a
quantidade de café exportado subia a 113.503.960; em 1870, a 22.340.595; em 1890, a 58.253.188 quilos. Nos últimos anos, a exportação de café seguiu
esta marcha:
Anos |
Quilos |
Valor Rs. |
1900 |
139.954.220 |
87.957:803$ |
1901 |
188.698.465 |
97.642:324$ |
1902 |
178.121.955 |
83.361:075$ |
1903 |
180.959.467 |
77.692:290$ |
1904 |
129.594.890 |
77.756:934$ |
1905 |
120.356.216 |
58.238:428$ |
1906 |
143.254.498 |
68.336:286$ |
1907 |
199.676.234 |
69.086:682$ |
1908 |
148.356.909 |
51.924:918$ |
1909 |
167.174.868 |
70.243:444$ |
1910 |
119.560.790 |
60.015:400$ |
O governo do estado cobra um imposto de 8 ½ por cento ad valorem sobre o
café exportado e mais três francos, ouro, por saca.
Terreiro de secagem, Fazenda Dumont
Foto publicada com o texto, página 346.
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Estado do Rio de Janeiro – Até 1840, o estado do Rio de Janeiro foi a principal zona produtora de café em todo o Brasil. Mas, desse ano em diante, foi superada por S.
Paulo e desde 1890 perdeu o segundo lugar em favor de Minas Gerais. A zona produtora no estado do Rio de Janeiro divide-se em duas partes: a alta,
formada pela bacia do Rio Paraíba e seus afluentes; e a baixa, situada entre a Serra do Mar e o oceano. A parte daquela, vizinha do estado de
Minas, é a mais importante, contando os municípios maiores produtores: Vassouras, Cantagalo, Rezende, Barra Mansa etc.
No estado, a produção média costuma ser de 344 gramas por pé, ou 23 ½ arrobas
por 1.000 pés. É uma produção fraca, mas o produto é apreciado pelo seu sabor mais acre do que o de S. Paulo. Calcula-se que, no estado, devam
existir 198.500.000 cafeeiros. Na maioria, estão velhos e mal tratados, pouco produzindo. A safra do ano agrícola de 1909-10 pode ser assim
computada, em sacas de 60 quilos:
Exportadas |
931.151 sacas |
Consumo interno |
265.400 sacas |
Produção total |
1.196.551 sacas |
A safra seguinte, de 1910-11, rendeu menos, avaliando-se o consumo:
Exportadas |
754.216 sacas |
Consumo interno |
270.000 sacas |
Produção total |
1.024.216 sacas |
A produção mostra tendências para diminuir nos últimos tempos. É prova disso
este quadro da exportação no decênio findo, segundo os registros das estações arrecadadoras das rendas do estado, que cobra um imposto de 8 ½ ad
valorem sobre o café exportado:
Anos |
Quilos |
Valor Rs. |
1900 |
53.506.673 |
45.940:373$240 |
1901 |
101.624.320 |
52.253:713$500 |
1902 |
75.321.294 |
34.606:002$550 |
1903 |
75.545.060 |
32.575:615$290 |
1904 |
58.149.082 |
35.959:471$300 |
1905 |
54.941.779 |
27.330:994$150 |
1906 |
58.325.552 |
26.675:345$455 |
1907 |
75.568.357 |
27.907:545$930 |
1908 |
56.696.151 |
20.099:188$750 |
1909 |
55.869.060 |
25.765:316$120 |
1910 |
44.643.029 |
27.929:616$026 |
Para esse resultado, também contribui o aumento do consumo interno, pois a
população tem crescido de ano para ano. Mas a principal causa do enfraquecimento da exportação é a velhice dos cafezais, que não têm o trato
necessário por falta de braços suficientes.
Estado do Espírito Santo – Próxima à região cafeeira do Rio de Janeiro e Minas, fica a do Espírito Santo, quarto estado produtor. A exploração desta é relativamente nova
e mantém-se em prosperidade. No Espírito Santo, o café é produzido especialmente no Sul pelas colônias de estrangeiros dos arredores de Cachoeiro de
Itapemirim.
As condições culturais são idênticas às de Minas, ficando as lavouras em terras
novas, ainda há pouco virgens. A colheita de café para 1909-10 pode ser avaliada em 793.200 sacas, sendo 60.000 para consumo interno. Os
principais municípios produtores são: Itapemirim, com a média anual de 500 a 600.000 arrobas; Cachoeiro, com 650.000 a 700.000; e Santa Leopoldina,
com 50.000, mais ou menos.
