1) Vendedor de cestos; 2) Pastorícia de outrora; 3) Como se transportava o café; 4) Vendedores
ambulantes
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História (C)
Por Arnold Wright
Capítulo III
A invasão holandesa
Depois dos franceses e ingleses, seguiram-se os holandeses, na
exploração do Brasil, termo cujo sentido, naquela época, encobria um sistema de pirataria, mais ou menos disfarçado. Desde os primeiros tempos da
vida do Brasil como colônia de Portugal, alguns holandeses, isoladamente, haviam estado ligados ao país, no desempenho de várias funções e ao
serviço dos portugueses; Hans Staden, que deixou uma das melhores descrições dos usos e costumes das tribos de índios, constitui um exemplo frisante
desta classe de aventureiros.
Nos últimos anos do século XVI e no princípio do XVII, quando o aniquilamento do poder naval
espanhol, pelo desastre da Grande Armada, acabou com o embargo estabelecido sobre a navegação, pelas duas potências da Península Ibérica, começaram
os navios holandeses a cruzar os mares, em busca de comércio. Dirigiram-se de preferência às regiões situadas ao Norte do Amazonas e por fim, do
mesmo modo que os franceses, aí fundaram diversos estabelecimentos; também como os franceses, foram expulsos pelos portugueses, os quais, para que
não surgissem outras dúvidas acerca do seu direito de propriedade naquela zona do continente sul-americano e para firmar a sua ocupação,
estabeleceram uma nova capitania, à qual deram o nome de Pará.
A sede da capitania foi fundada a 3 de dezembro de 1615, em Belém, ou melhor, para dar o nome
completo: Santa Maria de Nazareth de Belém do Grão-Pará. Durante algum tempo, não foi a supremacia dos portugueses naquela zona discutida nem
disputada, ou, em todo o caso, não foi atacada. Mas a organização em Amsterdam, Holanda, da poderosa Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, em
1621, veio dar novo aspecto à questão da soberania ao Norte do país. No correr de 1623, ficou tudo pronto para uma expedição ao Brasil. O comando da
esquadra foi entregue ao afamado almirante Jacob Willekens, ficando as forças de desembarque e o comando militar da expedição a cargo do célebre
Pieter Heyne Hans Vandort.
Deixou a esquadra a Holanda em dezembro; e tendo tido tempestuosa travessia, apareceu à vista da
Bahia alguns meses depois. As ordens que Willekens trazia mandavam-lhe atacar São Salvador e ocupar esta capital. Ofereceram os portugueses diminuta
resistência aos assaltantes, que se apoderaram da cidade e declararam o governador geral prisioneiro. Sob a hábil direção de Vandort, foram
reconstruídas e mais bem armadas as fortificações. Entretanto, lançava o chefe holandês proclamações, garantindo a liberdade de propriedade e a
religiosa a todos aqueles que se quisessem submeter ao domínio holandês.
A maior parte da população portuguesa não se quis submeter; grande número de judeus, porém, e a
população negra, assentiram em acatar e defender o regime holandês. Até aí não tinham encontrado os holandeses a menor dificuldade na execução do
seu plano; em breve, porém, reconheceram que a permanência na Bahia não era ainda um fato consumado.
Sacudidos em sua indiferença e alarmados com a intenção evidente dos holandeses de se não
contentar com saquear a cidade, mas estabelecer-se como colonizadores, organizaram os portugueses um movimento para a expulsão dos invasores. O
chefe deste movimento foi o bispo d. Marcos Teixeira. Com o hábito de penitente, organizou este ousado prelado serviços religiosos de súplicas à
Providência e, de crucifixo em punho, como um estandarte, exortava os seus patrícios a tomar armas em defesa da religião, do soo e dos seus
direitos.
Em breve havia d. Marcos reunido em volta de si uma força considerável, composta em grande parte
de portugueses, mas que incluía também 250 índios. Tomando posições no Rio Vermelho, a cerca de uma légua da cidade, aí estabeleceram os portugueses
um campo fortificado, munido de canhões tirados dum navio que havia escapado aos holandeses.
Vandort, em pessoa, saiu da cidade, para efetuar o reconhecimento das posições dos portugueses; e,
tendo desprecavidamente avançado em território inimigo, foi surpreendido numa emboscada e morto em combate corpo a corpo, com um oficial português.
Albert Schonten, seu imediato, tomou o comando das forças holandesas, concentradas na Bahia; e igualmente morreu em combate, pouco tempo depois.
