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O Coliseu, próximo da ressurreição
Depois de muitas controvérsias, declarações inflamadas e muita luta, o Teatro
Coliseu pode, brevemente, voltar a se iluminar para receber montagens teatrais, companhias de dança e outros espetáculos cênicos. Tudo porque o
Condephaat decidiu-se pela desapropriação do imóvel - cuja demolição chegou a ser iniciada - iniciativa que, ao que tudo indica, não deverá demorar
a ser concretizada.
Depende
de Marin
São Paulo (Sucursal) - A consumação da desapropriação do Teatro Coliseu depende
agora somente do governador José Maria Marin, ao qual foi encaminhado na terça-feira, pelo secretário da Cultura, João Carlos Martins, pedido de
urgência para a conclusão do processo deflagrado por parecer do Condephaat, que sugeriu a aquisição do imóvel pelo Estado e sua cessão, em comodato,
para grupos teatrais.
Não há, contudo, prazos rígidos para que o governador declare o Coliseu de utilidade
pública, o que será feito através de decreto. A informação é de Murilo Marx, que ontem exercia funções de presidente do Condephaat, porque seu
titular viajara.
Ele reiterou que o tombamento seria suficiente para a preservação física da sede do
teatro, mas a desapropriação é que realmente possibilitará o retorno do Coliseu à sua condição de casa voltada para a atividade teatral, como
reivindica a própria comunidade.
Na opinião de Murilo Marx, a mudança de governo, com a posse do governador eleito
Franco Montoro, não deverá dificultar a desapropriação do Coliseu, nem seu reaproveitamento como teatro, pois "a comunidade santista está muito
mobilizada e exercendo pressões capazes de motivar qualquer governante em favor de sua reivindicação".
Freixo contente
Uma decisão que é uma vitória da Cidade e que também agrada à empresa proprietária do
imóvel, a Freixo Cine Teatral. Assim é definida pelo advogado da empresa, Carlos Augusto Corte Real, a iniciativa do Condephaat, de desapropriar o
Teatro Coliseu. A decisão, tomada durante reunião do órgão, estendeu também as desapropriações aos teatros TBC e Oficina, em São Paulo, enquanto no
mesmo encontro foi resolvido o tombamento da Serra do Mar.
Na realidade, a desapropriação do Coliseu não pode ser tomada como um fato definitivo:
"Acho mesmo - diz Corte Real - que dizer-se que o Coliseu foi desapropriado é um pouco precipitado. Porque a desapropriação só tem início efetivo a
partir de um decreto declarando de utilidade pública o imóvel a ser desapropriado. E compete ao Governo do Estado assinar esse decreto, o que
evidentemente ainda não foi feito, mesmo porque não houve tempo hábil para isso, já que a decisão do Condephaat foi tomada terça-feira".
A luta pela conservação do Teatro Coliseu tem sido longa e movimentado os vários
setores culturais da Cidade, que não querem perder o velho e bonito espaço cultural, que já recebeu consagrados artistas nacionais e internacionais.
No entanto, a Freixo havia se decidido por derrubar a construção, uma vez que não via nela nenhuma possibilidade de lucro: "Para realizar essa
demolição - explica Corte Real - seguimos todo o processo exigido pelas normas municipais, obtendo inclusive licença da Prefeitura. Quando surgiu a
notícia do possível tombamento do prédio, nós não havíamos sido intimados. Mais tarde, fomos intimados legalmente pelo Conselho de Defesa do
Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado e imediatamente suspendemos a demolição".
Mas, com a notícia do possível tombamento do prédio, a Freixo sentiu-se
financeiramente prejudicada, uma vez que se afastaram os parceiros de um empreendimento comercial que surgiria no lugar do Coliseu. Deu entrada,
então, com ação ordinária na Justiça, objetivando proteger seus direitos de proprietária.
Corte Real espera solução rápida
Corte
Real entrou também com uma contestação longa e exaustiva, na qual afirmava que se o objetivo era preservar o Coliseu como teatro e espaço cultural,
o tombamento não resolveria o problema: "Com o tombamento, o proprietário não é despojado de seu direito de uso do imóvel. E a Freixo tem
consciência de que a atividade teatral não apresentaria resultados financeiros satisfatórios, pois acredita que o local onde o Coliseu se ergue
afasta o público, uma vez que o Centro à noite ganha características peculiares, e porque os preços a serem cobrados teriam que ser muito altos.
Sugerimos então que o Estado assumisse o ônus e os encargos da manutenção do teatro, concluindo que a maneira mais viável para isso seria a
desapropriação".