Em 1892 o estado exportava apenas 16.673.362 quilos de café. Em 1895, esse total
elevou-se a 24.641.717 e em 1900, a 23;694.222. Daí em diante temos os dados oficiais abaixo indicados:
Anos |
Quilos |
Valor |
1903 |
42.006.742 |
18.032:081$000 |
1904 |
30.363.517 |
18.336:175$000 |
1905 |
33.601.254 |
15.015:341$000 |
1906 |
33.329.638 |
14.699:615$907 |
1907 |
43.801.326 |
16.289:243$626 |
1909 |
27.667.551 |
12.173:551$958 |
Nessa exportação, está incluído, não só o café que sai pelo porto de Vitória,
como ainda o que sai pelos portos de Piuma e Benevente e pela fronteira terrestre com o estado do Rio de janeiro.
Estado da Bahia – Quinto estado produtor de café, a Bahia tem uma produção pequena, que hoje serve sobretudo para atender ao consumo interno. No ano de 1909-10
ela pode ser calculada desta forma:
Exportadas |
163.028 sacas |
Consumo local |
256.972 sacas |
Total |
420.000 sacas |
A exportação do estado foi de 9.499.620 quilos em 1891. Em 1901 elevou-se
extraordinariamente a 25.281.989 quilos. Depois baixou bastante, como se verifica pelos dados a seguir:
Anos |
Quilos |
Valor |
1904 |
12.791.885 |
6.177:302$560 |
1905 |
9.171.504 |
3.451:228$105 |
1906 |
13.638.315 |
5.246:921$900 |
1907 |
13.070.793 |
4.219:195$535 |
1908 |
10.735.844 |
3.750:134$000 |
1909 |
9.781.700 |
4.104:810$180 |
O café da Bahia é de qualidade inferior, em virtude de ser preparado por
processos primitivos.
O comércio do café – Se a indústria do café constitui, desde o lançamento da semente à terra até o ensacamento, toda uma fisiologia completa, nem por isso ainda
ele pode entrar logo em consumo. Entre esta fase e o largo período que gasta o seu preparo interpõem-se outras duas que são a do transporte e
impostos e a do comércio do artigo, o qual, tal como se faz no Brasil, representa uma nova série de despesas e lucros para outros elementos de
atividade, além do produtor, antes de dado ao consumo interno ou externo.
O comércio do café é como que uma nova máquina de elaboração do produto, feita
por tais processos que, conseqüentemente, com ela, se cria mais uma agravação do seu custo. Em sacos de 60 quilogramas, é o café transportado da
fazenda para a estação mais próxima em carros, carroças, lombo de animal ou pequenas vias férreas, aí sendo verificada a pesagem e embarcado o
produto em busca dos seus principais mercados, os portos de Santos e do Rio de Janeiro.
Da fazenda à estação, o preço de transporte é, em média, de 200 réis por saca,
variando entre 4$000 e 6$000 o preço desse transporte das referidas estações aos portos de destino. Antes, porém, já o café pagou os impostos
estaduais, 9% ad valorem em S. Paulo e 8½% no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. Dos armazéns das estradas de ferro é o café
transportado e levado para os das docas ou para os depósitos dos comissários de café, pagando-se novo transporte de 300 réis por quilo em Santos e
200 na capital federal.
No armazém do comissário, o café sofre a operação da viragem, que é a mudança do
saco do fazendeiro pelo do comissário, trabalho pelo qual se cobra 140 a 200 réis por saca, retirando-se de cada saca uma certa quantidade, como
amostra que serve para estabelecer a identidade do café ensacado, que é novamente pesado. O trabalho de venda fica por conta do comissário, que vai
em busca de compradores, estabelecendo-se do choque desse movimento de oferta e procura a "cotação" do café.
Esta espécie de Bolsa do Café funciona no Centro do Comércio de Café, associação
mantida pelos comissários. Liquidada a venda, uma nova operação traz novo gravame ao café, com o rateio, operação esta que proporciona ao
intermediário mais 5 a 6% de lucro. Os comissários começaram de algum tempo a esta parte a sofrer a concorrência dos exportadores que, como as casas
Theodor Wille, Arbuckle e outras, compram diretamente o café ao fazendeiro, fazendo por sua conta todas as despesas do produto, da plantação até o
porto para onde é exportado.
