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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - DESLIZamentos... (4)
Início de março de 1956: começa o drama - E

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Terreno sedimentar, com fina capa de solo, quando enfrenta chuva forte e não tem mais cobertura vegetal que fixe o solo... o resultado é um deslizamento de terras, e quem estiver no caminho sofre as conseqüências. Nos morros santistas, ocorreram vários deslizamentos célebres, como o que soterrou um grupo de piratas holandeses (caso excepcionalmente atribuído a um milagre da santa padroeira da Cidade), ainda no século XVII. Outros casos destacados aconteceram em 1928, 1956 e na década de 1980, motivando enfim a realização de um amplo trabalho de contenção das encostas e monitoramento da situação geomórfica nos morros santistas.

Na edição de 6 de março de 1956, terça-feira (a publicação não circulava às segundas-feiras), o jornal santista A Tribuna registrava, na última página e na página 6 - ortografia atualizada nesta transcrição:


Imagem: reprodução da última página de A Tribuna de 6/3/1956

Poucas possibilidades de haver outros corpos soterrados

Antigos moradores da Godofredo Fraga afirmam que quase todas as pessoas conhecidas já foram localizadas - Deve se precaver a população contra indivíduos que, dizendo-se vítimas da catástrofe, angariam donativos ludibriando a generosidade dos santistas - Funciona ininterruptamente o Conselho Municipal de Assistência Social

Sob o claro sol de domingo e de ontem, prosseguiram os trabalhos de desobstrução da área atingida pelo desabamento da encosta do Morro de Santa Terezinha. Até ontem à noite, nenhum outro corpo foi encontrado. O último, até o momento, foi, como noticiamos, os restos mortais do menino que estava sendo criado pela família do motorneiro Pedro Paulo de Souza. Trata-se de Alair Gonçalves, de 15 meses, filho de Geni e Salvador Gonçalves.

A população continua acompanhando, ainda vivamente emocionada, os serviços de desentulho. Os quarteirões, próximos à área soterrada, estão interditados, com cordões de isolamento a mais de cem metros de distância. Mesmo assim, mal divisando o local, dezenas e dezenas de pessoas continuam, de pé, assistindo, a longa distância, à remoção da enorme massa de pedras e terra desabada sobre a Rua Godofredo Fraga.

Segundo informações de moradores daquela rua, que conheciam grande parte dos habitantes da zona flagelada, há possibilidades de alguns corpos ainda estarem soterrados, não se acreditando, entretanto, que sejam em grande número.

Desaparecidos - Uma senhora, que reside na Godofredo Fraga há vinte anos, informou à reportagem de A Tribuna que, entre as pessoas que se salvaram e a relação dos mortos, estão os nomes de todos os seus conhecidos, faltando apenas um, cuja casa, por sinal, não foi destruída, e que era funcionário da pedreira "Santa Terezinha". A família continua ignorando seu paradeiro, não sabendo informar, contudo, se ele se encontrava ou não, ocasionalmente, em uma das casas atingidas.

Outras informações, confirmando o que já noticiamos, asseguram-nos que muitas das residências derruídas sublocavam cômodos. Todos os quartos, utilizados para tal fim, estavam alugados. A maioria dos inquilinos, entretanto, não era conhecida da vizinhança, pois mudava-se constantemente e quase todos eram moradores recentes. Pondera-se, no entanto, que tal maioria era formada de trabalhadores, que, provavelmente, no dia da catástrofe ainda não haviam regressado para as suas casas.

Providência importante - Por mais incrível que pareça, alguns indivíduos, da mais baixa espécie que se possa conceber, estão se aproveitando da solidariedade popular para tirar proveito da miséria a que foram atiradas as famílias atingidas pela catástrofe de quinta-feira.

Muitos, sem autorização nenhuma, estão pelas ruas angariando donativos, dizendo-se representantes de emissoras, entidades, associações. Outros dizem-se vítimas da catástrofe, informando que residiam em uma das casas atingidas.