Apesar de todos estes revezes, Willekens partiu para a Europa, com onze dos seus navios, deixando
os restantes sob o comando do almirante Hayne, na Bahia. Mas Hayne, arrojado marinheiro, em vez de se esforçar por consolidar a posição dos
holandeses na Bahia, empreendeu uma expedição ao Espírito Santo, que foi desastrosa. Quando voltava à Bahia, encontrou o porto já ocupado pelas
esquadras combinadas de Portugal e Espanha, enviadas da Europa. Esta frota era a mais poderosa que havia atravessado a Linha. O contingente
português compunha-se de 26 navios e 4.000 homens, e o espanhol de 40 navios e 8.000 homens. O comando supremo estava entregue a d. Fradique de
Toledo, nobre espanhol, ao passo que, a bordo dos navios portugueses, vinham muitos capitães ilustres, entre eles Affonso de Noronha, o qual fora
governador geral da Índia, e nesse cargo muito se ilustrara.
Os holandeses ofereceram ainda uma resistência valente e brilhante; foram, porém, finalmente
obrigados a capitular. No dia seguinte ao da rendição, apareceu em frente à Bahia a esquadra holandesa de socorro, composta de 34 navios, sob
o comando do almirante Bondeninj Hendrikszon, que, não tendo chegado a tempo, se fez rumo do Norte. Foi tal o fracasso desta tentativa que, por
algum tempo, não pensaram os perseverantes mercadores de Amsterdam em renovar o ataque.
Em 1626, porém, Hayne trouxe nova esquadra à Bahia e aí atacou os navios espanhóis, conseguindo
capturar alguns. Depois deste feito, andou Hayne cruzando ao longo da costa do Brasil e causando grandes prejuízos ao comércio português; depois,
fez-se ao largo, em busca de novas presas. Encontrando-se com uma frota espanhola, que vinha do México para a Espanha, capturou-a, sem deixar
escapar um só navio. Com esta proeza, obtiveram os holandeses despojos no valor de quatorze milhões de florins ou um milhão e duzentas mil libras, o
que constitui uma soma enorme, levando-se em consideração o valor muito maior do dinheiro naquele tempo.
Animada com o rendoso e brilhante resultado que a expedição de Hayne lhe havia trazido, aparelhou
a Companhia, em 1629, outra esquadra com destino ao Brasil. Representava esta uma força formidável, composta de 50 navios e 7.000 homens. Avisados,
haviam os portugueses feito preparativos de resistência e defesa das suas posições; os holandeses, porém, superiores em número e em tática militar,
venceram todas as oposições e, nove dias depois (23 de janeiro), estavam senhores da cidade e do porto.
Mas, ainda antes de obterem os holandeses o completo domínio na costa, se começava já a formar em
Bom Jesus, localidade mais ou menos eqüidistante de Olinda e do Recife, um núcleo de oposicionistas ao domínio holandês. Aos ataques operados pelos
portugueses contra os bem fortificados postos holandeses, conseguiram estes resistir e repelir o inimigo; mas o cerco estabelecido do lado de terra,
que cortava todas as comunicações com o interior, em breve começou a produzir uma perigosa escassez de provisões no acampamento holandês.
Com sorte vária, se sucederam, durante anos, os combates, sem que, todavia, se enfraquecesse a
posição dos holandeses na costa. Em 1632, a Companhia das Índias Ocidentais mandou ao Recife dois comissários, com instruções para, examinadas as
posições holandesas, tomar a deliberação de evacuarem o país, caso não vissem probabilidades de bom êxito para o empreendimento, ou na hipótese
contrária, prosseguir na conquista do interior, com mais vigor e energia.
De acordo com as instruções recebidas e decidindo-se pela alternativa da conquista, atacaram os
comissários, com bom êxito, as posições dos portugueses e capturaram o forte de Nazareth e a Paraíba, em 1634. Nos anos que se seguiram, conseguiram
eles tomar de assalto o campo fortificado que os portugueses tinham fora da cidade; conseguiu, entretanto, o valente chefe português, Mathias de
Albuquerque, as melhores condições, retirando-se com honras militares.
Os holandeses não conseguiam dominar por completo um inimigo extremamente móvel, conhecedor da
região e que, sobretudo, lhes fazia a guerra de emboscadas. Desesperados de conseguir estabelecer a indústria do açúcar, em que consistia o seu
objetivo principal, apelaram os chefes para a Companhia, pedindo-lhe poderosos reforços e um general hábil e competente, para vir assumir, no
Brasil, o comando supremo, e firmar definitivamente o domínio da Holanda na nova colônia.