Essa aquisição é feita a preços baixos, não melhorando, com a mudança de
processo, os lucros do produtor que quase nunca realiza os seus negócios diretamente até o embarque da mercadoria, não se entendendo diretamente com
os mercados consumidores.
Em condições tão onerosas, por mais larga que fosse a margem de lucro dada pelo
café, essa situação só podia concorrer para apressar a crise que deu origem ao convênio de Taubaté, que era uma questão de oportunidade que
infelizmente se verificou com larga repercussão em todo o país, encontrando-o numa superabundância que não tinha a extração correspondente nos
mercados mundiais, sendo que, aliás (é preciso que se diga) a capacidade de consumo destes ainda está longe de atingir o seu máximo, levando-se em
conta além disso que, nesse consumo, em geral entra apenas uma parte de café verdadeiro, sendo o resto representado pela chicória e outras misturas
que desfiguram o café verdadeiro, quando chegado ao termo de seu destino é servido, em infusão, ao consumidor estrangeiro.
A crise do café e a "Valorização" – O rápido crescimento da produção de café no estado de S. Paulo originou uma grave crise no comércio desse produto,
afetando aos plantadores. Inundados os mercados com o produto paulista, os estoques cresceram e os preços baixaram, causando grandes prejuízos. De
1886 a 1896, os preços do café haviam atingido de 70 a 132 francos por 50 quilos, no Havre. Mas a colheita de 1897-98, mais abundante, elevou
subitamente o estoque mundial a cinco e meio ou seis milhões de sacas. Em conseqüência, veio uma forte baixa nos preços; baixa que se tornou mais
sensível depois da colheita de 1901-02, quando o estoque mundial subiu a 11.305.000 sacas.
Em 1903, já os preços tinham baixado a 30 francos por 50 quilos. Então, a
situação dos agricultores paulistas chegou a ser extremamente difícil: o seu trabalho não era suficientemente remunerado e estavam na iminência de
abandonar parte das plantações.
Nessas condições foi que, em setembro de 1905, uma floração extraordinária dos
cafeeiros, favorecida por excepcionais circunstâncias climatéricas, anunciou uma colheita enorme. Uma produção formidável, calculada em 17 milhões
de sacas, ia afluir para Santos. O pânico dominou então os plantadores, que se viram ameaçados pela ruína completa, estando impossibilitados de
resistir à nova baixa, por falta de capitais.
Diante desse perigo que afetava também as rendas públicas, foi o Governo do
Estado obrigado a intervir, em socorro dos agricultores. Ele negociou com os Estados de Minas Gerais e do Rio de Janeiro um acordo destinado a
combater a crise do café e ao qual já nos referimos. Esse acordo, firmado em 26 de fevereiro de 1906, na cidade de Taubaté, ficou geralmente
conhecido pelo nome de Convênio de Taubaté.
Tendo, porém, surgido dificuldades para uma ação conjunta dos três estados
principais produtores, o Governo do Estado de S. Paulo resolveu operar por sua própria conta, comprando e armazenando uma parte da colheita de
1906-7. Para esse fim, o Governo de S. Paulo, que já havia impedido novas plantações de café por meio de um imposto proibitivo, contraiu
seguidamente dois empréstimos externos – um de 1.000.000 e outro de 3.000.000 de libras esterlinas. E não sendo isto suficiente, conseguiu da União
um novo empréstimo de £3.000.000.
Com estes recursos e mais o produto dos saques sobre banqueiros europeus, na
proporção de 80% mais ou menos, sobre o valor dos cafés embarcados, comprou o Governo de S. Paulo, por intermédio de casas comerciais, todo o café
disponível em Santos, Rio de Janeiro e S. Paulo. Em princípio de 1908, possuía e retinha 8.474.623 sacas, armazenadas no Havre, Hamburgo, Nova York,
Antuérpia, Londres, Rotterdam, Trieste e outras praças.
Estando conseguido o principal objetivo da campanha da defesa do café, isto é,
afastada dos mercados uma parte da imensa produção de 1906-07, o governo adotou uma série de medidas para consolidar a situação, que num momento
chegou a ser bem difícil.