Ontem, por simples coincidência, um destes, quando pedia auxílio em pleno centro da cidade, dirigiu-se a um morador da Rua Godofredo Fraga, dizendo que morava no n. 35, exatamente o número da casa onde reside o cidadão a quem foi pedir auxílio. Diante do espanto do morador da Godofredo Fraga, o malandro, vendo-se descoberto, evadiu-se imediatamente.

Deve, pois, a polícia tomar providências urgentes a fim de evitar esses miseráveis abusos. Por seu lado, a população deve precaver-se, negando-se a dar auxílio direto às pessoas que se dizem vítimas ou a desconhecidos que, em nome dos flagelados, angariam donativos. Para isto a população deve se dirigir às entidades idôneas que estejam arrecadando, à A Tribuna e ao Conselho Municipal de Assistência Social. A este último será encaminhada toda a coleta feita, pois só os seus serviços estão em condições de identificar os verdadeiros flagelados e calcular a extensão dos prejuízos e necessidades de cada um.

Conselho de Assistência - O Conselho Municipal de Assistência Social vem trabalhando ininterruptamente nestes últimos dias. No domingo atendeu ao público, desde as 9 horas da manhã até as 21 horas. Atende não só às vítimas do Marapé, como ainda todas as famílias, de outros bairros e outros morros, que tiveram seus chalés inundados, ou que tenham suas casas em zonas consideradas perigosas e, por isto mesmo, já interditadas.

O Conselho vem funcionando com grande atividade, sob a dedicada orientação de d. Alayde Oliveira Rato, auxiliada por Helena Coelho Caldeira, assistente social do Sesi, que se ofereceu, como voluntária, para prestar serviços ao conselho, que conta, ainda, com duas assistentes do Serviço Social do Estado, Graziela Ferreira, Cristina Inglês de Souza.

Ali, todos os atingidos pela fúria dos elementos, que tantos prejuízos causou à população humilde de Santos, estão sendo atendidos, um por um, sendo seus endereços antigos e atuais anotados, número de pessoas da família e demais dependentes, necessidades imediatas e posteriores.

De posse desse levantamento, que será confirmado depois, através das visitações, o Conselho fará uma justa aplicação de todas as verbas e donativos concedidos às famílias flageladas.


VIOLENTA A AVALANCHE DO MORRO DE SANTA TEREZINHA, APÓS ROLAR PELA ESCARPA MAIS DE 200 METROS, ARRASOU E SOTERROU TUDO O QUE ENCONTROU - Esta foto, batida na manhã de ontem, mostra a Rua Godofredo Fraga, já desobstruída. Por ela tem-se uma idéia exata da destruição trágica provocada pelo desmoronamento daquela parte da encosta do Morro de Santa Terezinha. Tomando-se como referência a "pedra do macaco" (na encosta direita do morro), constata-se nitidamente que o volume de terra deslocado foi o que estava contornado pela grande fenda aberta na encosta e desaparecida após a avalanche. Confronto com a situação anterior permite que se note que a base do morro, industrializada pela pedreira, era menor no dia do desastre, isto é, havia menos base para o bloco fendido.
A fatalidade que atingiu aquele ponto do bairro do Marapé não podia ser prevista por ninguém. Era generalizada a opinião de que se tratava de um único bloco de granito, impossível, por isto, de sofrer derruições parciais. Somente hoje, infelizmente, essa terrível evidência prova o contrário. Eis porque suas causas fatais não podem permanecer ignoradas. A cidade continuará crescendo e continuará sob a necessidade de resolver os seus mais sérios problemas de urbanismo, como o das habitações nos sopés dos morros, para cuja previsão e planejamento nossa atenção foi brutalmente despertada com a triste experiência do Marapé.
Medite-se na violência da avalanche, que atravessou um quarteirão inteiro, soterrou uma rua e derruiu casas do outro lado, sacrificando tantas vidas que confiavam na contextura granítica do morro. Nunca mais se apagará da memória dos santistas esse espetáculo de horror de que esta foto nos dá a exata dimensão. Nunca mais. -
(Foto de René Ferreira, com exclusividade para A Tribuna)

Foto e legenda publicadas com a matéria, na última página

Colaboração do Sesi - O Sesi vem, igualmente, colaborando com a campanha de amparo às vítimas do temporal de quinta-feira. Colocou, à disposição do Conselho, não só suas assistentes sociais, como também sua cozinha e seu estoque de víveres. Basta o Conselho Municipal indicar o local e a quantidade de gêneros necessários ao amparo de emergência, nesses dias, às famílias que se encontram abrigadas pelas associações, colégios, clubes, entidades etc.