Corte Real lembrou ainda, em sua contestação, que o tombamento atingiria também os
imóveis vizinhos, que não poderiam passar por nenhuma alteração, o que acarretaria problemas a outras pessoas. "Parece que nossos argumentos foram
ouvidos, tendo-se concluído pela desapropriação. Mas é bom sempre lembrar que essa desapropriação deve ser colocada em termos futuros. Somente após
a assinatura do decreto de utilidade pública, pelo Executivo, ela tem início e a partir dessa assinatura há um prazo de cinco anos para que o Estado
entre com o processo de desapropriação. Se nesse período de tempo o processo não der entrada, o imóvel fica automaticamente liberado, podendo seus
proprietários fazerem uso dele como entenderem melhor".
O advogado explica ainda que existem dois tipos de desapropriação: a amigável e a
litigiosa, esta envolvendo o Poder Judiciário. "No nosso caso, acredito que a amigável seja mais difícil. Estamos em fim de governo, não há verbas.
Acredito mais na litigiosa, que não se confunde com a ação ordinária, a que demos entrada na Justiça, em relação aos prejuízos sofridos com a
divulgação da notícia sobre o tombamento".
Na desapropriação litigiosa, o Estado entra na Justiça, oferece um preço (em geral, o
valor venal do imóvel) e o proprietário aceita ou não. Nesse processo está em discussão apenas o valor a ser pago, uma vez que a desapropriação é
algo já definitivo. Segundo Corte Real, se houver realmente a desapropriação litigiosa, a Freixo permanece tranqüila: "Confiamos na decisão do Poder
Judiciário".
O teatro - Mas Corte Real faz um alerta à Prefeitura e a outros órgãos
competentes: "Não será suficiente a desapropriação e a iniciativa de fazer o Coliseu voltar a funcionar como teatro. É necessário provocar a
metamorfose daquela área, que apresenta muitos inconvenientes. Pode-se considerar o local como uma área de degradação social, e isso tem que ser
mudado para que o Coliseu receba normalmente o seu público".
Até que tudo esteja legalmente decidido, o velho Coliseu continuará a funcionar como
cinema (em geral estão em cartaz filmes classe C, destinados a um público específico, freqüentador da área). O processo de demolição, que já tinha
sido iniciado pela Freixo, deu fim ao palco, às coxias e aos camarins do teatro. Dentro do cronograma da demolição, essa era a primeira parte a ser
posta abaixo, enquanto o restante continuava a funcionar normalmente como cinema.
Por isso o Coliseu permanece de pé apenas até os limites da tela. No lugar do palco
ficou um buraco, mas segundo Corte Real, "essa área deve ser de fácil reconstrução". Permanece intacto, ainda, o artístico teto do teatro, com uma
pintura do italiano Fonzari, uma concepção alegórica intitulada A Consagração da Música e da Comédia. A cena representa Euterpe apreciando
uma revoada de serafins, enquanto Tália segura os símbolos da comédia e da tragédia".
"De tudo isso - encerra Corte Real - pode-se concluir que foi uma vitória da cidade. A
nossa expectativa, agora, é de que tudo termine bem, o mais depressa possível".
Grandes montagens
Um dos mais atuantes empresários artísticos, que tem trazido a
Santos inúmeras (algumas importantíssimas) peças teatrais e shows, Antônio Graça não esconde sua satisfação com a anunciada desapropriação do
Teatro Coliseu: "Com a crise que estamos vivendo, as pequenas montagens teatrais tendem a diminuir e até desaparecer. Somente as grandes - como
Chorus Line e Evita - podem sobreviver, e Santos, sem um espaço viável para apresentá-las, fica marginalizada, impedida de ver bom
teatro".
Graça tem planos
Graça
lembra que o Teatro Municipal, apesar de bem aparelhado, não apresenta, com seus 544 lugares, condições para que as grandes montagens venham a
Santos: "Não há viabilidade econômica. Os lugares são poucos, a renda obtida não dá para pagar essas peças, entre as quais podemos até incluir
Amadeus, montagens caríssimas".
Por isso, se o Coliseu voltar a funcionar como teatro, será uma ótima opção: "O custo para a
restauração total do Coliseu seria bem grande. Mas prepará-lo para começar a funcionar como teatro não seria tanto. A estrutura do teatro permanece,
com a platéia, as frisas, o foyer, os camarotes e balcões de 1ª e de 2ª e ainda o anfiteatro. São mais de 1.500 lugares aproveitáveis, no
total, o que pode inclusive resultar no barateamento do preço dos ingressos de espetáculos de teatro. Além disso, abre perspectivas para as pessoas
de menor poder aquisitivo, que podem assistir às programações nos lugares de preços mais acessíveis".
Antônio Graça acha ainda que o Estado - que deverá desapropriar o imóvel - agiria mais
corretamente se entregasse a administração do teatro à Prefeitura: "Afinal, o Poder Municipal já tem know-how na administração do Teatro
Municipal, uma certa estrutura que lhe facilitaria administrar também o Coliseu. Além disso, os salões de cima do Coliseu poderão ser transformados
em salas de balé, galerias de arte, enfim, em espaços destinados à arte e à cultura. Se realmente essa desapropriação for efetivada, será a melhor
coisa já acontecida a Santos nos últimos anos, em termos de cultura".