Tais medidas, autorizadas pela lei nº 1.127 de 25 de agosto de 1908, consistiram
no seguinte: 1. limitação da exportação de café de S. Paulo a nove milhões de sacas em 1908-09, a nove milhões e meio em 1909-10 e a dez
milhões de 1911 em diante, por meio de um forte imposto adicional cobrado sobre o café que excedesse dessas quantidades; 2. elevação da
sobretaxa de três a cinco francos cobrada sobre cada saca de café exportada, a fim de, com sua renda, garantir o serviço de um empréstimo externo;
3. autorização para o levantamento de um empréstimo externo de £15.000.000 para consolidar todos os encargos oriundos da defesa do café.
Realizado o empréstimo de £15.000.000, organizou-se na Europa um Comitê
encarregado da liquidação dos cafés pertencentes ao estado, conforme contrato especial lavrado em Londres, a 1 de dezembro de 1908. A esse Comitê,
composto de sete membros, um dos quais representava o Governo de S. Paulo, competia:
a) pagar e liquidar, por intermédio dos banqueiros, todos os fundos ou qualquer
parte dos fundos devidos por adiantamentos feitos sob garantia de café pertencente ao Governo, desonerando esse café dos ônus que sobre ele pesavam;
b) pagar, por intermédio dos banqueiros, todos os seguros, despesas de
armazenagem e outras relativas ao dito café;
c) fazer a liquidação dos estoques de café, em nome e por conta do Governo de S.
Paulo, por meio de leilões públicos, ou ofertas em cartas lacradas, sendo vendidas 500.000 sacas em 1909-10; 600.000 em 1910-11; 700.000 em 1912-13;
e daí por diante 700.000 em cada ano, até liquidar-se o estoque.
Fora destas quantidades mínimas, e em qualquer tempo, antes do começo das vendas
obrigatórias, o Comitê poderia fornecer ao comércio as quantidades de que precisasse, tomando por base o preço de 47 francos por 50 quilos good
average e 50 francos para o tipo superior do Havre.
O referido Comitê recebeu 6.843.152 sacas de café e vendeu 532.829 no ano de
1910. Em 1911 foram ainda vendidas 1.200.000 sacas, em razão da forte procura nos mercados, ficando o estoque reduzido a 5.105.133 sacas. Com a
retirada dessa quantidade de sacas de café dos mercados mundiais, coincidiu a pequena colheita de 1910-11 no Brasil. Conseqüentemente, em 1911 o
preço do café no Havre chegava a 74 francos e em outubro de 1911 atingia mesmo a 90 francos.
Vencida a crise do café pela ação do Governo de S. Paulo, com as operações
denominadas da "Valorização", a situação da lavoura do café tornou-se próspera e sólida. Esta situação pode ser apreciada pelos quadros estatísticos
adiante reproduzidos. Os seguintes quadros estatísticos dão uma impressão global do movimento do café:
Quantidade
e valor da exportação do café em vários qüinqüênios entre os anos de 1839 e de 1907 |
Anos |
Quantidade em
quilogramas |
Valor em mil-réis |
1839-40 |
82.975.532 |
20.176:400 |
1840-41 |
74.314.900 |
17.804:400 |
1841-42 |
80.536.135 |
18.002:300 |
1842-43 |
86.639.200 |
17.091:200 |
1843-44 |
92.456.493 |
19.985:800 |
1849-50 |
87.748.861 |
22.838:070 |
1850-51 |
150.072.587 |
32.603:951 |
1851-52 |
141.148.221 |
32.954:510 |
