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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - OS ANDRADAS
Uma outra visão do Patriarca

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Esta análise do perfil de José Bonifácio foi publicada pelo semanário santista Jornal da Orla, na edição de 5 e 6 de setembro de 2009:


Foto: detalhe do monumento dos Andradas, na Praça da Independência, por Leandro Amaral

CULTURA

O lado B do Patriarca da Independência

Felipe Pupo / Mauri Alexandrino - Fotos: Leandro Amaral

Em Santos, mais que qualquer outro lugar do país, a Independência do Brasil tem pai com nome e sobrenome, e não é o do imperador D. Pedro I, que proclamou a separação de Portugal às plácidas margens do Ipiranga, como se sabe e canta. José Bonifácio de Andrada e Silva, por aqui, é "o cara".

Timoneiro da Independência, Patriarca, Pai da Pátria, Inspirador da Libertação, Negociador, agitador de bastidores, são apenas alguns dos epítetos que acompanham até hoje seu nome. E isso sem considerar ainda uma cultura do tipo renascentista, na qual cabia de tudo, da mineralogia à física, passando pela química, literatura, poesia, e era ainda lingüista, poliglota... Claro que ajuda muito o fato de ter nascido bem ali na Rua Direita, que hoje, depois da República, chamamos de rua XV de Novembro. O mesmo prédio onde está hoje a Câmara Municipal, instituição republicana. Bonifácio sonhava com uma monarquia constitucional duradoura.


Foto: detalhe do monumento dos Andradas, na Praça da Independência, por Leandro Amaral

O Patriarca da Independência é considerado o filho mais ilustre da cidade. Nascido no dia 13 de junho de 1763, era herdeiro da segunda família mais rica da Vila. Teve dois irmãos quase tão ilustres quanto ele, Antônio Carlos e Martim Francisco.

Saíram todos de Santos na adolescência, cada qual a seu turno, para tornarem-se os homens mais poderosos do país no Primeiro Reinado. Retornaram à cidade, para ficar, somente depois de mortos. Faziam questão de serem enterrados aqui. Entre uma coisa e outra, participaram de todos os mais importantes fatos políticos e administrativos daquele período.

O mausoléu dos Andradas, que chamamos Panteão, é dos monumentos mais conhecidos de Santos, sempre aberto à visitação, na praça Barão do Rio Branco, e guarda seus restos mortais. Três esfinges de bronze deitadas sobre o mármore negro para sempre. Quem ainda não foi até lá, deve ir.

Até hoje os historiadores quebram a cabeça para entender quais razões levaram o herdeiro da família Andrada a se tornar um dos políticos mais importantes da história brasileira. Ajudou, é verdade, algumas habilidades militares, que poucos conhecem: em 1808, quando a França invadiu Portugal, Bonifácio lutou com bravura e angariou a fama de bom português, mesmo não sendo um, fiel ao país, à Coroa e ao Príncipe. Isso foi lembrado e levado em conta quando foi nomeado, em 1821, vice-presidente da província de São Paulo, quando iniciou sua carreira política.


Foto: detalhe do monumento dos Andradas, na Praça da Independência, por Leandro Amaral

"Foi um homem brilhante, em todos os setores onde atuou. É por isso que todas as homenagens são justas para valorizar esse ícone da historia brasileira", afirma a historiadora Wilma Therezinha, que contribuiu com o levantamento das informações que se seguem.

Vizinhança - José Bonifácio inspirava-se, como relata em seus escritos, num de seus vizinhos, igualmente ilustre, nascido na mesma rua, mas muito tempo antes do seu próprio. Era Alexandre de Gusmão, diplomata e irmão do padre voador Bartolomeu de Gusmão. Não inventou balões de ar quente como o irmão, mas deu ao Brasil a forma que conhecemos hoje, em duras negociações com a Espanha, nas quais não faltaram golpes e truques de todo tipo.

Outras margens -  O famoso grito da independência, pronunciado por D. Pedro I, foi um fato fortuito e sequer é claro que ocorreu mesmo da forma garbosa como nos mostra a tela oficial do evento, do pintor Pedro Américo. Mas as margens que acabaram ouvindo o tal grito, como diz o Hino Nacional, deveriam ser outras. As do mangue de preferência. José Bonifácio era um perfeccionista. Fez tudo a propósito para que sua carta agitadora, que desanimaria D. Pedro de qualquer possibilidade de entendimento com a Corte Portuguesa, chegasse ao Imperador exatamente em sua cidade, onde, sabia ele, o sangue lhe subiria como costumava acontecer nessas ocasiões, e acabaria se dando aqui, então, a independência do país.

