Nuno lembra o frisson que a peça causou
Foto: Carlos Nogueira, publicada com a matéria
Primeiras cenas de nu chocaram
Da Reportagem
Como não tinha sentido, no Brasil, a bandeira dos EUA,
eles saíam debaixo de um pano branco que representava a paz. Durante a cena, na platéia, ouvia-se um sonoro "Ooooooh!". O elenco estava nu.
O que é muito comum nos tempos atuais, em 1970 causou enorme frisson. Vários
dias antes já era o assunto mais discutido nas rodinhas de quem apreciava teatro: Hair viria para o Teatro Coliseu.
"Na verdade, o nu era o apelo principal da peça. E a gente fazia numa boa. Como também
havia influência do movimento hippie, tudo isso despertava mais a curiosidade. Uma coisa é saber que há nu, outra é vê-lo no palco", lembra o
ator santista Nuno Leal Maia.
"Foi maravilhoso representar no Coliseu, por ser em Santos e um dos mais importantes
teatros do Brasil. Foi minha estréia nele, já que, antes, o freqüentei somente para assistir a filmes", conta o ator.
Nuno Leal Maia não participou dos movimentos teatrais amadores. Ele foi para São Paulo
fazer a Escola de Arte Dramática (EAD), da USP, fez teste para Hair, passou, mas ficou de stand by. "Um dia me telefonaram. A peça
estreou em outubro de 1969 e eu entrei em fevereiro de 1970. Minha estréia já foi como profissional".
Fazer a peça, conta, era muito bom, não somente pelo texto e pela direção de Ademar
Guerra, mas por ser muito assistida. "Somente quando a gente fazia matinê, no meio de semana, no Rio, o teatro não lotava".
Sobre o colega Ney Latorraca, Nuno conta que ele entrou depois, em substituição ao
ator Laerte Morroni (já falecido e que encantou os mais velhos fazendo também o Garibaldo, na série infantil Vila Sézamo). "Ele fazia a
mulher que saía da platéia e subia no palco".
Em férias, Nuno Leal Maia terminou seu ciclo, após quatro anos, na novelinha
Malhação. É comum a troca de elenco, tanto que também saíram Cristiana Oliveira, Paulo Betti e o santista Oscar Magrini.
"Estou querendo, para março, montar uma peça. Sou contratado da Globo, mas não fui
sondado por nenhum autor ou diretor para fazer novela. Espero que até o Carnaval isso não aconteça. Preciso descansar".
Em seus planos estão o retorno ao Teatro Coliseu. "A Cidade merece ter o teatro de
volta por tudo o que ele significa para a cultura. Seria uma honra poder pisar novamente no palco. Vou pensar nisso".
Neyde viu o teatro perder seu brilho
Foto: divulgação, publicada com a matéria
Sonhando com mais uma noite
Da Reportagem
"Minha relação com o Teatro Coliseu, inicialmente, foi
afetiva. Criança, minha mãe me contava a história de um tio (Álvaro Castro) que todo sábado apresentava, no palco, um episódio de Família do
Matraca, um tipo de Família Trapo, no qual ele era o protagonista. Eu não era nascida", revela a atriz e diretora de teatro santista
Neyde Veneziano.
Como atriz, ela estreou no Coliseu em 1965, com as peças A Crômica e O
Cristo Nu, ao lado de Jandira Martini, Ney Latorraca, Elias Tambur, Marli Nunes e Rubens Ewald Filho, entre outros, em montagens do Teatro
Escola, da Faculdade de Filosofia. "O Coliseu já estava decadente, mas a gente se sentia nas nuvens".
Neyde Veneziano revela que está aguardando com muito orgulho a reinauguração, pois
entende que, muito mais do que um imóvel, ela resgata a história da Cidade, mostra que ela não é somente praia e Porto, mas também cultura.
"Não sei como será o agendamento, mas gostaria muito de voltar ao palco do Teatro
Coliseu. Tenho um espetáculo pronto, que traz de volta o melodrama, E o Céu Uniu Dois Corações. Com ele vamos participar do Festival
Profissional de Teatro de Curitiba. Na verdade, maravilhoso, mesmo, seria a gente montar um peça com todos os atores santistas (Ney, Jandira,
Serafim, Sérgio Mamberti e os mais novos). Nem que fosse só para uma noite".
A atriz com Ney, Soffredini e Tambur
Foto: divulgação, publicada com a matéria
Santistas participaram do lendário musical Hair
Da Reportagem
"O espelho de uma cidade são seus teatros. Se eles são
bons, a cidade é boa". A análise é de um filho da terra: Ney Latorraca, muito feliz pela recuperação do Teatro Coliseu.
Para ele, é uma vitória da população e tem importância nacional, afinal de contas
trata-se de um patrimônio cultural de inestimável valor, no nível dos teatros municipais de São Paulo e Rio de Janeiro. "Todos ganham: as pessoas, a
Cidade, a classe artística, a cultura do País. Poucos teatros, no mundo, são como o Coliseu".