Solidariedade de Paraguaçu - A Tribuna recebeu, ontem, o seguinte telegrama dos funcionários do Banco do Brasil, da cidade de Paraguaçu: "Funcionários do Banco do Brasil de Paraguaçu, sensibilizados com dolorosa catástrofe que abalou profundamente família santista rogam a Deus sejam consolados todos os lares enlutados. (a) Antonio Alonso, Hélio Simão, Hélio Pires, Mário Fernandes, Rubens Vieira Rios".

Contribuição da AABB - A Associação Atlética do Banco do Brasil, solidarizando-se com a campanha de amparo às vítimas do Marapé, fez, entre seus sócios e funcionários daquele Banco, uma coleta de donativos em dinheiro, que ontem entregou à direção de A Tribuna, no total de Cr$ 19.110,00.

Contribuição de funcionários municipais - Além de uma centena de funcionários municipais que dedicaram um dia de vencimento ou salário em benefício das vítimas da catástrofe que abalou a cidade no dia 1º de março, cuja relação nominal já publicamos, deram espontaneamente suas adesões mais os seguintes servidores:

Áureo de Oliveira, Giovanina Pierri, Manoel dos Santos Gama, José Feliciano Ferreira, Valdomiro Andrade, Lígia Maria Machado Chaves, Coaracy Freire Costa, Mauro Mendonça, Antonio da Silva Cordeiro, Guiomar Moran Azevedo, Antonio Nascimento, José Longobardi, dr. Clóvis de Lacerda, dr. Antonio Oliva Netto, dr. José Dantas, dr. Manoel Silvestre Figueiredo, dr. Adolfo Barreto de Andrade, dra. Maria de Lourdes Domingues, Midbel Remígio da Silva, dra. Vitalina C. Rodrigues, dr. Archimedes Derito, dra. Siomara Balthazar da Silveira Trocoli, dr. José Henrique Costa, dr. Lauro Leite Soares, dr. Mário Saraiva, Laureano Rodrigues Lamas, Nestor Basseto Júnior, professora Carmen Florio Ellner, Gilda Rodrigues Carvalho, professoras: Zoraide Lopes de Moraes, Jacy Sant'Ana Alves, Helena Vieito, Maria d'Anunciação Marques, Maria de Lourdes Lustoza da Silva, Inocência Mercedes Lombardi, Dinorah de Lima Ferreira, Aurora das Mercês Gomes S. Alves e Rosoleta Montenegro, Álvaro Miller.

Ofícios e telegramas recebidos pelo prefeito municipal - O prefeito Antônio Feliciano recebeu, no dia de ontem, ofícios e telegramas de pesar pelo funesto acontecimento de 1º de março, da Cruz Vermelha Brasileira, Jóquei Clube S. Vicente, Otávio Ribeiro de Araújo, Lions Clube de Santos, administração, fiscais, feitores, auxiliares, motoristas e assalariados da Limpeza Pública, autorizando o desconto de um dia em seus vencimentos em favor das vítimas da catástrofe; Moinho Santista, encaminhando cheque no valor de Cr$ 20.000,00; Soc. Melhoramentos do Morro de S. Bento, d. Zulmira Fortes Gato, vereador em Itanhaém; dr. Lofredo Júnior, juiz de Direito em Itapira; prefeito e vereadores de Pedro de Toledo; Rocha, 1º tabelião de Paraguaçu; Valentim F. Bouças, do Rio de Janeiro; A. Nahas, Luiz Roberto Vidigal, José da Rocha Mendes Filho, deputado estadual; Ricardino Fonseca Rodrigues, Joaquim Pacheco Cirilo e Derville Alegrete, de S. Paulo; José Maria Pascoalini, prefeito de Ourinhos; Justiniano Passos, vice-prefeito de S. Vicente; Alberto Peres, prefeito de Araras; Sebastião José Abraão, presidente do Rotary Clube de Socorro; João Silveira Sobrinho, prefeito de Itapira; engenheiro Antônio Pozzolo, vice-prefeito de Santo André, e Edgar Perdigão, ora em Curitiba.