Mas mesmo os mais craques diplomatas esbarram em comezinhos detalhes não previstos. Por exemplo, o fato de o príncipe se empanturrar do que não devia em Santos e ter uma terrível indisposição intestinal, termo mais adequado a quem tem sangue azul que a frase equivalente que se diria sobre o resto dos mortais. E foi tão grave o problema, que D. Pedro saiu de Santos às pressas e foi parando pelo caminho todo até São Paulo, onde a carta, finalmente, o alcançou. Diz a lenda que o original da famosa carta teve um destino inglório. O resto da história todo mundo já sabe...

Franco Maçon - O Patrono da Independência era membro da Maçonaria, que tinha em Santos um de seus baluartes no país nesta época. Os franco-maçons dedicavam-se em todo o mundo às lutas independentistas, sob a inspiração da Revolução Francesa de 1789. A Maçonaria influenciou o pensamento político de José Bonifácio e que se tornou o Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil, o cargo mais elevado da organização, um mês antes da Independência. Isso, se por um lado aumentava sua importância, atraía contra si a fúria da Igreja Católica, em luta aberta contra a Maçonaria, o que por fim pesaria decisivamente na desavença tremenda com o imperador. D. Pedro I tentava conciliar os contrários, mas a intriga era muita.

Marquesa de Santos - Durante muitos anos, José Bonifácio foi o braço direito de D. Pedro I. Mas a relação entre o imperador e o patriarca foi construída entre tapas e beijos. Nessa época, a senhora Domitila de Castro Canto e Melo, a amante mais famosa das muitas de que desfrutava o imperador, era inimiga da família Andrada. Para humilhar o antigo aliado, D. Pedro concede a Domitila o título de Viscondessa e, depois, Marquesa de Santos. Isso gerou um problema enorme. Afinal, a Vila de Santos era a terra natal de Bonifácio. O imperador não era apenas um galanteador reconhecido, mas também sabia direitinho alfinetar os desafetos. José Bonifácio considerou o episódio a maior ofensa de sua vida.

Dureza - Atualmente, o local tem uma estátua de Nossa Senhora de Fátima, no Porto de Santos, e quase ninguém mais lembra que o lugar se chama Outeirinhos. Foi para lá que Bonifácio se mudou, recém-casado, logo que chegou ao Brasil depois de estudar em Portugal. Vivia na maior dureza, sem trabalho que lhe fizesse justiça ao conhecimento e formação. Esse período foi marcado por muitas dificuldades na vida do patriarca. Ele chegou a pedir socorro financeiro aos irmãos.

Filhas - Se José Bonifácio vivesse nos dias de hoje, ele poderia se juntar ao time de estadistas e políticos pouco afeitos aos rigores da monogamia. O patriarca teve duas filhas fora do casamento. Uma delas morou na França e recebia dinheiro enviado pelo pai. A outra nasceu em Portugal e foi adotada legalmente por ele. Para estranheza geral, batizou a filha bastarda com o mesmo de sua esposa, a irlandesa Narcisa Emilia O' Leary. De seu casamento teve duas filhas.

Filho do Homem - Após um longo período de desavenças, o imperador D. Pedro I se reconciliou com a família Andrada. Continuava não gostando de atitudes e pensamentos de Jose Bonifácio, mas reconhecia nele um homem íntegro e de confiança. Tanto que, com a crise do Primeiro Reinado, o imperador, ao abdicar da Coroa, tornou-o tutor de seu filho, futuro D. Pedro II, em 1831. Sob sua criação e empenho, esse monarca tornou-se o oposto de seu pai. Tornou-se homem culto, caseiro, tradicional, correspondente dos maiores estadistas e cientistas de seu tempo, entre eles, Pasteur e Gobineau, e foi considerado o mais ilustrado dos mandatários de seu tempo.

Escapamos - Em 1839, os paulistanos decidiram homenagear o Patriarca da Independência, que morrera no ano anterior. Foi então que surgiu a idéia de elevar a vila, onde Bonifácio nasceu e foi enterrado, à condição de cidade. Até aí, tudo certo. Só que pairou uma dúvida no ar: como deveria se chamar a nova cidade? A primeira proposta foi transferir o nome da vila para o município. Porém, surgiram mais dois nomes na disputa: Andradina e Bonifácia. Existe uma Andradina, como se sabe, perto de Mirandópolis e Castilho, e até uma cidade chamada José Bonifácio, que fica perto de São José do Rio Preto. Para nós, felizmente, prevaleceu a proposta de Cidade de Santos. Ufa, que sorte!


Foto: detalhe do monumento dos Andradas, na Praça da Independência, por Leandro Amaral

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