Solução harmoniosa
A presidenta do Centro de Expansão Cultural, Carolina Martins Costa, outra voz que
sempre se levantou contra a destruição do Coliseu, está radiante: "Eu já aguardava isso, tinha informações vindas de São Paulo de que essa medida
seria tomada. E foi, afinal, uma excelente solução, que no meu entender não prejudica a família Freixo, proprietária do imóvel".
Carolina não vê problemas no local
Carolina
Costa lembra que sempre que o Expansão precisou do Teatro Coliseu foi muito bem recebido pelos Freixo: "Mas Santos não poderia nunca perder o seu
teatro, sobre o qual sempre ouvi falar que é o quarto do Brasil, em termos de tamanho e capacidade de público. Pretendíamos uma solução bem
harmoniosa e, pelo visto, foi o que aconteceu".
A presidenta do Expansão conta que desde o início da entidade, há 35 anos, as
apresentações por ela promovidas eram realizadas no Coliseu, com longas filas espalhando-se pelos arredores: "Nós usamos muito aquela casa, e sempre
sem problemas. A última vez foi há aproximadamente dois anos, quando trouxemos a Santos a Sinfônica do Estado regida por Eleazar de Carvalho. Como
nas promoções anteriores, a nossa única medida tomada foi pedir reforço de policiamento, o que realmente aconteceu, sem que se registrasse nenhum
incidente. Por isso não concordo com os argumentos de que o local onde o Coliseu se localiza não é apropriado para receber o público freqüentador de
bons espetáculos".
Agora, com a possibilidade de o Coliseu voltar a funcionar como teatro, o Centro de
Expansão poderá, também, voltar a trazer a Santos grandes companhias de balé e outras atrações. "Inclusive os grupos de dança da Cidade - afirma
Carolina costa - poderão utilizar o local para boas montagens".
Para reafirmar a importância e o valor do Coliseu, a presidente do Centro de Expansão
conta uma pequena história: "Exatamente nessa última promoção da entidade, faziam parte da Sinfônica Estadual seis artistas americanos, contratados
da orquestra. Eu estava no palco quando os vi olharem admirados para o teatro e comentarem em seu sotaque característico: "É muito bonito! Que
beleza de teatro vocês têm aqui! Falta apenas melhorar a sua acústica".
"Por isso - conclui Carolina Martins Costa - temos confiança de que o Coliseu vai
continuar na ativa, servindo culturalmente à Cidade. Basta que todos nós, santistas, trabalhemos para isso".
Casa em ordem
Quando ainda participava da Comissão Municipal de Cultura, por volta de 1966, quando
Sílvio Fernandes Lopes era prefeito de Santos, Carlos Pinto já defendia a desapropriação do Coliseu. Foi a época em que se iniciaram os projetos
para a construção do Teatro Municipal, e ele saiu em defesa de reestruturação do Coliseu, que considerava muito mais barata do que a construção do
novo teatro.
Carlos defende a reestruturação
Hoje,
Carlos Pinto, um nome sempre ligado à cultura - em especial ao teatro e, mais especificamente, ao teatro amador - também está contente: "A atitude
do Condephaat preserva não apenas um patrimônio cultural que é do santista, mas que também tem história no teatro brasileiro". Mas ele também faz
uma ressalva: "Não interessa apenas a desapropriação. "É preciso colocar a casa em ordem e pô-la para funcionar".
Ex-presidente da Federação de Teatro Amador Santista e da Confederação Estadual, nas épocas
áureas do teatro amador, Carlos Pinto continua até hoje ligado em teatro. É o responsável pelo Centro de Cultura da Prefeitura de Cubatão, diretor
do Teatro Procópio Ferreira, ali instalado. Com seus muitos anos de experiência, sabe que um novo espaço cultural para Santos é muito importante.
"Eu, pessoalmente, estive no Instituto Nacional de Artes Cênicas e conversei com o
presidente do órgão, pedindo providências em relação a outro teatro santista, o Independência, que está fechado. Vamos ver o que pode ser feito a
respeito. Se Santos tiver três espaços para as artes cênicas terá, sem dúvida, melhores condições de revitalizar seu panorama cultural".
Especificamente em relação ao teatro amador, ele não acredita que apenas com mais
espaço para os grupos apresentarem seus trabalhos o movimento possa retornar à sua fase áurea: "Será, não nego, uma boa ajuda, mas só isso não
basta. O problema é a cabeça das pessoas. Acho mesmo é que os dirigentes teatrais amadores deveriam parar de se meter em política e partir para um
trabalho sério".
Quanto ao Coliseu, não tem dúvidas: "Só vai beneficiar. Mas está desfigurado e precisa
ser reestruturado. Além disso, o centro da Cidade, onde ele está localizado, precisa ser revitalizado, deixando de ser ponto de encontro de
marginais". |