1852-53 |
146.755.845 |
33.897:352 |
1853-54 |
120.952.270 |
33.344:668 |
1859-60 |
151.393.519 |
60.235:984 |
1860-61 |
213.928.269 |
79.659:981 |
1861-62 |
144.329.542 |
58.742:390 |
1862-63 |
121.032.418 |
36.530:735 |
1863-64 |
110.753.938 |
54.050:634 |
1869-70 |
186.602.219 |
77.094:000 |
1870-71 |
226.377.577 |
82.651:600 |
1871-72 |
147.336.106 |
72.858:800 |
1872-73 |
209.929.897 |
115.377:100 |
1873-74 |
168.623.808 |
110.142:600 |
1879-80 |
157.036.317 |
126.259:900 |
1880-81 |
219.569.022 |
126.134:000 |
1881-82 |
244.888.012 |
104.752:700 |
1882-83 |
401.214.840 |
122.643:350 |
1883-84 |
318.978.026 |
130.082:650 |
1903 |
775.650.770 |
384.299:165 |
1904 |
601.476.260 |
391.591:934 |
1905 |
649.246.670 |
324.688:378 |
1906 |
837.952.162 |
418.403:849 |
1907 |
940.828.521 |
453.780:826 |
Estatística do café entrado nos portos de embarque no Brasil, em sacos de 60 quilos |
Anos |
Rio |
Santos |
Vitória |
Bahia |
Outros portos |
1880-81 |
4.521.093 |
1.125.915 |
-- |
135.941 |
-- |
1881-82 |
3.841.000 |
1.723.332 |
-- |
126.477 |
-- |
1882-83 |
4.736.899 |
1.967.881 |
-- |
147.235 |
-- |
1883-84 |
3.185.823 |
1.871.516 |
-- |
108.569 |
-- |
1884-85 |
4.276.428 |
2.094.721 |
-- |
121.000 |
-- |
1885-86 |
3.779.218 |
1.668.980 |
-- |
208.000 |
-- |
1886-87 |
3.499.099 |
2.583.458 |
-- |
150.000 |
-- |
1887-88 |
1.910.829 |
1.120.145 |
-- |
106.000 |
-- |
1888-89 |
4.188.669 |
2.634.996 |
27.000 |
164.000 |
-- |
1889-90 |
2.427.673 |
1.870.202 |
14.000 |
170.000 |
-- |
1890-91 |
2.421.424 |
2.952.322 |
62.000 |
156.000 |
-- |
1891-92 |
3.718.899 |
3.386.084 |
94.000 |
306.000 |
-- |
1892-93 |
3.112.476 |
3.206.333 |
150.000 |
192.000 |
-- |
1893-94 |
3.856.304 |
1.685.055 |
358.000 |
370.000 |
-- |
1894-95 |
2.693.001 |
4.007.376 |
252.000 |
290.000 |
-- |
1895-96 |
2.398.988 |
3.093.548 |
303.000 |
211.000 |
-- |
1896-97 |
3.578.782 |
5.104.486 |
291.702 |
323.000 |
-- |
1897-98 |
4.304.638 |
6.152.594 |
453.778 |
302.000 |
-- |
1898-99 |
3.320.160 |
5.569.650 |
288.913 |
267.724 |
-- |
1899-1900 |
3.395.337 |
5.711.732 |
281.664 |
174.721 |
-- |
1900-01 |
3.015.968 |
7.973.148 |
203.699 |
180.556 |
-- |
1901-02 |
5.371.775 |
10.171.916 |
467.646 |
241.719 |
30.273 |
1902-03 |
4.002.935 |
8.357.449 |
414.151 |
197.914 |
21.107 |
1903-04 |
4.056.587 |
6.402.377 |
435.033 |
274.158 |
24.959 |
1904-05 |
2.591.567 |
7.423.002 |
389.382 |
179.349 |
13.780 |
1905-06 |
3.406.035 |
6.982.885 |
397.244 |
229.112 |
40.102 |
1906-07 |
4.439.963 |
15.392.170 |
409.412 |
150.223 |
17.412 |
1907-08 |
3.409.203 |
7.203.809 |
482.553 |
230.051 |
23.655 |
1908-09 |
2.926.501 |
9.533.243 |
395.459 |
175.865 |
7.970 |
1909-10 |
3.556.337 |
11.495.419 |
-- |
-- |
-- |
1910-11 |
2.488.811 |
8.110.145 |
-- |
-- |
-- |
Resumo do movimento geral de café em
Santos de 1898-1899 até 1910-1911 Clique >>aqui<<
ou para ampliar esta tabela |
Anos civis |
Anos |
En-
tra-
do |
Ex-
por-
tado |
Ven-
dido |
Base |
Pauta |
Estoque |
Câmbio a 90 d/v |
Valor
oficial
do café
paulista |
Direi-
tos
pagos
em papel |
Mín. |
Máx. |
Mín. |
Máx. |
em
31/12 |
