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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - ZEZINHO
As atribulações do fotógrafo Zezinho (2)

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Presidentes antes de assumir e após a deposição, ou que ficaram apenas na candidatura; prédios no apogeu e em ruínas; artistas em diferentes momentos de suas carreiras; manifestações de todos os tipos e por todos os motivos; ou o mero "buraco de rua", que também faz parte da profissão de fotógrafo registrar imagens de sarjetas para ilustrar matérias do cotidiano. Essas e outras imagens fazem parte do acervo do fotógrafo José Dias Herrera, que em 2004 foi entregue à Fundação Arquivo e Memória de Santos (FAMS).

Esta matéria foi publicada no jornal-laboratório Entrevista, da Faculdade de Comunicação Social de Santos (Facos), em abril de 2002:

CENAS:

O primeiro casamento de Pelé
Foto: José Dias Herrera, publicada com a matéria


Primeiros moradores da Areia Branca
Foto: José Dias Herrera, publicada com a matéria


Antigo Matadouro
Foto: José Dias Herrera, publicada com a matéria

José Herrera
65 anos registrando a História...

Simplicidade na vida; seriedade na profissão. Quem tem a oportunidade de conversar com José Herrera, mais conhecido como "Zezinho", não pode evitar ser contagiado por sua alegria e vivacidade. O filho de imigrantes espanhóis nasceu em São Paulo, no ano de 1920, e veio para Santos ainda criança, aos sete anos de idade. Aos 12, já tinha o primeiro emprego em uma loja na Rua do Comércio. Trabalhou em vários lugares, até que chegou às portas do futuro: uma casa de artigos fotográficos. Ele gostou do negócio. "A fotografia foi um acaso na minha vida", conta. A partir daí, decola uma carreira inesperada, sem passagem de volta.

 

"Zezinho não é fotógrafo de redação, ele quer é sair na rua. Para mim é um privilégio trabalhar ao lado dele. Enfim vem o reconhecimento pelo seu trabalho sério e seu profissionalismo"

Inívio Borda, jornalista

Nada de curso de especialização, nada de professor. Em 1937, aos 17 anos, José Herrera entrou no Diário como repórter fotográfico. Alguns anos mais tarde, recebeu o convite do jornal A Tribuna, onde ganhou o seu próprio laboratório. Seu expediente era das 13 horas até uma hora da madrugada. Não havia laboratorista. Ele fotografava, revelava e entregava antes do fechamento do jornal.

Na década de 30, as estradas do litoral ainda estavam sendo abertas. Debaixo de sol ou chuva, subindo e descendo os morros, caminhando na lama, Zezinho registrou fatos como a inauguração das rodovias Anchieta e Imigrantes, a chegada dos primeiros moradores ao bairro da Areia Branca, os navios de guerra americanos ancorados no Porto de Santos.

 

"Cheio de força de vontade, uma pessoa apaixonada pelo que faz, sempre extrovertido e colocando a gente para cima. Para mim é um privilégio trabalhar com Zezinho, o fotógrafo mais antigo do Brasil"

Adriana Cutino, jornalista

Mas certamente nada marcou mais a sua carreira do que a proximidade com o ídolo do futebol, Pelé. As fotos do rei foram as mais cobiçadas e invejadas pelos "concorrentes". Acompanhando o time do Santos, Herrera conheceu vários países, deu a volta no mundo. Mas o retorno era sempre para o mesmo lugar: a boa e velha cidade de Santos, onde tudo começou.

Herrera considera-se um homem realizado. Entre o Diário e A Tribuna, aposentou-se com mais de 40 anos de profissão. Mas engana-se quem pensa que a carreira do Zezinho parou por aí. Continua na ativa e já completou 20 anos como fotógrafo na Secretaria de Comunicação da Prefeitura de Santos. Dos seus 82 anos de idade, 65 foram dedicados à fotografia. Não somente como profissão; a sensibilidade e a paixão pelo que faz sempre ficaram bem marcadas junto com as imagens que registrou. E foram muitas. Segundo ele, milhões.

 

"Exemplo que deve ser seguido por todos. Quem milita nessa profissão sabe que é difícil não se corromper. Zezinho é mais que um fotógrafo; é profissional e honesto"

Celso Bertoli, jornalista

Atualmente, José Herrera é o fotógrafo mais "antigo" do Brasil. Antigo, talvez, na idade e no tempo de carreira. Mas definitivamente nada antigo no espírito jovial e na disposição para o trabalho. Marido e fotógrafo. Pai e fotógrafo. Avô e fotógrafo. É indiscutível: não se pode mais separar José Herrera da fotografia. Não da fotografia da era digital, que, aliás, o Zezinho repudia. Mas daquela fotografia como arte, como prazer, como imagem que não tem preço...

RARIDADES:
Fotos inéditas que somente as lentes da máquina de Zezinho registraram:


 Jânio Quadros
Foto: José Dias Herrera, publicada com a matéria


Plínio Salgado
Foto: José Dias Herrera, publicada com a matéria


Navio de guerra americano no Porto de Santos
Foto: José Dias Herrera, publicada com a matéria

"Nunca imitei ninguém..."

ENTREVISTA: Sua família te apoiou quando o senhor escolheu ser fotógrafo?

