Imagem: reprodução da página 5 do jornal A Tribuna de 27/3/1956
Santos abatida por outra imensa tragédia
[...]
O primeiro desmoronamento foi relativamente sem importância, tendo apenas atingido o
prédio onde funciona a Fábrica de Adubos Bueno. Ali operavam marinheiros do navio de guerra Barroso Pereira e, quando davam por encerrado o
serviço de desentulho, sobreveio o segundo desmoronamento, de proporções mais elevadas, segundo já referimos.
Em São Vicente e Guarujá - O temporal que desabou sobre S. Vicente e Guarujá
foi da mesma intensidade do de Santos. Em S. Vicente, além do desabamento de um chalé, na encosta do Morro do Voturuá, matando cinco crianças,
filhas do casal Haroldo e Herondina de Matos, ausente de casa, por haver ido a uma sessão cinematográfica e não encontrar condução para o regresso,
ocorreu a morte de um funcionário municipal de S. Vicente, Gustavo Barbosa dos Santos, de 37 anos de idade, o qual caiu num bueiro aberto, na Rua
Frei Gaspar, entre a Fábrica de Vidros e a linha da Sorocabana.
Em conseqüência das inundações, cerca de 60 pessoas residentes às margens do Rio d'Avó
ficaram desabrigadas.
No Guarujá desabou um chalé no Sítio Grande, onde residiam Casemiro de Jesus Amâncio,
sua esposa Maria de Lurdes Amâncio e a filha do casal, Dilvana, de seis meses. Quando ocorreu o desabamento, Casemiro tinha ao colo a filhinha,
perecendo ambos, enquanto Maria de Lurdes sofreu graves ferimentos, hospitalizando-se na Santa Casa.
Sepultamento das vítimas - O sepultamento das vítimas da catástrofe foi
realizado na manhã de ontem, saindo os corpos do necrotério da Santa Casa da Misericórdia.
Assistiram-se, nesses momentos, às mais pungentes e dolorosas cenas. Pais
inconformados pela brutalidade da tragédia quiseram impedir o saimento fúnebre de seus filhos, tentando reter os toscos caixões, sob copioso pranto
e aos mais lancinantes gritos de dor. Aquela procissão de desespero e luto confrangeu a quantos a presenciaram, até mesmo aos repórteres,
acostumados, por dever profissional, à contemplação de quadros brutais determinados pelo inevitável e pela inexorabilidade do destino.
Foi nesse ambiente de profundo abatimento espiritual que um guarda-civil impediu que o
fotógrafo deste jornal exercesse livremente sua atividade profissional, ameaçando-o de agressão e de destruição da máquina fotográfica, porque,
justificou, recebera ordens do médico Décio Brandão de Camargo.
Como se A Tribuna, sempre discreta e comedida, fosse fazer sensacionalismo em
circunstâncias tão deploráveis, como aquelas.
LAMA, PEDRAS, FERRO RETORCIDO, MUROS DERRUÍDOS, EIS O ESPETÁCULO VIOLENTO DA RUA
SENADOR FEIJÓ - Pouco depois do meio-dia de domingo, quando a população já estava chocada pelas dolorosas notícias dos desabamentos do morro do
Embaré, Santa Terezinha, Monte Serrate e Caneleira, deu-se mais um desmoronamento de colossais dimensões, desta vez em pleno centro da cidade, na
outra face do Monte Serrate. Um bloco gigantesco de terra e pedra despregou-se da encosta daquele morro e, com incrível violência, soterrou duas
oficinas mecânicas na Rua Senador Feijó, ao lado da Rua Tiro Naval. (...)
(...) O trecho atingido daquela via pública central ficou inteiramente obstruído por
uma camada de lama e destroços que subiam a três metros de altura acima do leito da rua. Nas fotos superiores, dois flagrantes colhidos pela
reportagem de A Tribuna, quando eram iniciados os serviços de desentulho. (...)
(...) No meio, à esquerda, os restos da parede de uma das oficinas mecânicas. (...)
(...) À direita, o prefeito Antônio Feliciano, presente a todos os locais das diversas
tragédias que abalaram a cidade que administra. (...)
(...) Alguns veículos, que se achavam nas oficinas soterradas, foram atirados sobre as
casas fronteiriças. Um caminhão (foto da esquerda, em baixo) estraçalhou-se de encontro a um poste. A foto dá uma nítida noção da violência do
impacto. (...)
(...) Em baixo, o governador Jânio Quadros, com o comandante do Corpo de Bombeiros
Fotos e legenda publicadas com a matéria
Em perigo de ruir o edifício América
- Foi tal a impetuosidade das chuvas que uma das margens do Canal 5, na esquina da Avenida Bartolomeu de Gusmão, sofreu uma fenda, por onde as águas
se precipitaram e inundaram perigosamente todo o trecho, atingindo os alicerces do edifício de apartamentos denominado América, situado na Av.