Mín. |
Máx. |
1899 |
6
.391
.398 |
6
.390
.596 |
4
.996
.000 |
5$900 |
9$000 |
600 |
880 |
628.103 |
6 11/16 |
8 5/16 |
264
.076
:940
$548 |
29
.050
:730
$688 |
1900 |
6
.518
.709 |
5
.851
.993 |
4
.895
.000 |
5$600 |
9$700 |
590 |
960 |
1.253.083 |
7 1/32 |
14 7/16 |
266
.780
:394
$879 |
29
.282
:311
$338 |
1901 |
9
.594
.817 |
9
.620
.192 |
6
.686
.000 |
4$100 |
6$200 |
420 |
620 |
1.138.865 |
9 19/32 |
13 3/8 |
290
.482
:447
$261 |
31
.980
:404
$656 |
1902 |
8
.808
.382 |
8
.717
.827 |
5
.833
.000 |
4$100 |
5$400 |
410 |
560 |
1.333.165 |
11 1/16 |
12 15/16 |
226
.588
:204
$884 |
24
.918
:583
$792 |
1903 |
7
.875
.177 |
8
.018
.755 |
5
.599
.000 |
3$600 |
6$200 |
370 |
600 |
1.234.960 |
11 19/32 |
12 19/32 |
201
.324
:425
$035 |
22
.145
:686
$754 |
1904 |
7
.150
.832 |
6
.584
.042 |
4
.764
.500 |
4$800 |
6$500 |
520 |
710 |
1.747.271 |
11 27/32 |
13 9/16 |
224
.835
:631
$286 |
24
.816
:823
$829 |
1905 |
7
.028
.054 |
7
.465
.120 |
4
.268
.652 |
3$800 |
5$300 |
440 |
600 |
1.341.012 |
13 19/32 |
18 7/32 |
203
.266
:246
$510 |
18
.566
:790
$197 |
1906 |
10
.960
.991 |
10
.172
.874 |
7
.126
.408 |
3$600 |
4$800 |
480 |
500 |
2.156.014 |
14 5/8 |
17 17/32 |
281
.603
:227
$920 |
25
.148
:564
$011 |
1907 |
44
.316
.931 |
11
.561
.491 |
9
.304
.089 |
3$200 |
5$000 |
460 |
460 |
1.829.502 |
15 5/32 |
15 3/16 |
303
.365
:528
$620 |
27
.303
:147
$363 |
1908 |
9
.249
.859 |
8
.997
.088 |
5
.445
.213 |
3$400 |
4$400 |
460 |
460 |
1.966.710 |
15 5/32 |
15 3/16 |
238
.176
:794
$400 |
21
.435
:911
$496 |
1909 |
12
.444
.699 |
13
.569
.886 |
7
.650
.634 |
3$600 |
4$300 |
460 |
460 |
983.075 |
15 7/32 |
15 5/32 |
365
.900
:238
$000 |
33
.186
:921
$262 |
1910 |
8
.301
.340 |
6
.839
.334 |
5
.047
.617 |
4$100 |
7$500 |
460 |
460 |
2.405.715 |
15 1/16 |
18 5/32 |
196
.885
:608
$044 |
17
.769
:014
$000 |
Anos de safra |
em 30/6 |
|
1898
-
1899 |
5
.569
.650 |
5
.535
.361 |
4
.668
.000 |
6$400 |
8$800 |
650 |
780 |
284.422 |
5 5/8 |
8 15/16 |
229
.892
:160
$163 |
25
.288
:137
$618 |
1899
-
1900 |
5
.711
.732 |
5
.742
.362 |
4
.595
.000 |
5$900 |
9$700 |
600 |
960 |
279.236 |
6 11/16 |
14 7/16 |
241
.779
:407
$300 |
26
.595
:723
$142 |
1900
-
1901 |
7
.973
.148 |
7
.821
.541 |
6
.467
.000 |
4$100 |
7$800 |
420 |
780 |
386.643 |
7 1/32 |
13 3/8 |
298
.287
:710
$664 |
32
.811
:648
$603 |
1901
-
1902 |
10
.171
.916 |
9
.731
.921 |
5
.953
.000 |
4$100 |
5$80 |
420 |
580 |
832.028 |
9 19/32 |
12 15/16 |
280
.470
:532
$927 |
30
.851
:758
$622 |
1902
-
1903 |
8
.357
.452 |
8
.542
.481 |
6
.335
.000 |
3$600 |
5$200 |
370 |
510 |
640.763 |
11 3/16 |
12 19/32 |
216
.431
:838
$627 |
23
.807
:502
$249 |
1903
-
1904 |
6
.402
.377 |
6
.537
.226 |
4
.784
.000 |
3$600 |
6$500 |
370 |
710 |
554.811 |
11 19/32 |
13 9/16 |
186
.441
:846
$200 |
20
.518
:603
$082 |
1904
-
1905 |
7
.423
.002 |
7
.174
.557 |
4
.595
.112 |
3$800 |
5$700 |
440 |
650 |
816.678 |
11 27/32 |
18 7/32 |
234
.654
:848
$800 |
24
.330
:181
$617 |
1905
-
1906 |
6
.982
.885 |
7
.280
.162 |
3
.910
.393 |
3$700 |
4$400 |
450 |
480 |
509.208 |
13 19/32 |
17 19/32 |
192
.670
:939
$387 |
17
.340
:785