A Companhia satisfez, em parte, esse pedido. João Maurício, conde de Nassau, um dos mais famosos
capitães da Holanda, foi mandado ao Brasil; mas, com ele, veio apenas, como reforço, uma pequena frota de 12 navios, com 720 homens. Logo após a sua
chegada ao Recife, em janeiro de 1637, distribuiu as forças, de que dispunha, por posições tais, que todos os pontos do território ocupado ficavam
protegidos, e foi reservado um corpo especial de 600 homens para incursões no território do inimigo e para resistir às que este fazia no território
holandês. Em São Francisco, mandou Nassau construir um forte, em posição excelente e bem artilhado, forte ao qual a História deu o nome de Forte
Maurício.
Executadas estas medidas, quis Nassau ir ao interior do país examinar, por si próprio, a
verdadeira natureza da região. Desta expedição, resultou tornar-se ele um partidário apaixonado da colonização do território pela Holanda. Em uma
carta escrita ao seu parente príncipe de Orange, por ocasião da sua chegada ao Recife, após esta expedição, pedia-lhe para reforçar as
representações que, à Companhia, ele, Nassau, dirigia, para lhe serem enviados tantos colonos alemães quantos fosse possível convencer de virem para
o Brasil. E, se não fosse possível enviar destes colonos, pedia ainda que se esvaziassem as cadeias e os presídios e se mandassem os criminosos para
o Brasil, onde poderiam resgatar os seus crimes com o trabalho honesto e útil.
O esplêndido alvitre dado por Nassau, para que lhe fossem enviados colonos alemães, não foi aceito
pelos diretores da Companhia. Tivesse ele tido outro acolhimento e a História do Brasil viria talvez a ser bem diferente daquela que lhe reservou o
destino. Um ataque improfícuo à cidade de São Salvador, no qual Maurício perdeu 500 homens, concorreu ainda mais para que não favorecessem os
diretores da Companhia os seus ambiciosos desígnios.
Entretanto, Nassau não desanimou com tal revés. Em nova carta aos diretores da Companhia, pediu um
reforço de 3.600 homens, de modo a ficarem as forças de que dispunha no Brasil elevadas a 7.000 homens. Os diretores, dizia ele, haviam iniciado
cometimentos dignos da época e da nação holandesa, e deviam agora continuar a empresa, de que eram responsáveis. Não tinham atravessado apenas o
Rubicon e sim o Oceano; e, ou se perdia tudo, ou então o que se fizesse devia ser completo.
Em conclusão, dizia: "Mandai-me as vossas
multidões às novas fortunas, que aqui as esperam; dai as terras aos soldados; colônias surgirão e serão os vossos postos avançados e as suas
guarnições. Foi assim que Roma subjugou o mundo!". Foram-lhe recusados os reforços militares;
mas o grande soldado e administrador prosseguiu firmemente na sua obra de consolidação do poderio holandês no Brasil. Os êxitos que obteve foram de
tal ordem que, em 1639, já os portugueses desesperavam de jamais expulsar os holandeses e reaver o território perdido; e fizeram propostas para o
restabelecimento da paz.
Engenho de açúcar primitivo
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Interessante exame sobre as condições das colônias holandesas no Norte do Brasil, neste período, é
o que se encontra no relatório dum senador holandês, que pessoalmente as observara. Os holandeses, observou ele, estavam de posse das seis
províncias desde Sergipe até o Ceará. A primeira destas províncias havia sido desprezada pelos comandantes holandeses e era realmente de mui pequeno
valor; as outras possuíam um forte único, guarnecido por quarenta homens; forneciam, porém, aos holandeses os produtos naturais com que traficavam
os indígenas.
Pernambuco, a mais importante das capitanias holandesas, contava cinco cidades: Garassú ou
Iguaraçu, Olinda, Recife, Bela Pojuca e Serinhaém; e tinha ainda várias vilas que se podiam considerar pequenas cidades. Antes da invasão holandesa,
havia em pleno desenvolvimento cento e vinte e uma plantações de cana-de-açúcar, cada qual formando, por si só, uma aldeia. Mas, com a invasão
holandesa e guerras contínuas que se lhe seguiram, trinta ou quarenta destas plantações haviam sido completamente abandonadas. Em Itamaracá
trabalhavam ainda quatorze engenhos dos vinte e três que, antes da conquista holandesa, havia funcionando. Havia em todas as capitanias holandesas
cento e vinte engenhos de açúcar, em trabalho.