Almirante Cócrane, esquina da Av. Bartolomeu de Gusmão. A infiltração das águas abalou a estrutura desse edifício de 14 pavimentos, temendo-se pela
sua segurança.
Como medida preventiva, todos os seus moradores foram intimados a abandoná-lo.
Durante a madrugada de domingo, aquele trecho, às escuras e oferecendo perigo aos
motoristas, pelas repetidas depressões, teria ocasionado acidentes, não fora o espírito de abnegação dos srs. Carlos Caldeira Filho e Antonio
Ribeirão Júnior, os quais, sob a chuva torrencial, se mantiveram no local, durante horas seguidas, orientando e prevenindo os motoristas que por lá
demandavam.
Luto na cidade - O prefeito municipal decretou luto oficial na cidade em
homenagem à memória das vítimas da deplorável ocorrência.
O comércio varejista do centro da cidade, atendendo a apelo do sindicato da classe,
não funcionou durante o dia de ontem. Muitos outros estabelecimentos localizados nos bairros funcionaram normalmente, mas com as portas
semi-cerradas.
As barreiras e pedras que se desintegraram de um dos lados do Monte Serrate alcançaram
uma oficina mecânica, na Rua Tiro Naval. Esses veículos (caminhão e auto particular) foram destruídos pela carga de terra, lama e pedra, sendo
retirados de sob os escombros da Rua Senador Feijó
Fotos e legenda publicadas com a matéria
Restabelecido o serviço de transporte coletivo - Durante a manhã de ontem, os
bondes ainda não trafegaram. Os ônibus circularam regularmente, superlotados, notando-se vários caminhões cruzando as ruas do município,
transportando graciosamente operários e até mesmo comerciários. Os automóveis de praça, que se haviam recolhido às primeiras horas da noite,
reapareceram na manhã de ontem. Teriam assumido atitude elogiável se, excepcionalmente, adotassem o sistema de lotação, com o beneplácito, é certo,
da autoridade competente.
Os bondes restabeleceram o tráfego às primeiras horas da tarde de ontem.
Durante a noite de ontem, faltou energia elétrica em vários setores da cidade.
Inundado o Entreposto de Malas Postais
- O Entreposto de Malas Postais, que funciona à Rua Tuiuti, 78, foi invadido pelas águas. Quando o visitamos, na manhã de ontem, cerca de 3.000
malas flutuavam, mas houve providências dedicadas dos encarregados e funcionários daquela unidade dos Correios e Telégrafos.
A Agência Postal Telegráfica de Santos encerrou ontem, às 17 horas, o expediente, pois
também foi invadida pelas águas. Durante o dia de ontem, só houve distribuição e entrega de correspondência na parte comercial da cidade.
Dois aviões da F.A.B. desceram na Praia Grande - Na tarde de anteontem, dois
aviões da FAB fizeram descida forçada na Praia Grande. Ambos os aparelhos ficaram atolados, nada sofrendo seus ocupantes.
Segundo fomos informados, Cumbica não os havia antes localizado e já se temia pela sua
sorte.
NO MORRO DO FONTANA - Também no Morro do Fontana houve desmoronamento parcial.
Foi atingido este chalé
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Cooperação que se repete - Como ocorrera por ocasião da catástrofe de 1º de
março, as autoridades civis e militares se conjugaram na intensa tarefa de socorrer as vítimas e as pessoas desabrigadas. A autoridade policial de
plantão, na Central, dr. Manoel Luiz Ribeiro, foi de uma dedicação inexcedível, estando a postos, igualmente, todas as demais autoridades policiais
e à frente delas o delegado auxiliar.
Força Pública, Exército, Guarda Civil, Corpo de Bombeiros, Base Aérea, Polícia
Rodoviária e a guarnição do transporte de guerra Barroso Pereira foram postos a serviço, prestando magnífica cooperação.
Todo o pessoal da Diretoria de Obras e Serviços Públicos da Prefeitura, além de
elementos da Companhia Docas, City, Refinaria de Petróleo, Departamento de Estradas de Rodagem, bem como populares, trabalharam e ainda trabalham
ativamente nos misteres exigidos pela extensão dos acontecimentos.
O D.E.R., além do pessoal operário, dispôs de suas viaturas e maquinaria técnica,
prestando apreciável colaboração. Bombeiros de São Paulo e ambulâncias, também da capital, vieram integrar-se nos serviços de socorro.
Considerável e preciosa a assistência que a Santa Casa, por sua direção, corpo
clínico, enfermeiros e atendentes, tributou durante aqueles momentos aflitivos que a cidade viveu. Do mesmo modo, é de louvar o esforço, a dedicação
e o zelo de todos os médicos e enfermeiros do Pronto-Socorro, bem como do SAMDÚ.
A FILA DA DOR - Foi intenso, na manhã de ontem, o movimento ao necrotério da Santa
Casa, onde se encontravam os corpos das vítimas do sinistro. Cenas as mais confrangedoras se verificaram durante o saimento fúnebre
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