$243 |
1906
-
1907 |
15
.392
.170 |
13
.874
.113 |
11
.694
.927 |
3$200 |
4$200 |
380 |
500 |
1.943.058 |
15 5/32 |
15 1/4 |
375
.396
:205
$520 |
32
.786
:182
$312 |
1907
-
1908 |
7
.203
.809 |
8
.515
.244 |
5
.256
.785 |
3$300 |
4$100 |
460 |
460 |
702.414 |
15 5/32 |
15 3/16 |
220
.957
:874
$776 |
19
.886
:535
$040 |
1908
-
1909 |
9
.533
.243 |
9
.381
.867 |
5
.544
.268 |
2$800 |
4$200 |
460 |
460 |
858.868 |
15 5/32 |
18 3/16 |
258
.364
:262
$400 |
23
.176
:273
$217 |
1909
-
1910 |
11
.495
.419 |
10
.278
.215 |
7
.255
.408 |
3$700 |
4$400 |
460 |
460 |
2.030.516 |
15 3/4 |
16 21/32 |
270
.311
:888
$400 |
24
.328
:069
$956 |
1910
-
1911 |
8
.110
.145 |
9
.440
.495 |
5
.816
.791 |
4$200 |
7$500 |
460 |
600 |
605.284 |
16 d. |
18 5/32 |
275
.571
:912
$000 |
22
.776
:437
$980 |
A propaganda do café - Grandes têm sido os esforços de
propaganda em prol do café brasileiro na Europa, feita, já pelo governo federal, já pelos governos dos estados produtores.
Grandes resultados já têm sido obtidos, mas ainda muito há que
fazer. Para isso, basta considerar que, antes de mais nada, o primeiro trabalho a fazer é restabelecer a identidade anulada do café do Brasil, que
aparece com todas as procedências, conservando o nome de brasileiras as qualidades inferiores. Por outro lado, as falsificações feitas em grande
proporção, com chicória, croto de figueira, fruto de fedegoso e outros ingredientes, fazem com que o café verdadeiro não seja conhecido nem de
longe, pelo seu verdadeiro paladar, dos consumidores.
Uma das primeiras investidas contra essas falsificações foi o
trabalho apresentado em Paris, à Liga do Alimento Puro, a qual pretendeu obter do governo francês a proibição do uso do nome de café a este produto
quando adicionado de qualquer outra substância.
Os resultados não foram francamente positivos, não se obtendo
essas medidas, sob a razão de que tais misturas não eram nocivas à saúde pública e que já haviam caído em grande uso. Esta última alegação era
infelizmente verdadeira e o café puro ver-se-ia repelido como um intruso, ao lado do café misturado numa proporção em que a rubiácea entra, em
média, só com 5%!
Mas houve sempre um resultado: o de se revelar ao público a
existência dessa substância em estado de pureza e com as suas qualidades fisiológicas muito mais vigorosas e intactas do que a beberagem que com o
nome de café é ministrada na Europa.
Ao lado disso, as comissões da propaganda, quer em exposições,
quer auxiliando a fundação de cafés em muitas cidades da Europa, esforça-se, ao mesmo tempo, em restituir ao café brasileiro a sua verdadeira
identidade e em revelar e estimular o gosto pelo café puro, que é quase totalmente desconhecido.
Graças a esses esforços tenazes, é lícito esperar que, finalmente,
se faça justiça a esse produto tão apreciado, tão recomendado, tão útil, e cuja identidade tem sido sofismada por tantos processos. É uma questão de
pertinácia e insistência na campanha em boa hora iniciada.
Cafezais da Fazenda Mueju
Foto publicada com o texto, página 348.
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