Os cargos para cobrança de impostos eram arrendados pelas seguintes importância: em Pernambuco
148.500 florins; Itamaracá e Goyana, 19.000; Paraíba, 54.000. Uma taxa denominada "pensão", imposta aos engenhos de açúcar em Pernambuco, era
arrendada por 26.000 florins. Os pequenos "dízimos", como eram chamados os impostos menores, ascendiam a 280.900 florins.
A cidade do Recife, sede do governo holandês, era um porto de grande movimento. Os seus habitantes
encaravam o futuro com a esperança de que a sua cidade se tornasse em uma segunda Tyro, mas compreendiam muito bem que, para haver progresso, era
preciso que viessem colonos. "Mandem-nos - diziam eles - os operários e oficiais a que a
indústria dos vossos países não pode manter nem satisfazer as primeiras necessidades da vida, ao passo que aqui eles encontrarão meios de enriquecer
em pouco tempo".
Três, quatro e seis florins por dia eram os salários pagos aos pedreiros e carpinteiros; e os
operários empregados na indústria do açúcar obtinham ainda melhores salários. Três qualidades de homens eram precisas no Brasil: homens com capital
a empregar em fábricas de açúcar, artífices e pessoas ao serviço da Companhia, que, quando o deixassem, se ocupassem de agricultura e se
estabelecessem sossegadamente, obtendo uma renda tão remuneradora, quanto poderiam obter em seus países de origem.
Observa o referido senador que os holandeses deviam as suas posições mais à fraqueza dos inimigos
que à sua própria força. Os soldados, pouco numerosos, andavam semi-nus e mal alimentados. Os mantimentos tornavam-se tão escassos que era preciso
ordenar aos indígenas que suprissem o Recife regularmente, sob pena de morte - decreto este que, inevitavelmente, havia agravado o mal que pretendia
sanar.
Todas as pessoas que possuíam terras eram obrigadas, por lei, a reservar determinada porção dessas
terras para o plantio de mandioca, e quando o não faziam, ficavam sujeitas a penas severas. Foram organizadas listas dos diversos proprietários e
nomeados oficiais encarregados de fiscalizar o rigoroso cumprimento do edito. Cada qual era obrigado a apresentar a quantidade que a lei lhe
marcava, sete vezes durante o ano; e o preço da mercadoria era determinado duas vezes por semana, pelo Senado.
Entre os rios Capiberibe e Beberibe, existia uma ilha desprovida de vegetação, para a qual Nassau
havia lançado as suas vistas, com a idéia de construir um porto em que os navios holandeses se pudessem refugiar, no caso de ser o Recife sitiado.
Longo tempo levou Nassau a representar aos diretores da Companhia em Amsterdam, sobre a conveniência de se iniciar o trabalho para conseguir aquele
fim; não teve, porém, deles, resposta favorável.
Finalmente, por sua própria iniciativa, mandou plantar a ilha de coqueiros e construiu nela uma
moradia para seu uso, a que deu o nome de Fribourg. Mais tarde, conseguiu convencer o Senado a mandar construir na ilha uma nova cidade, para
favorecer o desenvolvimento do Recife, que, pelo acúmulo de casas, não podia ser aumentado. Com material trazido das ruínas da antiga Olinda se foi
construindo a nova capital, que tomou o nome de Maurícia, em honra ao seu governador.
Era, entretanto, necessário ligar a nova à velha cidade, por meio duma ponte; resolvida esta obra,
foi ela dada por contrato. Depois de haver sido despendida a soma de 230.000 florins, o construtor abandonou a obra, desesperado por não achar meio
de assentar os alicerces na parte mais profunda do canal. Logo se levantou grande clamor contra Nassau, a quem acusaram de desperdiçar os dinheiros
públicos na execução duma obra impraticável. O grande chefe holandês confundiu os seus críticos e reduziu ao silêncio os seus detratores, tomando
ele mesmo a empreitada de terminar a construção da ponte, que ficou concluída com o melhor êxito, dentro de dois meses.
Este empreendimento se tornou notável não só pelo próprio valor como também por constituir a
primeira ponte construída na América Portuguesa. Não contente ainda com esse importante trabalho, Nassau fez construir segunda ponte sobre o
Capiberibe, por onde ficaram estabelecidas as comunicações entre o Recife e a região fronteira através Maurícia. E muito perto dessa ponte, mandou
edificar, para sua moradia, uma casa, à qual deu o nome português de "Boa Vista".
