João das Ostras
Nessa época recuada
(N.E.: final do século XIX), havia indivíduos que se tornaram populares pela excentricidade de
atitudes, como o 30 quilos, alvo de chacotas da garotada. Espírito fraco, ignorante presumido, o nosso 30 quilos achou de se
candidatar às eleições para senador. E concorreu ao pleito.
Não alcançou nenhum voto em Santos, nem o dele, pois deixara de votar, mas obteve 2
votos em Taubaté, fato que o encheu de orgulho, enquanto os gozadores o convenceram de que fora eleito e deveria embarcar para o Rio de Janeiro, a
fim de assumir a cadeira.
Fizeram mais: entregaram-lhe algumas moedas de cobre da Argentina, persuadindo-o de
que eram condecorações que o governo desse país lhe concedera. E ela acreditava, como acreditou num pergaminho que também lhe deram, homenagem por
"bons serviços prestados à causa pública", que orgulhosamente exibia a tiracolo pelas ruas da Cidade.
O 30 quilos, maníaco, abandonou seu comércio de frutas e, em dificuldades,
experimentou sérias privações, chegando a passar a noite em qualquer pouso ou na parte exterior do telhado do Mercado Velho. Assim, nessa triste
lida, nesse doloroso equívoco, morreu o nosso 30 quilos, mas deixou um substituto, o João das Ostras, como o apelidaram, pois a sua
atividade era extrair ostras e remetê-las ao Interior.
Pois o João das Ostras cismou que uma jovem bonita, de família importante, por
ele se apaixonara, e passava horas e horas postado na cabeceira de uma ponte com os olhos fitos na casa onde residia a moça. A molecada não o
poupava. Os trocistas dele se acercavam e o convenciam do amor que por ele nutria a jovem, embora o pai não visse com bons olhos o namoro, motivo
por que a moça não saía de casa e não o procurava.
- Você não tira mais ostras, ó João?
- Eu, não! Mando-as tirar. Tenho dinheiro para pagar empregados.
- Mas, com essa roupa tão bruta, não pode você agradar muito à pequena.
- Ah - respondia ele - a roupa não faz o homem! O que faz o homem são os patacos que
lá tenho na arca!
- Então você já está rico?
- Muito, muito, não. Mas para o casamento e tratá-la bem tenho alguma coisa.
- Qual, você não casa - dizia um dos contumazes trocistas.
- Casa! - respondia outro - Deixem o João, que ele casa.
- Não casa!
- Casa!
E a troça ia longe. João das Ostras tornou-se tipo popular na Cidade por sua
mania de gostar da moça prendada e ser por ela correspondido.
Mas tudo tem fim. Desiludido e decepcionado, o nosso João das Ostras admitiu
que o namoro não passava de produto da própria imaginação.
E retornou às ostras... |