Ney Latorraca
Foto: divulgação, publicada com a matéria
O
santista começou no teatro amador com a peça Pluft, O Fantasminha, no Colégio do Canadá, dirigido por Serafim Gonzalez. Depois, integrou o
grupo Teatro Escola, da Faculdade de Filosofia. Sua estréia (como amador) no Teatro Coliseu foi com os textos O Cristo Nu e A Crômina
(de cromo, cor), de Carlos Alberto Soffredini, que também assinava a direção.
"Foi fantástico, emocionante. Estávamos pisando o Coliseu, um templo nos moldes dos teatros
municipais do Rio de Janeiro e de São Paulo. Outra coisa que mexeu com a gente foi a disposição da platéia, bem diferente da dos teatros
convencionais".
Depois, Ney foi à luta atrás do profissionalismo em outras terras: São Paulo e Rio de
Janeiro. Voltou ao Teatro Coliseu somente em 1970, com a então polêmica peça Hair, com direção de Ademar Guerra, na qual os atores ficavam
nus no palco. "A gente ia fazer apenas uma apresentação e ficou uma semana em cartaz. Foi demais. E na minha terra".
Contente com o desfecho sobre o Coliseu, o ator santista não tem papas na língua ao
falar em como o imóvel deve ser usado. "Somente para teatro, música clássica e dança. Nada de shows de rock (com esse pessoal que
quebra o palco), formaturas ou festas sociais".
Ao saber que espetáculos de qualidade comprovada, como Bibi In Concert e
Ópera do Malandro estão na programação, ficou satisfeito. Ele também tem o desejo de retornar ao Coliseu.
"Com as gravações da novela (Bang-Bang) fico com a cabeça nas nuvens. São
muitas horas à disposição da equipe técnica, não dá para pensar em nada. Mas quando acabar, quero escolher um espetáculo para levar ao Coliseu. Pode
até ser uma seleção de cenas de Irma Vap, cujo filme estréia em março".
Ney Latorraca (ao centro) estava no elenco de Hair que veio ao Coliseu
Foto: arquivo pessoal, publicada com a matéria
Um grande pianista quer voltar, agora como regente
Da Reportagem
Ele perdeu os movimentos das mãos em um acidente,
afastando-se do piano. Mas jamais abandonaria a música. O pianista João Carlos Martins, agora regente, virá a Santos em maio, à frente da sua
orquestra, a Sinfônica Bacchiana.
"Espero que seja em concerto no Teatro Coliseu. O solo de piano será do maestro Luís
Gustavo Petri, regente da Orquestra Sinfônica Municipal. É só nessa ocasião que ele toca piano", revela Martins.
Para ele, a vontade de ocupar o palco do teatro é emocional e histórica. Foi lá que,
pela primeira vez na vida, se apresentou junto com uma orquestra, já que o Municipal de São Paulo estava em reforma. Antes, havia tocado no Teatro
Colombo, que não tinha a importância do Municipal e nem a do Coliseu.
De acordo com João Carlos Martins, seu primeiro concerto na Cidade foi em 1956,
durante o festival comemorativo dos 200 anos de nascimento de Mozart. "Foi com a Orquestra Sinfônica de Santos, com regência do maestro Moacir
Serra. Toquei a 27ª em Si Bemol Maior. Eu tinha 15 anos. Nervoso? Não. Eu já tinha feito recitais individuais e entrava no palco como um leão. É com
esse espírito, aliás, que estou de volta".
A apresentação foi organizada pela Comissão Municipal de Cultura. "A platéia estava
lotada e engravatada. Foi emocionante. Pretendo reviver esse sentimento no Coliseu".
João Carlos Martins pretende tocar no Coliseu em maio
Foto: divulgação, publicada com a matéria
As crianças também podiam assistir às óperas e operetas
Da Reportagem
Algumas lembranças jamais são esquecidas. Para a atriz
santista Jandira Martini, uma delas a faz retornar aos 8 anos. "Desde pequena eu ia assistir a óperas no Coliseu, e uma das que mais me
impressionaram foi a Tosca".
Ela conta que naquela época não havia censura, então, era comum a presença de crianças
no teatro. Mais tarde, Jandira passou a freqüentá-lo para assistir a peças teatrais.
A atriz santista teve, ainda, o privilégio de pisar o palco. Foi quando fez parte do
grupo Teatro Escola, da Faculdade de Filosofia, com as peças Cristo Nu e A Crômica (de Carlos Alberto Soffredini), ao lado dos amigos
Ney Latorraca, Eliana Rocha, Neyde Veneziano e outros.
"Foi em 1965, o teatro já não era o mesmo, mas para nós foi um imenso prazer, pois
pisávamos num dos primeiros teatros construídos no Brasil. Era como se a gente estivesse se apresentando no Teatro Municipal de São Paulo. Ainda
havia a pintura no teto, as cortinas..."