Carregadores de outrora
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As propostas de paz, feitas pelos portugueses, às quais já nos referimos, não deram resultado
algum. Antes de findar o ano de 1639, já se preparavam os portugueses, com a organização duma das maiores expedições, que até então haviam enviado
ao Brasil, com o objeto único de aniquilar o poderio holandês, estabelecido no Recife.
D. Fernando de Mascarenhas, conde da Torre, foi o escolhido para comandar esta poderosa expedição,
ao mesmo tempo que vinha assumir o governo geral do Brasil. A esquadra, composta de 87 navios com 2.400 peças de artilharia, era forte bastante para
dominar os holandeses. Todavia, depois de pequenas operações, achou-se Mascarenhas em situação tal que preferiu voltar à Europa. Chegando a Lisboa,
foi encarcerado.
O estado de coisas conservou-se praticamente estacionário até 1640, quando foi dado à casa de
Bragança o trono de Portugal, por longos anos usurpado pela família real espanhola.
Quando Nassau recebeu a notícia da restauração da família real portuguesa, deu ao portador uma
recompensa e tomou parte saliente no regozijo público, que se expandiu durante três dias. Algum tempo depois, com a chegada dum navio holandês
trazendo a notícia de haver sido concluída uma trégua de dez anos entre Portugal e a Holanda, o contentamento dos colonos, tanto portugueses como
holandeses, aumentou ainda mais.
Entretanto, como os acontecimentos logo o provaram, nem os portugueses nem os holandeses tinham
grandes motivos para congratulações. Poucos meses após a conclusão da trégua, delegados comissionados pelo governo de Lisboa chegaram ao Recife e
iniciaram negociações com o conde Maurício de Nassau para a restituição dos territórios portugueses, que os holandeses haviam conquistado, sob o
pretexto de que Portugal agira constrangido, fazendo guerra à Holanda.
O comandante em chefe holandês, que havia recebido instruções secretas para estender as suas
conquistas na medida do possível e especialmente para se apoderar da Bahia, deu aos comissários portugueses respostas vagas e nada satisfatórias.
Voltando à Bahia, os comissários portugueses avisaram as autoridades dessa cidade de que os holandeses pretendiam enganá-las e de que se deviam
preparar, pois não tardaria que eles atacassem os portugueses.
Efetivamente, os holandeses, com uma divisão de quatro navios, surpreenderam Sergipe e aí
estabeleceram uma guarnição sua. Em vão o governo de Lisboa protestou. O conde Maurício de Nassau, com a convicção plena de que os seus atos estavam
de perfeito acordo com a política holandesa, prosseguiu na sua tarefa de estender e consolidar as conquistas dos holandeses no Brasil.
Os seus ambiciosos planos, duma vastidão imensa, e que iam até o sonho dum ataque a Buenos Aires,
eram todavia anulados pela inatividade dos diretores da Companhia em Amsterdam, os quais se recusavam a fornecer os fundos necessários. Alguns
revezes sofridos pelas armas holandesas, devido a uma injustificada confiança nos colonos, de modo nenhum podiam ter concorrido para melhorar as
condições dos holandeses no Brasil.
Finalmente, em 1644, voltou Maurício de Nassau à Europa, com a esperança de poder, com a sua
presença, obter os recursos indispensáveis à manutenção das conquistas holandesas. A mesma frota que o transportou conduzia nada menos de mil e
quatrocentas pessoas de todas as classes e profissões, civis, militares e eclesiásticas.
Este grande êxodo abriu o epílogo do domínio holandês na América do Sul. Uma grande oportunidade
de expansão havia sido desprezada e, com o conde de Nassau e seus companheiros, ia também a última esperança da fundação dum império holandês no
Brasil. Mal decorrido um ano após a partida do conde de Nassau, estava o país inteiro envolvido numa guerra de extermínio e a custo se mantinham os
holandeses por traz das suas fortificações, combatendo mais para salvar as vidas, que para defender as colônias.