Show no Pavilhão Teatro "Irmãos Almeida" - Em benefício dos desabrigados em conseqüência dos desabamentos no Marapé, será realizado, no dia 19 do corrente, às 20,30 horas, no Pavilhão Teatro "Irmãos Almeida", gentilmente cedido, um grande show a cargo de Guaracy Sampaio, do qual participarão artistas do rádio e do teatro de Santos. Os preços serão os seguintes: cadeira, 20,00; geral, 10,00.

Agradece o governador o interesse do chefe da Nação - O governador do Estado enviou ao presidente da República, sr. Juscelino Kubitschek, telegrama agradecendo as manifestações de pesar do governo da República, ante os acontecimentos de Santos. O telegrama do governador paulista está redigido nos seguintes termos:

"Agradeço telegrama de v. excia. referente à tragédia que alcançou a nobre cidade de Santos. O interesse revelado por v. excia. comoveu este governo e o povo paulista. Normaliza-se a vida naquela cidade, estando o prefeito Feliciano e autoridades estaduais e federais empenhados no socorro às vítimas, procurando minorar os sofrimentos. Se necessário, o governo do Estado recorrerá a v. excia.".

Redução do policiamento - O governador do Estado determinou a redução do policiamento do bairro do Marapé, área do Morro de Santa Terezinha, normalizando-se o da cidade de Santos.

O povo de Santo André colabora, enviando donativos aos flagelados - Procedente de Santo André, chegou ontem, às 23,30 horas, em Santos, a comissão organizadora que angariou donativos para os flagelados da catástrofe do Morro de Santa Terezinha, no Marapé. A referida comissão é composta dos srs. Antônio Henrique, presidente; José Lopes Camargo, 1º secretário; sr. Nilo Pena, 2º secretário; e Henrique Arcuri, tesoureiro, e veio acompanhada do sr. Teófilo Cardoso, vereador à Câmara Municipal daquele Município.

Aquela comissão foi recebida na Prefeitura pelos membros da Associação Municipal de Assistência Social e fez a entrega dos donativos oferecidos pelo povo de Santo André, constando de móveis, gêneros alimentícios em geral e roupas para homens, senhoras e crianças, além de roupas de cama. Em dinheiro, a comissão trouxe a importância de Cr$ 21.500,00.

Oferecimento da Prefeitura de Santo André - O sr. Pedro del Antonia e dr. Antônio Pezzolo, prefeito e vice-prefeito daquele Município, colaboraram com a comissão organizadora, cedendo caminhões da Prefeitura para o transporte a esta cidade dos donativos oferecidos pelo povo de Santo André.



ENTULHOS COLOCADOS NA PRAIA - Com a urgente necessidade de se iniciar os serviços de salvamento, na noite de quinta-feira, e como a chuva houvesse tornado intransitáveis as saídas da cidade, os entulhos, retirados do bairro do Marapé, tiveram que ser descarregados na praia do José Menino, a fim de que os caminhões pudessem voltar, rapidamente, ao local da catástrofe, onde faziam o carregamento da terra para a rápida desobstrução do local. No dia seguinte, entretanto, os escombros já começaram a ser transportados para outro lugar. Ontem, a Prefeitura iniciou a limpeza da praia, ocupada naquela hora de emergência. Há, contudo, a necessidade de acelerar tais serviços, porque aquele entulho exala mau cheiro, devido aos animais mortos que, com ele, foram atirados à praia
Foto e legenda publicadas com a matéria, na página 6

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