Imagem: reprodução do documento divulgado pela biblioteca
japonesa
Todos os japoneses e alemães de Santos
já foram removidos para São Paulo
Continuam a chegar trens repletos de "eixistas" procedentes do Litoral - Os alemães
inventavam enfermidades para escapar à medida policial - Austríacos e perseguidos pela Gestapo
Santos, 9 (Do enviado especial da Folha da Noite, pelo telefone) - Continuam os srs.
Affonso Celso, delegado auxiliar e Nelson da Veiga,d elegado de Ordem Política de Santos, a despender esforços no sentido de terminar o envio de
japoneses e alemães para São Paulo, em cumprimento às ordens emanadas do superintendente de Segurança Política e Social, major Vieira de Mello.
Embarcados todos os japoneses e alemães residentes na cidade - Graças às medidas
preventivas postas em prática pelo delegado auxiliar, o titular da Ordem Política já conseguiu embarcar para São Paulo todos os japoneses
registrados e que residiam na cidade, o mesmo acontecendo com os alemães, cujo total é de 700, aproximadamente. Pela manhã de hoje, embarcaram 775
pessoas e, à noite, o total de embarcados atingiu a 600. "Como vemos, somente hoje, deixaram esta cidade 1.375 eixistas. Incluindo os que
embarcaram ontem, temos um total de 2.030. Não estão computados na cifra acima os que seguiram por conta própria, bem como as crianças menores de 3
anos. A estimativa geral é de cerca de 3.000 pessoas.
A partir de amanhã, as autoridades providenciarão o embarque dos eixistas não registrados e
residentes fora da cidade, incluindo São Vicente, Guarujá e localidades próximas.
Recursos para escapar à remoção - Como tem sido acentuado, os eixistas atingidos
pela providência do major Vieira de Mello, de modo algum foram colhidos de surpresa, pois de há muito estavam avisados de que deviam mudar-se.
Abusando da tolerância da autoridade, a maioria foi ficando e, com o tempo, chegaram a desistir de cumprir as determinações recebidas, naturalmente
na presunção de que tudo, afinal, ficaria como estava e ninguém precisaria arredar o pé do lugar.
Resultado dessa falsa crença foi acontecer, para eles, o pior. De uma hora para outra, tiveram de
levantar acampamento. A princípio, muitos ainda não acreditaram na efetivação da medida e pretenderam recalcitrar. A energia e serenidade da
autoridade, porém, os chamaram à realidade.
Mesmo assim, ainda houve os que tentaram reagir ou retardar a execução da medida policial,
apresentando uma série infindável de recursos, sobressaindo entre eles os "doentes", que acorreram aos médicos, a fim de conseguir atestados.
Deparamos com numerosos deles que se diziam portadores de moléstias de toda natureza. Um simples resfriado, era o bastante para requerer "repouso
absoluto" e impedir que o "paciente" saísse sequer à rua, principalmente nesses dias que correm, em que Santos tem experimentado uma temperatura
algo fria. Nessas condições, subir à Serra, ainda que bem agasalhado e medicado, era sujeitar-se a grandes males.
Primeiramente, quem surgiu com esse recurso de última hora foram os alemães. Posteriormente, ao
descobrirem o hábil truque, os japoneses formaram fila.
Uma casa de madeira, tipicamente
japonesa, em Vila Macuco
Foto: detalhe da página 16 do jornal
Folha da Noite de 10/7/1943
Não faltaram os pistolões - Paciente e zelosamente, o delegado de Ordem Política, ao
compreender os recursos, tratou de anulá-los a todos, sem qualquer contemplação. Os alemães, ainda em primeiro lugar, quando verificaram a
ineficácia do método, passaram a lançar mão dos pistolões. Queriam, quando não uma exceção, pelo menos adiar a partida e outros privilégios.
O delegado Affonso Celso teve de resistir a tremendos "cercos", encaminhando os "recomendados" ao
delegado Nelson da Veiga. Esta autoridade os recebia atenciosamente, mostrando-lhes a impossibilidade de qualquer proteção. Alguns insistiam.
E a autoridade, já cansada de tanta insistência, encontrava jeito especial para contentá-los - e
desiludi-los, afinal. Algumas vezes, vimo-lo, com ar compreensível:
"- Bom, vá lá uma concessãozinha, especialmente para o senhor... e para mais ninguém. Em vez de
embarcar já, pode embarcar daqui há uma hora. Se não pode embarcar no trem das 2, consinto que embarque no trem das 4 horas".
E, assim, todos desistiam de qualquer reação.
Padres alemães - A medida foi tão rigorosa que nem os padres escaparam. Todos os sacerdotes
alemães rumaram para São Paulo, o mesmo acontecendo com as irmãs religiosas. Também embarcaram os austríacos, os que se diziam judeus e perseguidos
pelo nazismo ou vítimas da "Gestapo". Alemães e japoneses naturalizados, que tentavam prevalecer-se dessa circunstância, tiveram igualmente de
entrar no cordão.
Uma casa de madeira, tipicamente
japonesa, em Vila Macuco
Foto: detalhe da
página 8 do jornal Folha da Noite de 10/7/1943
No pátio da Imigração
Seguem para o interior as primeiras levas
de súditos do eixo removidos do litoral
Continuam as remoções do litoral paulista - O clube Lira transformado em
hospedaria dos súditos da Alemanha
Prosseguem no Departamento de Imigração e Colonização os trabalhos de registro dos
súditos do eixo removidos da zona litorânea para a Capital. Cresce o número de alemães e japoneses na Hospedaria daquele Departamento, com a chegada
de novas levas. Ainda ontem à noite, foram removidas mais 674 pessoas. O major Vieira de Mello, que pessoalmente está acompanhando os trabalhos,
providenciou, então, um novo alojamento para os súditos da Alemanha, sendo para isso destinadas as dependências do Clube Lira.
A reportagem da Folha da Noite pôde apurar, ainda, que já foi iniciada, ontem
à noite, a distribuição dos súditos do eixo pelo interior paulista, em cidades onde não há tropas militares aquarteladas. Hoje pela manhã, em
trem da Sorocabana seguiu uma leva para Presidente Prudente |