A restauração do imóvel merece elogios por parte da atriz, para quem a preservação do
patrimônio, indispensável à cultura, em geral recebe pouca atenção das autoridades governamentais. "Claro que gostaria muito de voltar a me
apresentar no Coliseu".
Com 14 anos, Jandira Martini assistiu à Tosca. Mais tarde participou de várias
peças
Foto: divulgação, publicada com a matéria
Um incentivo à cultura e à auto-estima da Cidade
Da Reportagem
"O Teatro Coliseu tem uma conhecida história de
extraordinárias apresentações. Lembro-me de uma, na noite de 25 de janeiro de 1940 (há 66 anos), do fantástico Leonid Massine, sucessor de Nijinsky,
dirigindo Le Spectre de la Rose e Scheherazade, com o Ballet Russe de Monte Carlo". A recordação é do maestro
Gilberto Mendes.
Ele também fala, com reverência, do que presenciou um ano depois com o Ballet Russe do
Coronel de Basil. "Ambos os grupos haviam surgido da divisão do mitológico Ballet Russe de Diaghilev, após sua morte, e traziam as roupas e cenários
originais de Bakst e Benoit, que hoje estão no Museu da Dança, em Londres. Devido à guerra na Europa, excursionavam pelas Américas", explica o
maestro.
Depois que a II Guerra Mundial terminou, outro mitológico dançarino desembarcou no
palco do Teatro Coliseu, Harald Kreutzberg, considerado o mestre da dança expressionista.
O maestro Gilberto Mendes também se recorda da apresentação de Desejo, de
Eugene O'Neill, na histórica encenação de Os Comediantes. E de Il Fratello Inamorato, ópera de Pergolesi, com o Angelicum de Milano,
bem como óperas da temporada de São Paulo, que desciam a Santos trazendo cantores, orquestra, cenários e roupas do Teatro Municipal de São Paulo. E,
ainda, um dos maiores compositores do século 20, o genial Villa-Lobos, regendo sua obra.
"O mais importante na reabertura do Coliseu é que ela pode reanimar a auto-estima da
Cidade, há muito tempo decadente culturalmente e voltada para uma concorrência com as cidades vizinhas na promoção de um turismo brega, de shows
de praia, em vez de concorrer com Paraty, Londrina e Joinvile em turismo de alta cultura, o que sempre foi sua missão. O pouco que resta, como nosso
querido Cine Arte Posto 4, não recebe o apoio que merece. Santos tem uma história a preservar. O Brasil começou por aqui".
Gilberto Mendes viu balés memoráveis, concertos e óperas
Foto: divulgação, publicada com a matéria
Primeiro concerto será da OSMS, para 900 convidados
Da Reportagem
A Orquestra Sinfônica Municipal de Santos, com regência
do maestro Luís Gustavo Petri, é a principal atração da estréia do novo Teatro Coliseu. Do concerto participarão ainda a pianista Beatriz Alessio, o
coral Collegium Musicum de São Paulo, Rosana Lamosa (soprano), Ednéia de Oliveira (mezzo soprano), Fernando Portati (tenor) e José Gallisa (baixo).
No programa, o Concerto para Piano e Orquestra nº 23 em Lá Maior, K 488, de Mozart, e a Sinfonia nº 9 em Ré Menor op. 125, de Beethoven.
Outras atrações serão a Camerata de Violões Heitor Villa-Lobos e o grupo de seresta
Alma Brasileira, em performances nas outras dependências do teatro. Haverá ainda exposição fotográfica de Ernesto Papa, sobre as várias fases da
restauração.
Entre os convidados, a noite será especial para Edith Pires Gonçalves Dias, autora do
livro Santos de Ontem, que contém um capítulo inteiro sobre o Teatro Coliseu.
"Estou vivendo uma ansiedade enorme. O Coliseu possui valor histórico, artístico e
social com o peso de quase 100 anos. Recuperá-lo era um dever, uma resposta do poder público, um prêmio à Cidade", entende.
Edith Pires escreveu sobre o Coliseu...
Foto: Carlos Marques, publicada com a matéria
Orgulho - "Uma emoção forte, um imenso orgulho, porque estamos concluindo um
projeto complexo, que fez parte de quatro governos municipais. E nós também fizemos a nossa parte, injetando R$ 5 milhões. O Coliseu é teatro com
alma santista, mas tem caráter nacional, devido à sua importância", revela o prefeito João Paulo Tavares Papa.
Agora, o ele está empenhado em tomar todas as medidas necessárias para o bom
funcionamento do teatro, como a criação de uma Organização Social para cuidar da agenda e, mais o importante, captar recursos.
"Manter um teatro do porte do Coliseu não é fácil. E como é um equipamento que tem
tudo para trazer os grandes espetáculos, com nomes famosos, tenho certeza de que o empresariado vai nos prestigiar".
...e prefeito Papa supervisionou a reforma
Foto: Raimundo Rosa, publicada com a matéria
|