O espírito dirigente do lado dos portugueses - ou, melhor, do lado dos brasileiros - era João
Fernandes Vieira, natural da Madeira, mas emigrado em criança para o Brasil. João Fernandes Vieira, que havia adquirido considerável fortuna em
Pernambuco, gozava da estima tanto dos portugueses como dos holandeses e, tratado com habilidade, poderia ter-se tornado um poderoso sustentáculo da
administração dos holandeses no Brasil. Tendo, porém, sofrido uma série de humilhações, Vieira, num momento de raiva, matou um soldado holandês; e,
receando as conseqüências do seu ato, fugiu e começou a dedicar-se inteiramente a promover uma sublevação contra o governo holandês.
Em pouco tempo granjeara Vieira considerável número de partidários. Instituindo um sistema de
guerrilhas, aos quais os brasileiros se adaptavam maravilhosamente, começou a devastar o território holandês de tal modo que, em curto espaço, não
restavam aos invasores senão as posições fortificadas de todo o vasto território, em que antes exerciam a sua autoridade.
Pedidos de auxílio feitos à Holanda não eram ouvidos ou então atendidos apenas com diminutos
socorros. Finalmente, foi a situação perigosa das colônias holandesas no Brasil reconhecida em Amsterdam; e em 1648, foi enviada ao Brasil uma
esquadra com 6.000 homens, encarregada de recuperar o território perdido. Os brasileiros, sob o hábil comando de Vieira, tinham as suas posições nos
Guararapes, os quais formavam uma série de colinas que, por sua disposição particular e condição pantanosa do terreno entre o ponto em que ficavam e
o mar, se constituíam uma esplêndida posição para a defensiva.
Os holandeses, confiantes no seu número e desprezando a tática inimiga, lançaram-se ousadamente ao
ataque desta posição. Foram recebidos com um fogo terrível e, finalmente, quando contavam já 1.200 mortos e tinham ferido o seu general Schoppe,
retiraram-se. Esta vitória redundou num aumento de prestígio para a causa brasileira e fortaleceu o espírito das tropas. Não só viram os brasileiros
as suas fileiras extremamente reforçadas, mas também em Portugal começou a estabelecer-se uma forte corrente de opinião, para que fossem os odiados
holandeses expulsos do Brasil.
Por sugestão de Vieira, foi fundada em Lisboa uma companhia com o título de Sociedade Brasileira
de Portugal, com o objetivo de ajudar os brasileiros na empresa da reconquista do seu solo. Sob os auspícios desta sociedade, foi reunida e equipada
uma esquadra, que partiu para o Brasil, em auxílio das forças locais.
Poucos dias antes da sua chegada ao Brasil, no ano de 1649, empregaram os holandeses um esforço
supremo para reaver as antigas posições. Segunda vez se encontraram com os brasileiros nos Guararapes e, ainda desta, sofreram uma derrota
desastrosa. Nesta batalha, foi morto o general holandês e ficaram mortos no campo da batalha 1.100 homens. Esta derrota aniquilou irremediavelmente
o poderio holandês no Brasil; os brasileiros capturaram 19 estandartes e todas as armas e munições dos holandeses.
A vitória dos brasileiros, na segunda batalha dos Guararapes, decidiu da sorte das colônias
holandesas. Por trás de suas fortificações no Recife, conservaram ainda os vencidos, durante alguns anos, um simulacro de autoridade. A 23 de
janeiro de 1654, porém, depois duma luta prolongada, foi essa praça-forte finalmente entregue por Schoppe, comandante holandês, ao infatigável
Vieira. Este recebeu as chaves dos fortes, cujo número se elevava a setenta, e como muito bem diz o historiador: "Foi
das mãos de João Fernandes Vieira que Francisco Barreto, vice-rei português, recebeu esta cidade e a coroa portuguesa o seu império no Brasil".
Durante alguns anos ainda, duraram as hostilidades entre portugueses e holandeses, mas as ações
navais passaram-se longe do Brasil, em águas européias. A paz definitiva foi assinada em 1661, sendo, pelos bons ofícios da Inglaterra, concluído um
tratado, pelo qual pagara Portugal uma indenização de quatro milhões de cruzados em dinheiro, açúcar, tabaco e sal, do modo que mais lhe conviesse,
e se obrigava a restituir toda a artilharia tomada aos holandeses no Brasil, que estivesse marcada com as armas da Holanda ou da Companhia das
Índias Ocidentais.
O motivo principal que levou a Holanda a renunciar às conquistas que havia feito no Brasil foi a
tomada de Ceilão aos portugueses, que se deu precisamente nesta época, e outras conquistas efetuadas no Oriente e de imenso valor para ela. Assim
este glorioso sonho de ambição se desvaneceu como tantos outros na história dos empreendimentos coloniais. |