JOSÉ HERRERA: Os meus pais nunca deram palpite em minha profissão, sempre fui muito independente.

ENT.: Alguém da sua família também seguiu a profissão de fotógrafo?

JH: Ensinei aos meus dois irmãos minha profissão. Eu sou o mais fraquinho de todos eles, mas estou aqui até hoje. Quando meu irmão estava completando 50 anos de A Tribuna, foi para casa, teve um enfarte, e morreu.

ENT.: Herrera, como começou a trabalhar como fotógrafo?

JH: Foi no Diário. Um dia o secretário do Diário viu que eu não deixei um avião decolar para poder fotografá-lo. Então ele disse: "esse garoto tem talento".

ENT.: Como o senhor começou a trabalhar em A Tribuna?

JH: Depois de muita insistência dos diretores. A princípio eu escapei indicando o meu irmão Rafael, mas quem eles queriam mesmo era eu. Foi quando eu fiz algumas exigências para ir para lá e eles aceitaram.

ENT.: Quais foram essas exigências?

JH: No Diário eu tinha meu próprio laboratório e em A Tribuna não tinha. Então, eles construíram um para o meu irmão e outro para mim. Outra coisa era que todos os fotógrafos ganhavam por semana e eu queria ser contratado; foi outra exigência que eu fiz e eles aceitaram.

ENT.: Quais as pessoas mais importantes que você já fotografou?

JH: Muitas, fotografei diversos presidentes como Café Filho, Jânio Quadros, Washington Luiz, dentre outros.

ENT.: Durante os 65 anos dedicados à fotografia, qual foi a imagem que mais te marcou?

JH: Eu nunca tive isso, todos os trabalhos que eu fiz foram com muito gosto. No momento da fotografia a gente não pára para pensar; só sabe o que saiu quando a foto fica pronta.

ENT.: Conte um caso interessante que o senhor viveu durante a carreira.

JH: A cobertura da inauguração da primeira aciaria da Cosipa, que foi feita pelo presidente da França. No momento em que ia ser inaugurada, eu percebi que a imprensa tinha sido colocada muito longe, e antigamente não existiam alguns recursos que hoje as máquinas fotográficas oferecem. Eu saí correndo do palanque e fui na direção do presidente. A polícia queria me prender achando que eu fosse dar um tiro nele. Foi quando eu consegui chegar perto e, em francês, pedi que ele repetisse tudo novamente; ele fez.

ENT.: Durante toda a sua carreira, o que aprendeu de mais importante?

JH: Quem gosta do que faz não precisa de ninguém para ensinar; aprende sozinho. Tanto que, quando eu comecei, ninguém queria me ensinar para não ter concorrência. Então eu aprendi tudo sozinho, comprava livros, lia e ia me aperfeiçoando pouco a pouco.

ENT.: Ainda tem algum sonho que não realizou?

JH: Ganhar na megasena (gargalhadas). Eu já estou com 82 anos e ainda estou trabalhando na Prefeitura, faço meus trabalhos particulares... Acredito que já estou realizado.

ENT.: E quanto à fotografia atualmente?

JH: Ela está acabando. O fotógrafo não manda mais na sua obra. Atualmente toda fotografia pode ser modificada, principalmente se a máquina usada é a digital.

ENT.: E como foi a sua experiência durante a ditadura militar?

JH: Não houve nada dramático, eles me tratavam muito bem. Inclusive quando queriam tirar alguma foto mandavam me chamar. Não posso me queixar.

ENT.: O que o senhor acha da foto por dinheiro?

JH: Eu acho uma safadeza. Sempre que eu tirava uma foto e achava que pudesse prejudicar alguém, eu destruía a foto e o negativo.

ENT.: Você faria tudo por uma foto?

JH: Para escândalo não, eu jamais faria.

ENT.: Como é o seu relacionamento com o Pelé?

JH: Quando ele chegou a Santos eu fui o primeiro a fotografá-lo, e durante muito tempo eu acompanhei os treinos e as viagens do time. A convivência nos aproximou. Também tirava fotos particulares para ele.

ENT.: Você já foi processado ou tirou uma foto que alguém não gostou?

JH: Nos meus 4 anos de carreira isso nunca aconteceu.

ENT.: O que o senhor acha dos paparazzis?

JH: Eles não são fotógrafos, são picaretas. E o jornal que publica esse tipo de foto também não é sério.

ENT.: Qual é um jornal sério na sua opinião?

JH: A Folha de São Paulo.

ENT.: O senhor se considera um homem-família?

JH: Sim, pois tudo o que eu fiz até hoje foi pela minha família.

ENT.: Como o senhor vê todas essas homenagens que estão sendo feitas?

JH: É só porque eu estou ficando velho (muitas risadas); acho que é um pouco de exagero. Prefiro fotografar o homenageado a ser ele. Mas, mesmo assim, fico muito contente.



Na hora de ser fotografado, Zezinho também dá um show de simpatia e simplicidade, ficando totalmente à vontade diante da câmera
Fotos: Luciana Bari Mancini, publicadas com a matéria


Luciana Bari Mancini, Erika Aritibano, Omar Bermedo, Thaís Simões

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